Acórdão Nº 0006840-84.2009.8.24.0125 do Quarta Câmara de Direito Civil, 03-12-2020

Número do processo0006840-84.2009.8.24.0125
Data03 Dezembro 2020
Tribunal de OrigemItapema
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Civil
Classe processualEmbargos de Declaração
Tipo de documentoAcórdão


Embargos de Declaração n. 0006840-84.2009.8.24.0125/50001, de Itapema

Relator: Des. Luiz Felipe Schuch

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL CUMULADA COM CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO. CONTRATO DE CESSÃO DE DIREITOS SOBRE ESTABELECIMENTO COMERCIAL. PARCIAL PROCEDÊNCIA DOS PLEITOS MANTIDA PELO COLEGIADO.

OPOSIÇÃO DE ACLARATÓRIOS PELA AUTORA. SUSCITADA A EXISTÊNCIA DE ERROS MATERIAIS, OMISSÕES E CONTRADIÇÕES NA APURAÇÃO DO CENÁRIO FÁTICO. JULGAMENTO DO COLEGIADO QUE, À LUZ DAS PREMISSAS DO ART. 489, § 1º, DO CPC/2015, APRECIOU O CONJUNTO PROBATÓRIO DE FORMA EXAUSTIVA E MINUDENTE. MÁCULAS AFASTADAS.

RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Os embargos de declaração constituem recurso de rígidos contornos processuais, consoante disciplinamento contido no art. 1.022 do Código de Processo Civil, exigindo-se, para seu provimento, estejam presentes seus pressupostos legais de cabimento.

lnocorrentes as hipóteses de obscuridade, contradição, omissão ou erro material, não há como prosperar o inconformismo.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Embargos de Declaração n. 0006840-84.2009.8.24.0125/50001, da comarca de Itapema (1ª Vara Cível), em que é embargante Aparecida de Fátima Silva de Moraes e embargado Jorge Alberto dos Santos Rosa.

A Quarta Câmara de Direito Civil decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais.







O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Desembargador Helio David Vieira Figueira dos Santos, com voto, e dele participou o Desembargador José Agenor de Aragão.

Florianópolis, 3 de dezembro de 2020.

Luiz Felipe Schuch

RELATOR


RELATÓRIO

Aparecida de Fátima Silva de Moraes interpôs embargos de declaração (fls. 574-587) em desfavor do acórdão de fls. 520-548, da lavra deste Relator, assim ementado:

APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL CUMULADA COM CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO. CONTRATO DE CESSÃO DE DIREITOS SOBRE ESTABELECIMENTO COMERCIAL (SHOPPING GAÚCHO). PARCIAL PROCEDÊNCIA NA ORIGEM.

AGRAVO RETIDO INTERPOSTO PELA AUTORA NA VIGÊNCIA DO CPC/1973. AUSÊNCIA DE RATIFICAÇÃO POR OCASIÃO DO APELO. EXEGESE DO ART. 523, § 1º, DO CPC/1973. REQUISITO DE ADMISSIBILIDADE DESATENDIDO. RECLAMO NÃO CONHECIDO. APELAÇÕES CÍVEIS DA AUTORA E DO RÉU. ANÁLISE CONJUNTA. PRELIMINARES. ILEGITIMIDADE ATIVA. INTERESSE JURÍDICO DA DEMANDANTE EM DESFAZER O PACTO DO QUAL PARTICIPOU BEM EVIDENCIADO. REVELIA. CONTESTAÇÃO APÓCRIFA. ART. 13 DO CPC/1973. MÁCULA SANADA COM A IMEDIATA APRESENTAÇÃO DE PEÇA DEFENSIVA DEVIDAMENTE ASSINADA PELO ADVOGADO. CONTUMÁCIA NÃO CONFIGURADA. TESES AFASTADAS.

