Acórdão Nº 0005492-98.2012.8.24.0004 do Primeira Câmara Criminal, 06-05-2021

Número do processo0005492-98.2012.8.24.0004
Data06 Maio 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 0005492-98.2012.8.24.0004/SC



RELATOR: Desembargador CARLOS ALBERTO CIVINSKI


APELANTE: NEUZA MANENTI STOLF (RÉU) ADVOGADO: RANDERSON PERUCHI RIBEIRO (OAB SC009746) ADVOGADO: LUCINARA MANENTI (OAB SC013999) ADVOGADO: Tahiana de Souza Cavaller (OAB SC028287) APELANTE: VOLNEI MANENTI (RÉU) ADVOGADO: LUCINARA MANENTI (OAB SC013999) ADVOGADO: RANDERSON PERUCHI RIBEIRO (OAB SC009746) ADVOGADO: Tahiana de Souza Cavaller (OAB SC028287) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


RELATÓRIO


Denúncia: o Ministério Público da comarca de ARARANGUÁ ofereceu denúncia em face de Neuza Manenti Stolf e Volnei Manenti, dando-os como incursos nas sanções do no art. 7º, inciso IX, c/c art. 12, inciso III, ambos da Lei 8.137/1990, em razão dos seguintes fatos:
Conforme se infere do Inquérito Policial n.º 207.12.00086, da 1ª Delegacia de Polícia de Araranguá, na data de 25 de março de 2012, Alexander Acordi de Araújo adquiriu, nas dependências do Supermercado Manenti (conforme cupom fiscal de fl. 06), de propriedade e de responsabilidade dos denunciados VOLNEI MANENTI e NEUZA MANENTI STOLF, dois recipientes contendo os produtos denominados como bauru kg queijo/presunto m (310 gramas) e lanche folhado kg manentt (296 gramas), fabricados e embalados pelo próprio estabelecimento. Ocorre que os produtos apresentavam mofo e bolor, em que pese encontrarem-se dentro da validade, segundo as suas etiquetas. Verificou-se que os denunciados mantinham, no referido estabelecimento comercial, produtos destinados à venda que se encontravam em condições impróprias para o consumo, situação esta que foi corroborada pelo laudo pericial realizado no dia seguinte à compra (fls. 09/14), bem como pela declaração de Fúlvia Vieira Maia de Araujo (fl. 15), a qual, junto a seu marido, Alexander Acordi de Araújo, ingeriu o produto, o qual lhe gerou intoxicação alimentar (segundo auto de exame de corpo de delito de fl. 16) (evento 76, DENUNCIA102-103; em 19-5-2015).
Sentença: o juiz Evandro Volmar Rizzo julgou parcialmente procedente a denúncia para condenar a) Volnei Manenti pela prática do crime previsto no art. 7º, inciso IX, da Lei 8.137/1990, ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 2 (dois) anos de detenção, em regime aberto, substituída por duas restritivas de direitos, consistentes na: a) prestação de serviços à comunidade; e b) prestação pecuniária, no valor de 10 (dez) salários mínimos; e b) Neuza Manenti Stolf pela prática do crime previsto no art. 7º, inciso IX, da Lei 8.137/1990, ao cumprimento da pena privativa de liberdade 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de detenção, em regime aberto, substituída por duas restritivas de direitos, consistentes na: a) prestação de serviços à comunidade; e b) prestação pecuniária, no valor de 10 (dez) salários mínimo (evento 262; em 6-11-2020).
Trânsito em julgado: foi certificado o trânsito em julgado da sentença para o Ministério Público (evento 279).
Recurso de apelação de Neuza Manenti Stolf e Volnei Manenti: a defesa interpôs recurso de apelação, no qual sustentou:
a) a ausência da materialidade delitiva, porquanto: a.1) o crime previsto no art. 7º, inciso IX, da Lei 8.137/90, deixa vestígios, sendo indispensável, nos termos do art. 158 do Código de Processo Penal, a realização de exame pericial que ateste a materialidade delitiva; a.2) "apesar de constar nos autos documento denominado "Laudo Pericial" (evento 76 - inquérito 13-14), este, visivelmente, não detém os elementos necessários para fazer jus a tal denominação", pois "[...] carece de técnica e especificidade", especialmente porque os peritos não oficiais possuem diploma de curso superior em área diversa daquela exigida para a natureza do exame;
b) quanto à autoria delitiva, que a apelante Neuza, à época dos fatos era gerente financeira da empresa, logo cuidava apenas da parte administrativa e não vivenciava o dia a dia dos estabelecimentos; além disso, b.1) "carecem os autos de elementos probatórios suficientes para comprovação que as mercadorias, que se disse estarem expostas à venda no Supermercado Manenti, realmente provieram deste estabelecimento";
c) "a Vigilância Sanitária, teve o cuidado de examinar produtos idênticos aos que foram especificados no Boletim de Ocorrência, não verificando qualquer irregularidade"; no mais, "restou juntado pelo Supermercado Manenti, documento intitulado 'RELATÓRIO DE ACOMPANHAMENTO DO TESTE DE PRAZO DE VALIDADE DOS PRODUTOS BAURU DE PRESUNTO E QUEIJO E FOLHADO DE PRESUNTO E QUEIJO', feito por um nutricionista", o qual "[...] demonstra que a situação dos alimentos apresentados pelas vítimas, em correlação com as datas constantes nas suas etiquetas, não corresponde com a realidade";
d) o afastamento do aumento decorrente das consequências do crime, posto que não ficou demonstrada a relação causal entre a conduta que se imputa aos recorrente e a intoxicação alimentar supostamente apresentada pela vítima.
Requereu o conhecimento e provimento do recurso para reformar a sentença, de modo a absolvê-los da conduta narrada na denúncia; subsidiariamente, pela redução da pena imposta ao mínimo legal (eventos 269 e 271; em 23-11-2020).
Contrarrazões do Ministério Público: a acusação impugnou as razões recursais, ao argumento de que:
a) "no julgamento no Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas n. 4009173-78.2016.8.24.000, a Seção Criminal do Tribunal de Justiça de Santa Catarina decidiu, por maioria, fixar tese jurídica no sentido da 'desnecessidade da perícia para a comprovação da materialidade do crime tipificado no art. 7º, IX, da Lei n. 8.137/90, nas hipóteses de produtos com prazo de validade vencido (inciso I do §6º do art. 18 do CDC) e daqueles em desacordo com as normas regulamentares de fabricação, distribuição ou apresentação (inciso II, parte final, do §6º do art. 18 do CDC)'";
b) "o Laudo Pericial produzido nos autos (evento 76, docs. 13-18) atestou que havia mofo nos alimentos consumidos pela vítima e complementou: 'O bolor produz toxinas prejudiciais à saúde (Guia de Alimentos e Vigilância Sanitária - ANVISA) e pode produzir micotoxinas, que causam reações adversas em humanos e animais (http://www.todabiologia.com)'", e "o Auto de Exame de Corpo de Delito, realizado na vítima Fúlvia Vieira Maia de Araújo apenas 4 dias após a ingestão do alimento, atestou que havia ofensa à integridade corporal ou à saúde da paciente, cuja causa era intoxicação alimentar (evento 76, doc. 21)"; ainda, do "encadeamento probatório emerge que a ingestão dos alimentos em condições impróprias ao consumo, comercializados pelos apelantes à vítima, foram hábeis a causar nela lesões na cavidade oral, resultado anormal para o ocorrido".
Postulou o conhecimento do recurso e a manutenção da sentença condenatória (evento 283; em 11-2-2021).
Parecer da Procuradoria-Geral de Justiça: o procurador de justiça Paulo de Tarso Brandão opinou pelo conhecimento e desprovimento dos recursos (evento 13; em 8-4-2021).
Este é o relatório

