Acórdão Nº 0005998-62.2012.8.24.0008 do Segunda Câmara Criminal, 28-09-2021

Número do processo0005998-62.2012.8.24.0008
Data28 Setembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Tipo de documentoAcórdão
Recurso em Sentido Estrito Nº 0005998-62.2012.8.24.0008/SC

RELATOR: Desembargador NORIVAL ACÁCIO ENGEL

RECORRENTE: MAGNO ROBERTO DA CUNHA (ACUSADO) ADVOGADO: PATRICIA RAFAELA PEREIRA (OAB SC052911) ADVOGADO: Ricardo Artur Hutzelmann (OAB SC025098) RECORRENTE: LEANDRO KUHN DOS SANTOS (ACUSADO) ADVOGADO: THIAGO YUKIO GUENKA CAMPOS (DPE) RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Na Comarca de Blumenau, o Ministério Público ofereceu Denúncia contra Leandro Kuhn dos Santos e Magno Roberto da Cunha, dando-os como incursos nas sanções do art. 121, §2º, incisos I, III e IV, do Código Penal, em razão dos fatos assim descritos (Evento 343, DENUNCIA1-2):

[...] Na madrugada do dia 18 de setembro de 2011, por volta das 2h45m, os denunciados LEANDRO KUHN DOS SANTOS e MAGNO ROBERTO DA CUNHA, juntamente com outros indivíduos até o momento não identificados, encontravam-se no interior do Salão Nova Blumenau, localizado na Rua Dr. Pedro Zimmermann, nº127, Bairro Itoupava Central, nesta cidade, e iniciaram discussão com outro grupo de pessoas, quando os seguranças contratados pelo estabelecimento intervieram na briga e retiraram os denunciados à força do local. Em seguida os denunciados investiram contra os seguranças com pedaços de pau, sendo contidos por policiais militares, momento em que proferiram ameaças de morte contra os funcionários.

Assim, dado cabo às ameaças proferidas, na mesma madrugada, por volta das 3h45m, os denunciados retornaram ao Salão Nova Blumenau em um automóvel GM/Corsa, cor prata, placas MCA-8179, e buscando vingança contra os seguranças do salão, desceram do veículo empunhando uma arma de fogo cada um. Na sequência, acreditando que o guardador de carros Gilvan José Alves fosse um dos seguranças daquele estabelecimento, porquanto estava em frente à entrada do salão e trajava roupas pretas, os denunciados, imbuídos de evidente animus necandi, efetuaram diversos disparos de arma de fogo contra a vítima, a qual foi alvejada por dois projéteis, vindo a óbito por "choque hipovolêmico por hemorragia toracoabdominal" (Laudo de Exame Necroscópico de fls. 06-12). Na mesma oportunidade diversos disparos foram disparados em direção ao referido estabelecimento e imóveis vizinhos habitados.

Desta forma, os denunciados Leandro Kuhn dos Santos e Magno Roberto da Cunha, ao agirem por motivo torpe (vingança) e de forma inopinada, efetuando diversos disparos em local público, frequentado por um grande número de pessoas, empregaram meio que podia resultar em perigo comum e que tornou impossível a defesa da vítima, causaram a morte de Gilvan José Alves, que os denunciados, erroneamente, acreditavam tratar-se de um dos seguranças do Salão Nova Blumenau. [...]

Encerrada a instrução preliminar, foi julgado admissível o pleito formulado na exordial acusatória e, com fundamento no art. 413 do Código de Processo Penal, o Juiz a quo pronunciou Leandro Kuhn dos Santos e Magno Roberto da Cunha, dando-os como incursos nas sanções do art. 121, § 2º, incisos I, III e VI, do Código Penal (Evento 345, MAND533-538).

Inconformadas, as Defesas de Leandro e Magno interpuseram Recursos em Sentido Estrito (Eventos 355 e 390).

O Recorrente Magno pugnou, preliminarmente, pela declaração de nulidade da decisão de pronúncia, em razão do cerceamento de defesa, por entender que aquela até então apresentada é deficiente.

