Acórdão Nº 0007995-59.2017.8.24.0023 do Quarta Câmara Criminal, 19-08-2021

Número do processo0007995-59.2017.8.24.0023
Data19 Agosto 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0007995-59.2017.8.24.0023/SC

RELATOR: Desembargador SIDNEY ELOY DALABRIDA

APELANTE: JEFFERSON MORAIS BORGES (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Na comarca da Capital, o órgão do Ministério Público ofereceu denúncia em face de Jefferson Morais Borges, imputando-lhe a prática do delito capitulado no art. 180, caput, do Código Penal, pois, segundo consta na inicial:

Em 07 de outubro de 2016, à tarde, o acusado Jefferson Morais Borges conduzia uma bicicleta Monark, de cor vermelha, por via pública (av. Coronel Pedro Demoro, bairro Estreito - fl. 6), ciente de que a mesma era produto de crime (furto, em 05/10/16 - fl. 5 e 13). Fato ocorrido em Florianópolis.

Nesta ocasião, o proprietário da bicicleta indagou e Jefferson respondeu que a bicicleta havia sido 'roubada' (Evento 16, PET47, autos originários).

Finalizada a instrução, a Magistrada a quo julgou procedente o pedido formulado na denúncia, para condenar o réu ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, além do pagamento de 10 (dez) dias-multa, fixados no mínimo legal, pela prática do crime previsto no art. 180, caput, do Código Penal (Evento 104, SENT141, autos originários).

Inconformado com a prestação jurisdicional, o réu interpôs apelação criminal, mediante a qual postulou a absolvição, sustentando a atipicidade da conduta, diante da aplicação do princípio da insignificância à hipótese, porquanto não realizada avaliação do objeto e, ainda, em razão de ter sido restituído à vítima. Alegou, ademais, ausência de comprovação acerca do elemento subjetivo do crime de receptação dolosa, haja vista não haver provas de que conhecia a origem ilícita do bem. Por fim, requereu o abrandamento do regime prisional, pois "o condenado reincidente não pode ter essa condição como único fundamento a ensejar a imposição de regime inicial mais grave do que aquele recomendado pela pena fixada" (Evento 111, APELAÇÃO1, autos originários).

Apresentadas as contrarrazões (Evento 129, PROMOÇÃO1, autos originários), a douta Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio da Exma. Dra. Kátia Helena Scheidt Dal Pizzol, manifestou-se pelo conhecimento e não provimento do reclamo (Evento 10, PROMOÇÃO1).

Documento eletrônico assinado por SIDNEY ELOY DALABRIDA, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 1246917v5 e do código CRC e8a0d45c.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): SIDNEY ELOY DALABRIDAData e Hora: 30/7/2021, às 17:50:34





Apelação Criminal Nº 0007995-59.2017.8.24.0023/SC

RELATOR: Desembargador SIDNEY ELOY DALABRIDA

APELANTE: JEFFERSON MORAIS BORGES (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

VOTO

Presentes os requisitos legais de admissibilidade, conhece-se do recurso.

1 A defesa pretende a absolvição do apelante pela atipicidade material da conduta, com a incidência do princípio da insignificância. Para tanto, alega que o objeto receptado, além de não avaliado, foi restituído à vítima.

A tese não merece respaldo.

Pelo que se infere dos autos, em 7 de outubro de 2016, no período vespertino, o apelante conduzia uma bicicleta Monark, vermelha, cuja origem sabia ser ilícita, uma vez que, indagado pelo proprietário da bicicleta, Fabiano, respondeu que a bicicleta havia sido "roubada".

Isso posto, sabe-se que o princípio da insignificância se insere no rol dos mecanismos que a moderna dogmática jurídico-penal elaborou para tornar efetiva a tarefa político-criminal de descriminalização, sem que se abandone a segurança jurídica do sistema. Como decorrência dos postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima no direito penal, atua "como instrumento de interpretação restritiva do tipo penal, com o significado sistemático e político-criminal de expressão da regra constitucional do 'nullum crimen sine lege', que nada mais faz do que revelar a natureza subsidiária e fragmentária do direito penal" (MAÑAS, Carlos Vico. O princípio da insignificância como excludente da tipicidade no direito penal. São Paulo: Saraiva, 1994. p. 56).

Funda-se, portanto, na concepção material do tipo penal, por meio da qual a tipicidade não se esgota no juízo lógico-formal de subsunção do fato à norma. Exige que a conduta nela enquadrável revele-se, ainda, ofensiva para o bem jurídico protegido pela lei penal, sem o que a intervenção criminal não se justifica.

Tendo por consequência a exclusão da tipicidade material, no âmbito do Pretório Excelso, alguns parâmetros foram estabelecidos para a sua aplicação, a saber: a) mínima ofensividade da conduta do agente, b) ausência de periculosidade social da ação, c) reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento; d) inexpressividade da lesão jurídica provocada.

Apontada como um marco da jurisprudência, a decisão do Supremo Tribunal Federal no Habeas Corpus n. 84.412, julgado em 19/10/2004, da relatoria do Ministro Celso de Mello, expressa bem essa posição. Veja-se:

PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA - IDENTIFICAÇÃO DOS VETORES CUJA PRESENÇA LEGITIMA O RECONHECIMENTO DESSE POSTULADO DE POLÍTICA CRIMINAL - CONSEQUENTE DESCARACTERIZAÇÃO DA TIPICIDADE PENAL EM SEU ASPECTO MATERIAL - DELITO DE FURTO - CONDENAÇÃO IMPOSTA A JOVEM DESEMPREGADO, COM APENAS 19 ANOS DE IDADE - 'RES FURTIVA' NO VALOR DE R$ 25,00 (EQUIVALENTE A 9,61% DO SALÁRIO MÍNIMO ATUALMENTE EM VIGOR) - DOUTRINA - CONSIDERAÇÕES EM TORNO DA JURISPRUDÊNCIA DO STF - PEDIDO DEFERIDO. O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA QUALIFICA-SE COMO FATOR DE DESCARACTERIZAÇÃO MATERIAL DA TIPICIDADE PENAL. - O princípio da insignificância - que deve ser analisado em conexão com os postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima do Estado em matéria penal - tem o sentido de excluir ou de afastar a própria tipicidade penal, examinada na perspectiva de seu caráter material. Doutrina. Tal postulado - que considera necessária, na aferição do relevo material da tipicidade penal, a presença de certos vetores, tais como (a) a mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma periculosidade social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada - apoiou-se, em seu processo de formulação teórica, no reconhecimento de que o caráter subsidiário do sistema penal reclama e impõe em função dos próprios objetivos por ele visados, a intervenção mínima do Poder Público. O POSTULADO DA INSIGNIFICÂNCIA E A FUNÇÃO DO DIREITO PENAL: 'DE MINIMIS, NON CURAT PRAETOR'. - O sistema jurídico há de considerar a relevantíssima circunstância de que a privação da liberdade e a restrição de direitos do indivíduo somente se justificam quando estritamente necessárias à própria proteção das pessoas, da sociedade...

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