Acórdão Nº 0007006-28.2018.8.24.0020 do Primeira Câmara Criminal, 18-02-2021

Número do processo0007006-28.2018.8.24.0020
Data18 Fevereiro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 0007006-28.2018.8.24.0020/SC



RELATORA: Desembargadora ANA LIA BARBOZA MOURA VIEIRA LISBOA CARNEIRO


APELANTE: PATRICIA JACINTHO MATIAS (ACUSADO) ADVOGADO: THIAGO BURLANI NEVES (DPE) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


RELATÓRIO


Na comarca de Criciúma, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia em face de Patrícia Jacintho Matias, pelo cometimento, em tese, do crime de Tráfico de Drogas (art. 33, caput, da Lei 11.343/06) em razão dos fatos assim narrados na peça acusatória (Evento 25 dos autos originários):
Consta dos autos que no dia 28 de julho de 2018, por volta das 18h, policiais militares, já cientes da possível ocorrência de narcotraficância na residência da denunciado Patrícia Jacintho Matias, situada na Avenida Centenário, n. 19, fundos da igreja, Bairro Cristo Redentor, nesta cidade, deslocaram-se até o referido endereço para averiguação.
Ao se aproximarem do local, os agentes públicos se depararam com uma situação de venda de entorpecente ocorrendo entre duas pessoas, em frente ao supracitado imóvel, ocasião em que visualizaram a denunciada Patricia Jacintho Matias trocar algo com um masculino não identificado, o qual veio a se evadir rapidamente quando avistou os milicianos.
Logo, os agentes públicos procederam a abordagem da denunciada, oportunidade que visualizaram no chão 3 invólucros de plástico azul contendo cocaína, os quais haviam sido "dispensados" por ela momentos antes e que trazia consigo para comercializar a terceiros. Em revista pessoal foi encontrado na posse de Patricia a quantia de R$ 20,00 proveniente do comércio ilegal praticado.
Ato contínuo, com o apoio da guarnição do cão de faro do K-9 da Polícia Militar, foi realizada varredura na residência da denunciada, sendo encontrado dentro do pátio, embaixo de uma pilha de tijolos, um pote de vidro acondicionando 51 porções de cocaína, com peso total aproximado de 23g (laudo de constatação provisória fl. 10), que Patricia guardava e mantinha em depósito para comercializar, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar (art. 2º da Lei n. 11.343/06).
Além disso, no interior da residência restou apreendido 1 balança de precisão e 1 aparelho celular marca Samsung, ambos utilizados no comércio ilícito perpetrado, bem como a quantia de R$ 400,00 proveniente do tráfico de entorpecentes [...].
Encerrada a instrução e apresentadas alegações finais, sobreveio a sentença com o seguinte dispositivo (Evento 264 dos autos originários):
Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a pretensão acusatória (Evento 25) para CONDENAR a ré PATRÍCIA JACINTHO MATIAS, por infração ao art. 33, caput da Lei n. 11.343/06, ao cumprimento de pena privativa de liberdade de 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão, no regime inicial semiaberto, bem como ao pagamento de 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos (28/07/2018), atualizado para a data do pagamento.
Inconformada com o decisum, Patrícia interpôs a presente apelação criminal. Nas suas razões recursais (Evento 279 dos autos originários), apresentadas pela Defensoria Pública, arguiu, em preliminar, o reconhecimento de nulidade das provas obtidas, sob o argumento de que foram colhidas em manifesta afronta ao disposto no art. 5º, inc. XI, da Constituição Federal (violação de domicílio).
No mérito, a defesa sustentou a absolvição, ao argumento de que "os autos não contemplam suficientes elementos a atestar, com a segurança necessária, que seja a Apelante uma narcotraficante, principalmente porque não restou demonstrado que a propriedade da droga encontrada fosse sua."
No que tange à dosimetria da pena, pleiteou o afastamento do aumento da pena-base aplicado a título de "natureza da droga", por entender que contrariou o texto expresso do artigo 42 da Lei 11.343/06.
Ainda na dosimetria, pugnou pelo reconhecimento do tráfico privilegiado, previsto no §4º do art. 33 da Lei de Drogas, com a conseguinte alteração do regime inicial de cumprimento de pena para o aberto e a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos.
Contrarrazões da acusação pela manutenção incólume da sentença recorrida (Evento 287 dos autos originários).
Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça a Excelentíssima Senhora Procuradora de Justiça Dra. Heloísa Crescenti Abdalla Freire, que se manifestou pelo conhecimento e desprovimento do apelo interposto (Evento 18 do presente feito).
Este é o relatório

