Acórdão Nº 0009365-09.2018.8.24.0033 do Terceira Câmara Criminal, 28-03-2023

Número do processo0009365-09.2018.8.24.0033
Data28 Março 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 0009365-09.2018.8.24.0033/SC



RELATOR: Desembargador JÚLIO CÉSAR MACHADO FERREIRA DE MELO


APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) APELADO: MATEUS FAGUNDES (RÉU)


RELATÓRIO


Denúncia: O ministério público ofereceu denúncia contra Mateus Fagundes, recebida em 07/11/2018 (evento 22, DOC35), dando-o como incurso nas sanções do "arts. 33, caput, da Lei n. 11.343/06 e 12, caput, da Lei n. 10.826/03", pela prática dos seguintes fatos delituosos (evento 19, DOC34):
Fato 1:
No dia 3 de agosto de 2018, por volta das 12h10min, no interior da residência localizada na Rua José Firmino Vieira, n. 1442, bloco 3, apto 308, Cordeiros, Itajaí/SC, o denunciado Mateus Fagundes guardava/tinha em depósito 5 (cinco) porções de droga vulgarmente conhecida como maconha - substância entorpecente capaz de causar dependência física e/ou psíquica - pesando aproximadamente 3,2kg, para fins de comércio, sem autorização e em desacordo com determinação legal e/ou regulamentar.
Fato 2:
No mesmo dia e local, ou seja, no interior de sua residência, o denunciado Mateus Fagundes possuía 1 (uma) munição calibre .380, de uso permitido (p. 13), sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar.
Sentença: Após a regular instrução do processo criminal, o juiz do primeiro grau proferiu a seguinte decisão (evento 140, DOC1):
[...] Pelo exposto, julgo parcialmente procedente a denúncia para condenar o réu Mateus Fagundes ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 2 anos e 6 meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, substituída por duas penas restritivas de direitos consistentes na prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária, nos termos da dosimetria, além do pagamento de 250 dias-multa, com valor unitário de 1/30 do salário mínimo vigente à época do crime, pela prática do crime previsto no art. 33, caput, e §4°, da Lei n. 11.343/2006.
Defiro ao réu o direito de recorrer em liberdade, pois o acusado já se encontra nessa condição e não estão presentes os requisitos ensejadores da prisão cautelar, consoante o art. 312 do Código de Processo Penal.
Sobre os bens apreendidos: i) a droga deve ser destruída, a teor do art. 72 da Lei nº 11.343/06, ii) quanto ao dinheiro em espécie, há prova de que essa quantia é proveniente do tráfico ilícito de entorpecentes, razão pela qual decreto a sua perda em favor da União, com base no art. 91, inciso II, alínea "b", do Código Penal e art. 63 da Lei nº 11.343/06 e iii) a munição deve ser encaminhada ao Comando do Exército, nos termos do art. 25 e seguintes da Lei n. 10.826/03.
O recolhimento da pena de multa aplicada deve obedecer ao disposto no art. 50 do Código Penal [...] (Grifo nosso)
Apelação interposta pela acusação: O Ministério Público, por seu representante legal, apresentou apelação. Em suas razões, requer: "o conhecimento e o provimento do recurso interposto em face de Mateus Fagundes a fim de reformar a sentença constante no evento 140, para que seja o apelado condenado pelo delito previsto no artigo 12, caput, da Lei n. 10.826/2003" (evento 144, DOC1).
Contrarrazões: A defesa impugnou as razões recursais, requerendo: "se digne a negar o provimento ao apelo, mantendo a r. sentença negando provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público, razão pela a decisão de primeiro grau encontrasse bem fundamentada" (evento 158, DOC1).
Parecer da PGJ: Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o exmo. sr. Dr. Pedro Sérgio Steil, que opinou pelo "conhecimento, e, no mérito, pelo provimento do recurso de apelação interposto" (evento 9, DOC1)

Documento eletrônico assinado por JÚLIO CÉSAR MACHADO FERREIRA DE MELO, Relator do Acórdão, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 3277555v17 e do código CRC df20138e.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): JÚLIO CÉSAR MACHADO FERREIRA DE MELOData e Hora: 10/3/2023, às 17:32:8
















Apelação Criminal Nº 0009365-09.2018.8.24.0033/SC



RELATOR: Desembargador JÚLIO CÉSAR MACHADO FERREIRA DE MELO


APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) APELADO: MATEUS FAGUNDES (RÉU)


VOTO


Trata-se de apelação interposta pela acusação contra a sentença que, julgando parcialmente procedente a denúncia, condenou o apelado Mateus Fagundes à pena de 2 anos e 6 meses de reclusão, substituída por duas restritivas de direitos, e pagamento de 250 dias-multa, pela prática do crime previsto no art. 33, caput, e §4°, da Lei n. 11.343/2006 e o absolveu em relação ao delito previsto no artigo 12, caput, da Lei n. 10.826/03, pela aplicação do princípio da insignificância.
Insurge-se a acusação tão somente em relação à absolvição, pugnando pela reforma da decisão e pela condenação do apelado também neste crime.
Conheço do recurso da acusação, porque preenchidos seus requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, e passo à análise da matéria devolvida a conhecimento desta Colenda Câmara Criminal:

