Acórdão nº 0006341-10.2009.8.14.0051 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 2ª Turma de Direito Penal, 21-08-2023

Data de Julgamento21 Agosto 2023
Órgão2ª Turma de Direito Penal
Número do processo0006341-10.2009.8.14.0051
Classe processualAPELAÇÃO CRIMINAL
AssuntoTráfico de Drogas e Condutas Afins

APELAÇÃO CRIMINAL (417) - 0006341-10.2009.8.14.0051

APELANTE: SIMONE LIMA DOS SANTOS

APELADO: JUSTIÇA PÚBLICA

RELATOR(A): Desembargador LEONAM GONDIM DA CRUZ JÚNIOR

EMENTA

EMENTA: PENAL. PROCESSO PENAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. ARTIGO 33, CAPUT, DA LEI 11.343/2006. PROVAS QUE NÃO REVELAM CONDUTA ALÉM DO COMPANHEIRISMO. IMPOSSIBILIDADE DE RESPONSABILIZAÇÃO CRIMINAL. INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. ABSOLVIÇÃO DA COMPANHEIRA. 1. Admitir que a apelante sabia da atividade paralela exercida pelo seu companheiro, não demonstra que tenha aderido à conduta dele. 2. Ausência de "elementos de convicção necessários" sobre a participação da apelante, no sentido de praticar, dolosamente, alguma das condutas do tipo do art. 33 da Lei nº 11.343/06. 3. Acervo probatório acostado é lastreado de incertezas, mostrando-se insuficiente para comprovar a autoria delitiva da apelante, devendo ser aplicado o princípio do in dubio pro reo e proceder à absolvição. RECURSO PROVIDO À UNANIMIDADE.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores integrantes da Egrégia 2ª Turma de Direito Penal, à unanimidade, em CONHECER DO RECURSO E, NO MÉRITO, DAR-LHE PROVIMENTO, nos termos do voto do Desembargador Relator.

Sala das Sessões do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, aos vinte e um dias do mês de agosto do ano de dois mil e vinte e três.

Julgamento presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Rômulo José Ferreira Nunes.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. DES. LEONAM GONDIM DA CRUZ JÚNIOR (RELATOR):

Trata-se de Recurso de Apelação interposto por SIMONE LIMA DOS SANTOS, irresignada com os termos da r. sentença proferida pelo MM. Juízo de Direito da 6ª Vara Penal da Comarca de Santarém/PA, que julgou procedente a denúncia oferecida pelo Ministério Público, condenando-a à pena privativa de liberdade de 8 (oito) anos de reclusão, a ser cumprida inicialmente em regime semi-aberto, além do pagamento de 600 dias-multa, como incurso nas sanções do art. 33, caput, da Lei 11.343/2006.

Na peça acusatória, distribuída no dia 06.08.2009 (id Num. 14689267 - Pág. 2/5), há, ipsis litteris:

“Consta do incluso inquérito policial que, no dia 1" de julho de 2009, por volta das 18 horas, na residência localizada à Rua Niterói, Bairro Jutai, município de Santarém, policiais civis apreenderam 16 (dezesseis) petecas da substância entorpecente denominada "benzoil metil ecgonina", popularmente conhecida por "cocaína", que era mantida em depósito na residência dos denunciados, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar. Na oportunidade, também foram apreendidas no referido imóvel 09 (nove) munições intactas, calibre 32, marca CBC. Conforme apurado, policiais civis receberem notícia crime anônima informando que três indivíduos estariam preparando e pesando substância entorpecente dentro de uma residência no Bairro Jutaí. Ato contínuo, policiais civis diligenciaram até o referido imóvel, sendo que a indiciada Simone dos Santos, ao perceber a aproximação policial, correu até o banheiro e deu descarga no vaso sanitário, conduta típica de quem quer evitar a prisão em flagrante delito por tráfico de drogas. Com efeito, diante da situação de flagrante delito, policiais Civis ingressaram na residência dos denunciados, oportunidade em que encontraram duas "cabeças' de substância entorpecente emersas no vaso sanitário, sendo que, ao realizarem a revista no imóvel, apreenderam uma "cabeça" da mesma substância enrolada em uma fralda descartável nove munições, calibre 32, intactas, que estavam guardadas em uma uma gaveta no quarto da indiciada, uma balança utilizada para pesar a substância entorpecente; bem como várias sacolas plásticas utilizadas para embalar as "cabeças de droga". Em seguida, já no quintal da residência, foram apreendidos dois frascos vazios de solução de bateria, habitualmente utilizados para misturar "cabeças" de droga com a pasta base de cocaína, visando dar mais consistência e volume. Ademais, realizada a abertura da fossa do imóvel, foram encontradas treze cabeças" da substância entorpecente conhecida como cocaína, que haviam sido jogadas no vaso sanitário pela denunciada. No momento da operação policial somente a indiciada estava na residência, razão pela qual foi realizada sua prisão em flagrante delito, sendo que seu companheiro Gledson Ribeiro, ora denunciado, havia saído minutos antes. Conforme depoimentos testemunhais, os denunciados, juntamente com o indivíduo Valter Lopes Diniz, em associação estável, preparavam e vendiam substâncias entorpecentes no referido imóvel, que funcionava como "boca de fumo".

Resposta à acusação, id Num. 14689271 - Pág. 1/8.

Denúncia recebida e determinação de separação do feito ante a não localização do segundo réu no dia 27.09.2009, id Num. 14689272 - Pág. 1/2.

Audiência de Instrução e Julgamento em 20.10.2009, id Num. 14689272 - Pág. 22 a id Num. 14689273 - Pág. 2.