MÉRITO. ALEGAÇÃO DA AUTORA DE QUE CONTRAIU EMPRÉSTIMO POR MEIO DA SIMULAÇÃO DA CESSÃO DE DIRETOS. ART. 167 DO CC/2002. PROVA DOS AUTOS QUE NÃO AMPARA TAL CONCLUSÃO. TESTEMUNHOS INCAPAZES DE DEMONSTRAR O VÍCIO APONTADO. SUPOSTAS NOTAS PROMISSÓRIAS EMITIDAS EM DESFAVOR DA AUTORA CUJA EXISTÊNCIA NÃO FOI COMPROVADA. ART. 373, I, DO CPC/2015. ÔNUS PROCESSUAL DE DEMONSTRAR INDÍCIOS DE ILICITUDE NO PACTO NÃO ATENDIDO. VALIDADE DO NEGÓCIO CONFIRMADA. RÉU QUE SE COMPROMETEU A ENTREGAR DOIS VEÍCULOS (UM AUDI A4 E UM BMW 528) EM DAÇÃO EM PAGAMENTO, MAS DEIXOU DE FORNECER A DOCUMENTAÇÃO NECESSÁRIA À TRANSFERÊNCIA DO BMW. VEÍCULO FURTADO E, AO SER RECUPERADO E ENVIADO PARA UMA OFICINA MECÂNICA PARA SER REPARADO, FOI RETOMADO PELO DEMANDADO, AO ARGUMENTO DE QUE A ACIONANTE NÃO QUITOU AS DÍVIDAS DE FINANCIAMENTO QUE RECAIAM SOBRE O REFERIDO AUTOMÓVEL. ART. 476 DO CC/2002. EXCEÇÃO DO CONTRATO NÃO CUMPRIDO QUE AUTORIZOU A DEMANDANTE, PARTE CONTRATANTE INOCENTE, A DEIXAR DE RESPONDER POR TAL ENCARGO. RESCISÃO JUDICIAL DA AVENÇA QUE SE IMPÕE. RETORNO AO STATUS QUO ANTE. IMPOSSIBILIDADE DE A ACIONANTE RETOMAR O CONTROLE DO ESTABELECIMENTO COMERCIAL (O QUAL FOI DEMOLIDO APÓS TER SIDO VENDIDO PELO RÉU PARA TERCEIROS DE BOA-FÉ). CONVERSÃO DA OBRIGAÇÃO EM PERDAS E DANOS EQUIVALENTE AO VALOR DO CONTRATO.

PRETENSÃO DO ACIONADO AO ABATIMENTO DOS VALORES GASTOS COM OS REPAROS DO BMW. IMPOSSIBILIDADE, PORQUANTO ELE PRÓPRIO RETOMOU O AUTOMOTOR E OS REPAROS APENAS LHE BENEFICIARAM.

AUTORA QUE PRETENDE A INDENIZAÇÃO PELOS ALEGADOS PREJUÍZOS CAUSADOS PELO ENCERRAMENTO DAS ATIVIDADES COMERCIAIS E DEMOLIÇÃO DO "SHOPPING GAÚCHO". CESSÃO ONEROSA DOS DIREITOS À FRUIÇÃO E GOZO DO FUNDO DE COMÉRCIO QUE AFASTA QUALQUER INDENIZAÇÃO, SOB PENA DE ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA.

CLÁUSULA PENAL DE 20% SOBRE O VALOR DA TRANSAÇÃO. ARTS. 412 E 413 DO CC/2002. MONTANTE COMPATÍVEL COM AS PARTICULARIDADES DO CONTRATO E COM A CAPACIDADE FINANCEIRA DAS PARTES. EXCESSO ANTIJURÍDICO NA MULTA NÃO VERIFICADO. BASE DE CÁLCULO ELEITA LIVREMENTE PELAS PARTES QUE DEVE SER PRESTIGIADA. DECISUM QUE NÃO COMPORTA REPARO. PREQUESTIONAMENTO. DESNECESSIDADE DE O JULGADOR SE MANIFESTAR SOBRE TODOS OS DISPOSITIVOS APONTADOS PELAS PARTES QUANDO NÃO SE MOSTRAREM RELEVANTES PARA O DESLINDE DA CONTROVÉRSIA.

AGRAVO RETIDO NÃO CONHECIDO.

RECURSOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS. j. (9-7-2020).


Disse a embargante, em resumo, que o aresto seria obscuro e omisso "quanto ao contexto em que o negócio jurídico foi celebrado", em especial no tocante à apreciação das provas dos autos, as quais, ao seu ver, indicariam a "nulidade do negócio jurídico em razão da ocorrência de simulação (art. 167 do Código Civil)" (fl. 576).

