Acórdão nº 0006285-08.2020.8.14.0013 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 3ª Turma de Direito Penal, 24-04-2023

Data de Julgamento24 Abril 2023
Órgão3ª Turma de Direito Penal
Número do processo0006285-08.2020.8.14.0013
Classe processualAPELAÇÃO CRIMINAL
AssuntoTráfico de Drogas e Condutas Afins

APELAÇÃO CRIMINAL (417) - 0006285-08.2020.8.14.0013

APELANTE: DECIVALDO NASCIMENTO DA SILVA

APELADO: JUSTIÇA PUBLICA

RELATOR(A): Desembargador JOSÉ ROBERTO PINHEIRO MAIA BEZERRA JUNIOR

EMENTA

DIREITO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. 1) ABSOLVIÇÃO. AUSÊNCIA DE PROVA DA MATERIALIDADE. JUNTADA EXTEMPORÂNEA DO LAUDO TOXICOLÓGICO DEFINITIVO. INOCORRÊNCIA. 2) DESCLASSIFICAÇÃO PARA USO. PROVIMENTO.

1. Na hipótese em comento, não se constata prejuízo ao réu, mormente porque o laudo toxicológico definitivo foi elaborado e juntado aos autos, antes da apresentação das alegações finais pela Defesa, bem como não importou em qualquer alteração de conteúdo, em relação as conclusões do laudo de constatação provisório. Ademais, o laudo definitivo não ocasiona, automaticamente, a ausência de prova da materialidade do crime, quando há outros elementos de prova (Súmula nº 32, TJPA), sendo inaplicável a absolvição por ausência de provas da materialidade.

2. Os elementos probatórios dos autos apontam para o apelante como o agente do fato punível, todavia, o Parquet não se desincumbiu do ônus de provar a destinação da droga apreendida ao comércio espúrio, mesmo tendo elementos idôneos e constitucionais para tanto, a saber, por intermédio da quebra de sigilo telefônico. O acesso a mensagens de celular de réu preso em decorrência de busca pessoal e sem autorização judicial constitui violação de uma garantia fundamental e, portanto, sua utilização possui a natureza de prova ilícita, de modo que, remanesce somente a conduta de “trazer consigo” a droga, para consumo pessoal, prevista no tipo do caput do art. 28 da Lei n. 11.343/2006, a qual deve ser processada e julgada perante Juizado Especial Criminal, nos termos do art. 48, §1° da Lei de Drogas.

3. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO, afastando-se a condenação como incurso no art. 33, da Lei nº 11.343/06, remetendo-se os autos ao Juizado Especial Criminal, nos termos do art. 383, §2° do CPP, para o devido processamento e julgamento.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Componentes da 3ª Turma de Direito Penal deste Egrégio Tribunal de Justiça do Pará, em Sessão ocorrida entre os dias vinte e quatro de abril e dois de maio de 2023 (Sessão n° 11ª), por unanimidade, em CONHECER do Recurso, e CONCEDER-LHE PROVIMENTO, para afastar a condenação do recorrente ao crime previsto no art. 33 da Lei nº 11.343/2006, remetendo os autos para o Juizado Especial Criminal, nos termos do art. 383, §2° do CPP, para o devido processamento e julgamento, nos termos do voto do Relator.

Julgamento presidido pela Exmª Srª Desª Kédima Pacífico Lyra.

Belém (PA), 08 de maio de 2023.

JOSÉ ROBERTO PINHEIRO MAIA BEZERRA JÚNIOR

DESEMBARGADOR RELATOR

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Criminal interposta por DECIVALDO NASCIMENTO DA SILVA, representado por Defensor Público, em face de sentença proferida pelo MM. Juízo de Direito da Vara Criminal de Capanema, nos autos da Ação Penal nº 0006285-08.2020.814.0013, que o condenou nas sanções do art. 33 da Lei nº 11.343/06, fixando-lhe a pena de 05 anos de reclusão, a ser cumprida em regime, inicialmente, semiaberto, mais o pagamento de 500 dias multa, a ser atualizada na forma do art.49, § 2º, do CP, cujo pagamento haverá de ser feito dentro do prazo de 10 (dez) dias depois de transitada em julgado a sentença (art. 50 do CP), mediante guia própria, recolhida ao Fundo Penitenciário, no percentual de 75% de seu valor (Dec.- Lei 34/95, art. 14, inc. IV, par. 1º, Lei 10.396/80), em tudo atento ao que preceitua o art. 170 da Lei de Execução Penal, caso o condenado venha a exercer trabalho remunerado no cárcere.

Em suas razões recursais (Num. 9458738 - Pág. 1 a 21), o apelante pleiteia pela concessão de sua absolvição, em razão da ausência de prova da materialidade, diante da preclusão de juntada do laudo toxicológico definitivo e necessidade de seu desentranhamento dos autos.

Subsidiariamente, requer a desclassificação para o crime do art. 28 da Lei 11.343/2006, uma vez que a quantidade de droga encontrada é compatível com o consumo, bem como diante da inexistência de provas quanto a destinação mercantil do entorpecente.

E, ainda, caso seja mantida a condenação exarada na sentença, pugna pela fixação da pena-base no mínimo legal, aplicando-se a fração de 1/6 pela redução referente as atenuantes, com afastamento da Súmula nº 231 do STJ. Por fim, pugnou pela diminuição da pena pelo tráfico privilegiado em sua fração máxima e que, ao fim, seja efetuada a detração penal, com a fixação do regime aberto para cumprimento de pena.

