Acórdão Nº 0004163-07.2019.8.24.0004 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 03-12-2020

Número do processo0004163-07.2019.8.24.0004
Data03 Dezembro 2020
Tribunal de OrigemAraranguá
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão



Apelação Cível n. 0004163-07.2019.8.24.0004

Relator: Desembargador Luiz Zanelato

APELAÇÃO CÍVEL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA PROFERIDA EM AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. SENTENÇA QUE ACOLHEU A IMPUGNAÇÃO E EXTINGUIU O PROCESSO DE EXECUTIVO.

RECURSO DO EXEQUENTE/IMPUGNADO.

ADMISSIBILIDADE RECURSAL. PLEITO DE JUSTIÇA GRATUITA. DOCUMENTOS ACOSTADOS AOS AUTOS QUE EVIDENCIAM A ALEGADA INSUFICIÊNCIA FINANCEIRA. NECESSIDADE DA CONCESSÃO DO BENEPLÁCITO COMPROVADA. EXEGESE DO ART. 98, "CAPUT", DO CPC/2015 e ARTIGO 5º, INCISO LXXIV, DA CRFB/1988.

ALEGADO DEVER DE INDENIZAR O VEÍCULO PELO VALOR DA TABELA FIPE NA DATA DA VENDA EXTRAJUDICIAL DO BEM. TÍTULO EXECUTIVO QUE APENAS DETERMINOU A RESTITUIÇÃO DO BEM, SEM EXPRESSAR O MODO PELO QUAL DEVERIA OCORRER A CONVERSÃO EM PERDAS E DANOS. ÓBICE AO PROVIMENTO DO PEDIDO DO EXEQUENTE SOB PENA DE OFENSA À COISA JULGADA.

EXTINÇÃO PROCESSUAL, TODAVIA, EQUIVOCADA. CONVERSÃO EM PERDAS E DANOS AUTORIZADA PELO ARTIGO 821, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC. POSSIBILIDADE DE CONVERSÃO DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA PARA INSTAURAR PRÉVIA FASE DE LIQUIDAÇÃO, SEM PREJUÍZO DAS GARANTIAS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. PRINCÍPIOS DA ADAPTABILIDADE PROCEDIMENTAL, INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS, DA PRIMAZIA DO JULGAMENTO DE MÉRITO E DA ECONOMIA PROCESSUAL.

"O princípio da adaptabilidade é dirigido ao julgador. Incide num momento processual ou judicial. O magistrado deve aplicar as regras do procedimento de modo a melhor adaptá-lo às peculiaridades do caso concreto. O princípio da adaptabilidade permite ao magistrado adaptar o processo: a) às regras constitucionais, por exemplo, aplicando o contraditório nos procedimentos em que ele não foi previsto; b) determinando a inversão do ônus da prova, para atribuí-lo a quem tem melhores condições de produzi-la, de acordo com o caso concreto; c) determinando a conversão do procedimento (ex.: conversão da ação de execução em ação monitória, quando o título executivo estiver prescrito; conversão da monitória em procedimento comum, na hipótese do art. 700, § 5o, do CPC; conversão da ação de busca e apreensão em ação de depósito; conversão do divórcio litigioso em consensual etc.); d) dilatando os prazos processuais e alterando “a ordem de produção dos meios de prova, adequando-os às necessidades do conflito de modo a conferir maior efetividade à tutela do direito” (art. 139, VI, CPC); e) possibilitando ao relator, na ação rescisória, fixar o prazo de resposta, dentro dos limites do CPC (15 a 30 dias – art. 970, CPC); f) possibilitando ao juiz limitar o litisconsórcio multitudinário (somente para o litisconsórcio facultativo), quando o grande número de litisconsortes puder prejudicar o exercício do direito de defesa (art. 113, § 1o, CPC). [...] O princípio da adaptabilidade é aplicado diuturnamente pela jurisprudência, ainda que sem referência a essa nomenclatura, quando adapta o procedimento às peculiaridades do caso concreto". (LUNARDI, Fabrício C. Curso de Direito Processual Civil. 3.Ed. São Paulo: Saraiva, 2019, p. 91-92).

RECURSO CONHECIDO E PROVIDO PARCIALMENTE.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0004163-07.2019.8.24.0004, da comarca de Araranguá 2ª Vara Cível em que é Apelante Gilberto da Silva e Apelado Banco Santander Leasing S/A.

A Primeira Câmara de Direito Comercial decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Mariano do Nascimento, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. José Maurício Lisboa.

Florianópolis, 03 de dezembro de 2020.




Desembargador Luiz Zanelato

Relator





RELATÓRIO

Gilberto da Silva apresentou pedido de cumprimento de sentença contra Santander Leasing S/A Arrendamento Mercantil, no qual requer o pagamento da condenação dos autos n. 0500361-85.2012.8.24.0004, no valor de R$ 6.235,97 (seis mil duzentos e trinta e cinco reais e noventa e sete centavos – fls. 5-6), decorrente da diferença no valor depositado em juízo e valor da tabela FIPE do veículo na data de sua venda.

Pela decisão de fl. 8, o magistrado da causa determinou o levantamento do valor depositado em juízo, bem como a intimação do executado para efetuar o pagamento da condenação.

