Acórdão Nº 0004933-60.2016.8.24.0018 do Quarta Câmara Criminal, 23-01-2020

Número do processo0004933-60.2016.8.24.0018
Data23 Janeiro 2020
Tribunal de OrigemChapecó
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Criminal n. 0004933-60.2016.8.24.0018

Relator: Desembargador Sidney Eloy Dalabrida

APELAÇÃO CRIMINAL. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO E MUNIÇÕES DE USO PERMITIDO (ART. 14 DA LEI N. 10.826/03). CONDENAÇÃO. RECURSO DEFENSIVO.

ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS DEMONSTRADAS. DEPOIMENTOS DOS AGENTES PÚBLICOS FIRMES E COERENTES. CONFISSÃO JUDICIAL. CRIME DE PERIGO ABSTRATO E DE MERA CONDUTA. POTENCIALIDADE LESIVA DOS ARTEFATOS BÉLICOS QUE, APESAR DE PRESCINDÍVEL, FOI COMPROVADA NO CADERNO PROCESSUAL. TIPICIDADE CONFIGURADA. CONDENAÇÃO MANTIDA.

DOSIMETRIA COMPENSAÇÃO NA SENTENÇA DA ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA COM A AGRAVANTE DA REINCIDÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE DE REDUÇÃO DA PENA AQUÉM DO MÍNIMO LEGAL. SÚMULA 231 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. PRECEDENTES DOS TRIBUNAIS SUPERIORES.

ABRANDAMENTO DO REGIME PRISIONAL E SUBSTITUIÇÃO DA SANÇÃO CORPORAL. REJEIÇÃO. REQUISITOS LEGAIS NÃO PREENCHIDOS (ARTS. 33, § 2º, "B", E 44, II, DO CÓDIGO PENAL). EXEGESE DO VERBETE SUMULAR 269 DO STJ.

RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0004933-60.2016.8.24.0018, da comarca de Chapecó 1ª Vara Criminal em que é Apelante Jackson Cela e Apelado Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

A Quarta Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Desembargador Alexandre d'Ivanenko, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Desembargador José Everaldo Silva. Funcionou como representante do Ministério Público o Exmo. Sr. Dr. Aurino Alves de Souza.

Florianópolis, 23 de janeiro de 2020.

Desembargador Sidney Eloy Dalabrida

Relator

RELATÓRIO

Na comarca de Chapecó, o órgão do Ministério Público ofereceu denúncia em face de Jackson Cela, imputando-lhe a prática do delito capitulado no art. 14 da Lei n. 10.826/03, pois, segundo consta na inicial:

No dia 31 de maio de 2016, por volta das 19 horas e 30 minutos, na Linha Simonetto, próximo ao Loteamento Verdeti, interior do município de Chapecó, o denunciado Jackson Cela, de forma consciente e voluntária, portou e transportou uma arma de fogo de uso permitido, consistente no revólver marca Taurus, calibre .38, número de série n. 1759195, municiado com 6 (seis) munições, todas do respectivo calibre, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar.

Depreende-se dos autos que Policiais Militares estavam realizando patrulhamento na Linha Simonetto, próximo ao Loteamento Verdeti, nesta cidade, quando avistaram o denunciado a bordo do veículo Fiat/Maréa, cor cinza, placas DAL-5404, ocasião em que passaram a acompanhá-lo. Ao perceber a aproximação da guarnição, Jackson Cela abriu uma das portas traseiras do veículo e dispensou a arma de fogo supramencionada, a qual foi apreendida pelos agentes públicos na sequência (fls. 36-38).

Finalizada a instrução, o Magistrado a quo julgou procedente o pedido formulado na denúncia, para condenar o réu ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 2 (dois) anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, além do pagamento de 10 (dez) dias-multa, fixados no mínimo legal, por infração ao art. 14 da Lei n. 10.826/03 (fls. 105-109).

Inconformado com a prestação jurisdicional, o réu interpôs apelação criminal, mediante a qual postulou a absolvição, sustentando a ausência de lesividade da conduta. Subsidiariamente, pugnou pela reforma da dosimetria, com o reconhecimento da atenuante da confissão espontânea, bem como o abrandamento do regime prisional e a substituição da sanção corporal por medidas restritivas de direitos (fls. 136-139).

Apresentadas as contrarrazões (fls. 145-151), a douta Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio do Exmo. Dr. Rui Arno Richter, manifestou-se pelo conhecimento e não provimento do reclamo (fls. 159-162).

VOTO

Presentes os pressupostos legais de admissibilidade, o reclamo deve ser conhecido.

1 Absolvição

O apelante, ainda que de forma um tanto quanto confusa, pretende a absolvição, com fundamento na ausência de lesividade da conduta perpetrada.

Razão não lhe assiste.

A materialidade do crime restou devidamente comprovada pelo boletim de ocorrência (fls. 16-17), auto de exibição e apreensão (fl. 18) e pelo laudo pericial (fls. 65-68), que atestou a eficiência da arma e das munições encontradas com o apelante.

A autoria, da mesma forma, é inconteste, demonstrada pela prova oral coligida aos autos, cujas transcrições foram muito bem detalhadas pelo sentenciante e integrarão este voto.