Oferece longo arrazoado sobre a sua versão e interpretação jurídica dos fatos que permearam o indigitado contrato de cessão de direitos e, ao final, pretende o acolhimento da insurgência, inclusive em seus efeitos infringentes a fim de julgar totalmente procedentes os pleitos exordiais.



VOTO

De início, assinala-se que, não obstante a existência de outros feitos mais antigos no acervo de processos distribuídos a este Relator, a apreciação do presente recurso em detrimento daqueles distribuídos há mais tempo não significa violação ao disposto no art. 12, caput, do novo Código de Processo Civil, tendo em vista a exceção contida no § 2º, V, do mesmo dispositivo legal.

O recurso preenche os requisitos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade, motivo pelo qual deve ser conhecido.

Pois bem.

Como é cediço, os embargos de declaração constituem recurso de rígidos contornos processuais, consoante disciplinamento contido no art. 1.022 do Código de Processo Civil, exigindo-se, para seu provimento estejam presentes seus pressupostos legais de cabimento.

Assim, sem a presença de erro material, obscuridade, contradição ou omissão, não há como prosperar o inconformismo, ainda que para fim de pré-questionamento.

Na hipótese, a embargante – autora na origem – afirma que o aresto impugnado incorreu em omissões e obscuridades ao apreciar a prova dos autos (pois, ao que ela tornou a afirmar, o contrato de cessão de direitos seria nulo); contudo, deve-se destacar que o Órgão Fracionário desempenhou minudente avaliação de todo o conjunto probatório presente nos autos, conforme se pode inferir do seguinte excerto (fls. 531-540):

Da nulidade do negócio jurídico:

A autora defendeu a nulidade do contrato de cessão de direitos, pois, em resumo, o pacto esconderia a verdadeira intenção das partes de fazer um contrato de mútuo com remuneração de capital com juros acima do limite legal, em prática reputada de usurária.

A acusação é séria e merece análise minudente.

Por primeiro, importante estabelecer a diferença entre os conceitos de simulação e de dissimulação, pois, a depender da hipótese, as consequências serão diferentes.

Na visão de Arnaldo Rizzardo,

[...] na simulação faz-se parecer verdadeiro o que não existe. Provoca-se uma crença falsa de algo irreal. Na dissimulação, ao contrário, oculta-se o verdadeiro ou aquilo que se quis constituir, apresentando-se com um aspecto dissociado do verídico. Em ambas, porém, o agente busca o engano, ora ocultando sobre a inexistência de uma circunstância não verdadeira, ora propalando a existência de uma situação real e concreta. Esconde-se, na última, algo que sentimos. Mantém-se o outro contraente distanciado das pretensões que conduzem ao negócio. O art. 167 dá validade ao negócio que se dissimulou, se válido na forma e [substância]: "É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se dissimulou, se válido na substância e na forma" (Contratos, 16ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017, p. 206).


In casu, de dissimulação não se trata, pois as partes, a toda evidência, tinham plena ciência daquilo que pactuaram e concordaram; aqui se pode invocar a simulação, porquanto, se aceita a tese autoral, os contratantes simularam um negócio com a intenção de praticar outro, daí advindo a nulidade dos pactos eivados de tal vício, conforme o Código Civil, a saber:

Art. 167. É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se dissimulou, se válido for na substância e na forma.

§ 1 o Haverá simulação nos negócios jurídicos quando:

I - aparentarem conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas daquelas às quais realmente se conferem, ou transmitem;

II - contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira;

III - os instrumentos particulares forem antedatados, ou pós-datados.

§ 2 o Ressalvam-se os direitos de terceiros de boa-fé em face dos contraentes do negócio jurídico simulado.


A autora, em mais de uma oportunidade nestes autos, disse que "no final de setembro de 2008, já como reflexo da crise financeira que se iniciava, o Shopping Gaúcho Comércio de Calçados, Artigos de Couro e Confecções Ltda. ME enfrentava dificuldades financeiras" (fl. 4) e sem a possibilidade de tomar empréstimos bancários, soube por meio de "um investidor que desejava se tornar sócio no...

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