Acórdão nº 0004866-03.2018.8.14.0116 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 1ª Turma de Direito Público, 05-06-2023

Data de Julgamento05 Junho 2023
Órgão1ª Turma de Direito Público
Ano2023
Número do processo0004866-03.2018.8.14.0116
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
AssuntoGratificação de Incentivo

APELAÇÃO CÍVEL (198) - 0004866-03.2018.8.14.0116

APELANTE: ANTONIA DE SOUSA

APELADO: MUNICIPIO DE OURILANDIA DO NORTE

RELATOR(A): Desembargadora ROSILEIDE MARIA DA COSTA CUNHA

EMENTA

EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. INCENTIVO FINANCEIRO. ADICIONAL INSTITUÍDO POR PORTARIAS DO MINISTÉRIO DA SAÚDE. INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO QUANTO À DESTINAÇÃO DIRETA AOS AGENTES COMUNITÁRIOS DE SAÚDE (ACS) E AGENTES DE COMBATE À ENDEMIAS (ACE). PAGAMENTO INDEVIDO. NECESSIDADE DE LEI ESPECÍFICA. PRECEITO CONSTITUCIONAL. RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO E PROVIDO. DECISÃO UNÂNIME.

I- Cinge-se a controvérsia, em verificar se o incentivo adicional instituído por portaria do Ministério da Saúde pode ser utilizado como verba salarial integrada aos proventos dos Agentes Comunitários de Saúde;

II- A sentença de primeiro grau de jurisdição julgou improcedente o pleito inicial;

III- O incentivo financeiro instituído pela portaria n.º 1.350, alterada pela portaria n.º 674/03 estabelece que os valores são específicos para o custeio da atividade dos Agentes Comunitários de Saúde, que são repassados ao Fundo Municipal e não como integração salarial;

IV- É preceito constitucional, dos art. 37, X; 61, § 1º, c; e 169; que os proventos dos servidores públicos só poderão ser fixados ou alterados mediante lei específica;

V- Não cabe a portaria do Ministério da Saúde instituir remuneração salarial de servidor, mas sim a lei específica local;

VI- Recurso de apelação conhecido e improvido. Sentença mantida. Decisão Unânime.

Vistos, etc.,

Acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores componentes da 1ª Turma de Direito Público, por unanimidade de votos, em CONHECER E NEGAR PROVIMENTO ao recurso de apelação, nos termos do voto da Desembargadora Relatora.

Plenário Virtual da 1ª Turma de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, com início aos cinco dias do mês de junho do ano de dois mil e vinte e três.

RELATÓRIO

Trata-se de APELAÇÃO CÍVEL interposta por ANTÔNIA DE SOUSA, manifestando seu inconformismo com a decisão proferida pelo MM. Juízo de Direito da Vara Única de Ourilândia do Norte, nos autos da Ação Declaratória c/c Cobrança ajuizada em face do MUNICÍPIO DE OURILÂNDIA DO NORTE, que julgou improcedente o pedido inicial, nos seguintes termos (id. 13608651):

“(...) Tal incentivo não constitui verba remuneratória aos agentes comunitários de saúde, sobretudo porque tal numerário somente poderia ser instituído por meio de lei específica, na forma dos arts. 37, X, 61, § 1°, "c", e 169 da Constituição Federal, os quais dispõe que:

(...)

Logo, o direito à verba pleiteada não poderia ser instituído por meio da portaria invocada, posto que se constituiria em ato ilegítimo, por afronta, ao art. 37, X, da Constituição Federal, que preceitua, como citado acima, que a remuneração, sendo incluída nesta qualquer vantagem em pecúnia, dos servidores públicos e o subsídio de que trata o §4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices.

(...)

III. Dispositivo

Diante do exposto, julgo improcedentes os pedidos formulados na inicial, extinguindo o feito com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC.

Sem condenação em custas, posto que a parte autora é beneficiária da gratuidade de justiça. (...)”

Inconformada, a autora interpôs o presente recurso de apelação (id. 13608704).

Em suas razões, aduz que é agente comunitária de saúde e por isso tem o direito de receber o denominado incentivo adicional ao Programa de Agentes Comunitários de Saúde que é repassado pela União ao Município réu e este não faz o repasse aos seus substituídos.

Argui que o pedido tem como fundamento as portarias do Ministério da Saúde nº 674/GM/2003 e 648/GM/2006, que autorizam o Governo Federal a repassar aos municípios dois tipos de incentivo financeiro ao programa de gentes comunitários de saúde, todavia, os agentes nunca receberam tal verba, pois o requerido se apropria e utiliza o recurso para pagamento de diversas outras finalidades, em afronta ao princípio da legalidade estrita que rege a administração pública.

Afirma que o art. 198, §5º, da Carta Magna, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 63, prevê que lei federal disporá sobre piso salarial profissional nacional para o plano de carreira, bem como assistência financeira complementar para cumprimento do piso salarial dos agentes comunitários de saúde.

Aponta outros dispositivos legais que também embasariam seu pedido.

