Acórdão Nº 0008624-17.2019.8.24.0038 do Quinta Câmara Criminal, 09-12-2021

Número do processo0008624-17.2019.8.24.0038
Data09 Dezembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0008624-17.2019.8.24.0038/SC

RELATOR: Desembargador ANTÔNIO ZOLDAN DA VEIGA

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) APELANTE: BRUNO BORGES (ACUSADO) APELANTE: MAYARA MAGALI MARTINS (ACUSADO) APELANTE: LUCAS FERNANDO KROBBEL (ACUSADO) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

O Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia em desfavor de Bruno Borges, Lucas Fernando Krobbel e Mayara Magali Martins, imputando-lhes a prática dos crimes tipificados nas sanções do art. 121, § 2º, I, III e IV, e art. 211, ambos do Código Penal, e art. 2º, caput, da Lei n. 12.850/13, conforme os seguintes fatos narrados na inicial acusatória (doc. 374 da ação penal):

FATO N. 01 - ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA

Os denunciados BRUNO BORGES, LUCAS FERNANDO KROBBEL e MAYARA MAGALI MARTINS integram pessoalmente, de modo estável e permanente, a organização criminosa denominada Primeiro Grupo Catarinense - PGC.

Os acusados, durante o ano de 2017, nesta Comarca de Joinville/SC, estavam associados à citada organização criminosa com o fim específico de praticar infrações penais graves, tais como homicídios, tráfico de drogas, crimes patrimoniais e outros.

Conforme se observa de Relatório de Análise de Extração de Dados do aparelho celular da denunciada Mayara Magali Martins, Laudo Pericial n. 9108.17.02174 (págs. 85/114), onde resta evidente a relação de Mayara com a facção PGC, por meio de diálogos sobre comercialização de drogas, fotografias com armas, drogas, etc.

Referida organização criminosa é composta por centenas de integrantes, está estruturalmente ordenada - possui estatuto, regras e obrigações bem delimitadas, além de penalidades próprias - e é caracterizada pela divisão de tarefas hierarquicamente definidas, tudo objetivando garantir o sucesso na prática de delitos, a manutenção e o fortalecimento da entidade, bem como o ataque ao sistema de segurança pública estatal.

Os integrantes da organização criminosa PGC praticam a traficância de drogas. Sói dos autos que a vítima era usuária de substâncias entorpecentes e estava com dívidas decorrente do uso de drogas em relação a traficantes da região onde residia.

Nesse contexto, agindo de acordo com os preceitos da organização criminosa que integram, os denunciados em comunhão de esforços e vontades receberam a missão de matar a vítima Brendo da Silva.

FATO N. 02 - HOMICÍDIO QUALIFICADO

No dia 09 de junho de 2017, na Rua Izolina Paz Ribeiro, s/n, Bairro Paranaguamirim, Joinville/SC, os denunciados BRUNO BORGES, LUCAS FERNANDO KROBBEL e MAYARA MAGALI MARTINS, em comunhão de esforços e unidade de desígnios, com animus necandi, buscaram a vítima em um veículo Ford Fusion, cor branca, e utilizando-se de armas brancas (faca, facão, dentre outros objetos perfuro-cortantes) mataram a vítima Brendo da Silva, efetuando diversos golpes por todo o corpo e ocasionando as lesões descritas no Laudo Pericial de Exame Cadavérico n. 9406.2017.3989 (págs. 66/68).

O delito foi cometido mediante recurso que dificultou a defesa da vítima, tendo em vista que os denunciados surpreenderam Brendo, que transitava em via pública, e o colocaram dentro do veículo Ford Fusion, posteriormente o levando até o local onde o homicídio foi praticado.

A motivação do crime foi torpe, qual seja, em razão de dívida de drogas da vítima para com a facção PGC, organização criminosa a qual os denunciados integram.

O crime foi praticado com emprego de tortura, tendo em vista que a vítima teve seus pés atados e recebeu diversos golpes de arma branca na região abdominal, enquanto os denunciados a filmavam.

FATO N. 03 - DESTRUIÇÃO E OCULTAÇÃO DE CADÁVER

Após a prática do homicídio acima descrito, os denunciados decidiram destruir parcialmente e ocultar o cadáver da vítima Brendo da Silva. Para tanto, transportaram o corpo até a Rua Izolina Paz Ribeiro, local de difícil encontro por se tratar de local ermo e região de mata.

No local, destruíram parcialmente o corpo do ofendido, decapitandoo com o uso de um facão, e realizando um tentativa de desmembramento, constatada através do Laudo Pericial de Exame Cadavérico (págs. 66/68), onde é possível observar uma lesão presente no joelho esquerdo e uma fratura no antebraço direito da vítima. Posteriormente os denunciados ocultaram o corpo da vítima em uma cova.

Recebida a denúncia (doc. 380 da ação penal) e citados pessoalmente (docs. 398, 400 e 402 da ação penal), os acusados apresentaram resposta à acusação (docs. 433, 435 e 456 da ação penal).

Na decisão do doc. 466 da ação penal, em razão da litispendência, foi julgado "extinto o processo no que tange ao crime previsto no art. 2.º, caput, da Lei n.º 12.850/13, em relação aos acusados MAYARA MAGALI MARTINS e LUCAS FERNANDO KROBBEL, sem resolução do mérito (CPC, art. 485, V)".