Em sede de contrarrazões (Num. 9458741 - Pág. 1 a 14), o Ministério Público requereu o conhecimento e, no mérito, o improvimento do recurso, mantendo-se a sentença na íntegra.

Os autos vieram a mim por distribuição, oportunidade em que determinei a sua remessa ao exame e parecer do custos legis (Num. 9929623 - Pág. 1)

Nesta instância superior, a Procuradoria de Justiça do Ministério Público, por meio do Dr. Marcos Antônio Ferreira das Neves, se pronunciou pelo conhecimento do recurso e, no mérito, pelo provimento parcial, com alteração da dosimetria, mantendo-se incólume os demais termos da sentença (Num. 10704576 - Pág. 1 a 15).

É o relatório que submeto à revisão.

Sugiro inclusão em pauta no Plenário Virtual.

VOTO

O recurso sob análise deve ser conhecido, em razão do atendimento dos pressupostos e condições para sua admissibilidade, mormente em relação à adequação e tempestividade.

01. ABSOLVIÇÃO: JUNTADA INTEMPESTIVA DE LAUDO TOXICOLÓGICO DEFINITIVO.

Ab initio, o apelante requereu o desentranhamento do Laudo Toxicológico definitivo, alegando que esse documento foi anexado fora do prazo legalmente previsto no art. 52, parágrafo único, I da Lei de Drogas e, diante da ausência de prova da materialidade, que fosse concedida a absolvição, na forma do art. 386, II do CPP.

Sem razão o apelante! Compulsando-se os autos, observa-se que o Laudo nº: 2021.07.000067-QUI objurgado foi juntado aos autos após o oferecimento das alegações finais ministeriais, sendo oportunizado a defesa acesso as suas conclusões, inexistindo qualquer prejuízo, não haver que se falar em seu desentranhamento e consequente absolvição por ausência de prova da materialidade, in verbis:

AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. ATO INFRACIONAL ANÁLOGO AO CRIME DE TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. PRELIMINAR DE NULIDADE. JUNTADA TARDIA DO LAUDO PERICIAL. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE PREJUÍZO. MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE INTERNAÇÃO. FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. REITERAÇÃO NA PRÁTICA DO ATO INFRACIONAL. IMPERIOSIDADE DA MEDIDA DEMONSTRADA. RECOMENDAÇÃO N. 62/2020 DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. EXCEPCIONALIDADE NÃO CONFIGURADA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. Nos termos da assente jurisprudência desta Corte Superior, o reconhecimento de nulidade, relativa ou absoluta, no âmbito do Processo Penal, exige a demonstração do efetivo prejuízo suportado pelas partes (princípio pas de nullité sans grief). 2. Na hipótese vertente, não se constata o referido prejuízo, sobretudo porque o laudo toxicológico definitivo foi elaborado e juntado aos autos antes da apresentação das alegações finais pela Defesa e não implicou qualquer inovação em relação ao auto de constatação elaborado por ocasião do flagrante. 3. De todo modo, a jurisprudência desta Corte Superior de Justiça entende que, embora o laudo toxicológico definitivo, via de regra, seja imprescindível para provar a materialidade do delito de tráfico de drogas, a ausência da mencionada prova técnica não afasta a possibilidade de que, em casos excepcionais, essa comprovação se dê "[...] pelo próprio laudo de constatação provisório, quando ele permita grau de certeza idêntico ao do laudo definitivo, pois elaborado por perito oficial, em procedimento e com conclusões equivalentes", pois "a depender do grau de complexidade e de novidade da droga apreendida, sua identificação precisa como entorpecente pode exigir, ou não, a realização de exame mais complexo que somente é efetuado no laudo definitivo" (EREsp 1.544.057/RJ, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 26/10/2016, DJe 09/11/2016). 4. (...) 8. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC n. 669.046/SC, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 22/2/2022, DJe de 3/3/2022.)

In casu, o laudo definitivo não destoou das conclusões apresentadas no laudo de constatação provisório (Num. 9458671 - Pág. 20), apenas ratificando as informações neste último contidas, bem como sem ofensa à ampla defesa e ao contraditório do réu.

A regra insculpida no art. 52, parágrafo único, I da Lei de Drogas trata dos prazos que devem ser observados pela autoridade policial durante a tramitação do inquérito policial até a remessa ao Poder Judiciário, em nada se relacionando com os atos processuais praticados na fase judicial.

Pondo uma pá de cal na questão, na esteira da Súmula nº 32 deste E. TJPA, a ausência de Laudo Toxicológico Definitivo não conduz, necessariamente, à inexistência de prova de materialidade do crime, a qual poderá ser comprovada por outros elementos probatórios”, razão pela qual indefiro o pedido de desentranhamento da referida prova pericial e, afasto o pleito absolutório, por ausência de provas da materialidade.

02. DESCLASSIFICAÇÃO PARA USO.

O apelante não nega a posse das drogas apreendidas, quando de sua prisão em flagrante, contudo, desde o inquérito policial, afirma que elas se destinariam para o consumo próprio e não para o comércio espúrio.

Imperioso destacar que o art. 28, §2º da Lei nº 11.343/06 traz grande celeuma, no âmbito da prática forense pátria, na medida em que, determina que a análise do consumo pessoal perpassa pela:

1. Natureza e quantidade da substância apreendida;

2. Local e condições em que se desenvolveu a ação;

3. Circunstâncias sociais e pessoais;

4. Conduta e...

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