Audiência de Instrução e Julgamento em 30.01.2012, id Num. 14689279 - Pág. 7/9.

Exame toxicológico definitivo, id Num. 14689279 - Pág. 16.

Audiência de Instrução e Julgamento em 30.04.2014, gravado em mídia, id Num. 14689281 - Pág. 6

Continuação da Audiência de Instrução e Julgamento em 29.04.2015 por meio audiovisual, id Num. 14689281 - Pág. 24.

Memoriais do Ministério Público, id Num. 14689283 - Pág. 1/5.

A ré apresentou Memoriais, id Num. 14689283 - Pág. 7/13.

Certidão judicial criminal negativa, Num. 14689283 - Pág. 15.

Sentença data de 15/05/2017, id Num. 14689284 - Pág. 1/10, que julgou procedente a denúncia oferecida pelo Ministério Público.

Razões do Recurso de Apelação interposto pela ré, id Num. 14689284 - Pág. 13, pugnando, em suas razões, pela absolvição por falta de provas ou, alternativamente, fixação da pena-base no mínimo legal, incidência da causa de diminuição de pena (§4º, art. 33, da Lei 11.343/2006), regime inicial aberto e substituição da pena privativa por restritiva, id Num. 14689285 - Pág. 2/10.

Em Contrarrazões, id Num. 14689285 - Pág. 13 a id Num. 14689286 - Pág. 1, o Ministério Público requereu o CONHECIMENTO e TOTAL IMPROVIMENTO DO RECURSO.

Instada a se pronunciar como custos legis, a d. Procuradoria de Justiça manifestou-se pelo CONHECIMENTO e, no mérito, pelo TOTAL IMPROVIMENTO do recurso, id Num. 14689286 - Pág. 15 a id Num. 14689287 - Pág. 3.

Cópia dos autos, Num. 6474686 - Pág. 1 a Num. 6475234 - Pág. 1.

Certidão de trânsito em julgado para o Ministério Público em 05.06.2017, Num. 14689294 - Pág. 1.

Autos vieram-me conclusos

É o relatório do necessário.

À Douta Revisão.

Submeta-se o feito ao Plenário Virtual (artigo 140-A do Regimento Interno desta Egrégia Corte).


VOTO

O EXMO. SR. DES. LEONAM GONDIM DA CRUZ JÚNIOR (RELATOR):

1.DO JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE

Preenchidos os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço os recursos interpostos, por conseguinte.

2.DO MÉRITO

Trata-se de recurso de Apelação contra sentença que condenou a acusada pela prática do crime previsto no art. 33, caput, da Lei 11.243/2006, à pena de 8 (oito) anos de reclusão, em regime inicialmente semi-aberto, e ao pagamento de 600 (seiscentos) dias-multa.

Pugna pela absolvição por falta de provas e, subsidiariamente, fixação da pena-base no mínimo legal, incidência da causa de diminuição de pena (§4º, art. 33, da Lei 11.343/2006), regime inicial aberto, e substituição da pena privativa por restritiva,

Pois bem.

2.1. DA MATERIALIDADE

A materialidade do crime de tráfico ilícito de entorpecentes é incontestável, conforme o Laudo de Exame de constatação de substância entorpecente juntada aos autos, id Num. 14689279 - Pág. 16, referente à substância encontrada na residência da apelante, vulgarmente conhecida como cocaína,16 petecas, além de balança de precisão, diversos sacos plásticos para embalagem da droga e solução de bateria, habitualmente usada para misturar ao entorpecente.

2.2. DA AUTORIA

O delito de tráfico de entorpecentes é de ação múltipla, bastando para a sua caracterização que a conduta do agente seja subsumida em um dos verbos descritos no artigo 33 da Lei de Drogas, razão pela qual as expressões "guardar”, “transportar”, “trazer consigo", “oferecer”, “entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente”, são suficientes, por si só, para configurar o ilícito penal, não sendo necessária, portanto, a eventual venda de entorpecentes a terceiro para que ocorra a consumação de tal delito.

No processo criminal vigora o princípio segundo o qual, para alicerçar um decreto condenatório, a prova deve ser clara, positiva e indiscutível, não bastando apenas a probabilidade, mesmo que forte, acerca do delito e de sua autoria.

Pela divisão do ônus probatório, nos termos do artigo 156 do Código de Processo Penal, cabe ao órgão acusador fazer prova inequívoca das imputações feitas, sendo, pois, descabido atribuir à defesa, consoante é cediço, o encargo de se esquivar das alegações acusatórias lastreadas em meros indícios ou conjecturas.

No caso em apreço, a apelante foi presa em flagrante após denúncia anônima de que seu companheiro estaria embalando drogas na residência. No local, foram encontradas petecas de substância que, após laudo de constatação definitivo, restou confirmado tratar-se de entorpecente vulgarmente conhecido como cocaína.

Esclareço que o fato da apelante ser companheira de uma pessoa denunciada anonimamente por traficar substâncias ilícitas, não induz automaticamente que participava diretamente de qualquer atividade ilícita dela.

Ensina Damásio de Jesus que deve ser afastada a imputação de coautoria ou participação da esposa pelo simples motivo de residir na mesma casa do traficante, "[...] ainda que tenha conhecimento do preço da droga cobrado pelo marido", ou, mesmo "[...] pelo fato de saber que o marido guarda maconha no quarto", e mesmo que "[...] saiba que o companheiro guarda maconha na moradia comum" (Lei Antitóxicos Anotada, Saraiva, art....

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