Acórdão Nº 0011086-94.2012.8.24.0036 do Quinta Câmara de Direito Comercial, 12-08-2021

Número do processo0011086-94.2012.8.24.0036
Data12 Agosto 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0011086-94.2012.8.24.0036/SC

RELATOR: Desembargador JÂNIO MACHADO

APELANTE: DIEGO SANTOS FERRAO (AUTOR) APELADO: BANCO DO BRASIL S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

Diego Santos Ferrão ajuizou "ação declaratória de inexistência de débito c/c repetição de indébito c/c danos morais e tutela antecipada" contra Banco do Brasil S/A sob o fundamento de que: a) é policial militar e, ao ingressar no serviço público estadual, foi obrigado a abrir uma conta salário no banco requerido; b) "sempre verificou diversos descontos em sua conta salário e folha de pagamento", mas nunca obteve esclarecimentos a respeitos destes descontos; c) "existem diversos descontos na sua conta salário totalmente desconhecidos" e debitados automaticamente; d) "também há descontos de valores diversos em folha de pagamento do requerente, com juros e condições ao livre alvedrio do requerido, sendo que o requerente jamais contratou ou efetivou autorização"; e) encaminhou duas notificações extrajudiciais para o requerido a fim de resolver administrativamente a situação, mas foi ignorado; f) "não assinou e nem recebeu cópia de qualquer documento que autorizasse o banco a saquear seu salário ou conta". Pleiteou, assim, a: a) antecipação dos efeitos da tutela para a suspensão dos descontos; b) declaração da inexistência da relação jurídica referente aos descontos desconhecidos; c) declaração da impossibilidade dos descontos não contratados; d) repetição em dobro do indébito e; e) reparação do dano moral suportado.

A gratuidade da justiça foi indeferida (evento 65, despacho 180). O agravo interposto pelo autor (evento 65, agravos 185/199) teve seguimento negado pela ilustre desembargadora Cláudia Lambert de Faria (evento 65, decisões monocráticas 202/206). O pedido de retificação do valor da causa (evento 65, despachos 213/214) foi indeferido (evento 65, petição 211). O autor recolheu as custas iniciais (evento 65, comprovantes 217) e a análise do pedido de antecipação dos efeitos da tutela de mérito foi postergada (evento 65, despacho 219).

Após a apresentação de contestação (evento 65, contestações 223/232), a antecipação da tutela foi indeferida (evento 65, decisões 285/287). A preliminar arguida na resposta foi afastada na decisão que também determinou a exibição de documentos pelo banco (evento 65, decisões 298/299), a providência que foi cumprida (evento 65, anexos 302/392), sobrevindo a impugnação (evento 65, petições 395/409).

Na sequência, a digna magistrada Graziela Shizuiho Alchini proferiu sentença, o que fez nos seguintes termos:

"Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados por DIEGO SANTOS FERRAO em face de BANCO DO BRASIL S.A., partes qualificadas, com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil.

Em razão da caracterização da litigância de má-fé, condeno o autor ao pagamento de multa no importe de 5% (cinco por cento) do valor corrigido da causa (art. 81 do CPC).

Condeno a parte autora ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como honorários de sucumbência, que fixo em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, de acordo com o artigo 85, § 2º, do CPC.

Autorizo a restituição de eventuais diligências não utilizadas, a ser solicitada na forma da Resolução CM N. 10 de 27 de agosto de 2019.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Após o trânsito em julgado, cumpridas as formalidades legais, inclusive o art. 2º, § 6º, da Resolução TJ nº 1/2017, arquive-se." (evento 79) (os grifos estão no original).

Irresignado, o autor interpôs recurso de apelação cível (evento 84) sustentando a: a) necessidade de concessão do benefício da justiça gratuita; b) ausência de litigância de má-fé; c) aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ao caso concreto; d) inexigibilidade dos descontos não contratados, que devem ser repetidos em dobro; e) necessidade de reparação do dano moral suportado.

O apelado ofereceu resposta defendendo a manutenção da sentença e a necessidade de majoração da multa por litigância de má-fé aplicada, além de fixação de multa pelo caráter protelatório do recurso (evento 68). Na sequência, os autos vieram a esta Corte.

VOTO

Inicialmente, convém esclarecer que o Código de Processo Civil de 2015, em seu artigo 99, § 7º, dispensa o recolhimento do preparo em recursos cujo objetivo seja o deferimento da gratuidade de justiça:

"Art. 99. O pedido de gratuidade da justiça pode ser formulado na petição inicial, na contestação, na petição para ingresso de terceiro no processo ou em recurso.

(...)

§ 7º Requerida a concessão de gratuidade da justiça em recurso, o recorrente estará dispensado de comprovar o recolhimento do preparo, incumbindo ao relator, neste caso, apreciar o requerimento e, se indeferi-lo, fixar prazo para realização do recolhimento".

Não custa enfatizar que "seria inadmissível exigir-se do recorrente que efetuasse o preparo, quando justamente está discutindo que não pode pagar as despesas do processo, nas quais se inclui o preparo de recurso." (NERY JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de processo civil comentado. 17. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Thomson Reuters, 2018, p. 578).