No mérito, os Recorrentes pleiteiam a despronúncia ou a absolvição sumária, em razão da insuficiência probatória.

Por fim, a Defesa de Magno requer a concessão do benefício da assistência judiciária.

Apresentadas as Contrarrazões (Eventos 361 e 400) e mantida a Decisão por seus próprios fundamentos, no moldes do art. 589 do Código de Processo Penal (Eventos 369 e 404), os autos ascenderam ao Segundo Grau, oportunidade em que a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Humberto Francisco Scharf Vieira, manifestou-se pelo conhecimento, afastamento da preliminar suscitada pela defesa de Magno Roberto da Cunha, e desprovimento das insurgências (Evento 20 - autos em Segundo Grau).

Este é o relatório.

VOTO

O recurso merece ser conhecido, por próprio e tempestivo.

Da preliminar

Sustenta o Recorrente Magno, preliminarmente, o reconhecimento da nulidade da decisão de pronúncia, em razão do cerceamento de defesa, por entender que aquela até então apresentada é deficiente. Razão não lhe assiste. Vejamos

Conforme se depreende dos autos, o defensor nomeado (Evento 343, DENUNCIA174) e posteriormente a Defensoria Pública (Evento 345) durante o processo apresentaram as peças processuais necessárias, participaram das audiências, inclusive realizando perguntas, não sendo possível considerar a Defesa como insuficiente.

Inclusive, a Defensoria Pública além de apresentar Alegações Finais, interpôs Recurso em Sentido Estrito pugnando pela impronúncia do réu, o que tampouco pode ser considerado como defesa deficiente.

O novo causídico, constituído, por sua vez, entende que houve cerceamento da defesa, decorrente do fato de os defensores antecedentes não terem juntado a documentação referente a permanência de Magno em unidade hospitalar na data dos fatos, prova que entende ser capaz de comprovar que Magno não foi o autor do delito.

Contudo, verifica-se que a documentação versando sobre a entrada de Magno na unidade hospitalar se encontra acostada no Evento 344, CERT243, e fora apreciada pelo Magistrado de primeiro grau antes da Sentença de Pronúncia.

Cumpre ressaltar, como bem exposto pelo Magistrado a quo (Evento 345, MAND536):

[...] Não se olvida que a declaração de fl. 202 indica que o réu Magno Roberto da Cunha tenha dado entrada no Hospital Santo Antônio às 04h03min do dia dos fatos, minutos após a ocorrência do delito. Todavia, revela notar que, conforme informações extraídas do Google Maps, o local do crime é próximo ao hospital (distância de 8 km), de modo que o réu poderia rapidamente ter chegado lá, sobretudo levando em consideração o horário em que ocorreram os fatos. [...]

Ademais, observe-se que o Enunciado n. 523 da Súmula do Supremo Tribunal Federal dispõe expressamente quanto à necessidade de comprovação de prejuízo, nos casos de defesa deficiente, para que se proceda à anulação do processo: "No processo penal, a falta de defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o anulará se houver prove de prejuízo para o réu".

Conforme se extrai da lição de Norberto Avena:

[...] os termos da precitada Súmula deixam claro que, no entendimento do Excelso Pretório, a defesa deficiente importa em nulidade relativa, exigindo a demonstração do prejuízo. Trata-se, pois, de exceção decorrente de construção jurisprudencial, à regra de que é absoluta a nulidade que se originar de afronta direta ou indireta a garantias constitucionais. Idêntica posição é adotada pelo STJ: "nos termos do enunciado 523 da Súmula do Supremo Tribunal Federal, no processo penal, a falta de defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o anulará se houver prova de prejuízo para o réu". Não logrando a defesa demonstrar que foi prejudicada, impossível agasalhar-se a pretensão de anular o feito, pois no sistema processual penal pátrio nenhuma nulidade será declarada se não restar comprovado o efetivo prejuízo (art. 563 do CPP). (AVENA, Norberto. Processo penal - 10ª edição - Rio de Janeiro: Forense, 2018, p. 151)

Nesse sentido, entende-se que a simples alegação de que a defesa foi deficiente, sem demonstrar o prejuízo sofrido, não é capaz de ensejar a nulidade do processo.

