Acórdão Nº 0011977-31.2012.8.24.0064 do Sexta Câmara de Direito Civil, 16-03-2021

Número do processo0011977-31.2012.8.24.0064
Data16 Março 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSexta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0011977-31.2012.8.24.0064/SC

RELATOR: Desembargador ANDRÉ CARVALHO

APELANTE: GUIA MAIS MARKETING DIGITAL LTDA. - EM RECUPERACAO JUDICIAL APELADO: JOSE LUIS DE MATOS PAIANI

RELATÓRIO

Adoto, por economia processual e em homenagem à sua completude, o relatório da sentença de fls. 141-144, da lavra do Magistrado Roberto Marius Fávero, in verbis:

Carvajal Informação Ltda. ingressou com a presente "ação monitória" contra José Luis de Matos Paiani. Alegou ser credor da parte ré no montante de R$ 15.101,18 (quinze mil cento e um reais e dezoito centavos) representado pelo contrato de prestação de serviço juntado às fls. 37-51. Pugnou pela citação da parte ré para que efetue o pagamento do débito devidamente atualizado, no prazo de quinze dias, valorou a causa e juntou documentos (fls. 07-51).A parte ré, devidamente citada, ofereceu embargos monitórios (fls. 89-94). No mérito, defendeu-se dizendo que o débito foi devidamente quitado no estabelecimento da demandante mediante entrega de recibo (fl. 126). Por conta disso, rogou pela improcedência do feito.A parte ré, ainda, reconveio (fl. 83-94), requerendo a condenação da parte requerente ao pagamento em dobro do pretendido indevidamente na ação monitória, com fulcro no art. 940 do Código Civil.Houve réplica (fls. 100-102).Vieram-me conclusos os autos.É o breve relato.

Segue parte dispositiva da decisão:

Ante o exposto, julgo improcedente o pedido formulado na ação principal, o que faço com fulcro no art. 487, I, do Código de Processo Civil.Condeno a parte autora no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 20% do valor do valor da causa atualizado, forte no art. 85, §2º, do novo Código de Processo Civil.Por outro lado, julgo procedente a reconvenção, ex vi no art. 487, I, do Código de Processo Civil e CONDENO a parte reconvinda (Carvajal Informação Ltda.) no pagamento de R$ 30.202,36 (trinta mil duzentos e dois reais, trinta e seis centavos) à parte reconvinte, nos termos do art. 940 do Código Civil.Condeno a parte reconvinda, ainda, no pagamento de custas e honorários advocatícios, os quais fixo em 20% do valor da condenação, a teor do disposto no art. 85, §2º, do Código de Processo Civil.Determino a conversão do feito ao procedimento ordinário.Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Ato contínuo, a autora/reconvinda opôs aclaratórios (fls. 149-155), os quais foram rejeitados (fls. 157-158).

Inconformada com a prestação jurisdicional entregue, a demandante interpôs a apelação de fls. 162-175, requerendo, primeiramente, a concessão do benefício da gratuidade judiciária, ao argumento de que está em processo de recuperação judicial e não detém condições de arcar com as custas processuais.

No mais, em sede preliminar, alegou o cerceamento de defesa, ante o julgamento antecipado da lide, pois os pedidos deduzidos nos autos dependiam de prova do efetivo pagamento, cuja produção não foi oportunizada.

No mérito, aduziu que a parte requerida não logrou êxito em comprovar o adimplemento do débito, ônus que lhe incumbia, pois o recibo apresentado não preenche os requisitos insculpidos no art. 320 do Código Civil, porque desprovido de carimbo e assinatura de preposto ou representante da parte credora; E porque o valor nele descrito diverge daquele avençado.

Além disso, afirmou ser indevido qualquer ressarcimento ao apelado, pois não restou comprovado o pagamento do montante debatido, tampouco sua má-fé - o que, no seu entender, afasta a incidência do art. 940 da Lei Substantiva.

Contrarrazões ofertadas às fls. 195-202, pugnando pelo desprovimento da insurgência.

Após, vieram-me os autos conclusos. É o necessário escorço do processado.

VOTO

Ab initio, convém assentar que a publicação da decisão objurgada ocorreu na vigência do novo Código de Processo Civil. Logo, o caso será analisado sob a égide do referido regramento, consoante preconiza o Enunciado Administrativo n. 3 do Superior Tribunal de Justiça.

Não obstante a ausência de recolhimento do preparo, oportuno salientar que, mesmo antes da vigência da novel legislação processual civil, esta Corte já entendia que seria "dispensado o preparo nos recursos em que o mérito verse acerca da concessão ou não da gratuidade, sem prejuízo de exigência posterior" (Ato Regimental TJ n. 84/2007).

Essa interpretação foi acolhida expressamente pelo novo codex, em seu art. 99, § 7º, o qual preconiza que: "requerida a concessão de gratuidade da justiça em recurso, o recorrente estará dispensado de comprovar o recolhimento do preparo, incumbindo ao relator, neste caso, apreciar o requerimento e, se indeferi-lo, fixar prazo para realização do recolhimento".

