Acórdão Nº 0012967-71.2002.8.24.0064 do Segunda Câmara de Direito Público, 17-05-2022

Número do processo0012967-71.2002.8.24.0064
Data17 Maio 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0012967-71.2002.8.24.0064/SC

RELATOR: Desembargador FRANCISCO JOSÉ RODRIGUES DE OLIVEIRA NETO

APELANTE: IRIO ARMANDO FONTANA APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta por Irio Armando Fontana contra a sentença proferida na ação civil pública promovida pelo Ministério Público, que julgou procedente em parte os pedidos iniciais, para determinar que o réu se abstenha de promover o aterramento da área litigiosa sem licença ambiental do órgão competente e para que no prazo de 90 (noventa) dias promova o reflorestamento com espécies nativas, de acordo com projeto aprovado pela Fundação do Meio Ambiente do Município de São José, sob pena de multa diária (evento 37, doc. PROCJUDIC6, fls. 134-142).

Nas suas razões, alegou que não existem provas nos autos no sentido de que foi o responsável pelo depósito de lixo e de detritos no terreno, de modo que, à míngua de ação ou de omissão de sua parte, não se cogita da obrigação de reparar o dano ambiental e, assim, da responsabilidade ambiental, mormente considerando que não houve proveito econômico para si.

Aduziu que envidou todos os esforços possíveis para evitar o despejo de materiais na área questionada por parte de terceiros, instalando placas de advertência e cercas divisórias, todavia, essas medidas resultaram infrutíferas.

Afirmou que anteriormente à aquisição da propriedade o local já se tratava de um lixão, no qual os moradores, as empresas de construção civil e a própria Administração Pública despejavam detritos de toda ordem.

Asseverou que ficou provado nos autos que o Município de São José fez obras de dragagem no Rio Três Henrique e depositou os resíduos no seu imóvel, sendo a Administração Pública a provocadora da degradação ambiental.

Argumentou que a perícia é conclusiva no sentido de que o local não é área de preservação permanente (APP) por ressentir-se de vegetação de restinga, conquanto seja área de marinha.

Afirmou que no curso do feito houve decisão judicial no sentido de pairar dúvidas sobre se a perícia foi de fato realizada na área litigiosa ou em local diverso, o que não restou esclarecido.

Requereu o conhecimento e provimento do recurso (evento 37, doc. PROCJUDIC6, fls. 164-172).

O Ministério Público, por intermédio da 10ª Promotoria de Justiça, apresentou contrarrazões (evento 37, doc. PROCJUDIC6, fls. 177-182).

Os autos subiram ao Tribunal de Justiça, vindo a mim conclusos.

A douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra da Procuradora Gladys Afonso, manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso (evento 37, doc. PROCJUDIC6, fls. 190-201).

O processo foi suspenso em virtude da afetação do Tema 1010 pelo Superior Tribunal de Justiça (evento 37, doc. PROCJUDIC6, fls. 203-204), retornando posteriormente conclusos.

É o relatório.

VOTO

1. O voto, antecipe-se, é no sentido de conhecer do recurso e negar-lhe provimento.

2. Cuida-se de ação civil pública promovida pelo Ministério Público contra Irio Armando Fontana, imputando-lhe a execução de aterramento e o depósito de resíduos na sua propriedade localizada na Rua Heriberto Hülse, no bairro Barreiros, no Município de São José, e para além dela, atingindo o Rio Três Henriques e a praia contígua ao imóvel, a razão do pedido de cessação da atividade e de reparação da degradação ecológica.

A controvérsia recursal reside, basicamente, na negativa de autoria e de materialidade com relação aos danos ambientais.

Todavia, sem razão o apelante.

Senão vejamos o arcabouço probatório:

1º. O Termo Circunstanciado Ambiental n.º 111/2000 dá conta de que, a partir de denúncia anônima, em 09.11.00, a Polícia Militar Ambiental flagrou o aterramento de 83m da margem esquerda do Rio Três Henriques, assim como de 47m da praia onde ele deságua, perfazendo uma área de aproximadamente 3.500m². No ato, os agentes da lei interpelaram Aristides Santana, caseiro do imóvel, que informou que o seu patrão, Irio Armando Fontana, estava executando o aterramento focalizado sem licença ambiental (evento 37, doc. PROCJUDIC2, fls. 19-26).