É esse o entendimento adotado por esta Câmara Criminal, conforme se extrai da Apelação Criminal n. 0001373-73.2018.8.24.0040, de Laguna, de Relatoria da Desembargadora Salete Silva Sommariva, julgada em 23-06-2020:

APELAÇÃO CRIMINAL - TRIBUNAL DO JÚRI - HOMICÍDIO QUALIFICADO - SENTENÇA CONDENATÓRIA - INSURGÊNCIA DEFENSIVA PRELIMINARES - ALEGADA EXISTÊNCIA DE NULIDADE PROCESSUAL - PROVAS OBTIDAS POR MEIO DE SUPOSTO ESPELHAMENTO - TELEFONE CELULAR APREENDIDO EM OPERAÇÃO POLICIAL DIVERSA - PRÉVIA AUTORIZAÇÃO PARA QUEBRA DO SIGILO TELEFÔNICO E DE DADOS - EIVA INEXISTENTE - ALEGADA DEFICIÊNCIA DE DEFESA TÉCNICA - NÃO OCORRÊNCIA - ACUSADO DEFENDIDO, DE FORMA ATUANTE, POR DEFENSORES NOMEADOS - PREJUÍZO NÃO CONFIGURADO - SÚMULA 523 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - PREFACIAIS AFASTADAS - MÉRITO - DECISÃO MANIFESTAMENTE CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS - INOCORRÊNCIA - INDÍCIOS SUFICIENTES DE MATERIALIDADE E AUTORIA DO DELITO CONTRA A VIDA - DECISÃO AMPARADA EM UMA DAS VERSÕES EXISTENTES NO PROCESSO - SOBERANIA DO TRIBUNAL POPULAR (CF, ART. 5º, XXXVIII, 'C') - DECISÃO MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. (grifou-se)

E também na Apelação Criminal n. 0000636-71.2010.8.24.0001, de Abelardo Luz, de Relatoria do Desembargador Sérgio Rizelo, julgada em 10-12-2019:

APELAÇÃO CRIMINAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL (CP, ART. 217-A, § 1º). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DO ACUSADO. 1. DEFICIÊNCIA DA DEFESA TÉCNICA. NÃO OCORRÊNCIA. EXERCÍCIO DO MUNUS POR DEFENSORA DATIVA, CONFORME LIBERDADE PRÓPRIA DA CATEGORIA (LEI 8.906/94, ART. 7º, I). PREJUÍZO, ADEMAIS, NÃO DEMONSTRADO. INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 523 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. 2. PROVA DA MATERIALIDADE E DA AUTORIA. EXAME PERICIAL DE CONJUNÇÃO CARNAL. RUPTURA HIMENAL RECENTE. AUSÊNCIA DE SÊMEN NO CANAL VAGINAL DA OFENDIDA. PALAVRAS DA VÍTIMA. DECLARAÇÕES DE TESTEMUNHAS E INFORMANTES. 3. TIPICIDADE. VULNERABILIDADE DA VÍTIMA. ESTADO DE INCONSCIÊNCIA. INGESTÃO DE BEBIDA ALCOÓLICA E OUTRAS DROGAS. PROVA ORAL. 4. AFASTAMENTO DO CARÁTER HEDIONDO DO DELITO. CRIME COMETIDO APÓS A ENTRADA EM VIGOR DA LEI 12.015/09. SEPARAÇÃO DE PODERES. GRAVIDADE ABSTRATA E CONCRETA DO CRIME EM ANÁLISE. 1. A mera alegação de deficiência da defesa, diante da apresentação de alegações finais sucintas por advogada dativa, que atuou nos limites de sua liberdade profissional, não é suficiente para comprovar prejuízo ao acusado e, consequentemente, para macular o feito. [...] RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Deste modo, afasta-se a...

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