Acórdão nº 0008100-78.2013.8.11.0042 Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, Segunda Câmara Criminal, 05-06-2023

Data de Julgamento05 Junho 2023
Case OutcomeNão-Provimento
Classe processualCriminal - RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Número do processo0008100-78.2013.8.11.0042
AssuntoCrime Tentado

ESTADO DE MATO GROSSO

PODER JUDICIÁRIO

SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL


Número Único: 0008100-78.2013.8.11.0042
Classe: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO (426)
Assunto: [Homicídio Qualificado, Ameaça, Crime Tentado, Violência Doméstica Contra a Mulher, Contra a Mulher]
Relator: Des(a).
LUIZ FERREIRA DA SILVA


Turma Julgadora: [DES(A). LUIZ FERREIRA DA SILVA, DES(A). PEDRO SAKAMOTO, DES(A). RUI RAMOS RIBEIRO]

Parte(s):
[MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (RECORRIDO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (REPRESENTANTE), RODRIGO DIAS DA SILVA (RECORRENTE), DEFENSORIA PUBLICA DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 02.528.193/0001-83 (REPRESENTANTE), KEUNIA LEITE GONCALVES - CPF: 942.166.061-72 (VÍTIMA), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)]


A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a).
RUI RAMOS RIBEIRO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO.


E M E N T A

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO – TENTATIVA DE HOMICÍDIO QUALIFICADO PELO MOTIVO TORPE – PRONÚNCIA – IRRESIGNAÇÃO DEFENSIVA – 1. PLEITO VISANDO A DESPRONÚNCIA – ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE PROVA DA MATERIALIDADE DO RECORRENTE – INOCORRÊNCIA – TENTATIVA BRANCA – EXISTÊNCIA DO FATO DEMONSTRADA PELAS DECLARAÇÕES DA VÍTIMA E DA TESTEMUNHA OCULAR – PROVAS PRODUZIDAS SOB O CRIVO DO CONTRADITÓRIO – MERO JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE DA ACUSAÇÃO – APLICAÇÃO DO AFORISMO IN DUBIO PRO SOCIETATE – 2. ALMEJADA A DESCLASSIFICAÇÃO DO DELITO DOLOSO CONTRA A VIDA PARA O DE LESÃO CORPORAL – IMPOSSIBILIDADE – TESE DE AUSÊNCIA DE ANIMUS NECANDI QUE NÃO RESTOU COMPROVADA – APLICAÇÃO DO AFORISMO IN DUBIO PRO SOCIETATE – COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL DO TRIBUNAL DO JÚRI PARA A ANÁLISE DA MATÉRIA – 3. POSTULADO O AFASTAMENTO DA QUALIFICADORA – INVIABILIDADE – MERO JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE DA ACUSAÇÃO – INCIDÊNCIA DO AFORISMO IN DUBIO PRO SOCIETATE – COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI – PRESENÇA DE ELEMENTOS DE CONVICÇÃO QUE INDICAM A PERTINÊNCIA DA MOTIVAÇÃO TORPE – 4. DESPROVIMENTO DO RECURSO.

1. Deve ser mantida a pronúncia do recorrente, porquanto, na espécie, estão presentes os requisitos previstos no art. 413 do Código de Processo Penal, consubstanciados na comprovação da materialidade delitiva e em indícios de autoria, tendo em vista que, como se sabe, a sentença retrata mero juízo de admissibilidade da acusação. Em se tratando de tentativa branca de homicídio, em que não é possível a realização de perícia técnica, a prova testemunhal adquire especial relevância para a comprovação da materialidade delitiva. Dessa forma, eventuais dúvidas devem ser submetidas ao crivo do Conselho de Sentença, juízo natural da causa, a quem compete o julgamento dos crimes contra a vida em decorrência da previsão constitucional consagrada no art. 5º, XXXVIII, c, da Constituição Federal, em virtude do aforismo in dubio pro societate.

2. A desclassificação do crime de homicídio qualificado tentado, em sede de sentença de pronúncia, somente é autorizada quando emergirem, dos autos, elementos incontestáveis de que a conduta perpetrada pelo acusado não figura entre os crimes dolosos contra a vida, sendo certo que a ausência de comprovação, de forma segura e inconcussa, sobre a ausência de animus necandi na conduta em apuração impõe a manutenção do édito judicial que determinou a submissão do recorrente a julgamento perante o Tribunal do Júri, em virtude do aforismo in dubio pro societate.

3. A exclusão de qualificadoras do delito de homicídio somente é permitida quando forem manifestamente improcedentes; impondo-se ressaltar, outrossim, que a existência de um lastro mínimo de dúvida sobre a incidência das referidas causas modificadoras de pena, obriga sua apreciação pelo Conselho de Sentença, sob pena de se invadir a competência constitucional do Tribunal do Júri, prevista no art. 5º, XXXVIII, c e d, da Carta Política do Brasil.

4. Recurso desprovido.


R E L A T Ó R I O

EXMO. SR. DES. LUIZ FERREIRA DA SILVA:

Ilustres membros da Segunda Câmara Criminal:

Trata-se de recursos em sentido estrito interpostos por Rodrigo Dias da Silva contra a sentença prolatada pelo Juízo da 2ª Vara Especializada de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher da Comarca de Cuiabá/MT, nos autos da ação penal n. 0008100-78.2013.8.11.0042, pronunciando-o pela suposta prática do crime de tentativa de homicídio qualificado pelo motivo torpe (art. 121, § 2º, I, c/c art. 14, II, do Código Penal), perpetrado contra a vítima Keunia Leite Gonçalves, determinando a submissão do recorrente a julgamento pelo Conselho de Sentença daquela unidade judiciária.