2º. A Notificação de Infração Penal Ambiental n.º 112/2001 informa que, a partir de nova denúncia, em 14.11.2001 constatou-se a continuidade da atividade poluidora, com o depósito tijolos, entulhos, ferragens, lonas plásticas, telhas de amianto e outros materiais de construção, bem como de velas, túmulos, flores plásticas, velas, etc., tudo isso em prejuízo da biota existente na margem do curso d'água e da orla marinha. Nesse ensejo, o funcionário afirmou que tudo isso estava sucedendo com o permissão do proprietário Irio Armando Fontana (evento 37, doc. PROCJUDIC2, fls. 75-81).

3º. O Relatório de Vistoria do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais - IBAMA noticia que, em 14.11.2001, o imóvel encontrava-se repleto de entulhos resultantes de demolições de construção civil, tais como areia, barro, pedras, telhas, tijolos, vigas de concreto, revestimentos de cerâmica, além de peças de mobiliário, cujo aterro já perfazia uma área de 4.000m². Ademais, certificou-se que o aterramento e o depósito de resíduos sólidos deram-se em área de preservação permanente (APP), a considerar a proximidade do curso d'água com menos de 10m de largura, e sobre o bioma manguezal, a vegetação de restinga e a faixa de areia da praia, havendo um pequeno remanescente de mangue nos arredores e vegetação gramínea sobre o local aterrado (evento 37, doc. PROCJUDIC2, fls. 83-88).

4º. O Relatório de Vistoria n.º 22/2005 informa que, na data de 28.07.2005, não havia vestígios de alteração do local dos fatos, a denotar a cessação momentânea da atividade nociva (evento 37, doc. PROCJUDIC2, fls. 179-183).

5º. Na audiência de instrução e julgamento realizada em 08.06.2006, o policial militar ambiental Alberto Rampelotti da Rocha prestou o seguinte depoimento:

"[...] Que a pedido do Ministério Público de São José, procederam a uma vistoria na localidade dos fatos; Que não sabe informar se alguém apontou o requerido como sendo o autor da degradação; Que o crime estava acontecendo no terreno do requerido, que fica do rio até a lombada; Que não conversou com testemunhas, mas apenas com o caseiro; Que o aterro estava sendo feito com barro e entulho; Que não sabe se era frequente o depósito de entulho no local; Que a área do requerido era cercada; Que não foi com o depoente que determinado carreto teria chegado ao local, tendo sido permitido o depósito do entulho; [...] Que não sabe quem colocou o material degradante no local dos fatos; Que o caseiro informou que a propriedade era do requerido; Que o depoente não averiguou se o indivíduo era realmente o caseiro; [...] Que o Sargento Dioncarlos foi quem conduziu a vistoria e efetuou o relatório, sendo que o depoente apenas procedeu a medição da área; Que o depoente recorda do senhor que se apresentou como caseiro, mas não recorda o nome do mesmo; Que existia no local uma residência e acredita que o mesmo residia no local com mulher e filhos. [...]" (evento 37, doc. PROCJUDIC2, fl. 201).

6º. O Memorando n.º 182/07 da Secretaria de Obras do Município de São José reporta que "Os serviços de dragagem que ocorreram a alguns anos (2001/2002) na foz do Rio Três Henriques se limitaram à execução de desassoreamento para aumento da vazão devidos às obras de retificação daquele rio" e que "[...] os serviços consistiam somente na dragagem, onde os materiais provenientes dos serviços eram depositados, para posterior remoção, em parte do imóvel do sr. Irio Armando Fontana, sob sua autorização, não existindo de nossa parte nenhuma ação que caracterize aterro ou errocamento do Rio Três Henriques" (evento 37, doc. PROCJUDIC2, fl. 243).

7º. A Notificação de Infração Penal Ambiental n.º 29/2010 tem o seguinte teor:

"No dia 24 de agosto de 2010, a guarnição de serviço qualificada nos itens 5 e 6 do presente Termo deslocou-se ao endereço indicado no item 3, onde flagrou irregularidades no que tange à seara ambiental.No local, a equipe de fiscalização deparou-se com um aterro efetuado em área de marinha, atividade esta realizada com detritos de construção e carreamento de outros materiais, em um nível que resultou na destruição da biodiversidade, nas seguintes coordenadas geográficas: S27º32'97,8" e W48º36'73,4".No local foi feito contato com a sra. Jandira Aparecida Galvão Paes, que encontrava-se a serviço do proprietário do sítio, sendo a caseira da propriedade. Dessa forma, foi perguntado à mesma quem seria o proprietário da área em apreço, a qual informou que seria uma mulher...

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