Acórdão Nº 0005285-95.2019.8.24.0023 do Terceira Câmara Criminal, 31-05-2022

Número do processo0005285-95.2019.8.24.0023
Data31 Maio 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0005285-95.2019.8.24.0023/SC

RELATOR: Desembargador LEOPOLDO AUGUSTO BRÜGGEMANN

APELANTE: EMERSON MENDONCA (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Na comarca da Capital, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Emerson Mendonça, dando-o como incurso nas sanções do art. 2º, § 2º, da Lei n. 12.850/13, pela prática da conduta assim descrita na inicial acusatória:

I. DO CRIME DE INTEGRAR ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA.

Segundo apurado no Auto de Prisão em Flagrante incluso, no período que será melhor verificado durante a instrução processual, mas certamente durante o mês de abril de 2019, o denunciado EMERSON MENDONÇA, integrava, pessoalmente, a organização criminosa denominada PRIMEIRO GRUPO CATARINENSE (PGC), associando-se com demais membros da citada facção de forma hierarquizada e estruturalmente ordenada, de modo permanente, caracterizada pela divisão de tarefas, com o objetivo de obter, direta e indiretamente, vantagens ilícitas mediante a prática habitual do crime de tráfico de drogas e comércio de armas, dentre outros ilícitos voltados aos interesses da facção

O Primeiro Grupo Catarinense - PGC, criado em março de 2003, constitui uma estrutura no âmbito do crime organizado, com atuação inicial no interior de Unidades Prisionais e, depois, estendendo-se para cidades catarinenses.

O grupo tem liderança colegiada consistente no Primeiro Ministério (cargosvitalícios) e Segundo Ministério (com obrigatoriedade de estar recluso em São Pedro de Alcântara), além de contar com um Tesoureiro-Geral e com os que exercem os cargos de Disciplinas e Sintonias de estabelecimentos prisionais, cidades e bairros, difusores e cumpridores da ideologia e ordens do grupo. O objetivo da facção vem estampado em seu Estatuto, consistente em fazer o "crime de modo correto", especialmente o tráfico de drogas, crimes contra o patrimônio, comércio e transporte de armas de fogo e homicídios, promovendo o repasse de valores (dízimos) para obtenção de armas, pagamento de advogados, manutenção de familiares dos reeducandos do Sistema Prisional, além de fomentar um caixa central.

Em relação ao Auto de Prisão em Flagrante que deu origem aos presentes autos, o ponto de partida foram as medidas cautelares deferidas nos autos nº 0001691-73.2019.8.24.0023 (apenso), autorizadas judicialmente com base no inquérito policial que apurou o envolvimento do denunciado na organização criminosa PGC, o qual atuava com obediência ao Estatuto e às ordens superiores da citada facção criminosa, especialmente na aquisição de armamento bélico e explosivos com o intuito de se realizarem ataques no Estado de Santa Catarina.

Com o deferimento da medida de busca e apreensão, a equipe da Diretoria Estadual de Investigações Criminais - DEIC, no dia 05 de abril de 2019, logrou êxito em apreender na residência do denunciado anotações com cadastro de integrantes da facção criminosa Primeiro Grupo Catarinense, bem como anotações referentes a contabilidade do tráfico de drogas realizado pelo denunciado, e ainda, comprovantes de pagamentos de dízimos e 17 aparelhos celulares .

Em análise ao conteúdo de um dos celulares apreendidos, pertencente ao denunciado, extraiu-se conversa em aplicativo de mensagens instantânea em que Emerson trata do comércio de armas de fogo, em especial a negociação de um fuzil, em benefício da facção criminosa.

Portanto, o denunciado EMERSON MENDONÇA, vulgo ESPINHA, é responsável pela negociação e compra de armas de fogo em prol da organização criminosa, bem como manter o cadastro dos integrantes do grupo e ainda realizar depósito de valores referente ao dízimo dos demais membros (irmãos) faccionados e prestar contas à facção com relação ao tráfico de drogas realizado através de anotações de contabilidade (ev. 38).

Concluída a instrução do feito, a denúncia foi julgada procedente para condenar o acusado Emerson Mendonça às penas de 6 (seis) anos e 8 (oito) meses de reclusão, em regime inicial fechado, bem como ao pagamento de 146 (cento e quarenta e seis) dias-multa, em seu mínimo legal, por infração ao disposto no art. 2º, § 2º da Lei n. 12.850/13. Foi-lhe negado o direito de apelar em liberdade (ev. 256).

Irresignada, a defesa interpôs recurso de apelação, no qual requereu, preliminarmente, a nulidade do processo, por violação de domicílio, haja vista a expedição de mandado de busca e apreensão genérico. No mérito, busca a absolvição do acusado do delito, ao argumento de insuficiência de provas. Subsidiariamente, a redução da pena-base: (a) as circunstâncias do crime com fundamento inerente ao crime e em patamar superior ao adotado por esta Corte, (b) os antecedentes criminais baseados em condenação já alcançada pelo período depurador de 5 anos; o afastamento da causa de aumento de pena prevista no art. 2º, § 2º da Lei n. 12.850/2013 ou a redução da fração de aumento utilizada para 1/6 (um sexto), dado que não foi apreendida nenhuma arma de fogo; a alteração do regime de cumprimento de pena; a aplicação do instituto da detração; bem como o direito de recorrer em liberdade (ev. 12, autos do 2G).

