Acórdão Nº 0004425-59.2010.8.24.0072 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 31-03-2022

Número do processo0004425-59.2010.8.24.0072
Data31 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0004425-59.2010.8.24.0072/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO

APELANTE: O MEDIADOR.NET EIRELI ADVOGADO: MARCIA CRISTINA CARDOSO (OAB SC030002) ADVOGADO: JULIANA FRANKEN (OAB SC042833) APELADO: SEBASTIAO AMAURI REITZ

RELATÓRIO

O Mediador Net EIRELI interpôs recurso de apelação da sentença proferia pelo juízo da 1ª Vara Cível da comarca de Tijucas, nos autos da execução de título extrajudicial ajuizada em face de Sebastião Amauri Reitz, que julgou extinto o feito, nos seguintes termos (evento 112, autos do 1º grau):

Onegociador.net Ltda, já qualificado, propôs execução de título extrajudicial, autos n. 0004425-59.2010.8.24.0072, em face de Sebastião Amauri Reitz, também devidamente qualificado, objetivando a satisfação da obrigação representada pelo "contrato particular de prestação de serviços" e notas promissórias emitidas como parte do pagamento pelos serviços prestados em razão daquele.

Intimado em relação a decisão de fls. 135-136, que suscitou a possível presença de nulidade dos títulos que aparelham a presente execução, o exequente manifestou-se nos autos alegando que o conteúdo do julgado que embasou a decisão proferida limitou-se a proibir a divulgação de atos inerentes à advocacia, posicionamento que, segundo ele, não reflete na higidez do negócio jurídico.

[...]

Ante o exposto, declaro a nulidade dos títulos que aparelham a presente execução (contrato particular de prestação de serviços e notas promissórias emitidas como parte do pagamento pelos serviços prestados em razão daquele), vez que oriundas de negócio jurídico nulo e, nos termos do artigo 485, inciso IV, do novo Código de Processo Civil, declaro extinto o feito sem resolução do mérito.

Proceda-se a baixa de eventual constrição realizada sobre o patrimônio do executado durante o curso da presente demanda.

Custas pelo exequente.

Transitada em julgado, arquivem-se os autos.

Publique-se.

Registre-se.

Intime-se.

Em suas razões recursais (evento 123, autos do 1º grau), sustenta a recorrente, em suma: (a) ser imprescindível a concessão dos benefícios da justiça gratuita em seu favor; (b) deve ser reconhecida a nulidade da sentença, ao passo que ao contrário do consignado na decisão, a execução se embasa em comissão de contrato de prestação de serviços, e não em nota promissória; (c) a sentença foi proferida em afronta a jurisprudência deste Egrégio Tribunal de Justiça, a qual afirma ser vinculativa, de acordo com o preceituado no art. 927, V, do CPC; (d) ao contrário do reconhecido na sentença, inexiste óbice às atividades praticadas pela exequente/recorrente, ao passo que na ação 5002525-82.2010.4.04.7205/SC, a recorrente apenas ficou obstada de "divulgar nem praticar todo e qualquer ato privativo de advogado e de advocacia, direta ou indiretamente, por si e/ou mediante terceiros; bem como para determinar que se abstenham de promover capacitação ilegal de clientela, retirando tais atividades de seus materiais publicitários e de seu contrato de prestação de serviços; e ainda, de se abster de fazer qualquer propaganda ou anúncio inerentes a atividade advocatícia", mas que em nenhum momento os negócios por ela praticados foram anulados, sendo que ressalta que as atividades praticadas não invadem as privativas de advogado, motivo pelo qual não há se falar em nulidade do título executivo.

Não foram apresentadas contrarrazões.

Por ausência de indícios da suposta hipossuficiência da recorrente, foi procedida a sua intimação para promover a juntada aos autos de documentação comprobatória de sua situação econômica (evento 9, autos do 2º grau), o que foi atendido por meio da juntada de documentação vinculada ao evento 18, autos do 2º grau).

Por meio de decisão vinculada ao evento 29, autos do 2º grau, foi indeferida a gratuidade de justiça pleiteada pela recorrente.

Intimada acerca da decisão, a apelante efetuou o recolhimento do preparo recursal (evento 36, autos do 2º grau).

Vieram os autos conclusos.

É o relato.

VOTO

1. Juízo de admissibilidade

Inicialmente, registra-se que a sentença foi proferida já sob a vigência do Código de Processo Civil de 2015, motivo pelo qual é este diploma processual que deverá disciplinar o cabimento, o processamento e a análise do presente recurso, por incidência do princípio tempus regit actum (teoria do isolamento dos atos processuais).

O recurso deve ser conhecido, pois presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade.

