Acórdão Nº 0008849-91.2019.8.24.0020 do Quinta Câmara Criminal, 05-03-2020

Número do processo0008849-91.2019.8.24.0020
Data05 Março 2020
Tribunal de OrigemCriciúma
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Tipo de documentoAcórdão


Agravo de Execução Penal n. 0008849-91.2019.8.24.0020, de Criciúma

Relatora: Desembargadora Cinthia Beatriz da S. Bittencourt Schaefer

AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL. INSURGÊNCIA DA DEFESA CONTRA DECISÃO QUE INDEFERIU PEDIDO DE VISITA DA SUPOSTA COMPANHEIRA. UNIÃO ESTÁVEL DESDE OUTUBRO DE 2019 DECLARADA EM ESCRITURA PÚBLICA. TODAVIA, CIRCUNSTÂNCIAS FÁTICAS QUE DENOTAM FORTES DÚVIDAS ACERCA DA EXISTÊNCIA DE CONVIVÊNCIA PÚBLICA, CONTÍNUA E DURADOURA, ESTABELECIDA COM O OBJETIVO DE CONSTITUIR FAMÍLIA. CARTEIRINHA DE EX-COMPANHEIRA VIGENTE ATÉ SETEMBRO DE 2018. AGRAVANTE SEGREGADO QUE NÃO OBTEVE NENHUM TIPO DE PROGRESSÃO DE REGIME OU USUFRUIU DE SAÍDA TEMPORÁRIA. ESCRITURA PÚBLICA QUE POSSUI CARÁTER DECLARATÓRIO, NÃO CONSTITUTIVO. PRECEDENTE DO STJ E DESTA CORTE. DIREITO DA COLETIVIDADE À ORDEM E SEGURANÇA QUE SOBREPÕE AO DIREITO INDIVIDUAL DO PRESO. DECISÃO MANTIDA INCÓLUME. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Execução Penal n. 0008849-91.2019.8.24.0020, da comarca de Criciúma Vara de Execuções Penais em que é Agravante Alison dos Santos e Agravado Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

A Quinta Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, o Exmo. Sr. Desembargador Luiz Cesar Schweitzer (Presidente) e o Exmo. Sr. Desembargador Luiz Neri Oliveira de Souza.

Florianópolis, 5 de março de 2020.


Cinthia Beatriz da S. Bittencourt Schaefer

Relatora


RELATÓRIO

Cuida-se de agravo em execução penal interposto pela Defensoria Pública do Estado de Santa Catarina, em favor de Alison dos Santos, contra decisão proferida pelo Juízo da Vara de Execuções Penais da Comarca de Criciúma, que indeferiu o pedido de autorização para receber visitas de sua companheira, por entender não comprovada relação entre eles.

Pretende a defesa, em apertada síntese, a reforma da decisão interlocutória para autorizar as visitas da companheira ao agravante.

O Ministério Público apresentou contrarrazões (fls. 14-17) pelo desprovimento do recurso e, na sequência, o togado singular manteve a decisão impugnada por seus próprios e jurídicos fundamentos (fl. 18).

Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Luiz Ricardo Pereira Cavalcanti, no sentido do conhecimento e desprovimento do recurso de agravo.

Este é o relatório.





VOTO

Presentes os requisitos de admissibilidade o recurso deve ser conhecido.

Como sumariado, trata-se de agravo em execução penal interposto pela Defensoria Pública do Estado de Santa Catarina, em favor de Alison dos Santos, contra decisão proferida pelo Juízo da Vara de Execuções Penais da Comarca de Criciúma, que indeferiu o pedido de autorização para receber visitas de sua companheira, por entender não comprovada relação entre eles.

Prevê o art. 41, inciso X da Lei de Execução Penal


Art. 41 - Constituem direitos do preso:

[...] X - visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias determinados;


Guilherme de Souza Nucci observa que "o acompanhamento da execução da pena por parentes, amigos e, em particular, pelo cônjuge ou companheiro(a) é fundamental para a ressocialização. Feliz do preso que consegue manter de dentro do cárcere estreitos laços com sua família e seus amigos, que se encontram em liberdade" (Leis Penais e Processuais Penais Comentadas, volume 2, 11ª ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2018, pág. 246).

