Acórdão Nº 0010518-14.2017.8.24.0033 do Terceira Câmara Criminal, 15-12-2020

Número do processo0010518-14.2017.8.24.0033
Data15 Dezembro 2020
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 0010518-14.2017.8.24.0033/SC



RELATOR: Desembargador LEOPOLDO AUGUSTO BRÜGGEMANN


APELANTE: LUCAS FAGUNDES AMANDIO APELANTE: SAMUEL ROSENDO DA SILVA APELANTE: ALCEMIR AMORIM APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA


RELATÓRIO


Na comarca de Itajaí, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Alcemir Amorim, Samuel Rosendo da Silva e Lucas Fagundes Amandio, dando-os como incursos nas sanções do art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006, pela prática das condutas assim descritas na inicial acusatória:
No dia 3 de outubro de 2017, por volta das 20h40min, na servidão Ivo Atanásio Veiga, 105, bairro Fazenda, nesta cidade, o denunciado Alcemir Amorim, agindo sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar e mediante união de desígnios e esforços com os denunciados Lucas Fagundes Amandio e Samuel Rosendo da Silva, trazia consigo, acondicionadas em sua mochila, 50 (cinquenta) porções da substância causadora de dependência física e psíquica cocaína na forma petrificada - crack - , o que fazia com fins de comercialização, fornecimento e distribuição.
Na mesma circunstância temporal, o ora denunciado Lucas, em conluio com Alcemir e Samuel, agindo sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, mantinha em depósito, no interior de sua residência, situada no local supramencionado, 12 (doze) porções da substância causadora de dependência física e psíquica conhecida como cocaína, 8 (oito) porções da substância causadora de dependência física e psíquica cannabis sativa lineu - vulgarmente conhecida como maconha -, e 17 (dezessete) porções da substância causadora de dependência física e psíquica cocaína na forma petrificada (crack), embaladas e acondicionadas individualmente para venda.
Outrossim, na mesma data e hora, o denunciado Samuel, agindo em união de esforços e desígnios com seus asseclas, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, mantinha em depósito, no interior de sua residência, localizada no mesmo terreno, no aludido endereço, 6 (seis) porções da substância causadora de dependência física e psíquica cannabis sativa lineu - maconha -, o que também fazia com fins de comercialização, fornecimento e distribuição.
Ocorre que os Policiais Militares Marcelo Mussi Lara e Rafael Vicente Marcondes receberam denúncias ao longo da semana, narrando o comércio de entorpecentes naquela localidade, de modo que compareceram ao local e visualizaram os denunciados, que ao perceber a presença dos agentes públicos adentraram no terreno, ao qual as residências de Lucas e Samuel se situam, contudo restaram abordados ainda no pátio deste.
Ato contínuo, os militares encontraram em posse de Alcemir os ilícitos supramencionados, além de 1 (um) caderno contendo anotações da contabilidade da narcotraficância e R$ 345,70 (trezentos e quarenta e cinco reais e setenta centavos), em espécies de pequeno valor, oriundas da mercancia ilícita.
Dessa forma, procederam buscas na residência de Lucas, ocasião que apreenderam, além dos referidos estupefacientes, R$ 510,00 (quinhentos e dez reais) em espécies miúdas, 1 (um) prato, 1 (uma) faca, 2 (duas) lâminas metálicas e 1 (um) rolo de plástico filme, utilizados no fracionamento e individualização da droga, e ainda 3 (três) aparelhos celulares, pertencentes aos denunciados, nos quais continham conversas inerentes ao comércio de entorpecentes.
Destarte, na residência de Samuel, visualizaram Rafael Tavares Schneider, indivíduo que os militares conheciam como sendo usuário de drogas, e inclusive admitiu estar no local para adquirir entorpecentes, de modo que encontraram a respectiva droga, 1 (uma) balança de precisão, 1 (um) rolo de plástico filme e R$ 470,00 (quatrocentos e setenta reais) em espécie.
Diante disso, os policiais deram voz de prisão aos denunciados e conduziram todos até a autoridade policial para a tomada das providências cabíveis (p. 69-71).
Concluída a instrução do feito, a denúncia foi julgada procedente para condenar os acusados às penas de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão, em regime inicial aberto, e ao pagamento de 250 (duzentos e cinquenta) dias-multa, em seu mínimo legal, por infração ao disposto no art. 33, caput, c/c § 4º, da Lei n. 11.343/2006. A pena privativa de liberdade foi substituída por duas restritivas de direitos, a saber, prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária. Foi-lhes concedido o direito de apelar em liberdade (p. 369-392).
Irresignada, a defesa de Lucas e Samuel interpôs recurso de apelação e arguiu, preliminarmente, a nulidade das provas obtidas, em razão da violação de domicílio. No mérito, pugnou pela absolvição de Samuel, com fulcro no art. 386, inciso VII, do CPP. Subsidiariamente, postulou a desclassificação da conduta imputada para a prevista no art. 28, caput, da Lei n. 11.343/2006 ou para aquela disposta no art. 33, § 3º, do mesmo diploma legal. Ainda, em relação à dosimetria, arguiu a inconstitucionalidade da Súmula 231 do STJ e pugnou pela mitigação das penas para aquém do mínimo legal, tendo em vista o reconhecimento, em favor de Lucas, das atenuantes da menoridade relativa e da confissão espontânea, e da menoridade relativa em favor de Samuel (p. 427-442).
Também inconformada, a defesa de Alcemir Amorim interpôs recurso de apelação e arguiu, preliminarmente, a nulidade das provas obtidas, em razão da violação de domicílio No mérito, pugnou pela aplicação da atenuante da menoridade relativa, ainda que a pena base tenha sido fixada no mínimo legal (p. 455-468).
Juntadas as contrarrazões (p. 472-480), ascenderam os autos a esta instância, e a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Rui Arno Richter, opinou pelo conhecimento e não provimento dos recursos interpostos (p. 490-499).
É o relatório

