Acórdão Nº 0004424-28.2017.8.24.0008 do Segunda Câmara de Direito Público, 23-08-2022

Número do processo0004424-28.2017.8.24.0008
Data23 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0004424-28.2017.8.24.0008/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 0004424-28.2017.8.24.0008/SC

RELATOR: Desembargador CID GOULART

APELANTE: ELENICE MARIA WUNDERVALD BRUSAMARELLO (AUTOR) APELADO: ESTADO DE SANTA CATARINA (RÉU)

RELATÓRIO

Sentença do Juízo da 1ª Vara da Fazenda Pública, Acidentes do Trabalho e Registros Públicos julgou improcedente o pedido formulado na ação trabalhista n. 0004424-28.2017.8.24.0008, aforada por ELENICE MARIA WUNDERVALD BRUSAMARELLO em desfavor do ESTADO DE SANTA CATARINA, nos seguintes termos:

Ante o exposto, resolvo o mérito da lide, na forma do artigo 487, I e II, do CPC, para reconhecer a prescrição da pretensão ao recebimento de verbas trabalhistas cujo direito a sua percepção é anterior ao quinquênio da propositura da presente ação, com exceção do FGTS e, quanto aos demais pedidos, JULGAR IMPROCEDENTE a demanda.

Defiro os benefícios da gratuidade judiciária em favor da parte autora (art. 98, §1º, do CPC).

Retifique-se o valor da causa para R$ 88.000,00 (oitenta e oito mil reais).

Condeno a parte autora ao pagamento das custas judiciais e honorários advocatícios no patamar de 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa (CPC, art. 85, §2º), cuja exigibilidade fica suspensa em razão da concessão da gratuidade da justiça.

Elenice Maria Wundervald Brusamarello apelou repisando os termos da inicial, arguindo a necessidade de reforma da decisão para que seja decretado a nulidade do contrato por prazo determiando, bem como a condenação do Municipio réu ao pagamento das verbas almejadas (Evento 20).

Contrarrazões juntadas a contento (Evento 24).

A douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Excelentíssimo Senhor Procurador de Justiça doutor Newton Henrique Trennepohl, manifestou-se formalmente pela ausência de interesse tutelável do custos legis (Evento 7).

É a síntese do essencial.

VOTO

O recurso é próprio, tempestivo e preenche os pressupostos de admissibilidade, portanto comporta conhecimento.

Sem rodeios, a sentença a quo há de ser mantida incólume por seus próprios fundamentos. E com o escopo de evitar o exercício vulgar de tautologia, transcrevo, por significativo, os seguintes excertos da bem lançada decisão, que passam a compor o substrato do meu convencimento:

Do mérito.

Anoto que a hipótese debatida comporta o julgamento antecipado, nos termos do art. 355, inc. I, do CPC, considerando que a matéria de mérito é de direito, cuja prova para sua comprovação é eminentemente documental, que, por sua vez, deveria ter sido produzida pela parte autora juntamente com a petição inicial em relação aos fatos constitutivos do seu direito, e com a contestação pela ré, no que tange às suas alegações defensivas (art. 434 do CPC/2015), sob pena de preclusão, motivo pelo qual mostra-se, então, sem qualquer relevância para o desate da celeuma a produção de outras provas.

Cuida-se de Ação trabalhista, ajuizada por Elenice Maria Wundervald Brusamarello em face do Estado de Santa Catarina, fundada em suposta ilegalidade de contratos temporários, visando ao pagamento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS e outras verbas trabalhistas.

De acordo com o art. 37, IX, da Constituição Federal, "a lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público".

Como se vê, três são os requisitos obrigatórios para a contratação temporária, a saber: excepcional interesse público; temporariedade da contratação; hipóteses expressamente previstas em lei.

Alexandre de Moraes leciona:

O texto constitucional permite contratação temporária sem concurso público no art. 37, IX, mantendo disposição relativa à contratação para serviço temporário e de excepcional interesse público, somente nas hipóteses previstas em lei. Dessa forma, três são os requisitos obrigatórios para a utilização dessa exceção, muito perigosa, como diz Pinto Ferreira, por se tratar de uma válvula de escape para fugir à obrigatoriedade dos concursos públicos, sob pena de flagrante inconstitucionalidade: - excepcional interesse público; - temporariedade da contratação; - hipóteses expressamente previstas em lei (Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional, 1 edição. 2002, 2 tiragem, Editora Atlas).

O regramento do tema, consoante explicitado acima, é o do direito administrativo, e não da CLT. Nesse aspecto ensina José dos Santos Carvalho Filho:

"[...] os servidores públicos temporários, os quais, na verdade, se configuram como um agrupamento excepcional dentro da categoria geral dos servidores públicos. A previsão dessa categoria especial de servidores está contemplada no art. 37, IX, da CF, que admite a sua contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público. A própria leitura do texto constitucional demonstra o caráter de excepcionalidade de tais agentes. Entretanto, admitido o seu recrutamento na forma da lei, serão eles considerados como integrantes da categoria geral dos servidores públicos." (Manual de Direito Administrativo. 4 ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1999, p. 403/404).