Com escólio em tais premissas, extrai-se da jurisprudência deste Sodalício:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C PERDAS E DANOS. JUSTIÇA GRATUITA. - INTERLOCUTÓRIO DE INDEFERIMENTO NA ORIGEM.ADMISSIBILIDADE. (1) AUSÊNCIA DE PREPARO. JUSTIÇA GRATUITA. MÉRITO RECURSAL. POSSIBILIDADE.- Sendo o pedido de concessão das benesses da gratuidade da Justiça objeto do mérito recursal, é dado ao recorrente, por ocasião da interposição do reclamo, deixar de recolher o preparo comumente devido.MÉRITO. (2) JUSTIÇA GRATUITA. PRESSUPOSTOS AUSENTES. PRESUNÇÃO RELATIVA DE HIPOSSUFICIÊNCIA DERRUÍDA. INDEFERIMENTO DO BENEPLÁCITO. ACERTO.- Os benefícios da gratuidade da Justiça não devem ser concedidos se os elementos constantes dos autos derruem a relativa presunção de veracidade da declaração de hipossuficência econômico-financeira legalmente prevista em favor do pleiteante da graça.DECISÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. (TJSC, Agravo n. 0031654-06.2016.8.24.0000, da Capital, rel. Des. Henry Petry Júnior, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 14-3-2017.

Vê-se, portanto, que embora ausente o preparo, o recurso merece ser admitido, ainda que parcialmente, como se verá a seguir.

Fixada esta premissa, ocupo-me, inicialmente, da análise do pedido de gratuidade judiciária.



1. Gratuidade da Justiça

Acerca da matéria em discussão, é consabido que o beneplácito da gratuidade possui estatura constitucional, cujo dispositivo assim prescreve: "o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos" (art. 5º, inciso LXXIV, da Constituição Federal).

Na visão de Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery, o benefício em destaque confere maior "operatividade ao direito constitucional de ação", ao passo que franqueia o acesso dos hipossuficientes à prestação jurisdicional (in Comentários ao Código de Processo Civil. 1ª Edição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, p. 470).

Segundo ensinamento de Araken de Assis, desvela-se que a benesse da justiça gratuita insere-se no contexto das políticas públicas destinadas a remover os "obstáculos inibidores ou impeditivos do acesso à Justiça, a exemplo da desigualdade social e econômica, expressadas na situação de extrema pobreza" (in Processo Civil Brasileiro. Vol. I: parte geral. 2ª Edição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, p. 401).

Conveniente trazer à baila, igualmente, lição doutrinária do Ministro Alexandre de Moraes, que assim refere-se ao instituto:

A Constituição Federal, ao prever o dever do Estado em prestar assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos, pretende efetivar diversos outros princípios constitucionais, tais como igualdade, devido processo legal, ampla defesa, contraditório e, principalmente, pleno acesso à Justiça. Sem assistência jurídica integral e gratuita aos hipossuficientes, não haveria condições de aplicação imparcial e equânime de Justiça (in Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional. 8ª Edição. São Paulo: Atlas, 2011, p. 404).

Com o advento do Código de Processo Civil de 2015, o tema ganhou nova roupagem, atualizando-se as antigas disposições previstas na Lei n. 1.060/1950, cujo fragmento pertinente reproduz-se a seguir:

Art. 99. O pedido de gratuidade da justiça pode ser formulado na petição inicial, na contestação, na petição para ingresso de terceiro no processo ou em recurso.§ 1º Se superveniente à primeira manifestação da parte na instância, o pedido poderá ser formulado por petição simples, nos autos do próprio processo, e não suspenderá seu curso.§ 2º O juiz somente poderá indeferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, devendo, antes de indeferir o pedido, determinar à parte a comprovação do preenchimento dos referidos pressupostos.§ 3º Presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural.§ 4º A assistência do requerente por advogado particular não impede a concessão de gratuidade da justiça.§ 5º Na hipótese do § 4º, o recurso que verse exclusivamente sobre valor de honorários de sucumbência fixados em favor do advogado de beneficiário estará sujeito a preparo, salvo se o próprio advogado demonstrar que tem direito à gratuidade.§ 6º O direito à gratuidade da justiça é pessoal, não se estendendo a litisconsorte ou a sucessor do beneficiário, salvo requerimento e deferimento expressos.§ 7º Requerida a concessão de gratuidade da justiça em recurso, o recorrente estará dispensado de comprovar o recolhimento do preparo, incumbindo ao relator, neste caso, apreciar o requerimento e, se indeferi-lo, fixar prazo para realização do recolhimento.

Em caso de dúvida fundada quanto aos pressupostos para o deferimento da benesse, com vistas a preservar a excepcionalidade do instituto, o Magistrado pode determinar a comprovação das condições de hipossuficiência, solicitando ao postulante os documentos que entender necessários.

A propósito, Daniel Amorim Assumpção Neves bem elucida a mens legis da providência em análise:

A presunção de veracidade da alegação de insuficiência, apesar de limitada à pessoa natural, continua a ser regra para a concessão do benefício da gratuidade da justiça. O juiz, entretanto, não...

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