Em 25-5-2016, foi proferida sentença de extinção da execução, em razão da quitação do débito exequendo (fl. 20), sobrevindo recurso de apelação pelo executado (fls. 24-30), o qual foi provido para cassar a sentença (fls. 49-56).

Com o retorno dos autos à origem, determinou-se ao exequente apresentar cálculo atualizado da dívida e, após, a intimação do devedor para proceder ao pagamento da condenação (fls. 60-61).

Às fls. 64-65, o exequente pugnou pelo pagamento de R$ 9.132,81 (nove mil cento e trinta e dois reais e oitenta e um centavos).

O executado, por sua vez, apresentou impugnação ao cumprimento de sentença (fls. 98-112), argumentando, em resumo, que: (a) é inexigível a complementação do valor de acordo com a tabela FIPE, pois a condenação não foi assim disposta, tratando-se de coisa julgada; (b) o veículo possuía várias avarias, as quais depreciam o estado do carro; (c) os cálculos do exequente estão totalmente equivocados.

A decisão de fl. 117 determinou a suspensão dos atos expropriatórios.

Manifestação do exequente-impugnado às fls. 124-127.

Na data de 13-3-2019, o juiz da causa, Dr. Gustavo Santos Mottola, prolatou sentença de extinção da execução, nos seguintes termos (fls. 128-130):

3. Ante o exposto, acolho a impugnação e julgo extinto o presente cumprimento de sentença.

Condeno o exequente ao pagamento das eventuais custas e de honorários advocatícios que fixo em 10% sobre o valor executado, conforme fundamentação acima. Comunique-se o julgamento presente ao Juízo da 3ªVara, como requerido às fls. 98/99.

Publique-se, registre-se e intime-se

Transitada em julgado a decisão, arquive-se.

Contra a sentença, o impugnante opôs embargos de declaração (fls. 146-149), os quais foram acolhidos para sanar omissão, o que se deu nos seguintes termos (fls. 152-153):

3. Face ao exposto, acolho os embargos declaratórios para corrigir a omissão apontada, sendo que o dispositivo da sentença de fls 107/108 passa a ter a seguinte redação:

"3. Ante o exposto, acolho a impugnação e julgo extinto o presente cumprimento de sentença.

Condeno o exequente ao pagamento das eventuais custas e de honorários advocatícios que fixo em 10% sobre o valor executado, conforme fundamentação acima.

Comunique-se o julgamento presente ao Juízo da 3ª Vara, como requerido às fls. 98/99.

Libere-se alvará, em favor do impugnante/executado, da quantia depositada às fls. 102/103 para garantia do juízo, observando que não haverá retenção do imposto de renda, por se tratar de devolução.

Publique-se, registre-se e intime-se.

Transitada em julgado a decisão, arquive-se."

Intimem-se.

Irresignado, o exequente-impugnado interpôs recurso de apelação (fls. 133-140), argumentando, em síntese, que: (a) o juízo de primeiro grau não se manifestou acerca do pedido de gratuidade da justiça, devendo ser declarado seu deferimento tácito; (b) o título é certo, líquido e exigível, o qual determinou a devolução do veículo ao exequente, todavia, o executado já o vendeu em leilão, o que justifica o pedido de perdas e danos com fundamento na tabela FIPE; (c) ainda que o cumprimento de sentença fosse precedido de liquidação, o valor do veículo teria por base o preço estipulado na tabela FIPE; (d) subsidiariamente, o feito deve ser convertido em liquidação de sentença.

A apelação cível foi ratificada pelo recorrente à fl. 157.

Contrarrazões às fls. 165-173.

O recurso ascendeu ao Tribunal de Justiça e foi distribuído ao Desembargador Mariano do Nascimento (fls. 180-182), que, por meio da decisão de fls. 183-186, declinou da competência para este relator, em razão da prevenção.

Em cumprimento ao despacho de fl. 191, o apelante apresentou documentos (fls. 194-212).

Retornaram os autos conclusos.

Este é o relatório.





VOTO

1. Juízo de admissibilidade

Inicialmente, registra-se que se trata de recurso de apelação interposto contra sentença prolatada sob a égide do Código de Processo Civil de 2015, motivo pelo qual é este diploma processual que disciplina o cabimento, o processamento e a análise do presente recurso, haja vista o princípio tempus regit actum (teoria do isolamento dos atos processuais).

Pugna o recorrente, inicialmente, a concessão da justiça gratuita nesta instância recursal.

A Constituição Federal, em seu art. 5º, inciso LXXIV, garante que "o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos".

Importa ressaltar que o Código de Processo Civil/2015, em seu art. 98, caput, prevê a possibilidade de concessão do benefício:

Art. 98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei.

Nesse sentido, manifesta-se a jurisprudência desta Corte de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL. "GRATUIDADE DA JUSTIÇA" (CR, ART. 5º, LXXIV; CPC/2015, ARTS. 98 E SS.; LEI N. 1.060/1950). PEDIDO DENEGADO. "PRESUNÇÃO DE MISERABILIDADE" NÃO DERRUÍDA. RECURSO PROVIDO.

01. Por força da Constituição da República, é dever...

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