Acórdão Nº 0010677-64.2012.8.24.0054 do Sétima Câmara de Direito Civil, 22-09-2022

Número do processo0010677-64.2012.8.24.0054
Data22 Setembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSétima Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0010677-64.2012.8.24.0054/SC

RELATOR: Desembargador ÁLVARO LUIZ PEREIRA DE ANDRADE

APELANTE: COOPERATIVA REGIONAL AGROPECUARIA VALE DO ITAJAI APELADO: REGINALDO DA SILVA APELADO: LUCELIA HENNING DA SILVA

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto contra a sentença proferida na ação de reparação por danos materiais e morais que movem os apelados em face da apelante, na qual o Magistrado de origem julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial.

Adota-se o relatório da decisão recorrida (Evento 29 - PROCJUDIC12 - pp. 151-152 - SAJ2G):

"Reginaldo da Silva e Lucélia Henning da Silva ajuizaram ação indenizatória contra Cravil - Cooperativa Regional Agropecuária do Alto Vale do Itajaí Ltda, aduzindo, em síntese, serem legítimos proprietários do imóvel matriculado sob o nº 24075, localizado na rua Expedicionário Menelau Claudino dos Santos. Acrescentaram que a ré, no ano de 2010, ao executar obras nos fundos de sua sede, deu causa a diversos deslizamentos que atingiram, dentre outras, a rua onde localizada sua residência. Disseram que a situação acabou agravada com as cheias que ocorreram naquele ano e culminou com a interdição de várias residências, incluindo aquela de sua propriedade, por se tratar de área de risco. Daí os pedidos formulados para a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos materiais e morais. Procuração e documentos vieram aos autos.

Citada, a ré ofereceu resposta em forma de contestação e nela alegou, em preliminar, a ilegitimidade passiva, enquanto no mérito defendeu que os danos causados ao imóvel dos autores decorrem de força maior e da existência de deformidade geomorfológica naquele local. Por fim, argumentou da ausência do nexo de causalidade, rechaçou as pretensões indenizatórias e clamou a improcedência.

Houve réplica.

Em saneamento, rejeitou-se a preliminar e deliberou-se pela produção de prova pericial, decisão contra a qual a ré interpôs recurso de agravo retido.

Com a juntada do laudo, as partes ofereceram manifestação.

É o relatório".

Acrescenta-se que a sentença foi publicada na data de 12-3-2018, de cujo dispositivo extrai-se:

"Diante do exposto, julgo procedentes em parte os pedidos formulados para condenar a ré à reparação dos danos emergentes, em favor dos autores, no importe de R$ 240.000,00 (duzentos e quarenta mil reais), acrescido de juros de mora de 1% (um por cento ao mês) desde o evento danoso - aqui considerado a interdição do imóvel - e correção monetária pelo INPC a partir da confecção do laudo pericial, além do reembolso dos valores desembolsados com moradia provisória, desde outubro de 2011 até o pagamento da indenização, a serem apurados em liquidação de sentença, acrescidos de juros de mora de 1% (um por cento ao mês) desde o evento danoso e correção monetária pelo INPC a partir de cada desembolso. No mais, condeno a ré à reparação dos danos morais experimentados pelos autores, no montante de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), acrescido de juros de mora de 1%(um por cento ao mês) desde o evento danoso e correção monetária pelo INPC a partir desta data. Majoritariamente sucumbente (art. 86, parágrafo único, do NCPC), arca a ré, sozinha, com as despesas processuais e honorários advocatícios fixados em 15% (quinze por cento) sobre o proveito econômico obtido pelos autores (art. 85, § 2º do NCPC).

De imediato, liberem-se os honorários periciais (art. 465, § 4º do NCPC).

Publique-se. Registre-se. Intimem-se".

Inconformada, a parte ré interpôs recurso de apelação (Evento 29 - PROCJUDIC12 - pp. 175-213 - SAJ2G), alegando, em linhas gerais, que: a) deve ser conhecido e provido o agravo retido interposto da decisão que rejeitou a preliminar de carência de ação, a fim de que seja reconhecida a sua ilegitimidade passiva ad causam, com a consequente extinção do feito, nos termos do artigo 485, inciso VI, do CPC; b) o laudo pericial produzido nos autos deixou claro que três fatores contribuíram para o escorregamento da encosta, a saber: b.1) a localização do imóvel em área de risco; b.2) o elevado índice pluviométrico nos dias que antecederam o deslizamento; e b.3) a escavação do talude no sopé da encosta, sem precisar, porém, qual deles teria sido determinante para o ocorrido; c) nada obstante, por conta própria, o Juiz de origem entendeu que a escavação foi determinante para o deslizamento, o que não encontra amparo na prova produzida nos autos; d) em relação ainda à perícia, "para a realização do diagnóstico de estabilidade da encosta o laudo pericial adotou unicamente critérios teóricos, sem considerar a existência de vários trabalhos realizados em campo com amostras do solo", o que compromete em parte o resultado do trabalho; e) nada obstante, o perito foi taxativo ao consignar que, mesmo desconsiderando as escavações, o fator de segurança do imóvel já era baixo, diante da sua localização em área de risco e da condição climática com fortes chuvas; f) subsidiariamente, caso não seja afastada por completo a sua responsabilidade, que, então, seja a mesma limitada a 1/3, considerando as outras duas causas concorrentes; g) afora isso, não houve perda total do imóvel, já que, segundo a perícia, tudo é passível de reparo, daí a inviabilidade de condenação ao valor total do bem; h) não deve ser obrigada a custear os valores com aluguéis, haja vista que o contrato de locação é anterior à interdição do bem, a indicar, portanto, que a saída da residência foi impulsionada por motivo outro; i) quando menos, os aluguéis devem ser limitados a, no máximo, 12 meses; j) os danos morais foram fixados em patamar exorbitante, daí por que devem ser minorados; k) os juros de mora devem ter início a contar do arbitramento, ou, subsidiariamente, da data da citação, para os danos morais, e, para os aluguéis, o trânsito em julgado da decisão, ou, em última hipótese, a data da citação; l) com o acolhimento do apelo, os ônus sucumbenciais devem ser redimensionados. Requereu, nestes termos, o conhecimento e provimento do recurso.

