Acórdão Nº 0006860-65.2018.8.24.0091 do Quarta Câmara Criminal, 03-12-2020

Número do processo0006860-65.2018.8.24.0091
Data03 Dezembro 2020
Tribunal de OrigemCapital
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão

Apelação Criminal n. 0006860-65.2018.8.24.0091, da Capital - Eduardo Luz

Relator: Desembargador José Everaldo Silva

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME MILITAR. VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL, POR QUATRO VEZES (ART. 326 DO CPM), PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO (ART. 14, DA LEI N. 10.826/2003) E ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA ARMADA MAJORADA PELO CONCURSO COM FUNCIONÁRIO PÚBLICO (ART. 2º, §§2º E 4º, II, DA LEI N. 12.850/2013). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA.

1. CRIME DE VIOLAÇÃO DO SIGILO FUNCIONAL MILITAR. DIVULGAÇÃO DE INFORMAÇÕES EXTRAÍDAS DO SISTEMA DE INTELIGÊNCIA DE SEGURANÇA PÚBLICA (SISP). PLEITO ABSOLUTÓRIO.

MANUTENÇÃO DA CONDENAÇÃO EM RELAÇÃO ÀS INFORMAÇÕES SIGILOSAS DIVULGADAS PARA WELMA. TRANSMISSÃO VIA WHATSAPP DE FOTOGRAFIA DE PRESO RETIRADA DO SISTEMA DE IDENTIFICAÇÃO E ADMINISTRAÇÃO PRISIONAL (I-PEN). INFORMAÇÕES PENAIS QUE DEVEM PERMANECER EM SEGREDO, CUJA DIVULGAÇÃO ACARRETA PREJUÍZO À ADMINISTRAÇÃO MILITAR. ABSOLVIÇÃO INVIÁVEL.

ABSOLVIÇÃO EM RELAÇÃO ÀS INFORMAÇÕES TRANSMITIDAS PARA EDUARDO, GUSTAVO E RODRIGO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE PREJUÍZO À ADMINISTRAÇÃO PENAL. RECURSO PROVIDO NO PONTO.

2. PORTE DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO. APELANTE FLAGRADO POR CÂMERAS DE MONITORAMENTO DO ELEVADOR PORTANDO ILEGALMENTE ARMA DA POLÍCIA CIVIL.

ALEGAÇÃO DE ESTRITO CUMPRIMENTO DO DEVER LEGAL. EXCLUDENTE NÃO SUSCITADA NO PRIMEIRO GRAU DE INSTRUÇÃO. INOVAÇÃO RECURSAL. RECURSO NÃO CONHECIDO NO PONTO.

PLEITO ABSOLUTÓRIO POR ATIPICIDADE DA CONDUTA. ALEGADA AUSÊNCIA DE LESIVIDADE AO BEM JURÍDICO TUTELADO. TESE NÃO CARACTERIZADA. CRIME DE PERIGO ABSTRATO. DESNECESSIDADE DE COMPROVAR A EXISTÊNCIA DE PERIGO CONCRETO.

PEDIDO DE APLICAÇÃO RETROATIVA DO DECRETO PRESIDENCIAL N. 9.785/2019. ALEGAÇÃO QUE O ART. 20 DO REFERIDO DECRETO PERMITIU O PORTE DE QUALQUER ARMA DE FOGO COMPATÍVEL COM O CALIBRE, INDEPENDENTE DA ARMA ESTAR NOME DO PORTADOR. INVIABILIDADE. PORTE DE ARMA DE MILITAR ABORDADA EM ARTIGO DIVERSO. SITUAÇÃO QUE DEVE OBSERVAR O DISPOSTO NA PORTARIA 1.160/2009-PMSC. PORTE ILEGAL CONFIGURADO.

3. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA ARMADA MAJORADA PELO CONCURSO COM FUNCIONÁRIO PÚBLICO (ART. 2º, §§2º E 4º, II, DA LEI N. 12.850/2013). PRETENSÃO ABSOLUTÓRIA. POR INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. INVIABILIDADE. CONJUNTO PROBATÓRIO CONVINCENTE A INDICAR QUE O RÉU INTEGRAVA ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA.

4. COLABORAÇÃO COMO INFORMANTE COM ORGANIZAÇÃO DESTINADA AO TRÁFICO DE DROGAS (ART. 37, DA LEI N. 11.343/2006). PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO. FALTA DE INTERESSE RECURSAL. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA NA ORIGEM.

RECURSO CONHECIDO EM PARTE E PARCIALMENTE PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0006860-65.2018.8.24.0091, da comarca da Capital - Eduardo Luz Vara de Direito Militar em que é/são Apelante(s) Jeferson Carlos Raimundo e Apelado(s) Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

A Quarta Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, conhecer em parte do recurso e dar-lhe parcial provimento somente para absolver o apelante de três condutas de violação de sigilo funcional militar (art. 326, CPM), nos termos do art. 439, "b" do CPPM, mantidas as demais cominações da sentença. Custas legais.

O julgamento em sessão presencial por videoconferência, nos termos dos arts. 236, § 3º, 937, § 4º, 193, 196 e 217 do CPC c/c art. 3º do CPP, e dos arts. 142-D e seguintes do RITJSC, foi realizado nesta data, e dele participaram os Exmos. Srs. Des. Sidney Eloy Dalabrida e Zanini Fornerolli.

Funcionou como membro do Ministério Público o Exmo. Sr. Dr. Procurador de Justiça Lio Marcos Marin.

Florianópolis, 3 de dezembro de 2020.