1. MÉRITO: pleito único, de condenação
Como adiantado, a acusação requer a reforma da sentença, a fim de que o acusado seja condenado pela prática do crime previsto no artigo 12, caput, da Lei n. 10.826/03, pelo fato de que mantinha, no interior de sua residência, uma munição calibre .380, de uso permitido, sem autorização legal.
Alega, nesse sentido, que: (a) "o delito previsto no art. 12, caput, da Lei n. 10.826/03 é classificado como de mera conduta e perigo abstrato e, para a sua configuração, basta a simples posse de munição ou acessórios de uso permitido, sendo irrelevante o fato de não estarem desacompanhadas de arma de fogo"; (b) "a aplicação do princípio da insignificância, em relação aos delitos previstos no Estatuto do Desarmamento, ante a natureza de crime de perigo abstrato, é possível apenas em hipóteses singulares, não sendo justificável, contudo, no caso "; (c) isso porque "não se trata de uma apreensão de munição em contexto isolado, mas sim da abordagem do apelante em razão de denúncias de que, além de ser investigado como o responsável pelo tráfico de drogas no bairro Bambuzal, houve, na época, uma disputa no mencionado bairro que resultou na morte do tio do apelado", de modo que "diante da disputa, a polícia recebeu informações de que o apelado estaria na posse de arma de fogo"; (d) "assim, o fato de ser Mateus Fagundes investigado por integrar grupos voltados ao tráfico e ter a polícia recebido informações de que ele estaria em posse de uma arma de fogo após a morte de seu tio por conta de disputas no bairro por ponto de drogas, é mais do que suficiente para que ele seja também condenado pelo delito previsto no artigo 12, caput, da Lei n. 10.826/2003", concluindo que: " há evidências concretas de que a conduta efetivamente lesou a incolumidade pública".
Em contrarrazões, a defesa pugnou pela manutenção da sentença absolutória, ao argumento de que o princípio da insignificância aplica-se ao caso em tela, já que apreendida uma única munição desacompanhada de arma de fogo.
A meu ver, com razão a acusação.
Em primeiro lugar, é importante frisar que a jurisprudência majoritária é tranquila no sentido de que os crimes previstos nos artigos 12, 14 e 16 da Lei n. 10.826/2003 são de mera conduta e de perigo abstrato, sendo desnecessário perquirir sobre a lesividade concreta da ação, uma vez que o objeto jurídico tutelado não é a incolumidade física, mas a segurança pública e a paz social - razão pela qual, em regra, mostra-se inaplicável o princípio da insignificância.
Nesse sentido, colhe-se da jurisprudência dos Tribunais Superiores:
Superior Tribunal de Justiça:
"A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça aponta que os crimes previstos nos arts. 12, 14 e 16 da Lei n. 10.826/2003 são de perigo abstrato, sendo desnecessário perquirir sobre a lesividade concreta da conduta, porquanto o objeto jurídico tutelado não é a incolumidade física e sim a segurança pública e a paz social, colocadas em risco com a posse de munição, ainda que desacompanhada de arma de fogo, revelando-se despicienda a comprovação do potencial ofensivo do artefato através de laudo pericial. Por esses motivos, via de regra, inaplicável, nos termos da jurisprudência desta Corte, o princípio da insignificância aos crimes de posse e de porte de arma de fogo ou munição, sendo irrelevante inquirir a quantidade de munição apreendida" (AgRg no HC 554.858/SC, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 12/05/2020, DJe 18/05/2020)
"O entendimento deste Superior Tribunal de Justiça, firmado no julgamento do AgRg nos EAREsp n. 260.556/SC, em 26/03/2014, tendo como relator o eminente Ministro Sebastião Reis Júnior, é no sentido de que o crime previsto no art. 14 da Lei n. 10.826/2003 é de perigo abstrato, sendo irrelevante o fato de a arma estar desmuniciada ou, até mesmo, desmontada ou estragada, porquanto o objeto jurídico tutelado não é a incolumidade física, e sim a segurança pública e a paz social, colocados em risco com o porte de arma de fogo sem autorização ou em desacordo com determinação legal, revelando-se despicienda até mesmo a comprovação do potencial ofensivo do artefato através de laudo pericial" (AgRg no AgRg no AREsp 1437702/RJ, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 20/08/2019, DJe 23/08/2019)
Supremo Tribunal Federal (STF):
"Os tipos penais de posse e de porte ilegal de arma de fogo, acessórios e ou munição, de uso permitido, são formais e, a fortiori, de mera conduta e de perigo abstrato, razão pela qual as características do seu objeto material são irrelevantes, porquanto independe do quantum para ofender a segurança e incolumidade públicas, bem como a paz social, bens jurídicos...

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