VOTO


Do juízo de admissibilidade
Os recursos preenchem os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, motivo pelo qual devem ser conhecidos.
A despeito do preenchimento dos requisitos de admissibilidade, com relação aos recursos interpostos pela defesa, cabe registrar que o defensor constituído dos recorrentes reproduziu literalmente nos presentes apelos toda a matéria constante das alegações finais, sem discutir a razão pela qual não concordou com os fundamentos insertos na sentença penal.
O caso, portanto, seria de não conhecer da pretensão por violação ao princípio da dialeticidade recursal, conforme fundamentos adotados por este Órgão Fracionário (Apelação Criminal 0003454-12.2015.8.24.0036, deste relator, 12-04-2018, v.u.).
Pensar o contrário, com a devida venia, seria impor mero reexame necessário da decisão judicial, tornando irrelevante ou, no mínimo, de somenos importância a atuação do causídico em segundo grau de jurisdição.
Além disso, não se mostra apropriado passar ao largo de todo o trabalho adequadamente efetuado na origem para conhecer de recurso que nem sequer minimamente rebateu os fundamentos da sentença, limitando-se a reproduzir de modo literal os argumentos expostos nas alegações finais.
Apreciar questões assim seria, no mínimo, ignorar as regras que regem os direitos penal e processo penal, bem como o caótico quadro de congestionamento de processos aguardando por soluções que se acumulam aos milhões por este Brasil afora. Até porque, eventuais nulidades ou ilegalidades, poderão ser reconhecidas por ações constitucionais de rápida e prioritária tramitação, bem como ações revisionais.
Entretanto, em casos assim, mesmo diante da evidente afronta ao citado princípio, o Superior Tribunal de Justiça tem determinado o conhecimento da matéria por meio de decisões monocráticas, seja em virtude da interposição de Recurso Especial ou impetração de Habeas Corpus.
Um dos feitos cuja análise foi determinada pela Instância Superior diz respeito aos autos da Apelação Criminal 0004147-50.2015.8.24.0018, deste relator, julgado por esta Primeira Câmara Criminal, em 18-01-2018, por votação unânime.
Desse modo, sendo muito provável que o não conhecimento integral dos recursos sob exame possa ter como consequência a aplicação do referido entendimento consolidado na Corte de Uniformização, para evitá-lo, passa-se ao exame da insurgência.
Da prejudicial de mérito
Embora não constitua objeto de insurgência recursal, por se tratar de matéria de ordem pública, a ser analisada a qualquer momento e em qualquer grau de jurisdição, deve ser reconhecida, de ofício, a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva do Estado, na forma retroativa, com relação ao apelante VOLNEI MANENTI.
A prescrição da pretensão punitiva estatal, nas palavras de Luiz Regis Prado, corresponde "à perda do direito de punir pela inércia do Estado, que não...

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