Registre-se, por importante, que, anteriormente à prolação da sentença de pronúncia, a magistrada reconheceu a extinção da punibilidade do recorrente em relação aos crimes de ameaça e de violação de domicílio qualificado, em virtude da prescrição da pretensão punitiva; bem como determinou desmembramento da ação penal no que tange ao delito de lesão corporal no âmbito doméstico, ante a inexistência de conexão com o crime contra a vida apurado nestes autos.

O recorrente, nas razões recursais encontradiças no ID 151552248, postula a sua despronúncia, por ausência de comprovação da materialidade delitiva; e, subsidiariamente, a desclassificação do crime contra a vida imputado à sua pessoa para o delito de lesão corporal, em razão da ausência de animus necandi; como também o afastamento da qualificadora do motivo torpe, por ser manifestamente improcedente.

O recorrido, nas contrarrazões recursais exteriorizadas no ID 151552254, pugnou pelo desprovimento do vertente recurso.

Em juízo de retratação, visto no ID 151552250, o magistrado manteve a decisão objurgada por seus próprios fundamentos.

Nesta instancia revisora, a Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio do parecer que se encontra no ID 156763672, manifestou-se pelo desprovimento do presente recurso.

É o relatório.

V O T O R E L A T O R

A exordial acusatória, encontradiça no ID 151552228, p. 01-05, narra os fatos da seguinte forma:

[...] Depreende-se dos autos, que o denunciado e a vítima mantiveram uma união estável por aproximadamente seis meses e que há três meses a ofendida rompeu o relacionamento pelo fato de RODRIGO ser usuário de substâncias entorpecentes e por portar arma de fogo.

Entretanto, o denunciado não conseguia aceitar o rompimento afetivo, tentando diversas vezes reatar este laço.

FATO 01:

Consta do caderno informativo que no dia 27 de abril de 2013, por volta das 20h30min, na rua 11, quadra 17, nº 29, Jardim Vitória, nesta cidade e comarca, o denunciado RODRIGO DIAS DA SILVA (32 anos), violou a integridade física da vítima Keunia Leite Gonçalves (34 anos), causando-lhe lesões corporais, bem como a ameaçou, por meio de palavras, de causar-lhe mal grave e injusto.

Ressai dos autos que, no dia dos fatos, a vítima, ao adentrar na área de seu domicílio, foi surpreendida pelo denunciado, tendo sua integridade física violada, ao ser atingida por um golpe de objeto contundente (capacete) em sua face, derrubando a ofendida no chão.

Em seguida, o denunciado ameaçou dizendo “isto é apenas um aviso”, momento em que o filho da vítima (13 anos) viu RODRIGO e começou a gritar, nesta oportunidade o denunciado subiu na moto e ameaçou novamente sacando uma arma de fogo e bradou: “(...) QUE NÃO ADIANTA NADA QUE DA PRÓXIMA VEZ EU VOU TE MATAR E QUE SOU RÉU PRIMÁRIO E JÁ ME INFORMEI QUE FICO SOMENTE TRÊS MESES PRESO (...)” (sic) (nosso grifo) (fl. 06).

Tais fatos geraram grande temor à vítima, que em razão disso acionou a Polícia Militar, a qual juntamente com a ofendida se dirigiram para a residência do denunciado, entretanto não o localizaram.

Ato contínuo, Keunia recebeu uma ligação de RODRIGO, que a recebeu no modo viva voz de seu aparelho telefônico móvel, oportunidade em que os policiais constataram mais uma ameaça de morte por parte do denunciado em face da vítima.

FATO 02:

Infere-se do caderno informativo que no dia 29 de abril de 2013, por volta das 19h00min, na rua 11, quadra 17, nº 29, Jardim Vitória, nesta cidade e comarca, o denunciado RODRIGO DIAS DA SILVA (32 anos), tentou ceifar a vida da vítima Keunia Leite Gonçalves (34 anos), apenas não realizando o seu intento homicida por circunstâncias alheias à sua vontade. Não bastasse, através de outra conduta, o denunciado adentrou a residência da vítima contra a sua vontade, durante o período noturno.

Conforme apurado, o denunciado não conseguia aceitar o rompimento afetivo, manifestando ciúmes e sentimento de posse doentia com relação a vítima.

Ressaltam-se dos autos, que no dia dos fatos, o denunciado retornou à residência da vítima e, ao adentrar contra a vontade da ofendida, surpreendeu a ofendida, agarrando-a pelo braço com força suficiente para causar inchaço e deslocamento de seu ombro.

Em seguida, apoderando-se de um objeto cortante (facão) o denunciado tentou ceifar a vida da vítima, enquanto bradava: “(...) EU NÃO FALEI QUE IRIA TE MATAR? (...)” (sic) (nosso grifo) (fl. 06-verso).

Entretanto, não obteve êxito em seu intento por circunstância alheia à sua vontade, uma vez que o genro de Keunia, o senhor Sérgio Sidney, surpreendeu RODRIGO, segurando-o pelas costas.

Neste momento, os transeuntes mais próximos, ao ouvirem os gritos de socorro da vítima, prestaram imediato auxílio. Ocasião em que, com sucesso, retiraram a arma branca (facão) em posso do denunciado, como consequência causando-lhe lesões corporais aparentes, conseguindo deter o indiciado até a chegada da Polícia Militar.

Importa consignar que o móvel para a ação do denunciado fora, exclusivamente, o fato de não aceitar o rompimento da relação e, de consequência, dispor de sentimento...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT