Acórdão Nº 0009673-03.2016.8.24.0005 do Terceira Câmara Criminal, 27-07-2021

Número do processo0009673-03.2016.8.24.0005
Data27 Julho 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 0009673-03.2016.8.24.0005/SC



RELATOR: Desembargador LEOPOLDO AUGUSTO BRÜGGEMANN


APELANTE: BRENO AXEL MARQUES BODON (ACUSADO) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


RELATÓRIO


Na comarca de Balneário Camboriú, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Breno Axel Marques Bodon e Mirella Fernanda Marques Bodon, dando-os como incursos na sanção do art. 331, caput, do Código Penal, pela prática da conduta assim descrita na inicial acusatória:
No dia 12.7.2016, aproximadamente às 16h, uma guarnição da Polícia Militar foi acionada via central para atender ocorrência de tráfico de entorpecentes à rua 1451, 209, próximo à Avenida dos Estados, centro, nesta cidade e Comarca.
Passadas as características do suposto envolvido, os policiais dirigiram-se ao local e, ao avistarem o denunciado, procederam à abordagem.
Ocorre que, durante a ação policial, o denunciado investiu contra os agentes, desferindo socos e chutes, sendo necessário o uso de spray de pimenta para contê-lo.
Consta ainda que durante a abordagem o denunciado gritava chamando sua mãe, moradora do prédio em frente ao local onde estava sendo realizada a abordagem, a qual de imediato foi até a rua acompanhada da denunciada Mirella, irmã de Breno e que, em concurso de pessoas e no intuito de auxiliar seu irmão a furtar-se da abordagem, passou a desferir socos contra os integrantes da guarnição, além de lançarem aos gritos expressões ofensivas contra os agentes da força pública.
Ressalta-se que durante toda a ocorrência ambos os denunciados chamavam os agentes do Estado de "policiais covardes" e "policiais filhos da puta", além de lançarem diversas ofensas à instituição Polícia Militar de Santa Catarina.
Desta forma, os denunciados agiram dolosamente em concurso de pessoas, com a intenção deliberada de ofender os funcionários públicos, que estavam no exercício regular de suas funções, menosprezando a atuação deles perante terceiros, seja ao proferir palavras indecorosas e desrespeitosas, seja ao investir com violência física contra integrantes da força de segurança pública.
Esta Promotoria de Justiça deixou de oferecer ao autor proposta de transação penal ao autor (fl. 18), tendo em vista que ela não preenche os requisitos objetivos/subjetivos do art. 76 da Lei 9.099/95 (fls. 10/11). Por outro lado, ofereceu à autora, no entanto ela não compareceu à audiência designada (fl. 20) e, designadas outras duas datas para realização do ato, não foi encontrada nos endereços declinados nos autos (certidões de fls. 30 e 47) (ev. 48).
Houve a cisão do processo em relação à acusada Mirella (ev. 52).
Concluída a instrução do feito, a denúncia foi julgada procedente para condenar o acusado à pena de 7 (sete) meses de detenção, em regime inicial aberto, por infração ao art. 331 do Código Penal. Foi-lhe concedido o direito de apelar em liberdade (ev. 128).
Irresignada, a defesa interpôs recurso de apelação, no qual requereu a absolvição do acusado, alegando, em suma, a fragilidade probatória. De forma subsidiária, pugnou pela fixação da pena no mínimo legal, especialmente mediante o afastamento da valoração negativa da conduta social. Também pleiteia, a compensação integral entre a agravante da reincidência e a atenuante da confissão espontânea, bem como a substituição da pena corporal por restritivas de direitos ou multa. Por fim, pugna postula a fixação dos honorários recursais ao defensor nomeado por sua atuação neste grau recursal (ev. 164).
Juntadas as contrarrazões (ev. 168), ascenderam os autos a esta instância, e a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Paulo de Tarso Brandão, opinou pelo conhecimento e provimento do recurso (ev. 10 SG).
Este é o relatório.


