Acórdão nº 0007141-58.2018.8.14.0104 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 1ª Turma de Direito Penal, 19-12-2023

Data de Julgamento19 Dezembro 2023
Órgão1ª Turma de Direito Penal
Ano2023
Número do processo0007141-58.2018.8.14.0104
Classe processualAPELAÇÃO CRIMINAL
AssuntoRoubo Majorado

APELAÇÃO CRIMINAL (417) - 0007141-58.2018.8.14.0104

APELANTE: MIKAEL DE SOUZA VALENTE, WENDERSON DE CARVALHO VIANA

APELADO: JUSTIÇA PUBLICA

RELATOR(A): Desembargadora KÉDIMA LYRA

EMENTA

APELAÇÃO CRIMINAL. ROUBO MAJORADO PELO CONCURSO DE PESSOAS. DOSIMETRIA PENAL. CONDUTA SOCIAL NEGATIVADA MEDIANTE FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA EXCLUSIVAMENTE QUANTO A UM DOS RECORRENTES. AFASTAMENTO DA VETORIAL. REPRIMENDA REAJUSTADA. MANUTENÇÃO DOS DEMAIS TERMOS DO CÁLCULO DOSIMÉTRICO.

1. Na linha da jurisprudência placitada no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, “a conduta social e a personalidade do agente não se confundem com os antecedentes criminais, porquanto gozam de contornos próprios - referem-se ao modo de ser e agir do autor do delito -, os quais não podem ser deduzidos, de forma automática, da folha de antecedentes criminais do réu” (EAREsp n. 1.311.636/MS, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Terceira Seção, julgado em 10/4/2019, DJe de 26/4/2019).

2. In casu, a valoração negativa da conduta social relativamente ao apelante Wenderson de Carvalho Viana, porquanto amparada no extenso histórico criminal do acusado, contrariou a diretriz jurisprudencial advinda do c. STJ, a ensejar o provimento do apelo para afastar a negativação da vetorial em referência e fixar a pena-base no mínimo legal de 4 (quatro) anos de reclusão, ficando definitivamente estabelecida, após o percurso trifásico do cálculo dosimétrico, em 6 (seis) anos, 2 (dois) meses, e 20 (vinte) dias de pena reclusiva, a ser cumprida em regime inicial semiaberto, além de 160 dias-multa, correspondente a um trigésimo do salário mínimo vigente ao tempo do fato, em observância aos artigos 49 e 60 do Código Penal, mantidos os demais termos da condenação.

3. Nada obstante, não há margem para alterar a pena imposta ao apelante Mikael de Souza Valente, pois chegou a ter sua prisão em flagrante decretada por ocasião da audiência de instrução e julgamento por fazer gesto de ameaça para as vítimas, sendo certo que a conduta de coagir vítimas durante o processo permite ao magistrado aferir a periculosidade do agente, sendo possível pela discricionariedade do julgador a exasperação da pena-base nos termos como foi fixada, máxime considerando que o STJ firmou entendimento que o cometimento de novo crime no curso processual permite a valoração negativa do vetor “conduta social” (AgRg no AREsp n. 190.188/AC, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe de 14/9/2018), hipótese retratada nos autos.

4. Ademais, consoante verbete sumular nº 23 do TJPA, “a aplicação dos vetores do art. 59 do CPB obedece a critérios quantitativos e qualitativos, de modo que, existindo a aferição negativa de qualquer deles, fundamenta-se a elevação da pena base acima do mínimo legal”, de modo que não há que se falar em provimento do apelo sob tal prisma.

APLICAÇÃO DA ATENUANTE DA COCULPABILIDADE. AUSÊNCIA DE AMPARO LEGAL. DESCABIMENTO.

5. A aplicação da atenuante genérica prevista no art. 66 do CP com fundamento na Teoria da Coculpabilidade do Estado, além de não encontrar amparo legal no Código Penal Brasileiro, enseja uma espécie de justificativa ou amparo ao cometimento de crime. Precedente do STJ.

6. Além disso, não consta nos autos qualquer comprovação de eventual omissão estatal relevante e de que ao apelante foram negadas necessidades básicas pelo Estado ou mesmo de que foi marginalizado pela sociedade.

RECONHECIMENTO DA PARTICIPAÇÃO DE MENOR IMPORTÂNCIA. INVIABILIDADE. DEMONSTRAÇÃO DA PARTICIPAÇÃO EFETIVA DO RÉU NA EMPREITADA CRIMINOSA.

7. Tendo restado demonstrado de forma nítida a participação efetiva do réu na empreitada criminosa, com unidade de desígnios e divisão de tarefas, mostra-se impertinente a aplicação da causa de diminuição prevista no art. 29, §1º, do CP.

RECURSOS CONHECIDOS E DESPROVIDO EM RELAÇÃO AO APELANTE MIKAEL DE SOUZA VALENTE E PARCIALMENTE PROVIDO EM RELAÇÃO AO APELANTE WENDERSON DE CARVALHO VIANA.

ACÓRDÃO


Vistos e relatados estes autos, acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores integrantes da PRIMEIRA TURMA DE DIREITO PENAL do Tribunal de Justiça do Estado, em sessão plenária realizada em 19 de dezembro de 2023, por unanimidade de votos, em CONHECER dos recursos para NEGAR PROVIMENTO ao apelo interposto por MIKAEL DE SOUZA VALENTE e DAR PARCIAL PROVIMENTO à apelação interposta por WENDERSON DE CARVALHO VIANA, nos termos do voto da Desembargadora Relatora.

Belém (PA), 19 de dezembro de 2023.

