Acórdão nº 0012264-72.2011.8.14.0301 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 1ª Turma de Direito Público, 02-10-2023

Data de Julgamento02 Outubro 2023
Órgão1ª Turma de Direito Público
Ano2023
Número do processo0012264-72.2011.8.14.0301
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
AssuntoAbuso de Poder

APELAÇÃO CÍVEL (198) - 0012264-72.2011.8.14.0301

APELANTE: ESTADO DO PARÁ

APELADO: PORTO SEGURO COMPANHIA DE SEGUROS GERAIS

RELATOR(A): Desembargadora EZILDA PASTANA MUTRAN

EMENTA

RECURSO DE APELAÇÃO. AÇÃO ORDINÁRIA DE COBRANÇA DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS.INCIDÊNCIA DE PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. NÃO HÁ COMPROVAÇÃO DA DATA EM QUE AUTORA TOMOU CIÊNCIA DO OCORRIDO ACIDENTE E DA SUPOSTA OMISSÃO DO ESTADO O QUAL RESULTARIA NO DIES A QUO DO PRAZO PRESCRICIONAL. APLICAÇÃO DA TEORIA ACTIO NATA. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. DANO CAUSADO A VEÍCULO APREENDIDO. RESPONSABILIDADE DO ENTE ESTATAL PELA GUARDA E CONSERVAÇÃO DO BEM. NEXO DE CAUSALIDADE DEMONSTRADO. DEVER DE INDENIZAR. DANOS MATERIAIS. CABÍVEIS. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.

1-O instituto da prescrição é regido pelo princípio da actio nata, ou seja, o curso do prazo prescricional tem início com a efetiva lesão do direito tutelado, momento em que nasce a pretensão a ser deduzida em juízo, caso resistida, como preceitua o art. 189 do Código Civil.

2-In casu, ausência de comprovação da data da ciência inequívoca da violação do direito ou da efetiva extensão do dano sofrido, bem como, não haver comprovação de lapso superior a 05(cinco) anos entre a data e o ajuizamento da ação.

3-Uma vez que o veículo apreendido estava sob custódia do Estado do Pará, utilizado pelo TJE como fiel depositário no cumprimento de diligências, fora envolvido em acidente na Rodovia Transamazônica em 23/07/2003, não obstante, o poder público assumiu sua guarda e conservação, passando a ser responsável pelo referido bem para todos os efeitos.

4-A responsabilização do Estado afigura-se como objetiva, ou seja, independe de se perquirir acerca do elemento subjetivo da culpa, bastando, para tanto, restar verificado sua conduta, o dano e o nexo causal entre ambos os elementos

5-Os documentos juntados aos autos evidenciam as avarias ocorridas no veículo apreendido no acidente automobilístico, passando a ser inservível após ocorrido.

6-Comprovado o fato (omissão estatal), o dano e a relação de causalidade entre o prejuízo e a conduta, compete a administração pública o dever de indenizar pelos danos materiais sofridos pela autora.

7-Recurso conhecido e desprovido. À unanimidade.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos.

ACORDAM os Exmos. Desembargadores que integram a Egrégia 1ª Turma de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, à unanimidade de votos, EM CONHECER DO RECURSO, NEGANDO-LHE PROVIMENTO, nos termos do voto da relatora.

Belém (Pa), data de registro do sistema.

Desembargadora Ezilda Pastana Mutran

Relatora

RELATÓRIO

Trata-se de RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL interposto pelo ESTADO DO PARÁ, contra sentença proferida pelo Juízo da 4ª Vara da Fazenda Pública de Belém, nos autos da Ação de Indenização por Danos Materiais em face de PORTO SEGURO COMPANHIA DE SEGUROS GERAIS.

Na exordial informou a empresa autora (ID.7974308) que por força de contrato de seguro de automóvel, apólice n° 58950296, celebrado com o segurado Luiz Pimentel Refato, garantiu cobertura de furto e roubo quanto ao veículo automotor marca Fiat, modelo Strada Working 1.5, MPI SV 8V, ano/modelo 2000/2001, chassi n° 9BD27807212762657, placa DCA 0288, cor preta, de propriedade do referido segurado.

Relata que tal veículo fora furtado, em 16/06/2002, na cidade de São Paulo - SP, conforme Boletim de Ocorrência Policial n° 44255/2002, em anexo à inicial, e que, não sendo localizado o bem, promoveu a indenização ao segurado, conforme os recibos anexados aos autos, que somam o valor de R$ 16.333,00 (dezesseis mil, trezentos e trinta e três reais).

Narra que, com o pagamento da indenização ao segurado, a propriedade do automóvel lhe foi transferida na forma da lei, seguindo com a buscado bem a fim de obter a apreensão e minimizar as perdas patrimoniais decorrentes da indenização paga ao segurado.

Assevera, que obteve conhecimento de que o automóvel fora apreendido pela Polícia Civil do Estado do Pará, na cidade de Tucuruí, tendo sido apurado que, em 16/06/2003, o juízo da 1ª Vara da Comarca de Tucuruí, autorizou que o veículo apreendido fosse utilizado pelo oficial de justiça José Amadeu de Oliveira Filho para cumprimento de diligências, figurando este como fiel depositário.

Pontuou que, em 23/07/2003, quando estava sendo utilizado em serviço pelo citado oficial de justiça, o veículo foi envolvido em um acidente rodoviário de grandes proporções, por volta do Km 18 da Rodovia BR 230, ficando seriamente danificado.

