Acórdão Nº 0010501-79.2017.8.24.0064 do Terceira Câmara Criminal, 05-07-2022

Número do processo0010501-79.2017.8.24.0064
Data05 Julho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0010501-79.2017.8.24.0064/SC

RELATOR: Desembargador LEOPOLDO AUGUSTO BRÜGGEMANN

APELANTE: GUARACIARA ARISTIDES DOS SANTOS (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Na comarca de São José, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Guaraciara Aristides dos Santos, dando-a como incursa nas sanções do art. 155, § 4° IV, c/c art. 14, II, ambos do Código Penal, e art. 244-B do Estatuto da Criança e do Adolescente, na forma do art. 69 do Código Penal, pela prática das condutas assim descritas na inicial acusatória:

Constam das informações colhidas neste caderno indiciário que no dia 23 de novembro de 2017, por volta da 15h30min, a denunciada Guaraciara Aristides dos Santos, juntamente com a criança Lauana A. D. S. (10 anos), sua filha, corrompida pela denunciada para a prática criminosa, previamente ajustadas e agindo em comunhão de desígnios, com evidente animus furandi, objetivando lucro fácil em detrimento do patrimônio alheio, dirigiram-se até o estabelecimento comercial Bistek, localizado na rua Constancio Krumel, bairro Praia Comprida, nesta cidade, ocasião em que tentaram subtrair para elas: 02 (dois) produtos de higiene capilar marca Elseve; 01 (um) produto de higiene capilar marca Tralala; 01 (um) condicionador marca Niele Gold; 02 (dois) repelentes marca Off; 01 (um) desodorante marca Rexona; 02 (dois) desodorantes femininos, marca Rexona; 02 (dois) condicionadores marca Elseve; 01 (um) condicionador marca Seda; 01 (um) amaciante de carne maca Maggi; 02 (dois) shampoos marca Elseve; 01 (um) desodorante masculino marca Rexona; 01 (um) shampoo marca Gold; 02 (dois) desodorantes marca Dove; 02 (dois) temperos marca Sazon; 01 (um) desodorante corporal marca Paixão; 01 (um) aparelho de barbear marca Venus com uma unidade; 02 (dois) aparelhos de barbear marca Venus com duas unidades; 02 (dois) aparelhos de barbear marca Prestobarba comuma unidade; 02 (dois) amarradores de cabelos; 01 (um) creme de pentear marca Palmolive; 02 (dois) cremes de pentear marca Palmolive; 01 (um) protetor solar fator 50; 03 (três) desodorantes rolon marca Dove; 01 (um) shampoo Jhonson; 01 (um) desodorizador marca Coala; 01 (uma) colônia Huggies; 01 (um) produto de higiene capilar marca Nyele; 01 (um) reparador de cabelo marca Niely, totalizando R$ 613,70 (seiscentos e treze reais e setenta centavos), não obtendo êxito em sua empreitada criminosa por circunstâncias alheias a sua vontade, eis que foram surpreendidas pelos seguranças do estabelecimento no estacionamento do local, após passarem pelo caixa sem que tivessem efetuado pagamento pelos produtos listados na nota fiscal de p. 20.

Na ocasião, a denunciada Guaraciara adentrou no estabelecimento vítima acompanhada de suas filhas menores Lohana A. D. S. (04 anos) e Lauana A. D. S. (10 anos), ocasião em que colocou a mais nova na cadeira do carrinho de compras e passou a transitar entre os corredores do estabelecimento, ocasião em que, com o auxílio de sua filha Lauana A. D. S. (10 anos), corrompida pela denunciada Guaraciara a com ela praticar a infração penal, passou a colocar os produtos anteriormente descritos em sua bolsa pessoal, a qual estava no interior do carrinho de compras, mascarada em meio a outros produtos.

Em seguida, após passarem no caixa e efetuarem o pagamento de apenas alguns produtos, a denunciada Guaraciara foi detida no estacionamento do local pelos seguranças do estabelecimento que perceberam a ação delitiva, de modo que ela não obtive êxito na empreitada criminosa por circunstâncias alheias a sua vontade. (ev. 28)

Concluída a instrução do feito, a denúncia foi julgada parcialmente procedente para absolver a acusada quanto ao crime previsto no art. 244-B do Estatuto da Criança e do Adolescente, com base no art. 386, II, do Código de Processo Penal e para condená-la às penas de 8 (oito) meses de reclusão, em regime inicial aberto, e ao pagamento de 6 (seis) dias-multa, quantificada a unidade em 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo vigente à época dos fatos, por infração ao disposto no art. 155, caput, c/c artigo 14, II, art. 65, III, alínea "d", todos do Código Penal. Foi-lhe concedido o benefício da substituição da pena corporal por uma restritiva de direitos, qual seja, prestação de serviços à comunidade, bem como o direito de recorrer em liberdade. (ev. 101)