VOTO


Trata-se de recurso de apelação contra decisão que julgou procedente a denúncia e condenou o acusado à sanção prevista pelo art. 331 do Código Penal.
O apelo é de ser conhecido, porquanto presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade.
Do pleito absolutório
Pleiteia a defesa a absolvição do acusado, alegando a ausência de provas no que tange à autoria e à materialidade do delito, alegando que a versão dos agentes públicos, trata-se, em verdade, de "mera retaliação ao fato de que o apelante resistiu à abordagem injusta e truculenta que sofrera".
O pleito, contudo, não merece prosperar.
Verbera o art. 331 do Código Penal:
Art. 331 - Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.
O núcleo desacatar traz o sentido de ofender, menosprezar, humilhar, menoscabar.
Sobre o tema, leciona o insigne Júlio Fabbrini Mirabete:
O núcleo do verbo é desacatar, que significa ofender, vexar, humilhar, espezinhar, desprestigiar, menosprezar, menoscabar, agredir o funcionário, ofendendo a dignidade ou o decoro da função. É pois, o desacato toda e qualquer ofensa direta e voluntária à honra ou ao prestígio de funcionário público com a consciência de atingi-lo no exercício ou por causa de suas funções, tutelando a figura delituosa a dignidade da Administração Pública personificada em seus mandatários. Pode o desacato constituir-se em palavras ou atos (gritos, gestos, escritos se presente o funcionário) e, evidentemente, violência que constitua a contravenção de vias de fato ou o crime de lesões corporais (Manual de Direito Penal, v. 3, 20. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 375).
Nelson Hungria é claro:
É a grosseria, falta de acatamento, podendo consistir em palavras injuriosas, difamatórias ou caluniosas, vias de fato, agressão física, ameaças, gestos obscenos, gritos agudos etc., ou seja, qualquer palavra ou ato que redunde em vexame, humilhação, desprestígio ou irreverência ao funcionário (Comentários ao Código Penal, 1959, v. IX, p. 424).
O crime de desacato não exige resultado naturalístico, de sorte que a prova da sua ocorrência pode se fazer por qualquer meio em direito admitido.
In casu, ao contrário do alegado, a sua ocorrência vem assente por intermédio do Termo Circunstanciado n.º 5197/2016 (p. 02-05 do ev. 1), no qual consta o relato da ocorrência.
A autoria, da mesma forma, está comprovada.
Para elucidar tal entendimento, pertinente percorrer a prova oral produzida, cujas algumas transcrições muito bem elaboradas pelo togado a quo, passarão a integrar este voto, evitando tautologia.
O policial militar Eliomar Cândido da Veiga, ao ser ouvido em juízo, confirmou que o acusado ao resistir a uma abordagem policial, proferiu ofensas e xingamentos aos agentes:
[...] estávamos em serviço de motocicleta, fomos acionados via Central para uma ocorrência de tráfico, fomos averiguar e encontramos o Bodon, que já é conhecido das guarnições; fizemos a abordagem, havia mais familiares dele no local; de início, ele não queria se deixar abordar, resistiu, não acatou as ordens; os familiares começaram a aglomerar; quando ele quis entrar na residência, seguramos ele para fazer a revista pessoal e virou confusão, a família veio pra cima, o acusado aproveitou-se da situação para tentar se desvencilhar, foi preciso o uso da força física para contê-lo no local; o acusado proferiu ofensas, xingamentos, não me recordo as palavras dele, mas eram xingamentos e incitava a vizinhança, como "policiais de merda, corruptos", tanto é que aglomerou bastante gente, chamou bastante atenção na rua; saiu bastante gente para rua, como se nós fôssemos os culpados da situação; o acusado é conhecido das guarnições pelo envolvimento com o tráfico; já o abordei anteriormente, sempre neste nível, quando tinha algo ilícito. (fl. 112) [sic] (transcrição extraída da sentença referente ao vídeo 172 do ev. 113, grifou-se).
Da mesma forma, seu colega de farda Laerte Costa e Silva de Oliveira, narrou ao juízo que os agentes públicos foram chamados de "porcos, filhos da puta" pelo denunciado:
[...] fomos acionados por uma denúncia de tráfico e ao abordar o acusado, ele não deixou ser abordado, dizia que estava na casa dele, não iria colocar as mãos pra cima, tivemos que usar de força; a irmã dele veio pra cima da guarnição, tivemos que usar spray de pimenta; pedimos apoio para conseguir contê-lo; o acusado nos ofendia o tempo todo, todo tipo de xingamento, como "porco, filhos da puta"; eu já o conhecia de outras abordagens, pelo envolvimento com o tráfico. Dada a palavra à defesa: não me recordo se foi encontrado droga com o acusado; éramos em três ou quatro guarnições; havia cerca de três ou quatro pessoas no local. (fl. 112) [sic] (transcrição extraída da sentença referente ao vídeo 171 do ev. 113, grifou-se).
Por fim, as declarações judiciais do agente Jefferson...

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