Afirma que, obteve a informação de que o automóvel teria ficado por muitos dias na margem da rodovia onde ocorreu o acidente, sem que o Estado do Pará tomasse qualquer providência para a sua remoção, o que ocasionou seu deterioramento.

Arguiu que os documentos juntados à exordial comprovam o fato danoso e o prejuízo material que sofreu, considerando que o automóvel destruído havia sido apreendido pela Polícia Civil do Estado do Pará, sendo posteriormente utilizado pelo oficial de justiça José Amadeu Oliveira Filho, devidamente autorizado pelo juiz da Comarca de Tucuruí, que o nomeou como fiel depositário do bem.

Por fim, requer a condenação do Estado do Pará ao pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$16.333,00 (dezesseis mil, trezentos e trinta e três reais). Juntou documentos.

Em sua contestação (ID.7974368), o Estado do Pará suscitou a ocorrência da prescrição e a inexistência do dever de indenizar.

Réplica no ID. 7974372.

O feito seguiu seu regular processamento até a prolação de sentença (ID.7974380), que julgou o pedido juridicamente possível, nos seguintes termos:

Isto posto, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado na exordial e condeno o ESTADO DO PARÁ ao pagamento de indenização por danos materiais parte autora na quantia de R$16.333,00 (dezesseis mil, trezentos e trinta e três reais), devendo incidir retroativamente correção monetária e juros de mora, a contar do evento danoso (RE870.947, Resp 1.495.146-MG e Súmula 362 do STJ).

Quanto aos índices de correção monetária e de juros de mora, a aplicação em face da Fazenda Pública deve ser realizada da seguinte forma: a) juros de mora: A partir de 11/01/2003 (Transição para o novo Código Civil): serão de 1% ao mês, exceto nos casos previstos na MP n.º 2.180-35, que incluiu o art. T-F na Lei n° 9.494/97; a partir de 30/06/2009 (Data da entrada em vigor da Lei n" 11.960/2009), serão aplicáveis nos moldes empregados à caderneta de poupança, nos termos do art. 5° da Lei n" 11.960/2009; e a partir de 25/03/2015 (Data da decisão de Modulação), juros monetários nos moldes aplicados à Caderneta de Poupança.

b) Atualização monetária: o STF no julgamento do Tema 810 (RE 870947/SE, em julgamento de 20/09/2017, fixou a tese de que a atualização monetária deve ocorrer segundo o IPCA-E.

Condeno o Estado do Pará ao pagamento de honorários advocatícios em favor do patrono do requerente, que arbitro, com fundamento no art. 85, §§2° e 3°, do CPC, em 10% sobre o valor da condenação.

Isenção de custas para o ente estatal, conforme o art. 40, I, da Lei Estadual n"8.328/2015.

Irresignado, o Estado do Pará interpôs recurso de Apelação (ID.7974390), arguindo a ocorrência da prescrição do direito de ação, eis que a pretensão surgiu em 16/06/2002 (data do furto do veículo) e tendo sido interposta a ação na data de 18/04/2011, já foi em muito extrapolado o prazo trienal ou quinquenal.

No mérito, arguiu a inexistência dos requisitos caracterizadores da responsabilidade civil, pois não houve a comprovação acerca do nexo de causalidade entre a conduta dos agentes públicos de não diligenciar quanto a remoção e guarda do veículo e o dano sofrido pelo autor quanto a perda total do veículo após o acidente, não existindo com isso uma suposta omissão estatal.

Ao final, pugnou pela extinção do feito, por prescrição, e caso tal preliminar seja ultrapassada, que a ação seja julgada improcedente.

Contrarrazões no ID.7974395, pugnando pelo não provimento do apelo, com a manutenção da sentença in totem. (ID.7974395)

Coube-me a relatoria do feito por distribuição, tendo o recurso sido recebido no duplo efeito conforme o disposto no artigo 1.012, caput do CPC. (ID.7999327).

O Ministério Público de 2º Grau não opinou no feito, entendendo ausente o interesse público (ID. 8801417).

É o relatório.

VOTO

Conheço do recurso por estarem preenchidos os pressupostos de admissibilidade recursal.

Inicialmente, passo à análise da prescrição suscitada pelo Estado do Pará (afastada na decisão saneadora do feito – ID.79743780), que levou à condenação do recorrente ao pagamento de indenização por danos materiais.

De plano, é importante referir o significado da prescrição segundo a precisa lição de R. Limongi França:

“Prescrição é a perda da ação atribuída a um direito, e de toda sua capacidade defensiva, em consequência do não-uso delas durante um determinado espaço de tempo”. (Instituições de Direito Civil. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 193.).

Trata-se, portanto, do impedimento à pretensão não exercida no prazo legal, como referido por J. M. de Carvalho Santos[1], cuja origem remonta ao instituto da prescriptio do Direito Romano, possuindo os seguintes elementos integrantes: a) existência de uma ação exercitável (actio nata); b) inércia do titular da ação pelo seu não exercício; c) continuidade dessa inércia durante certo lapso de tempo; d) ausência de algum fato, a que a lei atribua a eficácia impeditiva, suspensiva ou interruptiva do curso do prazo prescricional, como bem coloca Délio Maranhão.

Nesse diapasão, com relação ao termo inicial do prazo prescricional, o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento, com base na teoria da actio nata, que seu termo inicial somente é possível a partir do conhecimento da violação do direito ou da efetiva extensão do dano.

Neste caso, em que pese o sinistro que ocasionou o pagamento...

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