Acórdão Nº 0012205-90.2012.8.24.0036 do Segunda Câmara de Direito Público, 06-09-2022

Número do processo0012205-90.2012.8.24.0036
Data06 Setembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0012205-90.2012.8.24.0036/SC

RELATOR: Desembargador CARLOS ADILSON SILVA

APELANTE: HANZ EGON BUROW (AUTOR) APELADO: MUNICÍPIO DE JARAGUÁ DO SUL (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por Hanz Egon Burow contra sentença proferida pelo Juízo da Vara da Fazenda Pública, Acidentes do Trab. e Registros Púb. da Comarca de Jaraguá do Sul, que julgou improcedente o pedido formulado nos autos da "ação de obrigação de fazer c/c pedido indenizatório" ajuizada em face do Município de Jaraguá do Sul, em que se objetiva a condenação do réu a obrigação de realizar a identificação dos pontos de estrangulamento do esgoto pluvial para consequente substituição das tubulações existentes por novas e adequadas, ou na implementação de redes secundárias que comportem as águas das chuvas, bem como para que o réu seja responsabilizado pela pagamento de indenização por danos morais e materiais decorrentes de alagamentos que atingiram a residência da parte autora.

Em suas razões recursais, o apelante suscita a preliminar de cerceamento de defesa decorrente do indeferimento do pedido de uma perícia complementar.

Quanto ao mérito, reitera a compreensão de que restou caracterizada a má-conservação das galerias e que o dimensionamento das tubulações não é apropriado, causas determinantes para os frequentes alagamentos em sua moradia, razão pela qual o ente público deve ser condenado a adequar a estrutura urbana e indenizar os danos morais e materiais, inclusive lucros cessantes, decorrentes dos alagamentos.

Apresentadas as contrarrazões, os autos ascenderam a esta Corte, sendo distribuídos a este Relator.

A douta Procuradoria-Geral de Justiça deixou de intervir no mérito da causa.

É o relatório.

VOTO

1. Admissibilidade:

Destaco, inicialmente, que embora existam processos mais antigos pendentes de julgamento sob minha relatoria, o julgamento deste reclamo não caracteriza violação ao art 12 do CPC, diante da flexibilização da obrigatoriedade de a jurisdição ser prestada conforme a ordem cronológica, consoante inovação da Lei n. 13.256/16, que retirou o caráter absoluto da regra.

Referida modificação traz melhoria da gestão de gabinete, permitindo a apreciação imediata de demandas repetitivas, visando desafogar a distribuição de processos, cada vez mais exacerbada neste Tribunal.

Com efeito, afigura-se cabível o recurso, porquanto tempestivo e preenchidos os requisitos de admissibilidade previstos nos arts. 1.009 e seguintes do CPC.

2. Da preliminar de ilegitimidade passiva ad causam superveniente suscitada em contrarrazões:

No que toca à ilegitimidade suscitada em contrarrazões, deixa-se de analisar a preliminar de mérito.

Isso porque, ao final, o mérito da demanda será julgado de forma inteiramente favorável ao apelado.

Nesse passo, "em observância aos princípios da primazia da decisão de mérito, da instrumentalidade das formas e da eficiência, e pela dicção dos artigos 4º, 282, §2º e 488, todos do CPC/2015, é dispensável o exame de questões preliminares (em sentido amplo), quando o julgamento de mérito for favorável à parte a quem aproveitaria o acolhimento daquelas arguições. A expressão 'questões preliminares em sentido amplo' representa tanto as nulidades processuais como as hipóteses do art. 485, e bem assim a decadência e prescrição (art. 487, II). [...]" (TJSC, Apelação n. 0003987-23.2011.8.24.0064, de São José, rel. Des. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva, j. em 12-7-2016).

3. Razões recursais:

3.1 Preliminar de cerceamento de defesa:

Deve ser repelida a prefacial de cerceamento de defesa.

Em razão das ponderações levantados por ambas as partes (eventos 339 e 340, 1G), determinou-se a complementação do teor da prova pericial, o que ocorreu no evento 350, 1G.

As questões controversas, portanto, foram plenamente respondidas pelo perito judicial, cuja conclusão foi categórica no sentido de que não há evidência de irregularidade no sistema de drenagem municipal, não havendo motivo hábil para a designação de nova perícia.

Ora, "não acarreta nulidade a ausência de determinação para que seja elaborado laudo complementar se o estudo previamente apresentado pelo perito é suficiente ao deslinde da lide'' (TJSC, Apelação Cível n. 0301652-12.2016.8.24.0054, de Rio do Sul, rel. Des. Odson Cardoso Filho, Quarta Câmara de Direito Público, j. em 27-06-2019).

Demais disso, "vige na lei processual brasileira o princípio da livre apreciação da prova, o qual faculta ao magistrado o indeferimento, de forma fundamentada, das providências que julgar protelatórias, irrelevantes ou impertinentes, conforme verifica a sua necessidade ou não para a elucidação dos fatos, sem que isso cause cerceamento de defesa" (STJ, HC 340.948/BA, rel. Min. Ribeiro Dantas, j. em 04-10-2016).