Na fase indiciária, o réu exerceu o direito de permanecer em silêncio (fl. 9). Em juízo, confessou a prática delitiva, bem como a tentativa de dispensar os artefatos bélicos (interrogatório audiovisual, fl. 97):

[...] afirmou que estava indo para um "pesque e pague" e nas proximidades de um bar o escapamento do veículo estragou. Tentaram arrumar, porém não foi possível. Durante o retorno visualizaram a viatura e poucos momentos depois foram abordados. Confessou que durante o acompanhamento abriu a porta do carona na frente e dispensou a arma (transcrição extraída da sentença, fl. 108 - grifou-se).

A testemunha Douglas Miguel Martins, que estava no mesmo carro que o acusado, perante a autoridade judicial, afirmou que (depoimento audiovisual, fl. 97):

[...] no dia dos fatos estava com o réu e que pretendiam pescar na linha Simonetto. Durante o trajeto o escapamento do veículo estragou, chegando nas proximidades do "bar do botinha" estacionaram para tentar consertar o carro. Não conseguindo fazer o conserto no local, decidiram retornar para cidade e foi nesse momento que avistaram a viatura da polícia, logo após foram abordados pelos policiais militares. O depoente afirmou que estava no banco de trás e o acusado no banco do "carona". Informou que a abordagem policial transcorreu normalmente e que na época não sabia o porquê do Jackson ter aberto sua porta. Afirmou que o réu admitiu, durante a abordagem, que a arma era dele. Indagado pelo magistrado sobre o local onde estava sentado, afirmou que estava no banco traseiro e que o réu abriu a porta da frente (transcrição extraída da sentença, fls. 106-107 - grifou-se).

O Policial Militar Giovan Alex Martins, sob o crivo do contraditório, declarou (depoimento audiovisual, fl. 97):

[...] que ele e seu colega, no dia dos fatos, efetuavam rondas em uma via de acesso rural que leva para a linha Simonetto. Durante o patrulhamento passaram pelo veículo em que o réu estava e seu colega avisou que os indivíduos estavam com uma atitude suspeita, daí porque acompanharam e abordaram o veículo. Embora não tenham encontrado nada com os ocupantes ou dentro veículo, o policial Kades fez buscas nas proximidades, pois ele tinha visto alguém abrir a porta do veículo durante o acompanhamento. Alegou que seu colega retornou com a arma e um dos indivíduos confessou que o artefato era seu. Afirmou que não viu o momento em que os suspeitos dispensaram o objeto e não recorda em desfavor de quem que foi lavrado o APF. Recordou que a arma foi dispensada pela porta traseira do lado direito, a qual estava com o vidro aberto (transcrição extraída da sentença, fl. 107 - grifou-se).

O seu colega de farda, Luiz Alexandre Kades Ferrarezi, relatou que (depoimento audiovisual, fl. 97):

[...] realizavam rondas na linha Simonetto, avistou um veículo FIAT/Marea suspeito e decidiu fazer a abordagem. Embora tenham ligado o Giroflex, o veículo não atendeu a ordem de parada imediatamente. Durante o acompanhamento viu a porta do lado direito abrir e fechar, não tendo sido possível observar se algo foi dispensado. Acompanharam o veículo por cerca de 1000 a 1500 metros e procederam a abordagem. Em revista pessoal e veicular nada foi encontrado. Durante as buscas nas proximidades, localizou o revólver calibre .38. Aduziu que Jackson confessou ser proprietário da arma. Indagado sobre qual porta foi aberta, afirmou ser a dianteira do lado direito e que a informação confirmava a confissão do réu, pois era o local onde ele estava. Indagado sobre o depoimento inquisitorial constar porta traseira, afirmou que pode ter sido erro de digitação, pois a ocorrência se deu no período de transição no qual a PM começou a utilizar tablets para preenchimento das ocorrências e que isso eventualmente ocasionava erros textuais. Mas se recorda que era a dianteira, local onde o réu estava (transcrição extraída da sentença, fl. 107 - grifou-se).

Como se vê, os depoimentos dos agentes estatais, por si sós, já representam sólido elemento de convencimento, não podendo tais testemunhos serem ignorados, nem reputados suspeitos, porquanto, dotados de fé pública, merecem fiúza, ainda mais como no caso em tela, em que seus relatos encontram amparo na confissão judicial do acusado.

Na falta de qualquer adminículo de prova, suspeitar da veracidade das declarações dos policiais militares, que, no cumprimento do seu dever funcional, submetem-se diariamente à situação de risco para atuar no combate ao crime, é inadmissível, traduzindo-se, ainda, em postura com a qual o Poder Judiciário não pode coonestar.

Nesse sentido, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça:

[...] É assente nesta Corte o entendimento no sentido de que o depoimento dos policiais prestados em juízo constitui meio de prova idôneo a resultar na condenação do paciente, notadamente quando ausente qualquer dúvida sobre a imparcialidade das testemunhas, cabendo à defesa o ônus de demonstrar a imprestabilidade da prova, fato que não ocorreu no presente caso (HC 165.561/AM, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, DJe 15/2/2016) (STJ, HC 393.516/MG, rel. Min. Reynaldo Soares Da Fonseca, j. em 20/6/2017).

O entendimento deste egrégio Tribunal de Justiça não destoa:

APELAÇÃO CRIMINAL. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO COM NUMERAÇÃO SUPRIMIDA. PLEITEADA A...

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