Acórdão Nº 0005058-32.2010.8.24.0020 do Terceira Câmara de Direito Público, 03-03-2020

Número do processo0005058-32.2010.8.24.0020
Data03 Março 2020
Tribunal de OrigemCriciúma
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão



ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Apelação Cível n. 0005058-32.2010.8.24.0020

Relator: Desembargador Jaime Ramos

APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO. ILEGITIMIDADE PASSIVA, CHAMAMENTO AO PROCESSO E PRESCRIÇÃO ARGUIDAS EM PRELIMINAR. MATÉRIAS EXAUSTIVAMENTE ANALISADAS EM DECISÕES ANTERIORES. PRECLUSÃO "PRO JUDICATO". PLEITO DE SOCIEDADE HOSPITALAR PARA COBRANÇA DE SERVIÇOS MÉDICO-HOSPITALARES PRESTADOS NO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS) A MUNÍCIPES DE CRICIÚMA E DE OUTROS MUNICÍPIOS ABRANGIDOS PELA GESTÃO PLENA DAQUELE. REDE REGIONALIZADA E HIERARQUIZADA. ATENDIMENTOS DE EMERGÊNCIA. AUTORIZAÇÕES DE INTERNAÇÃO HOSPITALAR (AIH) LISTADAS NO LAUDO PERICIAL. OBRIGAÇÃO DE PAGAR CONFIGURADA. RESSALVA DO EXERCÍCIO DE EVENTUAL DIREITO DE REGRESSO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DE APELAÇÃO E REMESSA NECESSÁRIA NÃO PROVIDOS.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0005058-32.2010.8.24.0020, da comarca de Criciúma 2ª Vara da Fazenda em que é Apelante Município de Criciúma e Apelado Sociedade Literária e Caritativa Santo Agostinho.

A Terceira Câmara de Direito Público decidiu, por votação unânime, conhecer em parte do recurso e, nessa extensão, negar-lhe provimento e à remessa necessária. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado nesta data e presidido pelo Exmo. Sr. Desembargador Júlio César Knoll (sem voto), os Exmos. Srs. Desembargadores Jaime Ramos, Ronei Danielli e Rodrigo Collaço.

Florianópolis, 3 de março de 2020.

Desembargador Jaime Ramos

Relator


RELATÓRIO

Na Comarca de Criciúma/SC, Sociedade Literária e Caritativa Santo Agostinho, mantenedora do Hospital São José, ajuizou "ação ordinária de cobrança" contra o Município de Criciúma, objetivando a condenação do requerido ao pagamento dos serviços de saúde prestados pela autora ao Município.

Sustenta a autora que desenvolve atividades no Hospital São José, tendo sido contratada pelo Ministério de Assistência Social (MAS), para exercer atendimento à saúde pública, por meio do Sistema Único de Saúde - SUS; que, desde a promulgação da Constituição de 1988, o Hospital de São José é o único em Criciúma que atende pelo SUS; que, para não incorrer em omissão de socorro, a autora atende a todos de maneira indiscriminada; que, emitida a AIH (autorização para internação hospitalar), o Poder Público deve efetuar o pagamento; que algumas AIHs não foram emitidas, o que impossibilitou a parte autora de receber pelos serviços prestados, cujo prejuízo reflete o montante de R$ 349.667,15 (trezentos e quarenta e nove mil, seiscentos e sessenta e sete reais e quinze centavos).

Ao final, requereu a concessão da justiça gratuita e, no mérito, que seja julgada procedente a demanda para condenar o Município réu ao pagamento de R$ 349.667,15 (trezentos e quarenta e nove mil, seiscentos e sessenta e sete reais e quinze centavos), com juros e correção monetária.

Foi deferida a gratuidade da justiça.

Citado, o Município de Criciúma apresentou contestação alegando, preliminarmente, sua ilegitimidade passiva, sob o argumento de que a responsabilidade pelo pagamento é do Estado de Santa Catarina e da União, haja vista o Município somente ter o dever de pagar as internações até o teto físico/financeiro concedido a ele; que deve ocorrer o chamamento da União e do Estado ao processo; que há a ocorrência de prescrição, haja vista ter transcorrido prazo superior a 3 anos entre os fatos e a propositura da ação ou, subsidiariamente, caso o juízo entenda pelo prazo de 5 anos para a ocorrência da prescrição, que seja julgada parcialmente prescrita a pretensão de cobrança da suposta dívida. No mérito, defende que a parte autora não comprovou os serviços realizados; que os valores dos serviços que superam o teto físico/financeiro do município são de responsabilidade do Estado e da União; que a condenação do requerido ao pagamento de internações acima do teto deste é inconstitucional; que há ofensa aos princípios da legalidade e da separação dos poderes; que a execução dos serviços públicos de saúde deve estar prevista na Lei Orçamentária Anual.

Por fim, requereu o acolhimento das preliminares arguidas e, no mérito, a improcedência dos pedidos.

Houve manifestação sobre a contestação.

Após analisar as preliminares aduzidas pelo Município, o MM. Juiz de Direito da 2ª Vara da Fazenda Pública, por decisão interlocutória, acolheu somente aquela que diz respeito à prescrição da pretensão relativa às verbas anteriores a 26.02.2005, rejeitando quanto às demais. Não houve interposição de nenhum agravo a respeito.

Após a coleta de prova pericial contábil, e apresentadas as alegações finais, o MM. Juiz de Direito, Dr. Pedro Aujor Furtado Júnior, julgou procedentes os pedidos exordiais, condenando o Município de Criciúma ao pagamento de RS 482.110,72 (quatrocentos e oitenta e dois mil, cento e dez reais e setenta e dois centavos), com juros desde a citação do réu e correção monetária desde o dia em que foi apresentado o Laudo Pericial.

Inconformado, o Município interpôs recurso de apelação, reeditando os argumentos narrados na peça defensiva, para que a sentença de 1º grau seja reformada e seja julgado improcedente o pedido inicial.

Com as contrarrazões, os autos subiram a esta Superior Instância, perante a qual, a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da Lavra da Exma. Sra. Dra. Eliana Volcato Nunes, opinou pelo conhecimento e parcial provimento do recurso de apelação.

Na sessão realizada em 12 de fevereiro de 2019, este Relator encaminhou o julgamento do recurso e da remessa necessária, emitindo seu voto, e houve pedido de vista por parte do eminente Desembargador Ronei Danielli, que trouxe seu voto na sessão do dia 26 de fevereiro de 2019 com a proposta de conversão do julgamento em diligência para ser complementada a prova pericial, ao que aderiu este Relator, com a concordância, também, do eminente Desembargador Ricardo Roesler.

Baixados os autos em diligência, a complementação do laudo pericial foi colacionada às fls. 44/87, oportunidade que em as partes foram intimadas para fins de manifestação.

Sobreveio resposta, tão somente, da parte apelada (Sociedade Literária e Caritativa Santo Agostinho, mantenedora do Hospital São José) que impugnou o laudo supramencionado, sob o fundamento de que "a diligência havida, com propósito de segregar a origem do paciente, com o devido respeito, ofende ao sistema jurídico"; que concernente "a avaliação acerca da natureza da internação, como registrado pela Ilustre Perita Judicial, foge à competência técnica da mesma e inova no objeto pericial, posto que, em nenhum momento foi objeto de perícia, em sede de conhecimento"; que "o laudo Pericial Complementar, em nada acrescenta e/ou exclui, no que tange às responsabilidades do Município de Criciúma, no que tange ao pagamento das despesas havidas na prestação de serviços da saúde".

Em seguida, a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em novo parecer da lavra da Exma. Sra. Dra. Eliana Volcato Nunes, opinou pelo conhecimento e parcial provimento da remessa e do recurso de apelação.

VOTO

Inicialmente, com base no Enunciado Administrativo n. 2 do Superior Tribunal de Justiça, considerando que a sentença recorrida foi publicada até 17 de março de 2016, processar-se-á a admissibilidade do presente recurso de apelação conforme o regramento contido no Código de Processo Civil de 1973.

Trata-se de reexame necessário e recurso de apelação contra a sentença que, nos autos da "ação ordinária de cobrança" proposta pela Sociedade Literária e Caritativa Santo Agostinho (mantenedora do Hospital São José) contra o Município de Criciúma, julgou procedentes os pedidos iniciais e condenou o ente público ao pagamento de R$ 482.110,72 (quatrocentos e oitenta e dois mil, cento e dez reais e setenta e dois centavos) a título de prestação de serviço público de saúde (internações hospitalares), realizado por meio do Sistema Único de Saúde (SUS), com os consectários da mora, bem como ao pagamento de honorários advocatícios.

Sustenta o Município, em preliminar, a sua ilegitimidade passiva diante da responsabilidade do Estado e da União pelos débitos cobrados, pelo que se faz necessário o chamamento destes ao processo, e a prescrição quanto ao débito exigido. No mérito, destacou a ausência de comprovação do débito; a competência da União e do Estado para o pagamento dos valores que excederem o teto físico e financeiro, como ocorrido; que o acatamento da pretensão ofende os artigos 196 e 198, da Carta Magna e o princípio da separação dos poderes; que não há previsão orçamentária para efetivação de gasto extra com a saúde; que não pode arcar com as despesas dos serviços prestados a pacientes oriundos de outros municípios.

Das preliminares

Observa-se, inicialmente, que as preliminares arguidas pelo Município, quanto à ilegitimidade passiva e ao chamamento da União e do Estado ao processo foram todas afastadas pelo douto Magistrado em decisões interlocutórias, as quais acolheram parcialmente apenas a arguição de prescrição quinquenal, excluindo de eventual condenação, por esse motivo, as parcelas anteriores a 26.02.2005 (págs. 211/212 e 245/247, dos autos principais - SAJ/PG), e contra essas decisões não houve interposição de recursos pelo ente municipal, daí porque houve preclusão "pro judicato" relativa a essas matérias, conforme determina o art. 507, do Código de Processo Civil de 2015 (equivalente ao art. 473 do Código de Processo Civil de 1973), que assim dispõe:

"Art. 507. É vedado à parte discutir no curso do processo as questões já decididas a cujo respeito se operou a preclusão."

Não se desconhece que, em se tratando de matéria de ordem pública, como no caso da prescrição, tal aspecto pode ser analisado em qualquer grau de jurisdição.

No entanto, o referido regramento não possui caráter absoluto, sendo obstado pelo instituto da preclusão que objetiva a proteção...

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