Acórdão nº 0013199-68.2018.8.14.0107 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 2ª Turma de Direito Privado, 12-12-2023

Data de Julgamento12 Dezembro 2023
Órgão2ª Turma de Direito Privado
Ano2023
Número do processo0013199-68.2018.8.14.0107
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
AssuntoRescisão do contrato e devolução do dinheiro

APELAÇÃO CÍVEL (198) - 0013199-68.2018.8.14.0107

APELANTE: MARIA JOSE DIAS SILVA

APELADO: BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A.

RELATOR(A): Desembargadora GLEIDE PEREIRA DE MOURA

EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL N. : 0013199-68.2018.8.14.0107

APELANTE: MARIA JOSE DIAS SILVA

ADVOGADO: THAYNA JAMYLLY DA SILVA GOMES

APELADO: BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A.

ADVOGADO: WILSON SALES BELCHIOR

RELATORA: DESA. GLEIDE PEREIRA DE MOURA

APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZAÇÃO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO. FRAUDE EM CONTRATO DE EMPRÉSTIMO. NÃO VERIFICADA. EXISTÊNCIA DE CONTRATO COM AS FORMALIDADE SUFICIENTES PARA DEMONSTRAR A DEVIDA CONTRATAÇÃO. ANALFABETOS PODEM CONTRATAR, PORQUANTO PLENAMENTE CAPAZES PARA EXERCER OS ATOS DA VIDA CIVIL. OBSERVÂNCIA DO ART. 595 DO CC/02. APLICAÇÃO DE LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. POSSIBILIDADE. ART. 80, II DO CPC/15. REDUÇÃO DA MULTA DE OFÍCIO. POSSÍVEL. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA NOS DEMAIS ASPECTOS. RECURSO DESPROVIDO.

RELATÓRIO

AL

APELAÇÃO CÍVEL N. : 0013199-68.2018.8.14.0107

APELANTE: MARIA JOSE DIAS SILVA

ADVOGADO: THAYNA JAMYLLY DA SILVA GOMES

APELADO: BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A.

ADVOGADO: WILSON SALES BELCHIOR

RELATORA: DESA. GLEIDE PEREIRA DE MOURA

RELATÓRIO

Trata-se de APELAÇÃO CÍVEL interposta por MARIA JOSE DIAS SILVA em face de sentença do juízo da comarca de DOM ELISEU nos autos da ação declaratória de inexistência de contrato de empréstimo consignado c/c indenização ajuizada em face de BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A.

Na inicial a autora disse que estavam ocorrendo descontos em seus proventos de valores de empréstimo que não reconhecia, referente ao contrato n. 791298248, no valor de R$ 737,39 (setecentos e trinta e sete reais e trinta e nove centavos) dividido em 60 parcelas de R$ 22,66 (vinte e dois reais e sessenta e seis centavos) em 21 parcelas que foram descontadas indevidamente. Requereu a declaração de inexistência de dívida, a restituição em dobro e danos morais.

Na contestação, BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A. afirmou que o contrato foi firmado legalmente, sendo cabíveis os descontos efetuados nos proventos da autora, requereu a improcedência da demanda. Juntou documentos pertinentes ao contrato de empréstimo no id n. 13913749 - Pág. 1.

O feito foi julgado da seguinte forma:

Ante o exposto, com fulcro no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO TOTALMENTE IMPROCEDENTE o pedido formulado na inicial e condeno a parte autora em litigância de má-fé, nos termos acima. DECLARO, ainda, existente a dívida objeto do presente feito.

CONDENO a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios em 10% (dez por cento) do valor da causa, e de custas, suspendendo-se, contudo, a exigibilidade tendo em vista a assistência judiciária gratuita deferida, enquanto perdurar a condição de hipossuficiência, observado o disposto nos § 2º e § 3º do art. 98 do CPC.

Fixo a multa de 10% (dez por cento) do valor corrigido da causa, por litigância de má-fé, nos termos acima expostos.

