Acórdão Nº 0008968-58.2019.8.24.0018 do Terceira Câmara Criminal, 02-03-2021

Número do processo0008968-58.2019.8.24.0018
Data02 Março 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 0008968-58.2019.8.24.0018/SC



RELATOR: Desembargador LEOPOLDO AUGUSTO BRÜGGEMANN


APELANTE: MAICON JHON NUNES MARIANO (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


RELATÓRIO


Na comarca de Chapecó, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Maicon Jhon Nunes Marianos, dando-o como incurso nas sanções do art. 155, § 4º, II, do Código Penal, pela prática da conduta assim descrita na inicial acusatória:
Na manhã do dia 30 de agosto de 2019, por volta das 11h37min, o aqui denunciado MAICON JHON NUNES MARIANO, agindo em flagrante demonstração de ofensa ao patrimônio alheio e com manifesto animus furandi, dirigiu-se até a residência da vítima Itamar João Tormen, então situada em área rural, Rua Ernesto Luiz Pasqual, s/n, nesta cidade e comarca, para concretização do visado desiderato ilícito.
Por sua vez, já no local acima mencionado, o denunciado MAICON JHON NUNES MARIANO tratou de adentar na aludida residência por via imprópria ou anormal de acesso, mediante escalada de uma cerca que resguarda o acesso a esta ("ele só pulou a cerca de 2 metros de altura, tanto pra entrar como pra sair, houve uma escalada, é uma cerca especial, industrial, alta, de 2 metros de altura") (fl. 7), promovendo a subtração ilícita de "2 aneis de família; 01 brinco de pedra; 3 pulseiras de ouro 18; 1 Smartphone/Telefone celular; R$ 200,00; 01 Corrente/Gargantilha", sob avaliação indireta e total de R$ 30.400,00 ( Auto de Exibição e Apreensão de fl. 12, Termo de Reconhecimento e Entrega de fl. 13 e Auto de Avaliação Indireta de fl. 14), retirando tais objetos da esfera de posse e disponibilidade do ofendido e empreendendo incontineti fuga.
Na ocasião, o ofendido ainda tentou ir ao encalço do agente delituoso (ora denunciado), "mas ele era muito rápido" "chegando perto da estrada da linha Tormem ele já tinha subido rumo ao mato do loteamento Sperandio". Assim é que, já acionada a Polícia Militar, integrantes desta deslocaram-se até o local, mantendo contato com a vítima ("no deslocamento pra ocorrência estava a vítima"), a qual indicou "a direção do masculino", além das características deste e o objeto da subtração ilícita.
Em seguida, efetuada "rondas nas imediações e cerca de 300 metros do local, já entrando no Bairro Belvedere", logrou-se finalmente êxito em proceder a final abordagem e detenção do denunciado ("que de pronto já era reconhecido pela vítima pelas características que foram repassadas").
Acrescente-se que no momento da abordagem, o denunciado, tão logo se deparou com a Polícia Militar, "saiu em disparada pelas casas e terrenos, pulou um matagal e barranco e se escondeu dentro de uma residência; fizemos a abordagem na casa, e o masculino se rendeu em negociação; ali no local onde foi detido ele, foi encontrado o celular da vítima; ele informou que anteriormente, com medo de ser abordado, antes de ele passar a rodovia, ele tinha escondido em outro local as joias; ele nos passou o local, foi com nós e confirmou que as joias estavam lá escondidas no mato [...]".
Por fim, os policiais militares conduziram o denunciado MAICON JHON NUNES MARIANO à repartição policial em situação de flagrante-delito e para a adoção das providências de estilo (Evento 19).
Concluída a instrução do feito, a denúncia foi julgada parcialmente procedente para condenar o acusado Maicon Jhon Nunes Marianos às penas de 1 (um) ano de reclusão, em regime inicial aberto, e ao pagamento de 10 (dez) dias-multa, em seu mínimo legal, por infração ao disposto no art. 155, caput, do Código Penal. A pena privativa de liberdade foi substituída por prestação de serviços à comunidade. Foi-lhe concedido o direito de apelar em liberdade (ev. 79).
Irresignada, a defesa interpôs recurso de apelação e arguiu, preliminarmente, a nulidade da decisão que recebeu a denúncia, por ausência de fundamentação. Ainda de maneira preliminar, suscitou a nulidade do reconhecimento fotográfico realizado na delegacia, por ter violado o procedimento previsto no art. 226 do CPP. No mérito, requereu a absolvição, nos termos do artigo 386, V e VII do CPP. Subsidiariamente, postulou o reconhecimento da causa de diminuição de pena prevista no art. 16 do Código Penal (arrependimento posterior) ou a aplicação da atenuante do art. 65, III, "b", do mesmo diploma legal (ev. 97).
Juntadas as contrarrazões (ev. 102), ascenderam os autos a esta instância, e a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Ernani Dutra, opinou pelo conhecimento e não provimento do apelo interposto (ev. 10)

