Acórdão Nº 0004138-95.2010.8.24.0040 do Quarta Câmara de Direito Comercial, 27-07-2021

Número do processo0004138-95.2010.8.24.0040
Data27 Julho 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 0004138-95.2010.8.24.0040/SC



RELATOR: Desembargador JOSÉ CARLOS CARSTENS KOHLER


APELANTE: ALCIDES JOSÉ FRETTA (AUTOR) APELADO: BANCO BRADESCO S.A. (RÉU)


RELATÓRIO


Alcides José Fretta interpôs Recurso de Apelação (ev. 107, anexo 820, autos de origem) contra a sentença prolatada pela Magistrada oficiante na 1ª Vara Cível da Comarca de Laguna - doutora Elaine Cristina de Souza Freitas - nos autos da presente "ação declaratória de nulidade de ato jurídico e pedido de indenização por danos materiais e morais c/c pedido de tutela antecipada" ajuizada pelo Recorrente em face do Banco Bradesco S.A., cuja parte dispositiva restou vazada nos seguintes termos:
Ante o exposto, com base no art. 487, inciso I, do CPC, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados na inicial e, em consequência, julgo extinto o processo, com resolução do mérito.
Condeno o requerente ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios sucumbenciais, os quais fixo em R$ 1.000,00 (mil reais), nos termos do art. 85, § 8º, do CPC.
(ev. 107, anexo 814, autos de origem).
Em suas razões recursais, o Apelante aduz, em síntese: (a) a nulidade da sentença por carência de fundamentação, notadamente acerca da falta do seguro rual; (b) a inversão do ônus da prova; (c) a inexigibilidade da dívida em razão da ocorrência de caso fortuito e força maior; (d) a ausência de assistência técnica obrigatória; (e) a perda da pretensão; (f) a indenização por danos materiais e morais; e (g) a inversão dos ônus sucumbenciais.
As contrarrazões foram apresentadas (ev. 100, autos de origem).
Empós, os autos ascenderam a este grau de jurisdição, sendo distribuídos para esta relatoria por sorteio.
É o necessário escorço

