Acórdão nº 0010103-19.2015.8.11.0015 Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, Terceira Câmara de Direito Privado, 02-08-2023

Data de Julgamento02 Agosto 2023
Case OutcomeNão-Provimento
Classe processualCível - APELAÇÃO CÍVEL - CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Privado
Número do processo0010103-19.2015.8.11.0015
AssuntoCompra e Venda

ESTADO DE MATO GROSSO

PODER JUDICIÁRIO

TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO


Número Único: 0010103-19.2015.8.11.0015
Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198)
Assunto: [Compra e Venda]
Relator: Des(a).
ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES


Turma Julgadora: [DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). CARLOS

ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). DIRCEU DOS SANTOS]

Parte(s):
[BUNGE ALIMENTOS S/A - CNPJ: 84.046.101/0001-93 (APELANTE), RENATA LEITE DO NASCIMENTO BUTENAS - CPF: 171.238.458-97 (ADVOGADO), SANDRA REGINA MIRANDA SANTOS - CPF: 117.555.468-58 (ADVOGADO), ROBERTO POLI RAYEL FILHO - CPF: 200.116.748-22 (ADVOGADO), BUNGE ALIMENTOS S/A - CNPJ: 84.046.101/0001-93 (REPRESENTANTE), TARCISIO SCHNEIDER - CPF: 503.199.061-91 (APELADO), ROVENIA DEIS COUTINHO DA SILVEIRA - CPF: 630.585.451-34 (ADVOGADO), ORLANDO CESAR JULIO - CPF: 045.080.818-19 (ADVOGADO)]

A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a).
Não encontrado, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO.

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL – EMBARGOS À EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL – SENTENÇA IMPROCEDENTE – DECABIDA A ALEGAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE TÍTULO – TÍTULO EXECUTIVO LÍQUIDO, CERTO E EXIGÍVEL – ALEGAÇÃO DE EXCEÇÃO DE CONTRATO NÃO CUMPRIDO – AUSENTE AJUSTE QUE AUTORIZE NÃO PAGAMENTO PELA EXISTÊNCIA DE OUTRO PENHOR – PENHOR REGISTRADO NA MATRÍCULA EM DATA ANTERIOR AO CONTRATO OBJETO DA LIDE – TEORIA DOS ATOS PRÓPRIOS – PODERIA NÃO CONTRATAR – POSSÍVEL SATISFAÇÃO DA GARANTIA COM OUTRO IMÓVEL LIVRE DE ÔNUS – PRESUNÇÃO DE INADIMPLEMENTO DA OUTRA OBRIGAÇÃO – EXIGÊNCIA ARBITRÁRIA E DESPROPORCIONAL – ENTREGA EFETIVADA – JUSTIFICATIVA APRESENTADA QUE AUTORIZA ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA – AUSENTE LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO – HONORÁRIOS MAJORADOS.

Não cabe a alegação da parte embargante/recorrente de que, diante da existência de anterior penhor rural, estaria autorizada a inadimplir o pagamento da quantia devida pelo efetivo fornecimento do 302.460 quilos de milho, objeto do Contrato de Compra e Venda ajustado entre as partes.

Improcede o argumento de que não haveria título executivo apto a lastrear a execução, isso porque o documento que fundamenta a execução extrajudicial é título executivo tipicamente formal, previsto no art. 784, III do CPC, atendendo aos requisitos de exequibilidade, de certeza, liquidez e exigibilidade.

Não cabe ir além do contrato para justificar o descumprimento de sua parte no ajuste, mormente porque “as partes pactuaram a possibilidade de a embargante reter o pagamento, tão somente para o caso de não entrega do produto (inadimplemento contratual)”.

Além disso, as provas coligidas aos autos e a sentença muito bem apreciou a questão, consignando que “Na data de assinatura do contrato, objeto da ação executiva (18/09/2014), já era pública e notória a existência do penhor cedular de primeiro grau, registrado junto ao Cartório de Registro de Imóveis em 31/01/2014 (pág. 37 do evento nº 78474291), devendo ser aplicada a "(...) 'teoria dos atos próprios', como concreção do princípio da boa-fé objetiva, sintetizada nos brocardos latinos 'tu quoque' e 'venire contra factum proprium', segundo a qual ninguém é lícito fazer valer um direito em contradição com a sua conduta anterior ou posterior interpretada objetivamente, segundo a lei, os bons costumes e a boa-fé" [STJ, REsp 1192678/PR, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 13/11/2012, DJe 26/11/2012], pois a empresa embargada detinha conhecimento prévio e anterior sobre a existência da garantia cedular e, ainda assim, celebrou o contrato, inclusive recebendo, posteriormente, o produto”.

Logo, sendo pública e notória a prévia existência de garantia de penhor devidamente registrada na matrícula do imóvel, a parte embargante poderia não contratar, mas ainda assim o fez, não cabendo a alegação da existência do referido ônus para o fim de justificar o inadimplemento do pagamento do valor devido pelo fornecimento, especialmente ao se considerar que as partes pactuaram expressamente a possibilidade de a embargante reter o pagamento tão somente para o caso de não entrega do produto, ajuste que por certo levou em conta a pública existência de gravame anterior de penhor.

Exigência de liberação ou anuência do credor do penhor também é injusta e desproporcional, na medida em que o embargado possuía outro imóvel livre de ônus, o qual poderia servir para eventual satisfação da garantia prestada, além de que, é bom lembrar, o fato de o embargado contrair nova obrigação não conduz à necessária ilação de que irá inadimplir as obrigações já pendentes.

