Acórdão Nº 0010210-91.2015.8.24.0018 do Quarta Câmara Criminal, 27-01-2022

Número do processo0010210-91.2015.8.24.0018
Data27 Janeiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Tipo de documentoAcórdão
Recurso em Sentido Estrito Nº 0010210-91.2015.8.24.0018/SC

RELATOR: Desembargador SIDNEY ELOY DALABRIDA

RECORRENTE: JOSE ALCERIO DOS SANTOS (ACUSADO) E OUTROS ADVOGADO: JAIME CECCON (OAB SC027393) RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) ASSISTENTE DE ACUSAÇÃO: CLAUDENIR ANTUNES DE PAULA (OFENDIDO) ADVOGADO: ALEXANDRE SANTOS CORREIA DE AMORIM

RELATÓRIO

Na comarca de Chapecó, o órgão do Ministério Público ofereceu denúncia em face de Joelso Adilio dos Santos, imputando-lhe a prática do delito previsto no art. 121, § 2º, II e IV, c/c os arts. 14, II, e 29, todos do Código Penal, e art. 14 da Lei n. 10.826/03, c/c o art. 69 do CP; e contra Antonio Rudinei dos Santos e José Alcerio dos Santos, imputando-lhes o cometimento do delito previsto no art. 121, § 2º, II e IV, c/c os arts. 14, II e art. 29, todos do CP, pois, segundo se infere da inicial:

Consta dos autos que no dia 30 de maio de 2011, no "Campo de Futebol do Bili", ocorreu um desentendimento entre os denunciados Joelso Adilio dos Santos e Antonio Rudinei dos Santos e a vítima Claudenir Antunes de Paula, o qual foi travado durante uma partida de futebol em que integravam times contrários, e desde então, firmou-se entre eles uma inimizade.

No decorrer dos meses, e anos, a inimizade foi cultivada pelos denunciados, e, irmãos, José, Joelson e Antonio, os quais, constantemente, ao depararem-se com a vítima, aceleravam seus veículos e a encaravam, em manifesta intenção provocativa.

No dia 30 de março de 2.015, por volta das 16 horas, na Rua Delcio Weber, Bairro Quedas do Palmital, em Chapecó/SC, a vítima trafegava em via pública, com seu veículo Honda Civic, tendo como caroneiras sua esposa e sua filha de três anos de idade, quando foram abalroados, propositalmente, na traseira, por um veículo Corsa, de cor vermelha, conduzido pelo denunciado Joelso Adilio dos Santos, e também ocupado pelos denunciados José Alcerio dos Santos e Antonio Rudinei dos Santos.

Devido a colisão, a vítima desembarcou do automóvel, momento em que os denunciados, Joelso Adilio dos Santos, Antonio Rudinei dos Santos e José Alcerio dos Santos, de forma consciente e voluntária, cientes da ilicitude e reprovabilidade de suas condutas, em comunhão de esforços e desígnio de vontades, um aderindo à conduta do outro, desceram do veículo Corsa, todos munidos com armas de fogo, entre elas, um revólver marca Taurus, calibre .38, portada por Joelson - e, com manifesto animus necandi, desferiram diversos disparos contra Claudemir, descarregando as armas, na nítida intenção de matá-lo.

Contudo, ao perceberem que não haviam logrado êxito em ceifar a vida vítima, que, na tentativa de proteger-se, mesmo ferido, buscou abrigo atrás de um poste e arremessou pedras contra os agressores, o denunciado José Adilio dos Santos, recarregou rapidamente a arma que portava e, sob o incentivo dos denunciados Antonio e Joelson que gritavam "Vamo, Vamo que ele caiu, Vamos matar!", desferiu outros disparos, alvejando-o novamente. Em sequência, os denunciados embarcaram no veículo Corsa, e evadiram-se do local.

Dos disparos efetuados contra a vítima pelos denunciados, (ao menos sete), dois atingiram-na, sendo um na região inguinal esquerda, e outro, no tórax lateral esquerdo, perfurando o rim esquerdo, baço, pâncreas, diafragma e pulmão esquerdo, bem como, ocasionaram escoriações no braço esquerdo, coxa direita e joelho direito, provocando-lhe os graves ferimentos que são noticiados no laudo de fl. 110 (hemopneumotórax esquerdo), com possibilidade de sequelas irreversíveis.

Os denunciados Joelso Adilio dos Santos, Antonio Rudinei dos Santos e José Alcerio dos Santos, então, iniciaram a execução de um homicídio que, só não se consumou por circunstâncias alheias à suas vontades, mormente, pela pronta e rápida ação de socorro prestada à vítima. Todos os denunciados, de qualquer forma, concorreram e ou participaram do crime, tendo em conta que, além de desferirem disparos de arma de fogo contra à vítima, também incentivaram o denunciado Adilio a desferir mais disparos contra ela, com manifesta intenção de cerifar-lhe a vida, culminando com o resultado noticiado.

O ato delituoso, foi perpetrado por motivo fútil, já que, diante de um desentendimento futebolístico travado entre os denunciados e a vítima há tempos atrás, movidos por desprezível sentimento de represália, resolveram ceifar a vida de Claudemir Antunes de Paula.

De outro lado, a vítima estava desarmada, e foi abordada e alvejada de forma repentina, quando trafegava com seu veículo, juntamente com sua esposa e filha, em via pública, de forma despreocupada, e não tinha razões, próximas ou remotas de esperar um ataque dessa envergadura e, sem condições de poder esboçar o mínimo gesto defensivo.