O Estado de Santa Catarina editou várias leis para regulamentação da referida forma de contratação excepcional e temporária na área da Educação (Lei n. 8.391/91, LCE n. 456/2009 e Lei n. 16.861/2015) a primeira legislação citada previa o prazo máximo de contratação até o termino do ano civil ou ano letivo, sem autorização de prorrogação, conforme art. 2º, § 2º, da Lei n. 8.391/91, regra que permaneceu intacta, mesmo após a vigência da LCE n. 456/09, mas ganhou uma nova redação com a Lei n. 16.861/2015 (art. 15 - O contrato do Professor admitido em caráter temporário não excederá o término do ano letivo).

Ainda, cabe destacar, que o processo seletivo antes da entrada emvigor da LCE n. 456/09 era somente pela prova de títulos (art. 5º da Lei Estadual n. 8.391), no entanto, a forma de seleção dos candidatos foi alterada pelo art. 3º da LCE n. 456/09, passando a ser por meio de prova escrita e de títulos (art. 4º da Lei n. 16.861/2015).

Dito isso, no caso em tela, da análise dos documentos carreados nos autos, verifica-se a ocorrência de trinta e quatro contratações temporárias (fl. 77-81 e 91) anos de 1993 a 2016. Atento-me ao fato de que não há alegação de prestação de serviço sem o devido processo seletivo, de modo que, a ausência de prova documental acerca da sua realização nos períodos indicados não prejudica o réu, pois a existência ou não destes fatos não foi arguida na causa de pedir. Ademais, os registros indicam que nenhuma das contratações excedeu sua duração a um ano letivo, de modo que a alegada sucessão contratual não se deu por meio de prorrogação do contrato inicial, mas de contratações autonômas, temporárias, decorrentes de processos seletivos a que haveria se submetido a parte autora, como condição para a contratação temporária. Destarte, os pactos firmados obedeceram os termos da lei.

Assim, inexistindo prorrogação de contrato, não há nulidade a ser declarada, visto que os pactos sempre foram firmados de forma temporária (com data préfixada de início e fim) e com base na Lei Estadual (Lei n. 8.391/91, LCE n. 456/2009 e Lei n. 16.861/2015).

Outrossim, diante da especificação contida no pacto, as partes se submetem ao regime jurídico-administrativo, por se tratar de típica relação de ordem estatutária ou de caráter administrativo, sem indícios de nulidade do contrato. Nesse sentido:

ADMINISTRATIVO. CONTRATO TEMPORÁRIO FIRMADO COM BASE EM LEI VÁLIDA E EFICAZ. AUSÊNCIA DE NULIDADE. INEXISTÊNCIA DE DIREITO AO RECEBIMENTO DE FUNDO DE GARANTIA POR TEMPO DE SERVIÇO (FGTS). INAPLICABILIDADE, NO CASO, DO PRECEDENTE CONTIDO NO RE N. 596.478 DO STF. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. (TJSC, Apelação Cível n. 0013611-33.2010.8.24.0064, de São José, rel. Des. Francisco Oliveira Neto, Segunda Câmara de Direito Público, j. 03-04-2018). (grifei)

Ainda, no tocante o direito do servidor público contratado temporariamente perceber verbas trabalhistas, a temática já foi enfrentada pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina, o qual, há muito firmou o entendimento de que "o emprego público, regido por lei própria, é modalidade de contrato administrativo o que torna dispensável a anotação na CTPS, dispensando-se igualmente o aviso prévio, o recolhimento do FGTS, a multa rescisória e a parcela do seguro desemprego, por serem obrigações inerentes ao regime a Consolidação das Leis do Trabalho" (AC n. 2009.011349-0, rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, j. 22.09.09), a concluir que "tratando-se de servidor público contratado temporariamente, somente são devidas as verbas trabalhistas previstas no Estatuto dos Servidores Públicos Municipais" (AC n. 2010.068333-1, rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, j. 17.6.11).

Colhem-se outros julgados:

"ADMINISTRATIVO - SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL - ADMISSÃO SEM CONCURSO PÚBLICO - CONTRATO TEMPORÁRIO - PAGAMENTO DE VERBAS TRABALHISTAS - IMPOSSIBILIDADE - ESTATUTO DOS SERVIDORES PÚBLICOS MUNICIPAIS"Tratando-se de servidor público contratado temporariamente, somente são devidas as verbas trabalhistas previstas no Estatuto dos Servidores Públicos Municipais. Improcede, portanto, o pagamento referente ao FGTS e a multa rescisória por serem verbas trabalhistas previstas somente na Consolidação das Leis do Trabalho" (AC n. 2008.062959-8, Des. Luiz Cézar Medeiros).

Ainda:

"ADMINISTRATIVO - CONTRATO DE TRABALHO POR PRAZO DETERMINADO - RESCISÃO ANTECIPADA - PRETENSÃO AO RECEBIMENTO DE VERBAS RESCISÓRIAS COM FUNDAMENTO NA CLT - IMPOSSIBILIDADE - CONTRATO REGIDO PELO ESTATUTO DOS SERVIDORES PÚBLICOS DO MUNICÍPIO - GOZO PARCIAL DAS FÉRIAS - INDENIZAÇÃO DOS DIAS RESTANTES - QUITAÇÃO DE OUTRAS VERBAS PLEITEADAS, NO CURSO DO FEITO, COM RECONHECIMENTO DO DIREITO - SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA DE IGUAL PROPORÇÃO - COMPENSAÇÃO INTEGRAL DOS HONORÁRIOS - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. São inaplicáveis aos servidores contratados sob regime temporário, os direitos...

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