Desembargadora KÉDIMA LYRA

Relatora

RELATÓRIO

A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA KÉDIMA LYRA (RELATORA):

Trata-se de recursos de APELAÇÃO CRIMINAL interpostos em favor de WENDERSON DE CARVALHO VIANA e MIKAEL DE SOUZA VALENTE, objetivando reformar a sentença proferida pelo Juízo da Comarca de Breu Branco/PA, que condenou os réus pela prática do crime de roubo majorado tipificado no art. 157, §2º, inciso II, do CP, nos moldes a seguir: a) Wenderson de Carvalho Viana: pena de 06 (seis) anos e 08 (oito) meses de reclusão, a ser cumprida inicialmente em regime semiaberto, e 170 (cento e setenta) dias-multa; e b) Mikael de Souza Valente: pena de 06 (seis) anos de reclusão, a ser cumprida inicialmente em regime semiaberto, e 150 (cento e cinquenta) dias-multa.

Em razões recursais, MIKAEL DE SOUSA VALENTE alega violação ao princípio da presunção de inocência, da proporcionalidade e do devido processo legal, considerando a ausência de fundamentação para exasperação da pena-base acima do mínimo legal, ressaltando que os elementos probatórios não evidenciam qualquer aspecto negativo da conduta social do réu, pleiteando o recálculo da pena para o mínimo de 04 (quatro) anos ou, alternativamente, a redução para patamar inferior ao aplicado. Aduz, ainda, a necessidade de reconhecer a participação de menor importância na ação delituosa, aplicando-se na terceira fase da dosimetria penal, a redução prevista no art. 29, §1º, do CP, em seu patamar máximo, qual seja, de 1/3 (um terço) (ID 4714342, p. 1-7).

Por sua vez, WENDERSON DE CARVALHO VIANA, sustenta a aplicação da pena-base no mínimo legal em razão da fundamentação inidônea empregada para exasperação da basilar, pugnando, ainda, pela aplicação da coculpabilidade como circunstância atenuante genérica na segunda fase da dosimetria da pena, nos termos do art. 66 do CP. (ID 4714342, p. 12-20)

Em contrarrazões, o Ministério Público de primeiro grau refutou as teses defensivas, manifestando-se pelo conhecimento e desprovimento dos recursos (ID 4714343, p. 7-20).

Nesta Superior Instância, a d. Procuradoria de Justiça ofertou parecer pelo conhecimento dos recursos e, no mérito, pelo parcial provimento apenas do apelo interposto por Wenderson de Carvalho Viana, mantendo a sentença recorrida nos seus demais termos (ID 4714344, p. 10-17).

É o relatório.

VOTO

Em juízo de admissibilidade, verifico a presença dos pressupostos recursais objetivos e subjetivos, de modo que CONHEÇO das apelações e diante da inexistência de teses preliminares, passo ao exame do meritum causae, correspondente, na espécie, à reforma da sentença proferida pelo juízo monocrático que condenou os apelantes pela prática do crime de roubo majorado pelo concurso de pessoas previsto no art. 157, §2º, inciso II, do CP.

Na espécie, as razões recursais visam a modificação da sentença penal condenatória, postulando, em síntese: a) a reforma na dosimetria penal para ambos os réus, pugnando pela aplicação da pena-base no mínimo legal, em razão da fundamentação inidônea empregada na negativação de circunstâncias judiciais; b) a aplicação da atenuante da coculpabilidade para o réu Wenderson, nos termos do que dispõe o art. 66 do CP; c) o reconhecimento da participação de menor importância para o réu Mikael, conforme previsto no art. 29, §1º, do CP.

Oportuno ressair que ambos os recursos trazem como matéria recursal a dosimetria da pena, de modo que a análise dos apelos será conjunta, consoante disposto a seguir.

I. DA REFORMA NA DOSIMETRIA DA PENA-BASE PARA AMBOS OS RÉUS.

Conforme se depreende das razões recursais, os apelantes pugnam pela reformulação da dosimetria da pena-base, alegando ausência de fundamentação para a aplicação da reprimenda acima do mínimo legal.

In casu, verifica-se que o Juízo de 1º grau, ao fixar a basilar, valorou negativamente apenas o vetor da conduta social, tanto em relação ao réu Wenderson de Carvalho Viana, quanto em relação ao réu Mikael de Sousa Valente.

Nesse particular, quanto ao argumento de desproporcionalidade na exasperação dada à basilar, destaco que “inexiste um critério legal para a exasperação da pena-base. Assim, o Magistrado, diante de sua discricionariedade vinculada aprecia as circunstâncias judiciais e incrementa a pena-base com indicação de elementos concretos, não inerentes ao tipo penal”, sendo certo que “não há um critério matemático para a escolha das frações de aumento em função da negativação dos vetores contidos no art. 59 do Código Penal, sendo garantida a discricionariedade do julgador para a fixação da pena-base, dentro do seu livre convencimento motivado e de acordo com as peculiaridades do caso concreto” (STJ, AgRg no AREsp 1840942/TO, relator Ministro Sebastião Reis Junior, Sexta Turma, DJe: 22/09/2022).

Imperioso ressaltar, além disso, que o art. 59 do CP não estabeleceu pesos absolutos a cada uma das circunstâncias judiciais de modo a ensejar uma operação aritmética dentro das penas máximas e mínimas cominadas ao delito. Nesse espeque, “não há impedimento a que o magistrado fixe a pena-base no máximo legal, ainda que tenha valorado tão somente uma circunstância judicial” (STJ, AgRg no REsp 1947208/TO, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, DJe: 08/10/2021).

Erigidas tais premissas, ressaio que a valoração negativa da conduta social relativamente ao apelante Wenderson de Carvalho Viana, porquanto amparada “no extenso histórico criminal do...

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