Acórdão Nº 0006959-94.2017.8.24.0018 do Segunda Câmara Criminal, 08-06-2021

Número do processo0006959-94.2017.8.24.0018
Data08 Junho 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0006959-94.2017.8.24.0018/SC

RELATORA: Desembargadora HILDEMAR MENEGUZZI DE CARVALHO

APELANTE: MARCO ANDRE MACHADO ALECIO ADVOGADO: Arthur Fernando Losekann (OAB SC019522) ADVOGADO: RODRIGO SANCHEZ RIOS (OAB PR019392) ADVOGADO: GUILHERME SIQUEIRA VIEIRA (OAB PR073938) ADVOGADO: VICTOR CEZAR RODRIGUES DA SILVA COSTA (OAB PR073963) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) INTERESSADO: SECRETARIA MUNICIPAL DE SAÚDE DO MUNICÍPIO DE CHAPECÓ (INTERESSADO) INTERESSADO: ASSOCIACAO HOSPITALAR LENOIR VARGAS FERREIRA (INTERESSADO) ADVOGADO: PEDRO LUIZ ZANDAVALLI WINCKLER JUNIOR ADVOGADO: ANTONIO ZANELLA NETO

RELATÓRIO

Denúncia (Evento 6 dos autos originários): o Ministério Público ofereceu denúncia em face de Marco André Machado Alecio, nos autos n. 0006959-94.2017.8.24.0018, dando-o como incurso nas sanções do artigo 121, § 3º e § 4º, c/c artigo 13, § 2º, letras 'a' e 'c' do Código Penal, em razão dos seguintes fatos:

No dia 03 de junho de 2.016, a jovem Kerolyin Gusberti, 19 anos na época, ingressou no Hospital Regional de Chapecó e, foi internada, para realizar um procedimento cirúrgico simples, conhecido como realinhamento do mecanismo exterior do joelho, que foi materializado pelo médico MARCO ANDRÉ MACHADO ALECIO, pois a paciente, tinha uma instabilidade patelar, com episódios de luxação.

De fato, a cirurgia foi efetivada e, a paciente, recebeu alta no dia seguinte mas, ainda no nosocômio, se queixava de fortes dores, no que o esculápio lhe informou que, 'isso era normal'.

Em casa, nos dias que seguiram à operação, Kerolyn, expressava muita dor na perna operada, o que motivou seu pai Dimorvan Gusberti, a procurar o médico MARCO ANDRÉ, para relatar-lhe as queixas referidas, mão não conseguiu contato com ele.

Decorridos 12 (doze) dias da operação, Kerolyn, foi até o hospital mencionado, para 'retirar os pontos' mas, as dores continuavam e, começaram a aparecer 'hematomas' no joelho operado e imediações.

Várias vezes, foram tentados contatos com o profissional mencionado, sem êxito, no que foram feitas fotografias do órgão cirurgiado e, por interposta pessoa, mostradas ao denunciado, que mandou dizer, que aquilo era normal, sem contudo, tratar a situação da paciente, com a diligência que a gravidade do caso exigia.

Seguiu-se então, verdadeira via crucis de Keryolyn, a qual, já quando eram passados 20 (vinte) dias da operação, começou a apresentar falta de ar e dores no peito.

Novamente, informado do quadro degenerativo da saúde da vítima, o acusado, omitiu-se em tomar qualquer providência, por mínima que fosse, até mesmo, um exame laboratorial.

No dia 29 de junho de 2.016, Kerolyn, desmaiou em casa, sendo levada ao hospital, onde veio a falecer, como demonstra o laudo cadavérico de fls. 12.

De acordo com o laudo pericial de fls. 25 e seguintes, elaborado pelo perito médico e legista patológico, Fabio Antonio Tironi, ao exame que realizou em fragmentos do rim, fígado, pulmão e coração da vítima, a provável causa mortis, decorreu de tromboembolismo pulmonar, que em literatura médica, é conhecido como obstrução (bloqueio) de uma ou mais artérias dos pulmões, ocasionada por massas sólidas de sangue, situadas nas veias profundas das pernas, coágulos que, quando se deslocam para os pulmões, ocasionam a embolia pulmonar.

O médico aqui acusado, como ortopedista, tinha e tem aptidão tanto prática quanto teórica para o exercício de sua atividade e, no mínimo, era de se esperar dele, atitude necessária, de acordo com o procedimento ditado pelas normas médicas, à luz da mediana cultura médica e tendo-se em vista as circunstâncias do caso concreto.

Todavia, pelas omissões relatadas, o denunciado, deu causa ao resultado noticiado, porque na sua condição de profissional habilitado, nem só devia como podia agir para evitar a morte prematura da vitima, mesmo porque, tinha por lei, a obrigação de cuidado em relação à ela e, com seu comportamento (pelos fatos anteriores), criou o risco de tal ocorrência.

O denunciado, diante da previsível hipótese do surgimento de um coágulo, na órgão operado da vítima, embora todas as narrativas que lhe foram feitas e os sintomas apresentados, se omitiu (porque nada fez), mostrando-se indiferente aos reclamos, atuando por absoluta negligência, como também indolência e, por seu desleixo, falta de zelo, menosprezo e até desdém, praticou um homicídio culposo, no exercício de seu mister habitual, com inobservância de regra técnica de sua profissão ou ofício.