A arma de fogo utilizada no ataque pelo denunciado Joelso Adilio dos Santos, tratava-se de um revólver marca Taurus, calibre .38 special, capacidade para 6 tiros, número de fabricação EN358791 (fl. 21), que foi empregada e portada por ele na ocasião, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar (Evento 7, PET147, fls. 2-4, autos originários).

Finalizada a instrução preliminar, a Magistrada a quo julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na denúncia, a fim de:

a) Pronunciar José Alcerio dos Santos, Joelso Adilio dos Santos e Antonio Rudinei dos Santos como incursos nas sanções do art. 121, § 2º, II, c/c o art. 14, II, ambos do Código Penal, para submetê-los a julgamento pelo Tribunal do Júri;

b) Impronunciar José Alcerio dos Santos pela prática do delito previsto no art. 14 da Lei n. 10.826/03, nos termos do art. 414 do Código de Processo Penal (Evento 157, SENT333, autos originários).

Inconformados com a prestação jurisdicional, o réus interpuseram recurso em sentido estrito. Joelso Adilio dos Santos e Antonio Rudinei dos Santos pugnaram pela impronúncia, porquanto não há provas de suas participações no fato criminoso. Por sua vez, José Alcerio dos Santos requereu o afastamento da qualificadora do motivo fútil, ao argumento de que agiu sob a excludente da legítima defesa (Evento 165, RSE340, autos originários).

Apresentadas as contrarrazões (Evento 178, CONTRAZ1, autos originários) e exarado despacho de manutenção do decisum (Evento 180, DESPADEC1, autos originários), a douta Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio do Exmo. Dr. José Eduardo Orofino da Luz Fontes, manifestou-se pelo conhecimento e não provimento do reclamo (Evento 13, PROMOÇÃO1).

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conhece-se do recurso.

1 Joelso Adilio dos Santos e Antônio Rudinei dos Santos pugnam pela impronúncia, uma vez que estaria comprovado nos autos que não tiveram participação nos fatos.

Ainda, José Alcerio dos Santos alega que agiu sob a excludente de ilicitude da legítima defesa e, com isso, busca o afastamento da qualificadora do motivo fútil.

Razão, contudo, não lhes assiste.

De partida, convém registrar que há mero equívoco na denúncia quanto ao ano dos fatos, pois apesar de constar 2015 (Evento 7, PET147) o delito ocorreu em 2014 (Evento 1, INQ2, ambos dos autos originários).

Como é cediço, em se tratando do procedimento criminal de competência do Tribunal do Júri, para a pronúncia do acusado é suficiente que se constate prova da materialidade do delito e indícios suficientes de autoria (art. 413 do Código de Processo Penal).

Isso porque se trata de uma decisão interlocutória, de caráter processual que, encerrando a fase de formação da culpa, tem por objetivo simplesmente julgar a admissibilidade da imputação para fins de submissão do acusado a julgamento popular.

Para tanto, nessa etapa do procedimento escalonado, quanto à prova produzida, procede-se a uma operação cognitiva não exauriente, já que não se pode exigir a formação de um juízo de certeza, mas apenas de probabilidade fundada.

Como consequência de seu caráter meramente declaratório, logicamente, não se pode exigir prova plena acerca da autoria delitiva, até porque, havendo dúvida razoável a respeito, uma vez presente prova da materialidade e indícios suficientes da autoria, deverá ela ser solucionada pelo juízo natural dos crimes contra a vida.

Acerca do tema, Fernando da Costa Tourinho Filho explica:

Dês que haja prova da materialidade do fato e indícios suficientes de que o réu foi o seu autor, deve o Juiz pronunciá-lo. A pronúncia é decisão de natureza processual (mesmo porque não faz coisa julgada), em que o Juiz, convencido da existência do crime, bem como de que o réu foi seu autor (e procura demonstrá-lo em sua decisão), reconhece a competência do Tribunal do Júri para proferir o julgamento (Código de processo penal comentado. v. 2. 15. ed. Saraiva: São Paulo, 2014. p. 80).

Na mesma linha de raciocínio, assinala Renato Brasileiro de Lima:

Assim, se o juiz sumariante estiver convencido da existência do crime e da presença de indícios suficientes de autoria ou de participação, deve pronunciar o acusado, de maneira fundamentada. Há na pronúncia um mero juízo de prelibação, por meio do qual o juiz admite ou rejeita a acusação, sem qualquer valoração acerca do mérito. Julga-se admissível o ius accusationis. Restringe-se à verificação da presença do fumus boni iuris, admitindo todas as acusações que tenham ao menos probabilidade de procedência (Manual de Processo Penal. 4. ed., Salvador: JusPodivm, 2016. p. 1336).

A decisão de impronúncia, por sua vez, somente subsiste no caso de o magistrado não se convencer "da materialidade do fato ou da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação" (art. 414 do Código de Processo Penal).

Justamente pelo seu caráter terminativo, que implica no afastamento de competência constitucional, a impronúncia é medida excepcional, que deve ser reservada às hipóteses em que sequer é possível reconhecer a probabilidade de sucesso da pretensão acusatória.

No caso dos autos, a materialidade delitiva está demonstrada pelo boletim de ocorrência (Evento 1, INQ2-INQ4), pelos termos de exibição e...

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