Ao final, pugna pelo conhecimento e provimento do recurso, a fim de reformar in totum a sentença e julgar totalmente procedente o pedido inicial.

O Município requerido não apresentou contrarrazões, conforme certidão de id. nº 13608710.

Instada a se manifestar, a Procuradoria de Justiça deixou de emitir parecer (id. 13854706).

É o relatório.

VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso voluntário.

Não existindo questão preliminar a ser debatida, passo a análise do mérito.

MÉRITO

Historiando os autos, verifica-se que se trata de apelação cível interposta contra decisão de primeiro grau que julgou improcedente o pleito inicial da autora, ora apelante. A ação visava que adicional financeiro previsto pela portaria n.º 674 de 03.07.2003 do Ministério da Saúde, fosse incorporada ao salário dos Agentes Comunitários de Saúde do Município requerido.

Inconformada com a decisão que não reconheceu o pleito, a autora interpôs o presente recurso de apelação requerendo a reforma completa da decisão de piso, defendendo que os valores podem ser incorporados aos salários do ACS’s, feito que só cabe ao Prefeito do Município mediante lei local que o autorize.

De início, aponto que não assiste razão à apelante.

Colaciono, assim, a delimitação trazida pela Portaria n.º 674/03:

Art. 2º Definir que o incentivo de custeio é um valor destinado ao custeio da atuação de agentes comunitários de saúde, transferido em parcelas mensais de 1/12 (um doze avos), pelo Fundo Nacional de Saúde para os Fundos Municipais de Saúde ou, em caráter excepcional, para os Fundos Estaduais de Saúde.

Como se observa, a parcela de adicional pleiteada pelos Agentes Comunitários não foi instituída como parcela que deveria ser integrada diretamente no salário dos servidores, mas sim como fundo aos municípios. Tal fundo foi instituído com o objetivo principal de custear as despesas da atuação de agentes de saúde.

Logo, torna-se evidente que o incentivo não foi constituído como verba remuneratória, vez que a medida só pode ser assentada mediante Lei que a autorize:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

(...)

X - a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices;

Art. 61. A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou Comissão da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do Congresso Nacional, ao Presidente da República, ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador-Geral da República e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição.

§ 1º São de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que:

(...)

c) servidores públicos da União e Territórios, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria;

Art. 169. A despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não poderá exceder os limites estabelecidos em lei complementar.

Ademais, não cabe ao Ministério da Saúde instituir verba remuneratória de servidores, tendo em vista, conforme resta claro, que a medida só pode ser instituída por meio de lei local específica para tanto. É este o entendimento consolidado deste Egrégio Tribunal:

APELAÇÃO CÍVEL E REMESSA NECESSÁRIA. AÇÃO DE COBRANÇA. INCENTIVO FINANCEIRO. ADICIONAL INSTITUÍDO POR PORTARIAS DO MINISTÉRIO DA SAÚDE. INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO QUANTO À DESTINAÇÃO DIRETA AOS AGENTES COMUNITÁRIOS DE SAÚDE (ACS) E AGENTES DE COMBATE À ENDEMIAS (ACE). PAGAMENTO INDEVIDO. NECESSIDADE DE LEI ESPECÍFICA. APELO E REMESSA CONHECIDOS E PARCIALMENTE PROVIDOS. 1. O Incentivo Financeiro Adicional, previsto na Portaria nº 1.350/2002 do Ministério da Saúde e instituído pelo art. 9º-D da Lei nº 11.350/2006, com a redação dada pela Lei nº 12.994/2014, é um incremento financeiro destinado aos entes públicos para o fortalecimento de ações e projetos direcionados à área da saúde. E, em que pese tenha a finalidade exclusiva de financiar as atividades dos Agentes Comunitários de Saúde (ACS), não integra a remuneração desses empregados públicos, não detendo natureza salarial. 2. Nos termos dos arts. 37, X , 61, § 1º, II, a, e 169 da CF, a concessão de qualquer vantagem ou aumento aos servidores e empregados públicos somente poderá ocorrer mediante autorização prévia conferida por lei específica, sendo necessário, para tanto, a o (6350707, 6350707, Rel. MARIA ELVINA GEMAQUE TAVEIRA, Órgão Julgador 1ª Turma de Direito Público, Julgado em 2021-08-02, Publicado em 2021-09-15) (Grifei)

EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. RECURSO DE APELAÇÃO. AÇÃO DE COBRANÇA. AGENTE COMUNITÁRIO DE SAÚDE. PLEITO VISANDO O PAGAMENTO DE INCENTIVO FINANCEIRO ADICIONAL. PAGAMENTO INDEVIDO. VERBA INSTITUÍDA EM PORTARIA DO MINISTÉRIO DA SAÚDE COM FINALIDADE DIVERSA. POSSIBILIDADE DA INSTITUIÇÃO DA VERBA RECLAMADA SOMENTE POR LEI. PRECEITO CONSTITUCIONAL. PRECEDENTES. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE AUMENTO DO...

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