Documento eletrônico assinado por ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIRO, Desembargadora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 612724v9 e do código CRC 04edaf7a.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIROData e Hora: 1/2/2021, às 15:38:21
















Apelação Criminal Nº 0007006-28.2018.8.24.0020/SC



RELATORA: Desembargadora ANA LIA BARBOZA MOURA VIEIRA LISBOA CARNEIRO


APELANTE: PATRICIA JACINTHO MATIAS (ACUSADO) ADVOGADO: THIAGO BURLANI NEVES (DPE) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


VOTO


Trata-se de recurso de apelação interposto por Patrícia Jacintho Matias em face da sentença proferida pelo juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Criciúma, que julgou procedente a pretensão deduzida na denúncia, a fim de condená-la ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, além do pagamento de 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa, cada qual fixado no valor unitário mínimo legal, por infração ao art. 33 caput, da Lei 11.343/06.
1. Do juízo de Admissibilidade
O recurso preenche os requisitos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade, motivo pelo qual é conhecido.
2. Da preliminar de nulidade processual
Pretende a defesa o reconhecimento da violação de domicílio e, por consequência, a nulidade das provas daí derivadas, sob o argumento de que a ação policial, que ingressou em residência sem autorização judicial, afrontou o disposto no art. 5º, X e XI, da Constituição da República.
O pedido, no entanto, não merece provimento.
De pronto, convém apontar que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do RE n. 603.616/RO, com repercussão geral reconhecida, assentou que "a entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade dos atos praticados" (Rel. Ministro Gilmar Mendes, DJe 8/10/2010).
Em resumo, a Corte Suprema delimitou a legitimidade de ingresso forçado em domicílio sem mandado judicial, seja durante o dia ou no período noturno, quando amparado por fundadas razões, devidamente justificadas pelas situações do caso concreto que apontem estar ocorrendo no interior da moradia situação de flagrante delito.
Por sua vez, a colenda Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça aperfeiçoou o entendimento supra e ao julgar o REsp n. 1.574.681/RJ (DJe 30/5/2017) concluiu que "para legitimar-se o ingresso em domicílio alheio, é necessário tenha a autoridade policial fundadas razões para acreditar, com lastro em circunstâncias objetivas, no atual ou iminente cometimento de crime no local onde a diligência vai ser cumprida [...]".
E foi isso o que ocorreu na hipótese tratada nos autos.
Consoante se depreende do caderno processual, no dia 28 de julho de 2018, por volta das 18h, uma guarnição da Polícia Militar, munida de prévias denúncias da prática do comércio espúrio perpetrado por Patrícia, realizou rondas no Bairro Cristo Redentor, mais especificamente na localidade chamada "Beco da 10" (famoso pelo narcotráfico), momento no qual avistou a acusada em uma possível situação de venda trocando algo com um masculino não identificado na frente de sua residência.
Ao notarem os policiais, o masculino fugiu da abordagem em direção ao matagal, enquanto a recorrente evadiu-se para dentro de sua residência. No acompanhamento, os agentes públicos encontraram no chão 3 invólucros de plástico azul contendo cocaína, os quais haviam sido dispensados por ela no momento da fuga. Além disso, em revista pessoal foi apreendido a quantia de R$20,00 (vinte reais) e no interior do imóvel uma balança de precisão, um aparelho celular da marca Samsung e o montante de R$400,00 (quatrocentos reais), todos utilizados e/ou provenientes do tráfico de entorpecentes.
Ato contínuo, com o auxílio do cão de faro do K-9 da Polícia Militar, foi realizada varredura na moradia da denunciada, sendo encontrado dentro do pátio, embaixo de uma pilha de tijolos, um pote de vidro acondicionando 51 porções de cocaína, com peso total aproximado de 23g (vinte e três gramas).
Ressalta-se que, dos firmes depoimentos prestados sob o crivo do contraditório de ambos os policiais que realizaram a apreensão (Evento 146 dos autos originários), é possível extrair que a acusada já era conhecido da guarnição por meio de outras situações e denúncias anônimas do comércio de drogas, narrando, inclusive, que as informações recebidas eram precisas, provenientes de diversos usuários que apontaram "uma mulher chamada Patrícia", moradora de um beco do bairro Cristo Redentor, como a vendedora dos entorpecentes.
Logo, o local de intensificado comércio espúrio onde ocorreu o delito, o fato da agente já ser conhecida no âmbito policial, o flagrante da atitude suspeita de venda com o masculino não identificado, a tentativa de fuga...

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