VOTO


Primeiramente, conheço do Recurso porque satisfeitos os requisitos de admissibilidade.
Esclareço, por oportuno, que a decisão recorrida se subsome ao regramento processual contido no Novo Código de Processo Civil, porquanto a publicidade do comando judicial prolatado pelo Estado-Juiz se deu em 19-8-19, isto é, já na vigência do CPC/15.
1 Das preliminares
1.1 Do cerceamento de defesa
Cuido de ação movida por Alcides José Fretta em que se pretende a declaração de nulidade das cédulas de crédito rural hipotecárias ns. 200205003, 200305015 e 200405006, firmadas com a Instituição Financeira ré, bem como a condenação desta ao pagamento de indenização por danos morais e materiais.
Das teses recursais, verifico que o Requerente inaugura sua pretensão defensiva argumentando, como preliminar de mérito, a omissão do Juiz de Direito ao não considerar a inversão do ônus da prova.
Segundo defende, a prova testemunhal requerida na petição inicial foi ignorada pelo Julgador.
Apesar de bastante arrevesada, não tendo sido muito clara as argumentações recursais, o que se percebe é o desígnio do Recorrente de ver desconstituída a decisão zurzida face a ocorrência de cerceamento de defesa, para a produção da prova testemunhal.
Entretanto, diferentemente do verberado pelo Requerente, a produção de provas em nada contribuiria para a solução da controvérsia.
Isso porque a questão versa unicamente sobre matéria de direito, motivo pelo qual não se constata qualquer mácula no julgamento antecipado da lide.
Ora, o Pergaminho Fux expressamente estabelece no inciso I do seu art. 355 que o Estado-Juiz julgará antecipadamente o pedido proferindo sentença com resolução de mérito quando "não houver necessidade de produção de outras provas".
Deve-se ter em mente que o destinatário das provas é o Magistrado que julgará a causa, incumbindo-lhe determinar a produção daquelas que entender necessárias ao julgamento do mérito.
Nesse viés, é clarividente a regra contida nos arts. 370 e 371, ambos do Novo Estatuto de Ritos:
Art. 370. Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito.
Art. 371. O juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento.
No caso em testilha, as genéricas alegações hasteadas nas razões recursais não justificam a desconstituição da sentença para produção de provas, porquanto não logrou o Recorrente positivar a imprescindibilidade delas.
Aliás, a controvérsia é suficientemente dirimida pelos contratos ajoujados nos autos, não havendo qualquer necessidade de produção de prova testemunhal.
A medida retardaria desncessariamente o andamento da marcha processual, em ofensa aos princípios da celeridade e economia processuais e da duração razoável do processo.
Dessarte, não há falar em violação ao direito de defesa.
1.2 Da ausência de fundamentação
O Recorrente também argumenta que a sentença zurzida deve ser descontituída, por ofensa ao art. 489, § 1º, do Pergaminho Fux, em razão da ausência de enfrentamento da tese de obrigatoriedade de instituição do seguro rural.
A prefacial imerece lograr êxito.
Compulsando a sentença, observo que a togada a quo - doutora Elaine Cristina de Souza Freitas - expressamente enfrentou o tema hasteado - contratação de seguro rural (ev. 107, anexo 802, autos de origem) - não havendo, portanto, o vício urdido.
Logo, a decisão é mantida.
2 Do mérito
2.1 Da inexigibilidade do contrato
O Autor, produtor rural, fomentado pelo Programa Estadual de Cultivo de Camarões Marinhos da Epagri, UFSC e ACCC, resolveu implantar atividade de carcinicultura em sua pequena propriedade rural.
Alterca que face a natureza da atividade teve que aderir empréstimos com a Instituição Financeira, ora ré.
Alega que ofereceu como garantia aos títulos diversos imóveis de sua propriedade.
Suscita, entretanto, algumas ilegalidades praticadas pelo Banco, dentre as quais a não observância à cláusula que prevê a obrigatoriedade de assistência técnica especializada, bem como o fornecimento do seguro rural obrigatório.
Em relação ao tema em voga - caso fortuito e força maior - o Requerente advoga pela inexigibilidade da dívida em razão de o inadimplemento ter ocorrido justamente pela perda da produção.
Argumenta que a sua produção de camarões foi contaminada por um agente infeccioso - "vírus da mancha branca" - que dizimou o cultivo de camarões.
Pois bem.
É fato notório que no longínquo ano de 2004 os praticantes da carcinicultura foram acometidos pela mencionada epidemia viral que atingiu profundamente a criação dos crustáceos.
Os acontecimentos na época tomaram conta dos noticiários. Aliás, basta uma pesquisa na rede mundial de computadores para encontrar diversas matérias a respeito do assunto.
Acerca da ocorrência de caso fortuito ou força maior o Código Civil de 2002 preconiza que:
Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado.
Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir.
Desponta incontroverso nos autos que a atividade do Autor restou parasalida em razão da contaminação viral em questão.
Conforme parecer técnico da Cidasc, o agente infeccioso, denominado de "vírus da mancha branca", foi considerado de impossível erradicação - ev. 107, anexo 120, autos de origem.
Não se discute, portanto, que o referido contágio implicou na mortalidade massiva dos camarões e assolou o cultivo em cativeiro de crustáceos de todo o Estado de Santa Catarina, não sendo diferente a situação do Autor, infelizmente.
E nem se diga que a contaminação pelo vírus da "mancha branca" teria sido previsível na época ou que ela decorre do risco da atividade empresarial desenvolvida pelos carcinicultores.
Ora, além de o Banco não colacionar qualquer prova nesse viés, esses argumentos são amplamente rechaçados pela jurisprudência remansosa deste Sodalício.
Confira-se:
APELAÇÃO CÍVEL - EMBARGOS À EXECUÇÃO - CÉDULA RURAL HIPOTECÁRIA OBJETIVANDO O FOMENTO DA ATIVIDADE PESQUEIRA - SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA - INSURGÊNCIA DA PARTE EMBARGANTE.
POSTULADA A APLICAÇÃO DA TEORIA DA IMPREVISÃO - CARCINICULTURA (CULTIVO DE CAMARÕES) - ATIVIDADE QUE RESTOU ATINGIDA PELO VÍRUS DA "MANCHA BRANCA" - PATOLOGIA QUE OBSTOU A CONTINUIDADE DO NEGÓCIO - INADIMPLEMENTO INVOLUNTÁRIO DA OBRIGAÇÃO ASSUMIDA COM A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA EM RAZÃO DE EVENTO DE NATUREZA IMPREVISÍVEL E INEVITÁVEL - AUSÊNCIA DE CULPA DA PARTE EMBARGANTE - FORÇA MAIOR CARACTERIZADA - EXEGESE...

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