Processado o feito, sobreveio decisão que admitiu a acusação e pronunciou "os acusados Mayara Magali Martins e Lucas Fernando Krobbel para julgamento pelo Tribunal do Júri, por infração ao art. 121, § 2.º, I, III e IV, c/c art. 29, caput, e ao art. 211 do Código Penal, e o acusado Bruno Borges por infração ao art. 121, § 2.º, I, III e IV, c/c art. 29, caput, e ao art. 211 do Código Penal e ao art. 2º, caput, da Lei n. 12.850/2013" (doc. 556 da ação penal).

Submetidos a julgamento, o Tribunal do Júri julgou procedente a denúncia, para o fim de condenar: a) o acusado Bruno "ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 22 (vinte dois) anos e 02 (dois) meses de reclusão, no regime fechado, mais 22 (vinte dois) dias-multa", em razão da prática dos crimes tipificados no art. 121, § 2º, I, III e IV, e art. 211, ambos do Código Penal, e art. 2º, caput, da Lei n. 12.850/13; b) os réus Lucas e Mayara, respectivamente, "ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 19 (dezenove) anos e 02 (dois) meses de reclusão, no regime fechado, mais 12 dias-multa" e "ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 23 (vinte três) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 12 (doze) dias-multa", em virtude da perpetração dos delitos capitulados no art. 121, § 2º, I, III e IV, e art. 211, ambos do Código Penal (doc. 841 da ação penal).

Irresignados com a prestação jurisdicional, os acusados e o Ministério Público interpuseram recursos de apelação (docs. 839-840 e 842-843 da ação penal).

Em suas razões (doc. 852 da ação penal), com fulcro no art. 593, III, "c", do Código de Processo Penal, que se limitam à primeira fase dosimétrica do crime de homicídio, o órgão ministerial requereu a readequação das penas-bases.

Alegou que as circunstâncias judiciais da conduta social e da personalidade devem ser julgadas desfavoráveis aos réus, uma vez que o Juiz Presidente "deixou de considerar que os autores do bárbaro crime além de integrar facção criminosa armada, conforme nitidamente demonstrado nas conversas de whatsapp, exerciam posição de elevada hierarquia na facção, inclusive determinando a prática de vários outros crimes".

De igual modo, sustentou que o vetor das circunstâncias do crime deve ser negativado, porquanto "não se pode deixar de sopesar que os apelados realizaram a execução da vítima, de forma impiedosa e covarde, o que revela sua frieza e acentuado desapreço pela integridade física alheia, de forma que suas condutas extrapolam a normalidade do tipo penal. Ademais, conforme extraído dos depoimentos judiciais, depois de autorizada a execução pela facção PGC, a vítima foi levada a uma emboscada, ocasião em que foi chamada à casa de outro traficante e então atacada pelos réus e demais agentes não identificados. Com efeito, os registros da execução da vítima demonstram os autores torturando a vítima à seu bel prazer, afligindo-lhe dor e sofrimento intenso, vindo a executá-la com requintes de crueldade, como se fossem protagonistas de um 'espetáculo' buscando satisfazer os anseios do 'público', com seu gran finale decepando a cabeça da vítima e a exibindo como se fosse um troféu, tudo sobre o manto permissivo da facção criminosa. Além disso, trataram divulgar, por meio das redes sociais, toda a selvageria empregada na execução da vítima, tanto o é que até mesmo o irmão menor da esposa da vítima, de apenas 12 anos, visualizou as cenas de tortura e o posterior esquartejamento, com os autores comemorando o feito".

Por derradeiro, declarou que as consequências do delito são desfavoráveis, haja vista que "não bastasse a dor de contemplar os últimos momentos agonizantes de seu filho em vida, sendo torturado e esquartejado, tudo registrado e amplamente divulgado, Marcos Antônio Coelho da Silva, genitor da vítima, ficou dias à procura do corpo dele. Em juízo, revelou Marcos que, dias depois dos fatos, foi até um traficante da região do Comasa, pedindo para devolverem o corpo de seu filho e o traficante disse que os réus não iriam lhe entregar o cadáver. Também não pode ser ignorado, que o pai da vítima relatou que a brutalidade da execução do seu filho e a busca por semanas do cadáver abalaram profundamente a família, obrigando-o a tomar medicação controlada continuamente".

O acusado Bruno, em suas razões (doc. 4), com fundamento no art. 593, III, "d", do Código de Processo Penal, pleiteou a anulação da decisão proferida pelo Conselho de Sentença, porquanto manifestamente contrária à prova dos autos, postulando para que seja submetido a novo julgamento, uma vez que não praticou os crimes imputados, tanto que Lucas assumiu a perpetração do homicídio, aduzindo, ainda, que sequer conhecia os demais réus, sendo que "somente estudou com Brendo e teve algumas desavenças inerentes ao convívio social entre adolescentes, nada além disso", estando a decisão dos jurados, portanto, baseada em meras suspeitas.

Ademais, especificamente no que se refere ao delito conexo de organização criminosa, argumentou que "sequer teve 1 única prova produzida, pois ressalta-se que a idade do Apelante à época dos fatos era 18 anos, logo, praticamente impossível um juízo de que o Apelante fosse faccionado e agisse sob ordens de facção", pelo contrário, "A única prova...

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