Acórdão nº 0009391-23.2019.8.14.0074 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 2ª Turma de Direito Privado, 23-05-2023

Data de Julgamento23 Maio 2023
Órgão2ª Turma de Direito Privado
Número do processo0009391-23.2019.8.14.0074
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
AssuntoContratos Bancários

APELAÇÃO CÍVEL (198) - 0009391-23.2019.8.14.0074

APELANTE: MARIA DA SILVA LIMA

APELADO: BANCO ITAU BMG CONSIGNADO S.A.

RELATOR(A): Desembargador RICARDO FERREIRA NUNES

EMENTA

APELAÇão CÍVEl. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DEMONSTRADA A EXISTÊNCIA DA CONTRATAÇÃO. AUSÊNCIA DE EVIDÊNCIAS DE FRAUDE BANCÁRIA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO À UNANIMIDADE.

1. Existe dever de indenizar quando resta comprovada falha na prestação do serviço em função de operações bancárias realizadas mediante fraude.

2. Caso concreto, no qual, em que pese a inversão do ônus da prova procedida em primeira instância, o banco apelado ao apresentar a realização do TED se desincumbiu do ônus de provar a efetiva contratação do empréstimo, não havendo nos autos indícios da ocorrência de fraude ou vício de consentimento.

3. Manutenção da sentença de improcedência, que se impõe.

4. Recurso conhecido e desprovido, à unanimidade.

RELATÓRIO

PROCESSO: 0009391-23.2019.814.0074

SEC. ÚNICA DE DIREITO PÚBLICO E PRIVADO – 2ª TURMA DE DIREITO PRIVADO

RECURSO: APELAÇÃO CÍVEL

APELANTE: MARIA DA SILVA LIMA

APELADO: BANCO ITAÚ CONSIGNADO S.A.

RELATOR: Des. RICARDO FERREIRA NUNES

RELATÓRIO

Tratam os presentes autos de APELAÇÃO CÍVEL interposta por MARIA DA SILVA LIMA, inconformada com a Sentença prolatada pelo MM. Juízo da 2ª Vara da Comarca de Tailândia/PA que, nos autos da AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA, ajuizada por si em face de BANCO ITAÚ CONSIGNADO S.A., julgou improcedente a pretensão formulada.

Em sua exordial (ID 10650582), narrou a autora/apelante ser pessoa idosa, com pouca instrução e que tomou conhecimento de empréstimo realizado indevidamente em seu nome – contrato número 242455463, não tendo autorizado a prestação de serviço e sido surpreendida com descontos em sua conta corrente, o que caracteriza fraude e inobservância do CDC na relação contratual.

Pleiteou liminarmente a suspensão dos descontos consignados referentes ao contrato de empréstimo indevido e, no mérito, a inversão do ônus da prova; a condenação da empresa requerida no valor de R$40.000,00 (quarenta mil reais), a título de indenização por danos morais, bem como a repetição do indébito, nos termos do artigo 42, parágrafo único, da Lei nº 8.078/90, na quantia de R$1.657,20 (um mil, seiscentos e cinquenta e sete reais e vinte centavos), acrescida de juros e correção monetária.

Foi deferida a gratuidade de justiça e o pedido de tutela de urgência formulados na exordial, determinando a suspensão imediata dos descontos efetuados junto ao benefício previdenciário da apelante, referentes ao contrato número 242455463 (ID 10650587).

Em contestação, o banco réu arguiu a regularidade da contratação, visto que juntou extrato de empréstimo e comprovante de TED, comprovando a disponibilização do valor na conta da apelante e, por conseguinte, defendeu regularidade dos descontos efetuados em razão do serviço contratado, não havendo motivos que fundamentem dano moral, por inexistir qualquer violação aos direitos à personalidade da parte autora, tais como honra, imagem, reputação ou intimidade.

Esclareceu que o contrato foi celebrado em 09.09.2014, no valor de R$458,33 (incluindo IOF), a ser quitado em 60 parcelas de R$13,81, mediante desconto em benefício previdenciário, sendo que foi liberada à parte autora a importância de R$ 449,84, por meio de crédito em conta corrente de sua titularidade no Banco do Brasil – agência 2123 – conta corrente número 134465, em 09.09.2014, conforme comprovante juntado (ID 10650590),

O banco ITAÚ CONSIGNADO repugna a tese de fraude, na medida em que comprova o depósito do valor contratado e a sua incorporação ao patrimônio do apelante. Ressalta a peculiaridade de que a possibilidade de realização da transferência eletrônica (TED) só existe nos casos em que o banco informe, obrigatoriamente, entre outros dados, a identificação da conta do cliente recebedor, além do seu nome e número de inscrição no CPF ou CNPJ, sob pena de devolução do valor ao emissor, em caso de divergência de dados, nos termos da circular do Banco Central do Brasil nº 3710, de 2014.

Assim, alega a impossibilidade de que a instituição financeira tenha tido a intenção de fraudar contrato de empréstimo, na medida em que designou a conta da própria vítima para recebimento do crédito, não obtendo qualquer vantagem econômica com a referida transação.