Houve contrarrazões (Evento 29 - PROCJUDIC12 - pp. 221-234 - SAJ2G).

Os autos ascenderam a esta Corte, ocasião em que foram originariamente distribuídos à Terceira Câmara de Direito Civil, sob a relatoria do então Des. Marcus Tulio Sartorato, e, com o advento da criação da Sétima Cãmara de Direito Civil, vieram redistribuídos.

É o suficiente relatório.

VOTO

A publicação da decisão profligada é ulterior ao início de vigência da Lei 13.105/2015, ocorrida em 18-3-2016 (art. 1.045), razão pela qual os requisitos de admissibilidade seguem a novel regulamentação, em conformidade com o Enunciado Administrativo n. 3 do Superior Tribunal de Justiça: "Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC".

1. Do agravo retido

Os requisitos legais de admissibilidade do recurso de agravo retido encontram-se consubstanciados nos artigos 522 e 523 do Código de Processo Civil de 1973, bem como nas demais disposições aplicáveis aos recursos em geral.

Neste trilhar, presentes os pressupostos de admissibilidade, passa-se à análise do recurso.

A parte apelante inaugurou seu recurso alegando que não possui legitimidade para figurar no polo passivo da lide, ao fundamento de que as obras de escavação, apesar de terem sido feitas em terreno de sua propriedade, foram realizadas pelo Município de Rio do Sul/SC a pretexto de beneficiar-se graciosamente de material nela contido (barro), com vistas à construção do Elevado José Thomé, que interliga os bairros Canoas e Jardim América, naquela municipalidade.

A preliminar, adianta-se, não merece acolhimento.

Como se sabe, as condições da ação devem ser examinadas à luz da teoria da asserção, isto é, de maneira abstrata conforme os argumentos trazidos na petição inicial.

No caso em análise, conforme narrado na inicial, as obras de escavação que teriam acarretado danos ao terreno e à residência dos autores/apelados ocorreu - incontroversamente - em terreno de propriedade da ré/apelante.

Em dado cenário, não se pode olvidar que "Tratando-se de direito de vizinhança a obrigação é propter rem, ou seja, decorre da propriedade da coisa. Por isso, o proprietário, com posse indireta, não pode se eximir de responder pelos danos causados pelo uso indevido de sua propriedade. Em resumo: o proprietário, em razão da natureza propter rem da obrigação, possui legitimidade passiva ad causam para responder por eventuais danos relativos a uso de sua propriedade" (STJ. REsp 1125153/RS, Rel. Ministro Massami Uyeda, j. 4-10-2012).

A propósito, em situação idêntica à dos autos:

AGRAVO RETIDO, APELAÇÕES CÍVEIS E REEXAME NECESSÁRIO. AÇÃO INDENIZATÓRIA E COMINATÓRIA MOVIDA POR PESSOAS FÍSICAS CONTRA PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO (COOPERATIVA) E CONTRA O MUNICÍPIO DE RIO DO SUL. DEMANDANTES PROPRIETÁRIOS DE IMÓVEL PRÓXIMO ÀQUELE DE PROPRIEDADE DA COOPERATIVA. PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO QUE TERIA SOLICITADO AO MUNICÍPIO DE RIO DO SUL A REMOÇÃO DE MATERIAL ARENOSO EXISTENTE NOS FUNDOS DO IMÓVEL. OBRAS EXECUTADAS PELO ENTE PÚBLICO. FORMAÇÃO DE TALUDES. ALEGAÇÃO DE QUE AS OBRAS FORAM REALIZADAS SEM ESTUDOS PRÉVIOS. TERRAPLANAGEM E ESCAVAÇÕES NO IMÓVEL DA COOPERATIVA QUE TERIAM CAUSADO DANOS AO IMÓVEL DOS DEMANDANTES. COMPROMETIMENTO DAS FUNDAÇÕES E DE PARTE DO TERRENO. INVIABILIDADE DE OCUPAÇÃO DA ÁREA ATINGIDA. DESVALORIZAÇÃO IMOBILIÁRIA. PRETENSÃO DA CONDENAÇÃO DOS DEMANDADOS AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO PELOS DANOS MATERIAIS E MORAIS, BEM COMO NA OBRIGAÇÃO DE FAZER CONSISTENTE NA EXECUÇÃO DE OBRAS DE CONTENÇÃO DA ENCOSTA. SENTENÇA QUE JULGOU PARCIALMENTE PROCEDENTES OS PEDIDOS INICIAIS PARA CONDENAR OS DEMANDADOS, SOLIDARIAMENTE, APENAS AO PAGAMENTO DA INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. [...] APELANTE QUE SOLICITOU A EXECUÇÃO DAS OBRAS E OBTEVE BENEFÍCIOS FISCAIS E MATERIAIS COM A SUA REALIZAÇÃO. RESPONSABILIDADE RELACIONADA AO DIREITO DE VIZINHANÇA, ADEMAIS, QUE TEM...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT