Acórdão Nº 0004294-04.2018.8.24.0008 do Quinta Câmara Criminal, 03-02-2022

Número do processo0004294-04.2018.8.24.0008
Data03 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0004294-04.2018.8.24.0008/SC

RELATORA: Desembargadora CINTHIA BEATRIZ DA SILVA BITTENCOURT SCHAEFER

APELANTE: GILMAR DO NASCIMENTO ALCANTARA (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

O Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofertou denúncia em face de Gilmar do Nascimento Alcântara, imputando-lhe a prática do crime previsto no art. 155, caput, c/c artigo 14, inciso II, ambos do Código Penal, conforme os seguintes fatos narrados na peça acusatória (evento 17 da ação penal):

No dia 05 de maio de 2018, um sábado, por volta das 18:00 horas, o denunciado Gilmar do Nascimento Alcântara dirigiu-se até o Supermercado Galegão - localizado na Rua Benjamin Constant, nº 939, bairro Escola Agrícola, nesta cidade - decidido em praticar um furto.

Lá chegando, ele introduziu em suas vestes duas peças de carne bovina (Picanha), perfazendo aproximadamente 2,5 kg, avaliadas no total de R$ 102,28 (cento e dois reais e vinte e oito centavos) - conforme se depreende do documento de fl. 11 - e passou entre os caixas sem efetuar o devido pagamento.

Porém, como estava sendo monitorado por funcionários da loja, Gilmar foi abordado e detido já na saída do estabelecimento comercial, na posse dos objetos subtraídos, deixando de consumar-se a subtração diante de tal circunstância alheia à sua vontade.

A denúncia foi recebida (evento 20 da ação penal), o réu foi citado (evento 25 da ação penal) e apresentou defesa (evento 30 da ação penal).

A defesa foi recebida e, não sendo o caso de absolvição sumária, foi designada audiência de instrução e julgamento (evento 34 da ação penal).

Na instrução foram inquiridas as testemunhas arroladas pela acusação e pela defesa, o interrogatório do réu restou prejudicado diante de sua revelia (evento 57 da ação penal).

Encerrada a instrução processual e apresentadas as alegações finais (eventos 99 e 103 da ação penal), sobreveio a sentença (evento 105 da ação penal) com o seguinte dispositivo:

Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido deduzido na denúncia e, em consequência, CONDENO o acusado GILMAR DO NASCIMENTO ALCANTARA ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 1 (um) ano de reclusão, a ser cumprida em regime inicialmente fechado, sem prejuízo do pagamento de 10 (dez) dias-multa, no mínimo legal, por infração ao art. 155, caput, c/c art. 14, II, ambos do Código Penal.

Inconformado o réu interpôs recurso de apelação (evento 111 da ação penal). Em suas razões busca revisão da dosimetria da pena aplicada em primeiro grau, com aplicação da redução máxima pela tentativa, fixação do regime inicial aberto e substituição da pena corporal por restritivas de direitos (evento 126 da ação penal).

Apresentadas as contrarrazões (evento 131 da ação penal), os autos ascenderam a este Tribunal de Justiça.

Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Gercino Gerson Gomes Neto manifestando-se pelo reconhecimento, de ofício, do cometimento de furto famélico, com a consequente absolvição, ou pelo parcial provimento do recurso interposto por Gilmar do Nascimento Alcântara, para aplicar a causa de diminuição em seu grau máximo (evento 8).

VOTO

Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.

Como sumariado, trata-se de recurso de apelação criminal interposto pelo réu Gilmar do Nascimento Alcantara, o qual busca a reforma da sentença proferida pela MM. Juíza de Direito da 2ª Vara Criminal da Comarca de Blumenau, que condenou-o ao cumprimento de pena privativa de liberdade de 1 (um) ano de reclusão, a ser cumprida em regime inicialmente fechado, e ao pagamento de 10 (dez) dias-multa, no mínimo legal, por infração ao art. 155, caput, c/c art. 14, II, ambos do Código Penal.

1 - Absolvição pelo reconhecimento de furto famélico

O douto Procurador de Justiça opina pelo reconhecimento, de ofício, do cometimento de furto famélico, com a consequente absolvição do apelante.