O banco réu requer a total improcedência da ação, na medida em que inexiste defeito na prestação do serviço e resta evidenciada a regularidade da contratação do empréstimo, assim como condenação da autora em multa por litigância de má-fé, nos termos do artigo 80, incisos II e III do CPC.

Réplica à contestação (ID 10650598).

Após o processamento do feito, foi proferida sentença, cuja parte dispositiva segue transcrita:

Pelo exposto JULGO IMPROCEDENTES OS PEDIDOS FORMULADOS PELA AUTORA, extinguindo o processo com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, CPC.

Revogo a tutela anteriormente concedida.

Com fulcro no art. 85, § 2º do CPC, condeno a parte requente ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) do valor da causa, cuja exigibilidade fica suspensa até que cesse a hipossuficiência do beneficiário da justiça gratuita ou seja atingido pela prescrição prevista no artigo 98, parágrafo 3º do Código de Processo Civil.

Inconformada, a autora interpôs recurso de apelação (ID 10650611), no qual insiste no argumento de que nunca autorizou o empréstimo ora discutido.

Alega que o apelado não trouxe aos autos documento comprovando que houve formalização de sua adesão ao serviço, estando, ainda, ilegíveis as cópias de seus documentos pessoais juntados, mas que mesmo assim foram julgados improcedentes os pedidos constantes na exordial, considerando justa a cobrança impugnada, por entender que restou configurada a relação contratual, uma vez que o valor do empréstimo foi efetivamente recebido e incorporado ao seu patrimônio.

Pleiteia, assim, pelo provimento do recurso para que seja anulada a sentença vergastada, julgando procedente os pedidos, reconhecendo a ilegalidade da prática do apelado, determinando a devolução dos valores pagos indevidamente, na forma do artigo 42 do CDC, na quantia de R$1.657,20 (um mil, seiscentos e cinquenta e sete reais e vinte centavos), acrescida de juros e correção monetária, bem como a condenação em R$40.000,00 (quarenta mil reais), a título de danos morais.

Em contrarrazões (ID 10650915), arrazoa a instituição financeira apelada, ser irrepreensível a sentença recorrida, razão pela qual defende sua manutenção integral e, por conseguinte, o desprovimento do recurso de apelação.

É o relato do necessário.

Inclua-se o presente feito na próxima sessão de julgamento do plenário virtual.

Belém, 04 de maio de 2023.

Des. RICARDO FERREIRA NUNES

Relator

VOTO

1. Juízo de admissibilidade.

Presentes os pressupostos de sua admissibilidade, conheço do recurso de apelação.

2. Razões recursais.

Cinge-se a presente controvérsia acerca do acerto ou desacerto da sentença que julgou improcedentes os pedidos efetuados pela apelante em face do banco apelado, por considerar demonstrada a efetiva contratação do empréstimo, sem indícios da ocorrência de fraude.

A recorrente se insurge contra a sentença, defendendo que os descontos efetuados em seu benefício previdenciário foram fraudulentos e que os documento apresentados pelo banco apelado não seriam aptos a comprovar a existência de relação jurídica entre as partes.

Sobre fraude para a obtenção de serviços bancários, é certo que o Superior Tribunal de Justiça possui entendimento consolidado que tal ação ilícita integra o risco da atividade do banco, sendo considerada fortuito interno, tornando a responsabilidade da instituição financeira objetiva, conforme Súmula 479, cujo verbete segue transcrito:

Súmula 479, STJ. "As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias"

Não obstante, analisando as provas documentais constantes nos autos, entendo não assistir razão à apelante, já que, diferentemente do que afirma, não há qualquer indício da efetiva ocorrência de fraude na contratação de empréstimo consignado em seu nome, perante o banco apelado.

Por oportuno, transcrevo trecho da sentença, na qual o juízo singular procedeu a análise da prova dos autos:

“Além disso, o banco réu juntou aos autos extrato de empréstimo e, principalmente, o comprovante da TED, com a transferência do valor de R$ 449,84 (quatrocentos e quarenta e nove reais e oitenta e quatro centavos), no nome da autora MARIA DA SILVA LIMA, CPF 254.534.672-15, agência 2123, conta 134465, datado do dia 09/09/2014 (data da contratação)” (ID nº 10650610)

Como se verifica, ao contrário do alegado em apelação, em meu sentir, os documentos apresentados demonstram que o valor em discussão foi efetivamente contratado e recebido pela autora, ora apelante.

Vejamos.

O banco apelado trouxe aos autos, com o intuito de demonstrar a regularidade da contratação o comprovante de transferência eletrônica – TED (ID 10650595, pg. 4), o qual tem a autora como beneficiária e a mesma conta constante na referida Cédula de Crédito Bancário, como destinatária.

Assim, entendo que, em que pese a inversão do ônus da prova procedida em primeira instância, o banco apelado se desincumbiu do ônus de provar a efetiva contratação do empréstimo, não havendo nos autos indícios da ocorrência de fraude ou vício de consentimento, o que impõe a manutenção da improcedência.

Corroborando este entendimento, transcreve-se julgados dos Tribunais Pátrios que se...

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