Acórdão Nº 0005060-74.2015.8.24.0004 do Quarta Câmara Criminal, 21-10-2021

Número do processo0005060-74.2015.8.24.0004
Data21 Outubro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Tipo de documentoAcórdão
Recurso em Sentido Estrito Nº 0005060-74.2015.8.24.0004/SC

RELATOR: Desembargador SIDNEY ELOY DALABRIDA

RECORRENTE: BRUNO HENRIQUE MACEDA MARCELO (ACUSADO) RECORRENTE: JOSE GUILHERME BARBOSA (ACUSADO) RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Na comarca de Araranguá, o órgão do Ministério Público ofereceu denúncia em face de Bruno Henrique Maceda Marcelo e José Guilherme Barbosa, imputando-lhes o cometimento do delito insculpido no art. 121, § 2º, II e IV, c/c o art. 14, II, ambos do Código Penal, pois, segundo consta na inicial:

No dia 6 de julho de 2015, por volta das 13h45min, na Rua Salvato Orige, Lagoão, Araranguá/SC, os denunciados BRUNO HENRIQUE MACEDA MARCELO e JOSÉ GUILHERME BARBOSA, em comunhão de esforços e voltados a um fim comum, desferiram diversos disparos de arma de fogo contra a vítima Josué Maciel Fernandes Junior, causando neste as lesões descritas no laudo pericial n. 9413.2015.879 (folha 14), não atingindo o resultado morte por circunstâncias alheias a sua vontade, eis que os disparos não atingiram órgão vital do ofendido.

Os denunciados agiram por motivo fútil, uma vez que, por ter sido a vítima ouvida como testemunha de acusação nos autos da ação penal n. 2601-02.2015.824.004 movida pelo Ministério Público contra o denunciado Josué Maciel, quiseram vingança.

Ademais, o modo utilizado na empreitada criminosa dificultou a defesa das vítimas, uma vez que, mediante surpresa, os denunciados apareceram pilotando uma motocicleta e, com arma em punho, passaram inesperadamente a efetuar os disparos (Evento 8, PET37).

Finalizada a instrução preliminar, o Magistrado a quo julgou parcialmente admissível o pedido formulado na denúncia, para, com fulcro no art. 413 do Código de Processo Penal, pronunciar os réus pela suposta prática do delito capitulado no art. 121, § 2º, IV, c/c o art. 14, II, ambos do Código Penal, submetendo-o, por conseguinte, a julgamento perante o Tribunal do Júri (Evento 194, SENT1).

Inconformado com a prestação jurisdicional, os acusados interpuseram recurso em sentido estrito.

Bruno Henrique Maceda Marcelo, em suas razões recursais, pugnou pela absolvição sumária ou impronúncia, "porque não houve nos autos indícios suficientes a demonstrar a participação delitiva do acusado e que venham a comprovar que foi ele o autor dos disparos contra a vítima" (fl. 6). Subsidiariamente, requereu a desclassificação para o delito de lesões corporais graves e o afastamento da qualificadora do recurso que impossibilitou a defesa da vítima (Evento 210, RAZRECUR1).

A defesa de José Guilherme Barbosa requereu a impronúncia, afirmando, para tanto, que "a prova é rasa para sustentar a submissão dos réus ao plenário do tribunal do júri, pois os depoimentos são inconsistentes e levam à dúvida quanto a real autoria dos disparos" (Evento 213, RAZRECUR1, fl. 3).

Apresentadas as contrarrazões (Evento 222, CONTRAZ1), em juízo de retratação, nos termos do art. 589, caput, do CPP, o juiz singular manteve a decisão por seus próprios fundamentos (Evento 228, DESPADEC1).

Posteriormente, a douta Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio do Exmo. Sr. Dr. Pedro Sérgio Steil, manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento dos recursos interpostos (Evento 19, PROMOÇÃO1).

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conhece-se dos recursos.

