Acórdão Nº 0005706-58.2018.8.24.0011 do Quinta Câmara Criminal, 30-01-2020

Número do processo0005706-58.2018.8.24.0011
Data30 Janeiro 2020
Tribunal de OrigemBrusque
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão



ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Apelação Criminal n. 0005706-58.2018.8.24.0011, de Brusque

Relator: Desembargador Luiz Neri Oliveira de Souza

APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS (ART. 33, CAPUT, DA LEI N. 11.343/2006). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSOS DA DEFESA E DA ACUSAÇÃO.

INSURGÊNCIA DEFENSIVA. PRETENSA DESCLASSIFICAÇÃO DO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS PARA O DELITO DE POSSE DE ENTORPECENTES PARA USO PESSOAL ANTE A INSUFICIÊNCIA DE PROVAS ACERCA DA NARCOTRAFICÂNCIA. INVIABILIDADE. RÉU QUE, APÓS DENÚNCIAS ANÔNIMAS, É ABORDADO POR POLICIAIS MILITARES EM VIA PÚBLICA, DURANTE A REVISTA PESSOAL, APREENDEM PEQUENA QUANTIDADE DE MACONHA EMBALADA E UMA BALANÇA DE PRECISÃO, NA SEQUÊNCIA, AO PROCEDEREM REVISTA NO IMÓVEL DO ACUSADO, LOCALIZAM 812 G (OITOCENTOS E DOZE GRAMAS) DE MACONHA E ROLO DE PAPEL FILME. CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO CONCRETO QUE PERMITEM CONCLUIR A REAL DESTINAÇÃO DOS ENTORPECENTES. CONDIÇÃO DE USUÁRIO QUE, POR SI SÓ, NÃO É SUFICIENTE PARA DESCLASSIFICAR A CONDUTA PARA O CRIME TIPIFICADO NO ART. 28 DA LEI N. 11.343/2006. NARCOTRAFICÂNCIA EVIDENCIADA.

RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. AFASTAMENTO DA CAUSA ESPECIAL DE DIMINUIÇÃO DE PENA PREVISTA NO ART. 33, § 4º, DA LEI N. 11.343/2006. IMPOSSIBILIDADE. DEDICAÇÃO ÀS ATIVIDADES CRIMINOSAS NÃO COMPROVADA. REQUISITOS LEGAIS ATENDIDOS.

PLEITO SUBSIDIÁRIO DA DEFESA. PRETENSA FIXAÇÃO DO PATAMAR MÁXIMO DE 2/3 (DOIS TERÇOS) SOBRE A CAUSA ESPECIAL REDUTORA. NÃO CABIMENTO. OBSERVÂNCIA À DISCRICIONARIEDADE DO MAGISTRADO SINGULAR NA ESCOLHA DA ETAPA DOSIMÉTRICA QUE INCIDIRÁ O REFERIDO CRITÉRIO. ADEMAIS, VETORES DIVERSIDADE E QUANTIDADE DE DROGAS QUE NÃO EXIGEM CUMULATIVIDADE PARA ANÁLISE DO ART. 42 DA LEI N. 11.343/2006. PRECEDENTES DESTA CORTE. REPRIMENDA IRRETOCÁVEL.

SUBSTITUIÇÃO DA REPRIMENDA CORPORAL POR RESTRITIVAS DE DIREITOS. POSSIBILIDADE. ACUSADO QUE PREENCHE OS REQUISITOS LEGAIS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO (ART. 44, I, § 2º, IN FINE, DO CÓDIGO PENAL).

RECURSOS CONHECIDOS, PROVIDO PARCIALMENTE O APELO MANEJADO PELA DEFESA E NÃO PROVIDO O RECLAMO INTERPOSTO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0005706-58.2018.8.24.0011, da comarca de Brusque Vara Criminal em que é Apte/Apdo Iury Luiz Zancanella e Apdo/Apte Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

A Quinta Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, conhecer dos recursos, negar provimento ao apelo manejado pelo Ministério Público e dar provimento parcial ao recurso interposto por Iury Luiz Zancanella, apenas para substituir a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, consistentes em limitação de fim de semana e prestação pecuniária no valor de 1 (um) salário mínimo vigente à época dos fatos, nos termos do art. 44, I, § 2º, in fine, do Código Penal. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pela Exma. Sra. Desembargadora Cinthia Beatriz da Silva B. Schaefer, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Desembargador Norival Acácio Engel.

Compareceu à sessão pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Rogério Antônio da Luz Bertoncini.

Florianópolis, 30 de janeiro de 2020

Luiz Neri Oliveira de Souza

Relator


RELATÓRIO

Na Comarca de Brusque, o representante do Ministério Público ofereceu denúncia contra Iury Luiz Zancanella, dando-o como incurso nas sanções do art. 33, caput, da Lei 11.343/2006, conforme os seguintes fatos descritos na inicial acusatória, in verbis (fls. 60-62):

No dia 20 de novembro de 2018 (terça-feira), por volta das 21h40min, a polícia militar realizava rondas na Rodovia Ivo Silveira, Bairro Bateas, nesta urbe, quando avistou uma motocicleta que adentrando em uma rua lateral, ao tentar a abordagem, o veículo empreendeu fuga, sendo abordado posteriormente, e o condutor identificado como IURY LUIZ ZANCANELLA, ora denunciado.

Em revista pessoal ao denunciado foi encontrado um torrão de substância vulgarmente conhecida como "maconha", com peso aproximado de 32g (trinta e dois gramas), além de uma balança de precisão e um aparelho de telefone celular, marca Motorola, conforme descreve o Auto de Exibição e Apreensão de fl. 5.