[assinado digitalmente]

Desembargador José Everaldo Silva

Presidente e Relator



RELATÓRIO

Na comarca da Capital, Vara Militar, o representante do Ministério Público ofereceu denúncia contra Jeferson Carlos Raimundo, dando-o como incurso nas sanções dos artigos 308, caput e 326, caput, por cinco vezes, ambos do Código Penal Militar; art. 37, caput, c/c art. 40, II e V, ambos da Lei n. 11.343/2006; o art. 2º, §§ 2º e 4º, II, da lei n. 12.850/2013; e o art. 14, caput, da lei n. 10.826/2003, tudo na forma do artigo 79, do Código Penal Militar, porque, conforme descreve a exordial acusatória de fls. 620-626:


INTROITO

No período de dezembro de 2015 a abril de 2017 verificou-se que os civis Danilo de Souza, Andrei Miraldo Ferreira, Marcos Paulo Gonçalves, Douglas César Albino e outras pessoas, integraram organização criminosa, estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, com o fim de obter vantagem pecuniária por intermédio da prática do crime de tráfico de drogas interestadual, com sede na Costeira do Pirajubaé, na Cidade de Florianópolis, sendo suas condutas apuradas nos autos da ação penal n. 0045138-53.2015.8.24.0023, que tramita perante a Vara Criminal da Região Metropolitana de Florianópolis.

No decorrer das investigações, constou-se a proximidade do denunciado Soldado PM JEFERSON CARLOS RAIMUNDO, vulgo "Sadolzinho"1, com os integrantes da mencionada organização criminosa, bem como a prática, pelo agente público, dos seguintes crimes:

FATO 1

No ano de 2016, em data a ser melhor apurada ao longo da instrução processual, o denunciado JEFERSON CARLOS RAIMUNDO recebeu para si, em razão da função de Policial Militar, vantagem indevida.

Segundo apurado, o denunciado recebeu a quantia de 35 mil reais de Andrei Miraldo Ferreira para prestar informações à organização criminosa e efetuar consultas no Sistema Integrado de Segurança Público [SISP] dos membros da agremiação ilícita.

Nesse sentido, consta que no dia 7 de novembro de 2016, Marcos Paulo Gonçalves foi preso em flagrante delito no posto de Biguaçu da Polícia Rodoviária Federal, transportando cerca de 200 quilogramas de maconha, sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar, substância estupefaciente pertencente à organização criminosa mencionada.

A partir dessa data, Andrei Miraldo Ferreira passou a diligenciar no intuito de obter informações acerca das investigações que culminaram na prisão de Marcos Paulo Gonçalves, bem como para se cientificar das consequências que dela poderiam advir à organização.

Com isso, no dia 12 de novembro de 2016, o denunciado JEFERSON CARLOS RAIMUNDO realizou três consultas no SISP em nome de Marcos Paulo Gonçalves, à 0 hora, 8 minutos e 27 segundos; à 0 hora, 15 minutos e 4 segundos e à 0 hora, 16 minutos e 36 segundos a fim de cientificar Andrei da existência, ou não, de mandado em desfavor de Marcos e de qualquer reflexo das investigações que estavam em curso.

Igualmente, no dia 1º de dezembro de 2016, o agente delitual efetuou duas consultas no SISP do nome de Andrei Miraldo Ferreira, valendo-se dos usuários no sistema de seus colegas de guarnição Raryton Andrade Pereira e Raul Adalberto Fraga Júnior.

Ainda como consectário das investigações contra a organização criminosa, no dia 9 de março de 2017, Policiais Civis estiveram no condomínio São José, situado na rua João Batista Derner nº 120, bairro Kobrasol, na cidade de São José/SC, a fim de verificar se Andrei Miraldo Ferreira e Danilo de Souza residiam no apartamento 801 da edificação.

Em seguida, Andrei, que não estava em casa no momento, foi alertado da presença dos Policiais Civis pelo porteiro Jorge Luis Waltrick da Silva, também acusado nos autos n. 0045138-53.2015.8.24.0023 de integrar a organização criminosa.

Frente a isso, Andrei conseguiu uma fotografia dos dois Policiais Civis por intermédio de Jorge e do sistema de vigilância do Condomínio e solicitou ao denunciado que os identificasse [p. 286].

Em atendimento à solicitação de Andrei, o denunciado efetuou consulta pelo SISP, no dia 11 de março de 2017, em nome de Andrei Miraldo Ferreira a fim de averiguar a existência de algum mandado de busca e apreensão e/ou de prisão em desfavor dele.

Além disso, no dia 22 de março de 2017, os Policiais Civis mencionados retornaram à residência de Andrei, o qual contatou Samuel Cerino Alves, avisando-o que ligaria para o denunciado para ele confirmar se, de fato, se tratavam de policiais.

Sob outro aspecto, consta que, no dia 28 de junho de 2017, por volta da 1 hora da madrugada, a residência do denunciado foi alvo de disparos de arma de fogo, tendo o agente delitual desconfiado que os disparos foram efetuados a mando de Douglas Cesário Albino, bem como que os demais integrantes da organização criminosa acreditavam que o denunciado havia os delatado.

Frente a isso, no dia 3 de agosto de 2017, o denunciado contatou, por meio de mensagem de SMS, Welma Xavier da Silva e ambos trataram sobre a organização criminosa, tendo o denunciado afirmado que Douglas teria o acusado de entregar a organização. Welma, por sua vez, afirmou que a prisão da organização criminosa se deu em virtude das interceptações telefônicas e que Douglas sabia disso, bem como sabia que não foi o denunciado o delator.

Já no dia 4 de agosto de 2017, o denunciado conversou novamente com Welma e reclamou que foi acusado de ter delatado a organização criminosa, ratificando que nunca entregou eles.

Salienta-se...

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