1 As defesas pretendem, em suma, a absolvição sumária ou a impronúncia dos acusados, sob a alegação de que inexistem indícios acerca da autoria delitiva, notadamente porque os depoimentos são inconsistentes e deixam dúvidas quanto ao real autor dos disparos.

De partida, convém registrar que, como é cediço, em se tratando do procedimento criminal de competência do Tribunal do Júri, para a pronúncia do acusado é suficiente que se constate prova da materialidade do delito e indícios suficientes de autoria (art. 413 do Código de Processo Penal).

Isso porque se trata de uma decisão interlocutória, de caráter processual que, encerrando a fase de formação da culpa, tem por objetivo simplesmente julgar a admissibilidade da imputação para fins de submissão do acusado a julgamento popular.

Para tanto, nessa etapa do procedimento escalonado, quanto à prova produzida, procede-se a uma operação cognitiva não exauriente, já que não se pode exigir a formação de um juízo de certeza, mas apenas de probabilidade fundada.

Como consequência de seu caráter meramente declaratório, logicamente, não se pode exigir prova plena acerca da autoria delitiva, até porque, havendo dúvida razoável a respeito, uma vez presente prova da materialidade e indícios suficientes da autoria, deverá ela ser solucionada pelo juízo natural dos crimes contra a vida.

Acerca do tema, Fernando da Costa Tourinho Filho explica:

Dês que haja prova da materialidade do fato e indícios suficientes de que o réu foi o seu autor, deve o Juiz pronunciá-lo. A pronúncia é decisão de natureza processual (mesmo porque não faz coisa julgada), em que o Juiz, convencido da existência do crime, bem como de que o réu foi seu autor (e procura demonstrá-lo em sua decisão), reconhece a competência do Tribunal do Júri para proferir o julgamento (Código de processo penal comentado. v. 2. 15. ed. Saraiva: São Paulo, 2014. p. 80).

Na mesma linha de raciocínio, assinala Renato Brasileiro de Lima:

Assim, se o juiz sumariante estiver convencido da existência do crime e da presença de indícios suficientes de autoria ou de participação, deve pronunciar o acusado, de maneira fundamentada. Há na pronúncia um mero juízo de prelibação, por meio do qual o juiz admite ou rejeita a acusação, sem qualquer valoração acerca do mérito. Julga-se admissível o ius accusaionis. Restringe-se à verificação da presença do fumus boni iuris, admitindo todas as acusações que tenham ao menos probabilidade de procedência (Manual de Processo Penal. 4. ed, Salvador: JusPodivm, 201. p. 1336).

A decisão de impronúncia, por sua vez, somente subsiste no caso de o magistrado não se convencer "da materialidade do fato ou da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação" (art. 414 do Código de Processo Penal).

Justamente pelo seu caráter terminativo, que implica no afastamento de competência constitucional, a impronúncia é medida excepcional, que deve ser reservada às hipóteses em que sequer é possível reconhecer a probabilidade de sucesso da pretensão acusatória.

A absolvição sumária, de outro lado, será declarada nas hipóteses previstas no art. 415 do Código de Processo Penal, in verbis:

I - provada a inexistência do fato;

II - provado não ser ele autor ou partícipe do fato;

III - o fato não constituir infração penal;

IV - demonstrada causa de isenção de pena ou de exclusão do crime.

No caso dos autos, entretanto, a materialidade está comprovada e os indícios suficientes de autoria estão presentes.

A materialidade delitiva encontra-se demonstrada por meio do boletim de ocorrência (Evento 1, INQ3-4), laudo pericial (Evento 1, INQ14) e dos depoimentos colhidos ao longo das etapas procedimentais.

A vítima Josué Manoel Fernandes Júnior, sob o crivo do contraditório (Evento 145, VÍDEO221), confirmou seu depoimento anterior (Evento 1, INQ8), aduzindo que os recorrentes foram os autores do crime, detalhando que Bruno conduzia a motocicleta, enquanto seu primo, José, sacou a arma e efetuou os disparos:

[...] asseriu que é primo do acusado...

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