Juntadas as contrarrazões (ev. 18, autos do 2G), ascenderam os autos a esta instância, e a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Jorge Orofino da Luz Fontes, opinou pelo conhecimento e provimento parcial do apelo interposto para que seja readequada a fração de aumento empregada na fixação da pena-base em relação às circunstâncias do crime (ev. 21, autos do SG).

Este é o relatório.

VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto pela defesa contra decisão que julgou procedente a denúncia e condenou o acusado às sanções previstas no art. 2º, § 2º da Lei n.12.850/13.

O recurso é de ser conhecido, porquanto presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade.

1 Inviolabilidade de domicílio

Preliminarmente, a defesa busca a nulidade do processo, por violação de domicílio, haja vista a expedição de mandado de busca e apreensão genérico.

A tese não procede.

Ao contrário do que alega o apelante, o mandado de busca e apreensão expedido em seu desfavor não é genérico, porquanto preenche os requisitos dispostos no art. 240 do Código de Processo Penal.

O mandado expedido de busca e apreensão foi devidamente autorizado por meio de representação formulada pela autoridade policial, coadjuvada pelo órgão acusador, relacionada ao Inquérito Policial n. 18.19.00036, instaurado para apurar a prática do crime de organização criminosa.

Na ocasião, o magistrado deferiu o reclamo, como ainda a quebra de sigilo de dados dos celulares eventualmente apreendidos. Note-se:

1. Trata-se de representação formulada pela Autoridade Policial da Divisão de Repressão ao Crime Organizado (DRACO), objetivando a medida de busca e apreensão a ser realizada na residência do investigado Emerson Mendonça, bem como a quebra do sigilo de dados dos celulares eventualmente apreendidos durante a execução da medida de busca, com a finalidade de obter subsidios à investigação dos crimes descritos no art. 2º da Lei nº 12.850/2013.O Ministério Público se manifestou favorável aos pedidos (fls. 108-109) e os autos vieram conclusos.

2. DA MEDIDA DE BUSCA E APREENSÃO.A representação formulada pela Autoridade Policial se relaciona ao ao Inquérito Policial n. 18.19.00036, instaurado para apurar a prática do crime de participação em organização criminosa.

Segundo informa a autoridade policial, integrantes do PGC, por determinação da facção criminosa Comando Vermelho - CV, do estado do Rio de Janeiro, estariam se preparando para realizar atentados no estado de Santa Catarina.A facção criminosa CV, responsável por ataques no estado do Ceará, estaria cobrando ações do PGC para que fizessem, como forma de apoio, o mesmo no estado de Santa Catarina.

Aponta a autoridade policial que os alvos seriam as pontes que fazem ligação continente-ilha de Florianópolis: Hercílio Luz, Pedro Ivo Campos ou Colombo Salles, fazendo uso de explosivos para realização do ato criminoso. A investigação chegou até a pessoa de Emerson Mendonça, vulgo "Espinha", integrante da organização criminosa PGC, que seria o encarregado da missão de conseguir explosivos para o desiderato criminoso.

O faccionado é residente em Palhoça/SC e possui diversos registros policiais por tráfico de drogas, uso de entorpecentes e estupro (fl. 4).A Autoridade Policial, inicialmente, representou pela interceptação telefônica do ramal do investigado, medida que foi deferida por este Juízo às fls. 67-72. Contudo, em razão do número interceptado estar inativo, nenhuma informação pode ser colhida.Em razão das diligências investigativas até então realizadas, e da falta de êxito na medida de interceptação telefônica, a Autoridade Policial representa, nesta oportunidade, pela medida de busca e apreensão no domicílio do investigado.Conforme consta da representação, a residência do investigado pode conter elementos de provas essenciais para a elucidação dos fatos, cujo endereço restou descrito às fls. 100-101, a saber:Rua Pedro Alves Cabral, nº 785, bairro Jardim Eldorado, Palhoça/SC.Há fundadas razões, portanto, que recaem sobre o local referido, de modo que o requerimento encontra suporte legal no disposto no art. 240, § 1º, alínea "b" "d", "e", e "h", do CPP, em face do que autorizo a busca e apreensão, a ser executada na residência acima indicada, devendo a Autoridade Policial, quando da execução da medida, observar as formalidades legais do ato.

Expeça-se o mandado de busca e apreensão, com prazo de 30(trinta) dias [...]

Como se pode observar, não há qualquer ilegalidade no mandado de busca e apreensão, porquanto, além de amparado em elementos da possível participação do recorrente em crime de organização criminosa, indica o seu endereço, os motivos e os fins da diligência, diga-se, interligado com o teor da decisão de sua Excelência.

Como bem anotou o magistrado singular, "não obstante o referido mandado não tenha...

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