Acórdão Nº 0011171-26.2012.8.24.0054 do Sétima Câmara de Direito Civil, 12-11-2020

Número do processo0011171-26.2012.8.24.0054
Data12 Novembro 2020
Tribunal de OrigemRio do Sul
ÓrgãoSétima Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão



Apelação Cível n. 0011171-26.2012.8.24.0054


Apelação Cível n. 0011171-26.2012.8.24.0054, de Rio do Sul

Relatora: Desembargadora Haidée Denise Grin

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. INCONFORMISMO DA PARTE AUTORA.

MANUTENÇÃO DE POSSE DE SERVIDÃO DE PASSAGEM. AUSÊNCIA DE PROVA DA TURBAÇÃO. ATO DE MERA PERMISSÃO QUE NÃO GERA DIREITO POSSESSÓRIO. INEXISTÊNCIA DE INSTITUIÇÃO DE SERVIDÃO ENTRE AS PARTES. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 415 DO STJ AO CASO CONCRETO.

ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS RECURSAIS. INTELIGÊNCIA DO ART. 85, § 11, DO CPC.

RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0011171-26.2012.8.24.0054, da comarca de Rio do Sul 2ª Vara Cível em que são Apelantes Marlene Silveira e outros e Apelados Leonir Weiss e outro.

A Sétima Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento, fixando-se honorários recursais. Custas legais.

O julgamento virtual, realizado nesta data, foi presidido pelo Exma. Sra. Desa. Haidée Denise Grin(com voto), e dele participou o Exmo. Des. Álvaro Luiz Pereira de Andrade e o Exmo. Des. Carlos Roberto da Silva.

Funcionou como representante do Ministério Público o Exmo. Promotor de Justiça Durval da Silva Amorim

Florianópolis, 12 de novembro de 2020.

Desembargadora Haidée Denise Grin

Relatora


RELATÓRIO

Forte no princípio da celeridade e utilizando das ferramentas informatizadas, adota-se o relatório da sentença recorrida, por sintetizar o conteúdo dos autos, in verbis:

Marlene Silveira, Fabiana Silveira, Dejair Machado e Evanir Machado ajuizaram a presente ação de manutenção de posse em face de Leonir Weiss, aduzindo, em síntese, que a primeira autora adquiriu, em 1975, um lote urbano com 325,67m², matriculado sob o nº 28089, no qual edificou uma casa de madeira, atualmente dividida em dois compartimentos, um deles com acesso direto pela rua Videira e o outro, onde reside a segunda autora, por uma servidão de passagem que fica nos fundos do terreno. Informaram que o terceiro e quarto autores são proprietários de um terreno urbano situado na rua Videira, matriculado sob o nº 27430, no qual existem duas casas, a primeira que se encontra locada e a segunda, onde residem os autores, cujo acesso se dá também pela referida servidão de passagem. Disseram que dita servidão possui iluminação pública e foi construída há mais de sessenta anos e que, além dos autores, a população local também utiliza tal passagem.

Disseram que o terreno onde se localiza a servidão de passagem pertencia à empresa Cerâmica São João mas que, depois da quebra, foi dividido entre os funcionários que, posteriormente, alienaram ao réu. Aduziram que, no dia 27.09.2012 foram informados, pelo réu, de que a servidão seria fechada no prazo de trinta dias. Daí o pedido de manutenção de posse formulado, inclusive em sede de tutela de urgência. Procuração e documentos vieram aos autos.

Após audiência de justificação prévia, a medida de urgência não foi concedida, em decisão objeto de recurso de agravo de instrumento, também inexitoso.

Então o réu, citado, ofereceu resposta em forma de contestação e nela arguiu, em preliminares, a carência de ação e a ilegitimidade passiva, enquanto no mérito esclareceu que a estrada particular servia à empresa e seus funcionários, proprietários e prestadores de serviços e que, por tolerância, era utilizada por moradores da região. Sustentou que os autores possuem acesso às residências pela via pública e que inexiste comprovação de que os imóveis são encravados de modo que, também não se aplica o instituto da passagem forçada. Por fim, clamou a improcedência.

Na sequência, designou-se data para audiência de conciliação e saneamento.

Sobreveio, então, de forma extemporânea, réplica à contestação.

A tentativa de conciliação em audiência não restou exitosa.

Após manifestação dos autores, determinou-se a inclusão da esposa do réu no polo passivo da demanda ela que, igualmente citada, apresentou contestação, oportunidade em que sustentou a necessidade de inclusão dos demais proprietários do imóvel, no polo passivo da demanda. No mais, arguiu em preliminar a carência de ação, enquanto no mérito ofereceu resposta nos mesmos moldes daquela apresentada pelo primeiro, clamando a improcedência.

Também houve réplica.

Em saneamento, afastaram-se as preliminares arguidas e deliberou-se pela produção de prova oral.

Na fase instrutória, inquiriram-se cinco testemunhas.

Sobrevieram razões finais escritas pelas partes.