Sendo assim, o recurso é conhecido.

A gratuidade da justiça destina-se a atender pessoas físicas ou jurídicas, brasileiras ou estrangeiras, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios, o que se extrai do artigo 98 do Código de Processo Civil de 2015.

O artigo 5º, inciso LXXIV, da Constituição Federal, por sua vez, determina que "o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos".

Daí porque se tem compreendido que o interessado na concessão dos benefícios da gratuidade deverá comprovar o alegado, não bastando a simples declaração.

Outrossim, apesar da presunção de veracidade consubstanciada no artigo 99, § 2º, do Código de Processo Civil de 2015, o juiz pode, sim, discordar da afirmação de pobreza quando entender que, ao contrário do alegado, a parte dispõe de recursos para arcar com as custas do processo. Ou seja, diante do caso concreto, o juiz pode indeferir o pleito em debate, desde que os elementos existentes nos autos assim o recomendem.

A propósito, confira-se a lição de Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery:

"o dever de comprovar o cabimento do pedido de gratuidade da justiça se impõe caso o juiz entenda que haja elementos nos autos que permitam seja questionável esse pedido. (...) alegação constitui presunção iuris tantum de que o interessado é necessitado. Havendo dúvida fundada quanto a veracidade da alegação, poderá ser exigida, do interessado, prova da condição por ele declarada." (NERY JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Op. cit., p. 573).

Não bastasse, registra-se que o Conselho da Magistratura também editou ato com orientação nesse sentido, a saber, a Resolução n. 11/2018-CM, de 12.11.2018.

No caso aqui examinado, a hipossuficiência do apelante não ficou demonstrada. Afinal, o apelante formulou o pedido de concessão da justiça gratuita nas razões do recurso (o pedido que já havia sido indeferido no início da ação por ausência de prova da hipossuficiência, evento 65, despacho 180), mas não trouxe prova da efetiva escassez financeira, limitando-se a apresentar comprovante de rendimentos referente ao mês de julho de 2020 no valor bruto de R$11.447,62 (onze mil quatrocentos e quarenta e sete reais e sessenta e dois centavos) (evento 84). Se for subtraído o percentual excepcional referente às férias recebidas em julho de 2020, a renda bruta ordinária é de R$8.994,13 (oito mil novecentos e noventa e quatro reais e treze centavos).

Do que se viu, a insuficiência de recursos para arcar com as despesas processuais e os honorários advocatícios não ficou comprovada nos autos. Ao contrário, os documentos apresentados dão conta de que a renda do apelante é suficiente para arcar com as despesas do processo e incompatível com o pedido de gratuidade da justiça, que é indeferido pela Câmara.

Na Câmara, assim já se decidiu:

"APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA. ALEGAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA QUE NÃO SE AFIGURA SUFICIENTE À CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. RESOLUÇÃO N. 04/06-CM. AUSÊNCIA DE PROVA DOCUMENTAL QUE CONTENHA INDICATIVOS DA CARÊNCIA FINANCEIRA. BENEFÍCIO INDEFERIDO. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. EXCESSO DE EXECUÇÃO. NECESSIDADE DA INDICAÇÃO, NA PETIÇÃO INICIAL DOS EMBARGOS, DO VALOR INCONTROVERSO E DA APRESENTAÇÃO DA MEMÓRIA DE CÁLCULO. ARTIGO 917, § 3º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. ÔNUS QUE NÃO FOI SATISFEITO PELOS EMBARGANTES E INVIABILIDADE DA CONCESSÃO DA OPORTUNIDADE PARA EMENDA, CONFORME A ORIENTAÇÃO QUE VEM DA CORTE ESPECIAL DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. CONSEQUÊNCIA: REJEIÇÃO LIMINAR DOS EMBARGOS. RECURSO DESPROVIDO." (apelação cível n. 0305457-56.2018.8.24.0036, de Jaraguá do Sul, da minha relatoria, j. em 14.3.2019).

Some-se:

"APELAÇÃO CÍVEL. EXECUÇÃO. INDEFERIMENTO DA JUSTIÇA GRATUITA. AUSÊNCIA DE PROVA DA HIPOSSUFICIÊNCIA. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO." (apelação cível n. 0305320-54.2018.8.24.0075, de Tubarão, relator o desembargador Cláudio Barreto Dutra, j. em 26.9.2019).

O apelante ajuizou a presente ação pretendendo a declaração da inexistência de débito e a indenização dos supostos danos materiais e morais sob o fundamento de que "existem diversos descontos na sua conta salário, totalmente desconhecidos", sendo que "jamais assinou qualquer contrato ou autorização solicitando um empréstimo financeiro", além de não ter autorizado que "descontos fossem efetuados em sua folha de pagamento" (evento 66). O intento do apelante não é revisar contratos (que nega veementemente ter firmado), mas apenas obter o reconhecimento da inexistência das relações jurídicas que acarretaram descontos tanto em sua conta corrente quanto em sua folha de pagamento.

Dito de outro modo, o apelante nega a existência de toda e qualquer contratação que não seja a abertura de conta bancária n...

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