Acórdão Nº 0004329-32.2013.8.24.0139 do Quinta Câmara de Direito Civil, 03-03-2020
Número do processo | 0004329-32.2013.8.24.0139 |
Data | 03 Março 2020 |
Tribunal de Origem | Porto Belo |
Órgão | Quinta Câmara de Direito Civil |
Classe processual | Apelação Cível |
Tipo de documento | Acórdão |
ESTADO DE SANTA CATARINA
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
ESTADO DE SANTA CATARINA
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Cível n. 0004329-32.2013.8.24.0139 |
Apelação Cível n. 0004329-32.2013.8.24.0139, de Porto Belo
Relator: Desembargador Luiz Cézar Medeiros
PLANO DE SAÚDE - OPERADORA DE AUTOGESTÃO - CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - INAPLICABILIDADE
"Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de auto-gestão" (STJ, Súmula 608).
DANO MORAL - OCORRÊNCIA - SITUAÇÃO DE RISCO - COMPENSAÇÃO DEVIDA - QUANTUM INDENIZATÓRIO
1 O descumprimento de cláusula contratual, por si só, não enseja o abalo psíquico justificador de indenização por dano moral. No entanto, em se tratando de contrato de plano de saúde, em que a violação ao direito do beneficiário ocasionou penúria e sofrimento em razão da urgência que o seu estado de saúde reclamava, resta autorizada a reparação extrapatrimonial.
2 Na fixação do valor dos danos morais deve o julgador, na falta de critérios objetivos, estabelecer o quantum indenizatório com prudência, de maneira que sejam atendidas as peculiaridades e a repercussão econômica da reparação, devendo esta guardar proporcionalidade com o grau de culpa e o gravame sofrido.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0004329-32.2013.8.24.0139, da Comarca de Porto Belo 1ª Vara em que são Apelantes Magna Silvana Hoffmann e outro e Apelada Caixa de Assistência dos Funcionários do Banco do Brasil - CASSI.
A Quinta Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e dar-lhe provimento. Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, realizado no dia 3 de março de 2020, os Excelentíssimos Senhores Desembargador Luiz Cézar Medeiros, Desembargador Ricardo Fontes e Desembargador Jairo Fernandes Gonçalves.
Florianópolis, 4 de março de 2020.
Desembargador Luiz Cézar Medeiros
PRESIDENTE E RELATOR
RELATÓRIO
Por refletir fielmente o contido no presente feito, adoto o relatório da sentença de fls. 289-296:
"Magna Silvana Hoffmann e outro ajuizaram a presente 'ação para fornecimento de medicação cumulado com indenização' em face de Cassi - Caixa de Assistência aos Funcionários do Banco do Brasil, com o objetivo de compelir a parte ré ao fornecimento dos medicamentos para tratamento quimioterápico, bem como condená-la ao pagamento de indenização por danos morais, no importe de R$ 20.000,00 (vinte mil reais).
Inicialmente, a ação foi ajuizada por Edlar Nichele Subtil, o qual alegou que foi acometido por câncer ('neoplasia andenocarcinoma com matástases hepáticas e pulmonares e lesão em cauda de pâncreas com adenomegalias regionais') e submetido a tratamento médico quimioterápico, com aplicação dos medicamentos Gemzar e Oxilatina. Após melhora do quadro clínico, passou por procedimento cirúrgico para 'ressecção de doença residual hepática e pancreática'. Pouco tempo depois, apresentou surgimento de novos nódulos pulmonares, o que foi negado, sob a justificativa de ausência de registro na ANVISA para tratamento da moléstia que aflige a parte autora. Posteriormente, também foi negada solicitação de tais medicamentos feita pelo médico responsável por seu tratamento. Nesse contexto, por entender que a parte ré tem o dever de fornecer medicação supracitada, ajuizou a presente demanda. Pleiteou, em sede de tutela antecipada, o fornecimento imediato dos fármacos (fls. 02-16).
A exordial veio acompanhada de documentos (fls. 17-53).
Determinou-se a emenda da petição inicial, para que a parte autora descrevesse a doença a seu respectivo CID; apresentasse a denomicação comum brasileira do fármaco ou de seu princípio ativo, sua forma, concentração e posologia; previsão de duração do tratamento; e possibilidade de uso de medicação similar ou razões de impossibilidade de substituição (fl. 55).
A parte autora emendou a petição inicial e acostou novos documentos (fls. 57-126).
Às fls. 127-130, foi deferida antecipação dos efeitos da tutela em favor da parte autora, determinando que a parte ré fornecesse a medicação necessária para seu tratamento médico (Oxaliplatina endovenosa, na dose de 130 mg/m² a cada 21 dias, e Capecitabina comprimidos de 500 mg e 150 mg, na dose de 200 mg/m² oral por dia, ou similares registrados no Ministério da Saúde/ANVISA), sob pena de multa diária no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais).
A parte ré ofereceu resposta, na modalidade contestação. Inicialmente, informou o cumprimento da decisão que antecipou os efeitos da tutela. Aduziu, em síntese, que não existe relação de consumo entre as partes, pois a parte ré consiste em associação de servidores do Banco do Brasil, de cunho assistencialista e sem fins lucrativos, o que afastaria a aplicação do Código de Defesa do Consumidor ao caso em tela. Afirmou que o tratamento pleiteado pela parte autora não encontra cobertura no plano associativo, pois se caracteriza como experimental. Defendeu, ainda, que não cometeu ato ilícito, de modo que não está caracterizado o dever de indenizar a parte autora (fls. 127-151).
No ensejo, juntou documentos.
O prazo para réplica transcorreu in albis (fl. 214).
Às fls. 223-224, Magna Silva Hoffman informou o falecimento do autor Edlar Nichele Subtil e requereu a substituição processual.
Determinou-se a substituição do polo ativo do processo, com habilitação dos sucessores do de cujus, Magna Silva Hoffmann e Thiago Subtil. No mesmo ato, determinou-se a intimação dos autores para informarem o período pelo qual o falecido utilizou a medicação postulada (fl. 258)" (fls. 289-290).
O Juízo a quo, ao sentenciar o feito, julgou extinta a pretensão de recebimento de medicamentos e improcedente o pedido de indenização a título de danos morais, consignando na parte dispositiva do decisum:
"Ante o exposto:
a) DECLARO EXTINTO O FEITO, sem resolução do mérito, com relação ao pedido de fornecimento de medicamentos pela parte ré, forte no art. 485, inciso VI, do Código de Processo Civil, em virtude o falecimento da parte autora original, que tem como consectário a perda superveniente do interesse processual.
Considerando que a parte ré deu causa ao processo, no que diz respeito ao pedido cominatório que perdeu seu objeto, condeno-a ao pagamento de honorários advocatícios de sucumbência em favor do patrono da parte autora, fixados no importe de 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, em atenção ao disposto no art. 85, §§ 2º e 10, do Código de Processo Civil.
b) JULGO IMPROCEDENTE o pedido de honorários advocatícios de sucumbência em favor do patrono da parte ré, fixados no importe de 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, em atenção ao disposto no art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil.
Diante da sucumbência recíproca, condeno ambas as partes, pro rata, ao pagamento das custas processuais (art. 86 do Código de Processo Civil).
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Certificado o trânsito em julgado, cumpridas as demais exigências legais, arquivem-se" (fl. 296).
Inconformada com a prestação jurisdicional entregue, a parte autora apelou (fls. 302-313).
Inicialmente, sustentou ser necessária a aplicação das diretrizes do Código de Defesa do Consumidor ao caso dos autos, porquanto, à época do ajuizamento da demanda, vigia a Súm. n. 469, do Superior Tribunal de Justiça, a qual dispunha acerca da aplicabilidade do referido diploma legal aos contratos de plano de saúde, "sem qualquer distinção quanto à personalidade das entidades" (fl. 307).
Mencionou, nesse sentido, que "restou claro nos autos que o autor aderiu ao plano de saúde na condição de consumidor" (fl. 307), de modo que o feito deve ser julgado com fundamento nas referidas diretrizes legais.
No mérito de suas razões recursais, defendeu ser "nítido que o autor foi diretamente prejudicado em seu ânimo, fugindo a situações comuns do cotidiano, na medida em que teve seu tratamento suspenso sem qualquer justificativa ou aviso prévio, o que acarretou piora significativa" (fls. 308-309).
Asseverou que a documentação apresentada com a inicial "comprova a melhora significativa e estabilidade no quadro de saúde do apelante frente ao tratamento utilizado, e, 6 meses após sua falta, seu óbito comprova o nítido prejuízo em resultado do ato ilícito cometido" (fl. 309).
Nessa linha, ressaltando a ocorrência de efetivo abalo anímico, pleiteou a reforma da sentença, a fim de que seja reconhecido o dever de indenizar da apelada, condenando-a ao pagamento de indenização por danos morais.
Com as contrarrazões da parte ré (fls. 317-326), os autos ascenderam a esta Corte de Justiça.
VOTO
1 Presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade recursal, o reclamo merece ser conhecido, passando-se, desta forma, à respectiva análise.
2 De início, destaca-se que, de fato, o Código de Defesa do Consumidor não se aplica ao caso em comento.
É que, em consulta ao estatuto da parte ré, ora recorrida, retira-se que a Caixa de Assistência dos Funcionários do Banco do Brasil - CASSI "é uma associação, sem fins lucrativos, voltada para a assistência social na modalidade de autogestão" (fl. 162), enquadrando-se, portanto, na exceção estabelecida pela Súmula n. 608 do Superior Tribunal de Justiça: "Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de auto-gestão".
Vale gizar, no ponto, que embora não se ignore a existência de prévio posicionamento jurisprudencial em sentido contrário, isto é, de que mesmo se tratando de entidade de autogestão a relação entre a administradora de plano de saúde e os seus participantes deveria ser considerada como de consumo, aludido entendimento fora superado nos idos de 2018, com o cancelamento da Súm. n. 469 da Corte Superior de Justiça.
Dessa forma, não obstante a tese de que à época da contratação do plano de saúde vigia o...
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