VOTO


Trata-se de recursos de apelação interpostos pelas defesas contra decisão que julgou procedente a denúncia para condenar os acusados pelo crime previsto no art. 33, caput, c/c § 4º, da Lei n. 11.343/2006.
Os apelos devem ser conhecidos, porquanto presentes os requisitos objetivos e subjetivos de admissibilidade.
Da inviolabilidade de domicílio
Preliminarmente, em uma só voz, as defesas buscam a nulidade da prisão em flagrante, tal como das provas subsequentes, em decorrência da violação de domicílio, porque a diligência ocorreu sem ordem judicial.
A tese não procede.
Isso porque, no contexto que envolve o caso concreto - como melhor se verá quando da análise do mérito -, havia denúncias de o local funciona como ponto de venda de drogas. No dia dos fatos, policiais realizaram incursão e, ao se aproximarem, foram avistados pelos apelantes, que tentaram empreender fuga para dentro dos imóveis, mas acabaram sendo abordados ainda nos pátios das residências. Realizada a busca pessoal, dentro da mochilla de Alcemir os militares apreenderam 50 (cinquenta) pedras de crack, além de R$ 345,70 (trezentos e quarenta e cinco reais e setenta centavos) e um caderno com anotações do tráfico.
Desse modo, diante das prévias denúncias e da evidente situação flagrancial do crime de tráfico de drogas - delito de natureza permanente -, era prescindível autorização judicial para realização de busca e apreensão em domicílio, onde foram encontrados o restante dos entorpecentes e demais apetrechos para a prática do tráfico de drogas, pelo que as provas decorrentes da referida diligência não estão tomadas de nulidade, porque os informes davam conta de que no local estavam ocorrendo crimes, de cunho permanente.
O art. 5º, XI, da Constituição da República ressalva a possibilidade: "XI - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial".
O Supremo Tribunal Federal, em recurso representativo de controvérsia, confirmou a desnecessidade de autorização judicial para a violação domiciliar, nas hipóteses de crimes permanentes. Veja-se:
Recurso extraordinário representativo da controvérsia. Repercussão geral. 2. Inviolabilidade de domicílio - art. 5º, XI, da CF. Busca e apreensão domiciliar sem mandado judicial em caso de crime permanente. Possibilidade. A Constituição dispensa o mandado judicial para ingresso forçado em residência em caso de flagrante delito. No crime permanente, a situação de flagrância se protrai no tempo. 3. Período noturno. A cláusula que limita o ingresso ao período do dia é aplicável apenas aos casos em que a busca é determinada por ordem judicial. Nos demais casos - flagrante delito, desastre ou para prestar socorro - a Constituição não faz exigência quanto ao período do dia. 4. Controle judicial a posteriori. Necessidade de preservação da inviolabilidade domiciliar. Interpretação da Constituição. Proteção contra ingerências arbitrárias no domicílio. Muito embora o flagrante delito legitime o ingresso forçado em casa sem determinação judicial, a medida deve ser controlada judicialmente. A inexistência de controle judicial, ainda que posterior à execução da medida, esvaziaria o núcleo fundamental da garantia contra a inviolabilidade da casa (art. 5, XI, da CF) e deixaria de proteger contra ingerências arbitrárias no domicílio (Pacto de São José da Costa Rica, artigo 11, 2, e Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, artigo 17, 1). O controle judicial a posteriori decorre tanto da interpretação da Constituição,...

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