Irresignada, a defesa interpôs recurso de apelação, no qual, preliminarmente, suscitou a preliminar de nulidade por cerceamento de defesa, uma vez que a denúncia foi genérica, não observando os requisitos previstos no art. 41 do Código de Processo Penal. No mérito, rogou pela absolvição da acusada ao argumento de insuficiência probatória, especialmente quanto à autoria delitiva. Ainda, de forma subsidiária, requereu seja a pena aplicada "no mínimo legal, ou até mesmo abaixo do mínimo legal" e substituída "pela pena restritiva de direito de prestação de serviços à comunidade". Também, pleiteou o direito de apelar em liberdade e que seja deferida a justiça gratuita, isentando a defendida do pagamento das custas processuais e da multa imposta. Por fim, requereu que sejam arbitrados honorários advocatícios ao defensor dativo pela apresentação das razões recursais. (ev. 146)

Juntadas as contrarrazões (ev. 151), ascenderam os autos a esta instância, e a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Marcílio de Novaes Costa, opinou pelo parcial conhecimento do recurso, uma vez que o pedido de concessão dos benefícios da justiça gratuita é atinente ao juízo de primeiro grau, a prefacial de cerceamento de defesa por inépcia da denúncia, também não comporta análise, sob pena de incorrer em supressão de instância, assim como, os pedidos para fixação da pena no mínimo legal, substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos e pelo direito de recorrer em liberdade carecem de interesse recursal e, nesta extensão, pelo seu parcial provimento, tão somente para deferir o pleito de arbitramento de honorários advocatícios ao defensor dativo, mantida a condenação. (ev. 12 SG)

Este é o relatório.

VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto pela defesa contra decisão que julgou procedente em parte a denúncia e condenou a acusada às sanções previstas no art. 155, caput, c/c artigo 14, II, art. 65, III, alínea "d", todos do Código Penal.

Presentes os requisitos objetivos e subjetivos de admissibilidade, porém, o apelo deve ser conhecido em parte, conforme se verá adiante.

1. Preliminar

Do cerceamento de defesa por inépcia da denúncia

Em preliminar, a defesa arguiu a inépcia da denúncia, alegando que restou cerceada a ampla defesa e o contraditório da acusada, tendo em vista que a exordial apresentou-se genérica, sem observar os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal.

Ora, não deve prosperar a prefacial, primeiro, porque alegada manifestamente fora do momento processual cabível, consoante determina o art. 569 do Código de Processo Penal, assim in verbis: "as omissões da denúncia [...] poderão ser supridas a todo tempo, antes da sentença final" (grifei).

Colhe-se da jurisprudência desta Câmara Criminal:

APELAÇÃO CRIMINAL. ROUBOS DUPLAMENTE CIRCUNSTANCIADOS (EMPREGO DE ARMA DE FOGO E CONCURSO DE AGENTES). CONTINUIDADE DELITIVA. RECURSOS DA DEFESA E DO MINISTÉRIO PÚBLICO. RECURSO DEFENSIVO. PRELIMINAR DE INÉPCIA DA DENÚNCIA. AUSÊNCIA DE ARGUIÇÃO NO MOMENTO OPORTUNO. MATÉRIA PRECLUSA. DICÇÃO DO ART. 569 DO CPP. PREFACIAL AFASTADA. ROUBO AO "SUPERMERCADO CASA NOSSA". RESPONSABILIDADE PENAL DEFINIDA EM PRIMEIRO GRAU PELO MODUS OPERANDI E PELA SIMILITUDE ENTRE AS VESTES E A POSTURA DO APELANTE E AS DO AUTOR DO CRIME. RECONHECIMENTO FALHO. AUSÊNCIA DE OUTROS ELEMENTOS DE PROVA A SUSTENTAR A PARTICIPAÇÃO DO AGENTE NA EMPREITADA DELITIVA. ABSOLVIÇÃO QUANTO A ESTE INJUSTO. INTELIGÊNCIA DO ART. 386, VII, DO CPP. [...] (TJSC, Apelação Criminal (Réu Preso) n. 2011.045240-9, de Lages, rel. Des. Torres Marques, j. 23-08-2011 - grifou-se).

Segundo, que colhe-se da leitura atenta dos autos que a proemial, cumpriu todos os requisitos determinados pelo art. 41 do CPP, pois descreveu a ação criminosa - furto simples e corrupção de menores -, a qualificação da acusada, a classificação do delito e trouxe o respectivo rol de testemunhas.

É do Superior Tribunal de Justiça: "Não é inepta a denúncia que descreve fatos que, em tese, apresentam feição de crime e oferece condições plenas para o exercício da defesa" (RT 725/526).

Do nosso Sodalício, colhe-se:

DENÚNCIA. PRELIMINAR DE INÉPCIA. INOCORRÊNCIA. SE A DENÚNCIA DESCREVE O FATO TÍPICO IMPUTADO AOS ACUSADOS, PROPICIANDO AMPLA DEFESA, NÃO PODE SER CONSIDERADA INEPTA, MUITO MENOS O ALEGADO ABUSO DE PODER MINISTERIAL, UMA VEZ QUE, EM NENHUM MOMENTO HOUVE DIFICULDADE NA ELABORAÇÃO DA DEFESA. INTELIGÊNCIA DO ART. 41 DO CPP. REJEITADA, PORTANTO, A PRELIMINAR DE INÉPCIA DA DENÚNCIA. [...] (Apelação Criminal n. 31.177, de São José, rel. Des. Cláudio Marques).

Incabível, pois, a...

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