Justificativa de exceção de contrato não cumprido e conseguinte inexigibilidade da obrigação para o não pagamento do preço premia o enriquecimento sem causa, já que o embargado cumpriu sua parte no contrato entregando a quantidade de milho contratada, o que não deve ser admitido.

Ausente manifesta conduta processualmente maliciosa praticada pela parte recorrente, a qual, diante de decisão que lhe foi desfavorável, valeu-se do recurso adequado almejando a reforma em aparente exercício regular de direito, não havendo que se falar em imposição de multa por litigância de má-fé.

Recurso desprovido. Sentença mantida. Honorários majorados.


TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO

APELAÇÃO CÍVEL Nº 0010103-19.2015.8.11.0015

APELANTE: BUNGE ALIMENTOS S/A

APELADO: TARCISIO SCHNEIDER

RELATÓRIO

EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA)

Egrégia Câmara:

Trata-se de recurso de apelação interposto por BUNGE ALIMENTOS S/A, contra sentença proferida pelo juízo da 3ª Vara da Comarca de Sinop, Dr. Cristiano Dias Fialho, o qual, nos autos dos Embargos à Execução nº. 0010103-19.2015.8.11.0015, ajuizada pela parte apelante contra o apelado TARCISIO SCHNEIDER, julgou improcedente o pedido veiculado na inicial, condenando ainda a parte embargante nas custas do processo e em honorários arbitrados em 15% do valor atualizado da causa.

Nas razões do apelo de Id. 173498191, a parte apelante aduz que o contrato de compra e venda executado não é exigível, porque há comprovadamente um penhor agrícola que recai sobre a mercadoria adquirida, de modo que a recorrente não pode efetuar o pagamento ajustado, não sem antes aquela garantia ser devidamente baixada”, sendo “inexigível enquanto perdurar a penhora sobre os grãos de milho relativos à safra de 2014”, o que impõe que “o Recorrido satisfaça o penhor, ou obtenha, junto aos credores pignoratícios, a apresentação da liberação do recebimento do preço ajustado, relativo a venda dos grãos de milho” (sic).

Argumenta “que se há uma discussão sobre a exigibilidade do valor devido, sendo necessário fazer prova da quitação dos credores pignoratícios e baixa do penhor mercantil existente sobre a mercadoria, certamente não se pode dizer que a relação contratual entre as partes enseja a existência de um título executivo extrajudicial exigível”, o que impõe a “extinção da Ação de Execução, em face da clara e evidente ausência de título extrajudicial, em razão de sua inexigibilidade, sendo certo que o contrato firmado entre as partes não pode ser assim considerado, ainda que estejam assinados por duas testemunhas” (sic).

Assevera que enquanto o Recorrido não extinguir o penhor, tendo em vista que realizou a venda da coisa empenhada (safra de milho de 2014), a Recorrente não pode quitar o valor do contrato firmado”, sendo “sabido que o Recorrido pode responder, ainda, por eventual crime de defraudação de garantia, caso fique comprovado que alienou à Recorrente bem já gravado com penhor mercantil a favor de terceiro, embora esta (Recorrente) só tenha tomado ciência do fato em momento posterior à compra da mercadoria e, sequencialmente, tenha tomado a precaução de notificar o Recorrido acerca de tais fatos” (sic).

Pontua que “tem o dever de NÃO colaborar com possível ilícito de defraudação de penhor, somente podendo adimplir a mercadoria adquirida quando credor pignoratício – C. VALE COOPERATIVA AGROINDUSTRIAL (CNPJ: 77.863.223/0001-70) venha a consentir com o pagamento da mercadoria adquirida, em favor do Recorrido”, sendo que “o Recorrido não cumpriu com todas as suas obrigações, posto que se omitiu e quedou-se inerte diante comprovada existência de Penhor Agrícola sobre a mercadoria vendida a Recorrente” (sic), incidindo a exceção de contrato não cumprido disposta no art. 476 do CC.

A par desses argumentos, pede que o recurso seja “CONHECIDO E PROVIDO, para a reforma da respeitável sentença em todos os pontos debatidos, acolhendo-se as preliminares ou, para que a presente demanda seja JULGADA TOTALMENTE PROCEDENTE em face da ausência de respaldo jurídico a pretensão da Recorrida” (sic).

Certidão de tempestividade recursal e de recolhimento do preparo constante no Id. 173498193.

Intimada, a parte apelada apresenta contrarrazões na peça de Id. 173498195, argumentando, em síntese, a correção da sentença recorrida. Pede seja negado provimento ao apelo, mantendo incólume a decisão recorrida, pedindo também que “diante do abuso do direito de defesa, que seja a recorrente condenada por litigância de má-fé, pois apesar de useira e vezeira a alegação de estar defendendo direito que é de terceiros (não poderia estar postulando em nome próprio), em nenhum momento fala em pagar por aquilo que está usufruindo há mais de 9 anos” (sic).

É o relatório.


VOTO

EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA)

Egrégia Câmara:

Conforme relatado, cinge-se a controvérsia em aferir a correção ou não da sentença que julgou improcedentes os embargos à execução ajuizados pela parte apelante.

Preparado, adequado e tempestivo, CONHEÇO o apelo interposto, o que faço com fulcro no artigo 1.009 do Código de Processo Civil.

Pois bem.

Antes de adentrar a análise da insurgência recursal, a fim de ilustrar a controvérsia, entendo pertinente trazer à...

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