Sentença (Evento 152 dos autos originários): A Juíza de Direito Tiane Lohn Mariot julgou parcialmente procedente a denúncia para condenar o acusado Marco André Machado Alecio, como incurso no art. 121, § 3º c/c art. 13, §2º, alíneas 'a' e 'c', ambos do Código Penal, ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 1 (um) ano de detenção, em regime inicial aberto, substituída por prestação de serviços à comunidade, a ser cumprida à razão de uma hora de tarefa por dia de condenação.

Recurso de apelação de Marco André Machado Alécio (Evento 11 do presente feito): a defesa sustentou, em síntese, a absolvição do apelante por entender que inexistiu a individualização de posição de garante e da possibilidade de agir do recorrente, frisando, ainda, a ausência de omissão imprópria penalmente relevante.

Gizou a impossibilidade de se imputar objetivamente o resultado a uma conduta do recorrente, sobretudo em razão da não configuração da teoria do incremento do risco. Alegou que o apelante não violou seu dever de cuidado, observando todas as regras técnicas de sua profissão, o que afasta a suposta negligência atribuída por ausência de provas.

Em caráter subsidiário, pugnou seja reconhecida a nulidade da sentença por ausência de fundamentação (com esteio no art. 564, inciso V, do Código de Processo Penal), especificamente quanto à inexistência de motivos que ensejaram a escolha da modalidade de pena alternativa a ser aplicada em caráter substitutivo à pena privativa de liberdade, determinando-se o retorno dos autos para que o juízo sentenciante complemente o édito condenatório nessa extensão.

Contrarrazões do Ministério Público (Evento 15 do presente feito): a acusação impugnou as razões recursais e postulou pelo parcial conhecimento do apelo, em sendo reconhecida a inovação recursal, e não provimento do recurso, com a consequente manutenção incólume da sentença condenatória.

Parecer da Procuradoria-Geral de Justiça (Evento 18 do presente feito): o Excelentíssimo Senhor Procurador de Justiça Dr. Gilberto Callado de Oliveira opinou pelo conhecimento e o desprovimento do recurso.

Este é o relatório.

Documento eletrônico assinado por HILDEMAR MENEGUZZI DE CARVALHO, Desembargadora Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 883510v6 e do código CRC a187e95b.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): HILDEMAR MENEGUZZI DE CARVALHOData e Hora: 9/6/2021, às 19:9:31





Apelação Criminal Nº 0006959-94.2017.8.24.0018/SC

RELATORA: Desembargadora HILDEMAR MENEGUZZI DE CARVALHO

APELANTE: MARCO ANDRE MACHADO ALECIO ADVOGADO: Arthur Fernando Losekann (OAB SC019522) ADVOGADO: RODRIGO SANCHEZ RIOS (OAB PR019392) ADVOGADO: GUILHERME SIQUEIRA VIEIRA (OAB PR073938) ADVOGADO: VICTOR CEZAR RODRIGUES DA SILVA COSTA (OAB PR073963) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) INTERESSADO: SECRETARIA MUNICIPAL DE SAÚDE DO MUNICÍPIO DE CHAPECÓ (INTERESSADO) INTERESSADO: ASSOCIACAO HOSPITALAR LENOIR VARGAS FERREIRA (INTERESSADO) ADVOGADO: PEDRO LUIZ ZANDAVALLI WINCKLER JUNIOR ADVOGADO: ANTONIO ZANELLA NETO

VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto por Marco André Machado Alécio contra a sentença que o condenou ao cumprimento da pena privativa de liberdade fixada em 1 (um) ano de detenção, em regime inicial aberto, substituída por prestação de serviços à comunidade, a ser cumprida à razão de uma hora de tarefa por dia de condenação, por reconhecer que praticou o crime descrito no artigo 121, § 3º c/c art. 13, §2º, alíneas 'a' e 'c', ambos do Código Penal.

1 - Do juízo de admissibilidade

O recurso preenche os requisitos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade, motivo pelo qual é conhecido.

2 - Do mérito

A defesa do Dr. Marco André pretende a absolvição do acusado por insuficiência probatória. Gizou a inexistência de dados concretos suficientes que justifiquem o juízo de convicção necessário para a condenação, notadamente porque entende que a prova nos autos não foi capaz de apontar a suposta negligência atribuída ao acusado.

Elencou, para tanto, uma série de argumentos como a inexistência de individualização de posição de garante e da possibilidade de agir do recorrente, a ausência de omissão imprópria penalmente relevante, a impossibilidade de se imputar objetivamente o resultado a uma conduta do recorrente, sobretudo em razão da não configuração da teoria do incremento do risco e, por fim, a ausência de violação do dever de cuidado do apelante, que observou todas as regras técnicas de sua profissão.

O pedido, adianta-se, merece provimento.

De início, é de se destacar que a morte repentina de uma jovem de 19 (dezenove) anos sensibiliza a todos, sobretudo quando a causa mortis até o momento não restou indubitavelmente esclarecida. Logo, é perfeitamente natural e compreensível que os pais e familiares dessa jovem busquem conforto em explicações para o ocorrido, de modo a se certificarem que essa fatalidade poderia ter sido evitada.

Também é comumente que os sobreviventes de uma tragédia de tal envergadura, procurem por um culpado ou, de alguma forma, sintam-se culpados. Todavia, é necessário ter consciência de que cada ser vivente é filho de um pai e de uma mãe e de muitos ancestrais. Em ambos os lados aconteceram muitas coisas que afetaram a vida dessa jovem, desde a...

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