VOTO


Trata-se de recurso de apelação interposto pela defesa, contra decisão que julgou parcialmente procedente a denúncia e condenou o acusado pela prática da conduta descrita no art. 155, caput, do Código Penal.
O apelo é de ser conhecido, porquanto presentes os requisitos objetivos e subjetivos de admissibilidade.
Da nulidade da decisão de recebimento da denúncia
A defesa suscitou a nulidade da decisão que recebeu a denúncia, frente a ausência de fundamentação e consequente violação do art. 93, IX da Constituição Federal.
Tal não merece acolhimento.
Não se nega a natureza jurídica de decisão interlocutória simples.
Todavia, tal ato não se qualifica, tampouco se equipara, para os fins a que se remete o art. 93, IX, da Constituição da República, a ato de caráter decisório, motivo por que não demanda, em regra, fundamentação como pressuposto de sua validade.
Veja-se de interessante precedente do Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que a verificação dos requisitos legais mostra-se suficiente para preencher a exigência:
PENAL E PROCESSO PENAL. RECURSO EM HABEAS CORPUS. 1. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. AUSÊNCIA DE EXCEPCIONALIDADE. 2. TENTATIVA DE HOMICÍDIO. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. INDÍCIOS DE AUTORIA DEMONSTRADOS. SUPERVENIÊNCIA DE DECISÃO DE PRONÚNCIA. 3. NULIDADE DA DECISÃO QUE RECEBEU A DENÚNCIA. CARÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. NÃO VERIFICAÇÃO. MOTIVAÇÃO CONCISA. PRECEDENTES DO STF E DO STJ. 4. RECURSO EM HABEAS CORPUS IMPROVIDO.
[...]
3. No que concerne à nulidade da decisão que recebeu a denúncia, verifico que igualmente não merece prosperar a irresignação do recorrente. Com efeito, conforme firmado pelo Superior Tribunal de Justiça em consonância com o entendimento do Supremo Tribunal Federal, tem-se que na fase do art. 395 do Código de Processo Penal, ou seja, antes da citação do acusado, bastaria uma fundamentação concisa acerca dos requisitos do art. 41 do referido diploma legal, até mesmo para evitar o pré-julgamento da ação penal. Dessa forma, não há constrangimento ilegal na hipótese dos autos, uma vez que efetivamente afirmada pelo Magistrado de origem, por ocasião do recebimento da denúncia, a presença dos requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal.
4. Recurso em habeas corpus improvido (RHC 75.487/ES, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª Turma, j. 21/09/2017 - grifou-se).
É de se notar que não se olvida que seria possível, em determinadas situações em que a lei expressamente dispusesse, a exigência de fundamentação da decisão de recebimento da denúncia, como o era no caso, por exemplo, do art. 109, § 2º, do Decreto-lei n. 7.661/45, que regulamentava o processo de falência empresarial, atualmente revogado pela Lei n. 11.101/2005.
Contudo, a regra geral, prevista no art. 396 e seguintes do Código de Processo Penal, não faz qualquer exigência de motivação para o recebimento, apenas ressalva para o caso de rejeição liminar ou absolvição sumária - logicamente por colocar termo ao processo, a fundamentação é obrigatória -, de modo que, na hipótese do caso vertente, a motivação que a defesa defende é prescindível.
Colaciona-se também do Superior Tribunal de Justiça:
RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO CULPOSO NA DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR. ART. 302, PARÁGRAFO ÚNICO, II, DA LEI N. 9.503/1997. RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. REJEIÇÃO DA DEFESA PRELIMINAR. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. ILEGALIDADE. NÃO EXISTÊNCIA. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme em assinalar que "não sendo a hipótese de absolvição sumária do acusado, a decisão do Juízo processante que...

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