2. Fundamentação

2.1 Da nulidade da sentença

Neste ponto, argumenta a parte apelante que deve ser reconhecida a nulidade da sentença vergastada, ao argumento de que "Ao analisar as sentença, o Apelante verificou que mesma refere-se a processo diverso, pois o juízo afirma que tratam-se de execução de notas promissórias, o que não condiz com a realidade dos Autos" (evento 123, APELAÇAO193, fl. 13, autos do 1º grau).

Do corpo da sentença combatida, depreende-se que ao defender a nulidade do negócio jurídico e, por consequência da execução nele embasada, a magistrada singular, Joana Ribeiro, assim dispôs (evento 112, SENT174, autos do 1º grau):

Contrariamente ao alegado pelo exequente por ocasião da manifestação de fls. 139-140, analisando a íntegra do acórdão prolatado quando do julgamento do recurso de apelação autuado sob n. 5002525-82.2010.4.04.7205, denoto que a irregularidade capaz de nulificar o negócio jurídico representado pelo contrato de prestação de serviços, bem como das notas promissórias emitidas por ocasião de sua celebração restou evidente, vez que reconhecida de fora incisiva a prestação de serviço de consultoria e assessoria jurídica, atividade privativa de advogado. (grifou-se).

Conforme se depreende da leitura do trecho tirado da sentença combatida, ao contrário do que afirma a parte recorrente, a sentença não se fundou em processo diverso, ao passo a juíza da causa deixou claro que estava reconhecendo a nulidade do negócio jurídica representado pelo contrato de prestação de serviços e das notas promissórias a ele vinculadas, e não apenas a notas promissórias como tenta fazer crer a parte recorrente.

Não fosse só isso, ainda que a sentença tivesse disposto apenas a respeito de nota promissória, ainda assim, não haveria se falar em nulidade, ao passo que da simples leitura da petição inicial da execução subjacente, depreende-se que a exequente, ora recorrente, almejava a cobrança também da nota promissória anexada aos autos executórios (evento 111, PET3, autos do 1º grau).

Portanto, diante do acima exposto, tem-se que a tese recursal aventada pela parte recorrente não merece prosperar.

2.2 Da aplicação do art 927 do Código de Processo Civil

Argumenta a parte apelante que "o juiz antes de prolatar a sentença deve observar a jurisprudência recente e sobre ela fundamentar sua decisão, isso tudo em nome da ordem e da segurança jurídica, nesse passo, o inciso V do artigo 927 do CPC não dá margem" [...] "Pois bem, a presente ação não pode ser julgada EXTINTA POR NULIDADE DOS TITULOS, eis que tal sentença afronta a jurisprudência do órgão colegiado ao qual esse juízo é vinculado hierarquicamente" [...] "Desta forma, deve ser reformada a sentença de primeiro grau, declarando valido o titulo que embasa a presente execução, com a aplicação do artigo 927 do CPC".

No entretanto, sem razão a recorrente em sua insurgência.

O art. 927, V, do CPC, no qual a parte apelante embasa sua alegação, assim dispõe:

Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão:

I - as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade;

II - os enunciados de súmula vinculante;

III - os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos;

IV - os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional;

V - a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados.

§ 1º Os juízes e os tribunais observarão o disposto no art. 10 e no art. 489, § 1º , quando decidirem com fundamento neste artigo.

§ 2º A alteração de tese jurídica adotada em enunciado de súmula ou em julgamento de casos repetitivos poderá ser precedida de audiências públicas e da participação de pessoas, órgãos ou entidades que possam contribuir para a rediscussão da tese.

§ 3º Na hipótese de alteração de jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores ou daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos, pode haver modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da segurança jurídica.

§ 4º A modificação de enunciado de súmula, de jurisprudência pacificada ou de tese adotada em julgamento de casos repetitivos observará a necessidade de fundamentação adequada e específica, considerando os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia.

§ 5º Os tribunais darão publicidade a seus precedentes, organizando-os por questão jurídica decidida e divulgando-os, preferencialmente, na rede mundial de computadores

A respeito do assunto, assim ensina Humberto Theodoro Júnior:

Há dois graus de força normativa atribuída à jurisprudência, segundo a sistemática prestigiadora da uniformização pretoriana da interpretação e aplicação do direito positivo: (i) as hipóteses em que a jurisprudência vincula todos os julgamentos futuros que envolvam a mesma tese normativa (i.e., a mesma ratio decidendi), reprimindo as insubmissões eventuais com remédio enérgico e de eficácia imediata, qual seja, a reclamação; e (ii) aquelas em que o Código preconiza a observância dos precedentes judiciais, sem, entretanto, coibir de imediato as transgressões cometidas pelos juízes e tribunais obrigados à respectiva sujeição. Não nos parece, todavia, razoável considerar a vinculação prevista nos incisos IV e V do art. 927 como meramente persuasiva, já que o comando do dispositivo legal impõe a sujeição dos órgãos judicantes, em caráter imperativo, ao conteúdo de todas as...

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