A preliminar, na verdade, confunde-se com o mérito.

3.2 Mérito:

De plano, não há evidência nos autos quanto ao nexo de causalidade entre os danos suportados pelo apelante e qualquer ação ou omissão por parte do ente público.

Os elementos de prova demonstram que: o sistema de drenagem que atende o imóvel individualizado na inicial foi dimensionado de forma adequada; e as portunidades em que a água adentrou na residência do apelante - o que, em princípio, ocorreu durante fortes enchentes nos anos de 2008 e 2011 - coincidem com eventos climáticos extremos e que causaram alagamentos e estragos generalizados em diversas locais.

A matéria foi apreciada de forma minudente pela MMa. Juíza de Direito da Vara da Fazenda Pública, Acidentes do Trab. e Registros Púb. da Comarca de Jaraguá do Sul, Dra. Candida Inês Zoellner Brugnoli, razão pela qual, a fim de evitar tautologia, passa-se a adotar a bem lançada decisão de primeiro grau como razões decidir:

"[...] II.a Obrigação de fazer - Substituição das tubulações

O liame da obrigação de fazer requerida na inicial está relacionado à alegada necessidade de prestações positivas e negativas pelo Município no tocante à rede pluvial, sob sua responsabilidade quando do ajuizamento da demanda e no momento em que ocorridos os danos aventados na inicial.

Primeiramente, incumbe ponderar que o autor busca, por meio de demanda individual, a realização de obras para sanar intercorrências relativas à prestação de serviços públicos que, em caráter abstrato, embora sejam capazes de atingir toda a coletividade, interferem diretamente na esfera pessoal de direitos por si alegada.

Diante disso, não se vislumbra óbice à pretensão, formulada em caráter singular, para a realização de verdadeira ampliação do volume da rede de drenagem pluvial, razão pela qual prossigo no exame da obrigação requerida.

A esse respeito, a Constituição Federal, efetivamente, estabelece ser competência comum entre a União, os Estados e os Municípios, a promoção de "programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico" (artigo 23, inciso IX), além de dispor que "A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes" (artigo 182).

Para a consecução destes objetivos, originariamente, foi editada a Lei n. 11.445/2007, que passou a estabelecer diretrizes nacionais para o saneamento básico, e consignava, em seu artigo 2º, inciso IV, dentre seus princípios fundamentais, a "disponibilidade, em todas as áreas urbanas, de serviços de drenagem e de manejo das águas pluviais adequados à saúde pública e à segurança da vida e do patrimônio público e privado". Referida redação, inclusive, não foi alterada com o advento do Marco Legal do Saneamento Básico (Lei n. 14.026/2020).

Prosseguindo no balizamento legal, extrai-se que, a partir do artigo 2º, inciso I, alínea "d", da Lei n. 11.445/2007, foram explicitados diversos conceitos aplicáveis ao presente caso, os quais, em seu teor original de redação, contaram com o seguinte teor:

"Art. 3o Para os efeitos desta Lei, considera-se:I - saneamento básico: conjunto de serviços, infra-estruturas e instalações operacionais de:a) abastecimento de água potável: constituído pelas atividades, infra-estruturas e instalações necessárias ao abastecimento público de água potável, desde a captação até as ligações prediais e respectivos instrumentos de medição;b) esgotamento sanitário: constituído pelas atividades, infraestruturas e instalações operacionais de coleta, transporte, tratamento e disposição final adequados dos esgotos sanitários, desde as ligações prediais até o seu lançamento final no meio ambiente;c) limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos: conjunto de atividades, infra-estruturas e instalações operacionais de coleta, transporte, transbordo, tratamento e destino final do lixo doméstico e do lixo originário da varrição e limpeza de logradouros e vias públicas;d) drenagem e manejo das águas pluviais urbanas: conjunto de atividades, infra-estruturas e instalações operacionais de drenagem urbana de águas pluviais, de transporte, detenção ou retenção para o amortecimento de vazões de cheias, tratamento e disposição final das águas pluviais drenadas nas áreas urbanas". Grifei.

Com as alterações advindas do Marco Legal do Saneamento Básico, o dispositivo destacado acima passou a elencar, em sua alínea "d", que assume especial relevância para o presente caso, a definição a seguir:

"d) drenagem e manejo das águas pluviais urbanas: constituídos pelas atividades, pela infraestrutura e pelas instalações operacionais de drenagem de águas pluviais, transporte, detenção ou retenção para o amortecimento de vazões de cheias, tratamento e disposição final das águas pluviais drenadas, contempladas a limpeza e a fiscalização preventiva das redes".

Feito o balizamento legal, tem-se, de acordo com a cartilha "Drenagem e o Manejo das Águas Pluviais Urbanas", editada pelo Ministério do Desenvolvimento Regional, que "A drenagem e manejo das águas pluviais urbanas (DMAPU) evitam e atenuam impactos humanos, sociais...

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