A materialidade delitiva está demonstrada no feito por meio da documentação acostada ao auto de prisão em flagrante n. 00299.2018.00321, em especial: pelo boletim de ocorrência n. 00299-20218-0002526 (evento 1, P_FLAGRANTE4-5, da ação penal), pelo termo de exibição e apreensão (evento 1, P_FLAGRANTE7, da ação penal), pelo termo de reconhecimento e entrega (evento 1, P_FLAGRANTE10, da ação penal), pela nota fiscal (evento 1, P_FLAGRANTE11, da ação penal) e pela prova oral colhida em ambas as fases da persecução criminal.

A autoria, da mesma forma, é inconteste.

Na presença da autoridade policial, o apelante Gilmar do Nascimento Alcântara confessou a autoria delitiva e justificou que subtraiu o bem "para comer alguma coisa", vejamos (evento 3, vídeo 114, da ação penal):

Que pegou uma carne no supermercado para poder comer alguma coisa. Que estava desempregado no momento, que sua mãe também não recebeu seu pagamento. Que pegou uma carne de "segunda". Que passou pelo caixa sem pagar e foi abordado logo à frente do caixa. Que já tem passagem pelo mesmo crime.

Em juízo seu interrogatório foi prejudicado, eis que decretada sua revelia (evento 57 da ação penal).

O vigilante do supermercado, Artur Antunes de Miranda, na fase inquisitorial, afirmou que (evento 3, vídeo 115, da ação penal):

Estava fora de seu expediente e foi chamado para auxiliar no caso em questão, enquanto não chegava ao local, solicitou para que acompanhassem o trajeto do investigado. Chegou no estabelecimento e deixou o homem "à vontade", que foi abordado ao sair do mercado e levado até a sala de gerência. Foram encontradas suas peças de picanha em suas vestes e, em seguida, foi acionada a polícia militar.

Em juízo, Artur reprisou (evento 96, vídeo 1, da ação penal - transcrição extraída da sentença):

que seu expediente já havia terminado, mas o empregador lhe telefonou para auxiliar num caso de furto. Disse que o estabelecimento monitorou o acusado e percebeu que esta colocou produtos nas vestes, então aguardou a saída dele numa das portas de acesso, juntamente com outro funcionário. Contou que, quando o réu saiu sem pagar, o abordaram e levaram até a sala da gerência para aguardar a polícia militar.

Na etapa admininistrativa, o policial militar Robison Alambec disse que a Central de Emergência lhes acionou para atendimento da ocorrência de furto em supermercado. Se deslocaram ao local e lá o funcionário Artur, identificado como chefe de segurança do estabelecimento, relatou que o agente foi monitorado colocando dois pacotes de carne nas calças e foi detido na parte exterior da loja. Esclareceu que a res furtiva consistia em cerca de 2,5kg de picanha (evento 3, vídeo 116, da ação penal).

O depoimento de seu colega de farda Heinz Michael Komatsu, não diverge, porquanto ele noticia na Delegacia de Polícia sua atuação na ocorrência objeto do feito e a descreve de modo idêntico. Acrescentou que o acusado relatou ter subtraído a carne porque estava com fome (evento 3, vídeo 117, da ação penal).

Sob o crivo o contraditório, o policial Heinz disse não se recordar da ocorrência atendida e da prisão do apelante. No entanto, confirmou ser sua a assinatura constante do boletim de ocorrência juntado ao feito (evento 57, vídeo 111, da ação penal).

Neste contexto probatório, não há dúvidas que os objetos subtraídos do estabelecimento comercial vítima foram apreendidos na posse do apelante logo após o cometimento do crime sem que, todavia, este tivesse apresentado qualquer justificativa legítima para sua posse.

Tal situação, conforme entendimento deste Tribunal de Justiça, gera a inversão do ônus da prova, na forma do art. 156, primeira parte, do Código de Processo Penal, cabendo ao acusado provar a posse lícita da coisa, fato que não restou demonstrado no caso vertente.

Dessa forma, não há dúvidas de que o apelante cometeu o delito de furto narrado na denúncia.

Ao opinar pelo reconhecimento, de ofício, do furto famélico, o douto Procurador de Justiça fundamenta (evento 8):

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