Sentenciando, o MM. Juiz de Direito Luís Paulo Dal Pont Lodett julgou improcedente o pleito inicial, condenando os autores, em proporções iguais entre si (art. 87, caput e § 1º, do NCPC), ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, estes fixados estes em 15% (quinze por cento) do valor da causa (art. 85, § 2º do NCPC), ressalvada a suspensão da exigibilidade (art. 98, §§ 2º e 3º do NCPC).

Irresignados os autores interpuseram o presente apelo (fls. 381-408).

Nas suas razões recursais, pugnam pela reforma do decisum vergastado, sob o argumento de que a passagem, objeto da inicial, foi construída há mais de 60 anos e, aberta à população há mais de 40 anos e que funciona como importante saída em casos de cheias, bem como pelo subdimensionamento da via principal, que não comporta o movimento atual de veículos.

Afirmam, ainda, que a referida servidão possui iluminação pública e que algumas garagens tem entrada exclusiva pela via discutida, bem como o art. 1.208 do CC não possui aplicação no caso concreto, devendo ser aplicada a Súmula 417 do STJ.

Com as contrarrazões (fls. 412-423), os autos ascenderam a esta Corte de Justiça.

Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Paulo Cezar Ramos de Oliveira, no sentido de inexistir interesse, razão pela qual se absteve de apresentar manifestação.

Este é o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade, o recurso merece ser conhecido e, adianta-se, desprovido.

O cerne da questão reside em determinar a existência ou não da alegada servidão de trânsito, bem como da possível turbação perpetrada pelo réu, ora apelado, ao afirmar que fecharia o acesso em trinta dias.

Na forma do art. 1.378 do Código Civil, tem-se que:

A servidão proporciona utilidade para o prédio dominante, e grava o prédio serviente, que pertence a diverso dono, e constitui-se mediante declaração expressa dos proprietários, ou por testamento, e subsequente registro no Cartório de Registro de Imóveis.

Nessa ordem, as servidões "definem-se como restrições impostas a um prédio para uso e utilidade de outro prédio, pertencente a proprietário diverso" (MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Dirieto Civil: Direito das Coisas. 37 ed. São Paulo: Saraiva. 2003. p. 276).

Acerca das espécies de servidão, leciona Orlando Gomes:

Servidões contínuas são as que dispensam atos humanos para que subsistam e sejam exercidas, como a de aqueduto. Servidões descontínuas, as que dependem, para seu exercício, de atos do senhor ou possuidor do prédio dominante, como a de passagem. O critério de distinção, como esclarecem os Mazeaud, não é a permanência, mas a intervenção ou ausência de intervenção do homem.

Servidões aparentes são as que se revelam por sinais exteriores. Servidões não-aparentes, as que não têm sinal externo de sua existência (Direitos Reais, Forense, 2000, 17. ed., p. 284).

As servidões de trânsito são caracterizadas por sua utilização contínua e tranquila, aliada à necessidade ou utilidade do prédio dominante, como vem consignado no magistério de Arnaldo Rizzardo, ao afirmar que "particularmente a servidão de trânsito, sendo constantemente usada, adquire a condição de aparente e continuidade. Com mais razão quando exteriorizada por obras no caminho, que lhe dão a qualidade de contínua. Daí que, assumindo, embora descontínua, o aspecto de visibilidade e continuidade, por meio de obras denunciadoras de sua existência faz por merecer a proteção possessória" (Das Servidões, Aide, 1984, p.79).

No tocante às diferenças existentes acerca da passagem forçada e servidão de trânsito, preleciona Arnaldo Rizzardo que: "Convém, de logo, que se frise a distinção entre o direito de passagem forçada regulada pelos denominados direitos de vizinhança e a proteção às servidões. A primeira pressupõe um prédio encravado, com indispensável necessidade de saída para a via pública, assegurando a lei ao proprietário o direito de consegui-la sobre prédios alheios, possibilitando-lhe a destinação econômica. Funda-se, assim, na necessidade e na indispensabilidade. Já a servidão se coloca no cômodo e até no supérfluo" (op. cit., p. 204 - sem grifo no original).

No caso em apreço, embora os apelantes sustentem toda a sua irresignação no fato de a servidão de passagem em discussão ser o melhor meio de acesso às suas residências e à via principal (Estrada da Madeira), tem-se que este não é único meio, uma vez que eles mesmos informam que a Rua Videira lhes dá acesso à via pública.

Não se observa, conforme relatados nos autos do agravo n. 2012.086685-2, a constituição da alegada servidão, uma vez que não há qualquer documento que demonstre a concordância do agravado, atual proprietário da área, nem dos antigos proprietários, ou mesmo o comprometimento de um ou de outro em ceder parte da área como servidão de passagem aos moradores locais.

Em verdade, o que se visualiza nos autos é um ato permissivo, ou de tolerância do proprietário do terreno, em benefício dos imóveis dos apelantes e demais moradores da redondeza,...

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