Acórdão Nº 0011824-97.2016.8.24.0018 do Terceira Câmara Criminal, 08-02-2022

Número do processo0011824-97.2016.8.24.0018
Data08 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0011824-97.2016.8.24.0018/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 0011824-97.2016.8.24.0018/SC

RELATOR: Desembargador ERNANI GUETTEN DE ALMEIDA

APELANTE: GEOVANI LUCAS (ACUSADO) ADVOGADO: LUDMILA GRADICI CARVALHO DRUMOND (DPE) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

O representante do Ministério Público, com atribuição para atuar perante a 1ª Vara Criminal da comarca de Chapecó, ofereceu denúncia em desfavor de Geovani Lucas por infração ao art. 12, caput, da Lei n. 10.826/03, em razão dos seguintes fatos narrados na exordial acusatória, in verbis (evento 09):

No dia 19 de outubro de 2015, por volta das 16 horas, na Rua Tiago, s/n, Bar dos Amigos, Bairro Bom Pastor, em Chapecó/SC, o denunciado Geovani Lucas, de forma consciente e voluntária, ciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, possuía e mantinha sob sua guarda, no interior de sua residência (quarto), arma de fogo, de uso permitido, consistente em uma espingarda, marca CBC, modelo Montenegro F22, com modificação/adulteração física e mecânica de sua caraterísticas originais, com pino percutor que dispara munição de calibre . 22, e um cartucho, marca CBC, do mesmo calibre, intacto, ambos sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar.

Segundo apurado, nas circunstâncias de tempo e locais acima descritos, a Polícia Militar estava em rondas quando avistaram o denunciado em atitude suspeita dentro de um bar. Efetuada abordagem, logrou-se êxito em encontrar resquícios de substancia similar à maconha.

Concluída a instrução do feito, a denúncia foi julgada procedente para condenar Geovani Lucas à pena privativa de liberdade de 01 (um) ano de detenção, em regime aberto, além do pagamento de 10 (dez) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente à época dos fatos, por infração ao art. 12, caput, da Lei n. 10.826/03. Preenchidos os requisitos previstos nos art. 44 do Código Penal, a pena privativa de liberdade foi substituída por 01 (uma) restritiva de direito, consistente em prestação pecuniária no valor de 01 (um) salário mínimo vigente à época dos fatos (evento 47).

Inconformada com a prestação jurisdicional entregue, a defesa interpôs recurso de apelação, em cujas razões pretende, preliminarmente, a nulidade das provas colhidas diante de ofensa ao direito de inviolabilidade de domicílio. No mérito, requer a alteração da pena restritiva de direito aplicada (prestação pecuniária) por multa (evento 69).

Contra-arrazoado o recurso (evento 74), os autos ascenderam a este Tribunal, oportunidade em que a Douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer do Exmo. Sr. Dr. Rui Arno Richter, manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso (evento 10).

Este é o relatório.

VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto por Geovani Lucas contra decisão de primeira instância que, julgando procedente a denúncia, condenou-o à pena privativa de liberdade de 01 (um) ano de detenção, em regime aberto, além do pagamento de 10 (dez) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente à época dos fatos, por infração ao art. 12, caput, da Lei n. 10.826/03, sendo substituída por 01 (uma) restritiva de direito, consistente em prestação pecuniária no valor de 01 (um) salário mínimo vigente à época dos fatos.

O recurso deve ser conhecido, porquanto preenchidos os requisitos de admissibilidade.

1 - Da preliminar: Inviolabilidade do domicílio.

Preliminarmente, a defesa de Geovani Lucas sustenta a nulidade das provas colhidas, porquanto teriam sido obtidas em desatenção à garantia de inviolabilidade de domicílio (art. 5º, XI, da Constituição Federal). Aduz, nesse sentido, a impossibilidade de ingresso na residência do apelante sem prévias diligências investigativas.

Contudo, razão não lhe assiste.

Ab initio, importante relembrar que o direito à inviolabilidade do domicílio não é absoluto, vez que possui suas exceções estampadas no próprio texto constitucional, conforme se infere do art. 5º, XI, da Constituição Federal, in verbis: "a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial".

Com efeito, a proteção à intimidade, à privacidade, à segurança e a outros direitos personalíssimos não pode servir de barreira intransponível para a realização de ilícitos penais.

A propósito, o art. 302 do Código de Processo Penal dispõe:

Art. 302. Considera-se em flagrante delito quem:

I - está cometendo a infração penal;

Nesse sentido, Guilherme de Souza Nucci vide Código de Processo Penal comentado. 8. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 530-531, leciona que:[...] desnecessidade de mandado em caso de flagrante: é indiscutível que a ocorrência de um delito no interior do domicílio autoriza a sua invasão, a qualquer hora do dia ou da noite, mesmo sem o mandado, o que, aliás, não teria mesmo sentido exigir fosse expedido. Assim, a polícia pode ingressar em casa alheia para intervir num flagrante delito, prendendo o agente e buscando salvar, quando for o caso, a vítima. Em caso de crimes permanentes (aqueles cuja consumação se prolonga no tempo), como é o caso de tráfico de entorpecentes, na modalidade "ter em depósito" ou "trazer consigo", pode o policial penetrar no domicílio efetuando a prisão cabível [...].

Sob tal premissa, ao contrário do que sustenta a defesa, a existência de fundadas suspeitas da ocorrência de flagrante delito é o suficiente para legitimar o ingresso em domicílio, conforme julgamento sob o regime de repercussão geral realizado pelo Supremo Tribunal Federal (RE 603616, Relator(a): Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 05/11/2015, acórdão eletrônico repercussão geral - mérito, DJe-093 Divulg 09-05-2016 Public 10-05-2016):

Recurso extraordinário representativo da controvérsia. Repercussão geral. 2. Inviolabilidade de domicílio - art. 5º, XI, da CF. Busca e apreensão domiciliar sem mandado judicial em caso de crime permanente...

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