Prossegue o doutrinador, "o direito de visitas ao preso tem como escopo a manutenção do convívio familiar para maior efetividade da reinserção social, podendo sofrer limitações a depender das circunstâncias do caso concreto, pois não se trata de direito absoluto" (obra citada, pág. 248).

Ou seja, embora assegurado expressamente pela legislação e ser importante elemento de reinserção social, o direito de visitação não possui caráter absoluto, sendo indevida sua sobreposição à disciplina interna garantidora da ordem nos presídios, devendo o interesse privado ceder espaço à primazia do interesse público.

No caso concreto, colhe-se da decisão da autoridade judicial singular (fls. 301-302 dos autos n. 0004538-13.2016.8.24.0004):


A situação dos autos é deveras peculiar.

Afirma o reeducando que mantém união pública, estável e duradoura com a Sra. Márcia Maria das Neves desde outubro de 2019, situação essa, aliás, declarada em escritura pública (fl. 267/269).

Causa estranheza, no entanto, que embora o casal afirme essa convivência pública, notória e duradoura, com o objetivo de constituir família, não existe sequer uma fotografia para comprovar que de fato existiu relação amorosa ou mesmo de amizade entre dois, lembrando-se que a escritura pública, por si só, nada comprova, especialmente porque foi assinada pelo reeducando, quando já estava preso. Daí a pergunta: será que o casal efetivamente se conhecia pessoalmente?

E o que deixa o juízo ainda mais descrente da existência dessa relação amorosa é o teor do documento de fl. 292, onde a Unidade Prisional esclarece que o reeducando tinha uma outra companheira cadastrada (Sra. Juçara), carteirinha de visitas em vigor até setembro de 2018. Depois desse período, o reeducando continuou preso, não obtendo qualquer benefício, tampouco saída temporária, que justificasse conhecer e se enamorar de outra pessoa, contraindo núpcias.

Enfim, tenho que não restou comprovada qualquer relação entre ALISON DOS SANTOS E MÁRCIA MARIA DAS NEVES.

Por tais motivos, INDEFIRO o pedido de visitação formulado por Alison dos Santos (para ser visitado por Márcia Maria das Neves).


Segundo o art. 1.723, do Código Civil: "É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família".

Efetivamente a escritura pública de declaração de união estável subscrita pelo reeducando Alison dos Santos e Márcia Maria das Neves consta que eles declararam "[...] que não se enquadram em nenhum dos impedimentos do artigo 1.521 do Código Civil e que desde o mês de Outubro de 2019 do ano de [sic], mantêm convivência pública, contínua e duradoura, estabelecida com o objetivo de constituir família [...]" (fls. 267-269 dos autos n. 0004538-13.2016.8.24.0004) – grifei.

Ora, como é possível existência desta convivência pública, contínua e duradoura, estabelecida com o objetivo de constituir família, desde outubro de 2019 se neste período o reeducando Alison estava segregado ?

Para sedimentar a dúvida acerca da união estável declarada, o Departamento de Administração Prisional informa que "[...] na data de 01 de setembro de 2018 o reeducando solicitou o cancelamento da carteirinha de sua ex-companheira Sra. Juçara Costa a qual o visitou até a data de 20 de janeiro de 2018 no Presídio Regional de Araranguá e desde então não obteve nenhum tipo de progressão de regime ou usufruiu de saída temporária para manter qualquer relacionamento amoroso com a Sra. Márcia" (fl. 292 dos autos n. 0004538-13.2016.8.24.0004).

O recurso não rebate os argumentos da decisão singular que levaram o togado singular a duvidar da existência da união estável declarada. Limita-se o agravante a indicar existência de escritura pública de união estável, a qual seria impassível de desconstituição senão pelas vias adequadas (ou nova escritura ou via ação judicial).

Razão não lhe assiste.

No meu sentir, a simples existência de uma escritura pública de declaração de união estável é insuficiente para provar que esse tipo de relacionamento ocorreu na vida real.

Em...

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