Na sequência, os milicianos receberam do próprio denunciado a informação de que havia uma quantidade maior de drogas em sua residência, deslocando-se para o local imediatamente.

A residência situa-se na Rua Brasil (Rua Joaquim Silvino da Cunha), n. 392, Bairro Santa Terezinha, na cidade de Gaspar/SC, local onde a entrada foi franqueada pelo pai de Iury, Sr. Luiz carlos Zancanella, ocasião em que no quarto do denunciado, o qual encontrava-se chaveado e foi aberto por ele, em baixo do colchão, foi localizado tablete de substância entorpecentes conhecida como "maconha", com peso aproximado de 812 g (oitocentas e doze gramas), além de um rolo de papel filme, conforme consta do Auto de Exibição e Apreensão de fl. 5, utensílio utilizado juntamente com a balança para preparo e embalo da droga para comercialização.

As substâncias apreendidas foram submetidas a exame pericial preliminar (vide fl. 17), que se constatou tratar, aparentemente, da droga conhecida como maconha, que possui em sua composição substâncias capazes de causar dependência física e psíquica, de uso proscrito em todo o território nacional, por força da Portaria n. 344/98 da Secretaria de Vigilância Sanitária/MS e subsequentes alterações.

Dessa forma, o denunciado IURY adquiriu, vendeu, expôs à venda, transportou, trouxe consigo, guardou, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar.

Encerrada a instrução, o magistrado a quo proferiu sentença, nos seguintes termos (fls. 174-183):

Ante o exposto, com fundamento do artigo 383 do Código de Processo Penal, dou nova definição jurídica ao fato e reconheço a causa de diminuição da pena decorrente do tráfico privilegiado e, em consequência JULGO PROCEDENTE a denúncia, para condenar o acusado IURY ZANCANELLA, vulgo "Zanca", já identificado nos autos, às penas de três (3) anos e quatro (4) meses de reclusão, em regime inicial aberto, e trezentos e trinta e quatro (334) dias-multa, no valor de um trinta avos (1/30) do salário mínimo vigente à época dos fatos, por cada dia multa, pela prática do crime previsto no artigo 33, caput, da Lei n. 11.343/2006.

Inconformada, a representante do Ministério Público interpôs recurso de apelação. Nas razões de recurso, pugna a reforma da sentença condenatória, para que seja afastada a causa especial de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006, argumentando haver provas de que o acusado não preenche os requisitos para fazer jus ao benefício (fls. 199-211).

O acusado, por intermédio de defensor constituído, também recorreu. Em síntese, almeja a desclassificação da conduta para o crime de posse de drogas para consumo pessoal, tipificado no art. 28 da Lei n. 11.343/2006. Subsidiariamente, pugna pela aplicação da fração máxima de 2/3 (dois terços) referente à causa especial de diminuição de pena, com a consequente substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos (fls. 234-249).

Contrarrazões às fls. 217-229; 253-263.

A Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer lavrado pelo Excelentíssimo Procurador de Justiça Sr. Dr. Pedro Sérgio Steil, manifestou-se pelo "conhecimento e desprovimento do recurso defensivo interposto, e pelo conhecimento e parcial provimento do recurso ministerial" (fls. 270-276).

Este é o relatório.


VOTO

Presentes os pressupostos legais de admissibilidade, conhece-se dos recursos.

1. Recurso da defesa.

O apelante postula a desclassificação do crime de tráfico de drogas para o delito de posse de entorpecentes para consumo pessoal, previsto no art. 28 da Lei n. 11.343/2006, argumentando ser usuário e que as provas coligidas não são suficientes para demonstrar a suposta narcotraficância.

Sem razão.

Como se sabe, o crime previsto no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006, é composto por dezoito verbos e a prática de qualquer um destes configura o ilícito penal (Renato Brasileiro de Lima, Legislação Criminal Especial Comentada. 4. ed. Salvador: JusPodivm, 2016, p. 739).

Portanto, o agente que transporta e mantém em depósito, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, entorpecente visando a narcotraficância incorre nas sanções do art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006.

Com efeito, a materialidade delitiva está devidamente comprovada por intermédio do auto de prisão em flagrante (fl. 2), do boletim de ocorrência (fls. 3-4), do auto de exibição e apreensão (fl. 5), do auto de constatação (fl. 17), do laudo pericial (fls. 143-144), bem como pela prova oral coligida no decorrer da instrução processual, de onde também se extrai a autoria, cujas transcrições foram elaboradas com exímio pelo magistrado singular, Dr. Edemar Leopoldo Schlösser, veja-se:

[...] Por ocasião do auto de prisão em flagrante, o acusado Iury Luiz Zancanella negou vender entorpecentes, declarando-se usuário de maconha desde os 12 anos de idade. Alegou que chegava a fumar em um final de semana 25 gramas da droga. Afirmou que a balança consigo apreendida, "no começo era para pesar a comida", e também para verificar se "quando eu compro a quantidade certa". Quanto ao papel plástico encontrado na residência, disse que servia para manter a droga conservada (mídia de fl. 24).

Na fase do contraditório, relatou que é usuário de drogas já desde longa data e que na noite dos fatos, enquanto a família preparava a decoração natalina, o interrogando ficou "perturbado", pegou a motocicleta e foi dar uma volta num bairro que não conhecia, para consumir a droga que levava consigo. Que no local percebeu a presença de uma camioneta, toda preta, e saiu, pois não viu que era os policiais, e logo depois foi abordado pela polícia, que aprenderam a droga que...

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