Caso tenha sido deferida liminar nos autos, fica esta revogada, tendo em vista a improcedência da demanda.

Nas razões da apelação, MARIA JOSE DIAS SILVA aduziu que Banco que é o detentor das provas, e não trouxe nenhuma aos autos. Mencionou que o banco apresentou um contrato, o qual desconhece e sem as formalidades legais. Afirmou que não foi respeitada a exigência legal para contratação por pessoa analfabeta. Disse que não foi comprovado que a apelante tenha sacado o dinheiro. Requereu que fosse afastada a condenação do pagamento de litigância de má-fé, comentando que jamais buscou o Judiciário com objetivo de enriquecer ilicitamente Requereu provimento do recurso para que seja declarada extinta a obrigação, ocorra a condenação em danos morais e repetição de indébito.

Houve contrarrazões - id n.id n. 13913797, requerendo a manutenção da sentença.

É o relatório.

À secretaria, para inclusão em pauta de julgamento, VIA PLENÁRIO VIRTUAL.

Belém, de de 2023.

DESA. GLEIDE PEREIRA DE MOURA

RELATORA

VOTO

APELAÇÃO CÍVEL N. : 0013199-68.2018.8.14.0107

APELANTE: MARIA JOSE DIAS SILVA

ADVOGADO: THAYNA JAMYLLY DA SILVA GOMES

APELADO: BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A.

ADVOGADO: WILSON SALES BELCHIOR

RELATORA: DESA. GLEIDE PEREIRA DE MOURA

VOTO

Conheço do recurso de apelação, posto que presentes os seus pressupostos de admissibilidade recursal.

No caso em tela, a situação versa sobre o cabimento de o banco recorrido arcar com o pagamento de danos morais, bem como o dever de pagar em dobro a quantia que teria sido cobrada indevidamente do autor/ recorrente, em decorrência de empréstimo, o qual este última não reconhece a contratação. Busca ainda o recorrente que seja afastada a multa por litigância de má-fé.

Na presente situação verifica-se que fora realizado desconto nos proventos da apelante, que diz respeito a empréstimo firmado com o Banco Apelado.

Contudo, verifica-se que o contrato de empréstimo consignado fora de fato realizado pela recorrente, considerando que consta nos autos o devido instrumento contratual, tendo a assinatura do autor por meio de sua digital, acompanhada de assinatura de testemunhas, conforme previsto no art. 595 do CC/02, sendo suficiente para demonstrar a licitude da contratação conforme se verifica no contrato id n. id n. 13913749 - Pág. 1. Nesse sentido, vejamos o julgado do STJ:

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. DIREITO CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA. RESTITUIÇÃO DE INDÉBITO. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. IDOSO E ANALFABETO. VULNERABILIDADE. REQUISITO DE FORMA. ASSINATURA DO INSTRUMENTO CONTRATUAL A ROGO POR TERCEIRO. PRESENÇA DE DUAS TESTEMUNHAS. ART. 595 DO CC/02. ESCRITURA PÚBLICA. NECESSIDADE DE PREVISÃO LEGAL. 1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 2. Os analfabetos podem contratar, porquanto plenamente capazes para exercer os atos da vida civil, mas expressam sua vontade de forma distinta. 3. A validade do contrato firmado por pessoa que não saiba ler ou escrever não depende de instrumento público, salvo previsão legal nesse sentido. 4. O contrato escrito firmado pela pessoa analfabeta observa a formalidade prevista no art. 595 do CC/02, que prevê a assinatura do instrumento contratual a rogo por terceiro, com a firma de duas testemunhas. 5. Recurso especial não provido.

(STJ - REsp: 1954424 PE 2021/0120873-7, Relator: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 07/12/2021, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 14/12/2021)

Ressalta-se que se o referido valor do empréstimo não tivesse sido recebido pelo apelante, facilmente este poderia apresentar seu extrato bancário, com o intuito de descartar o recebimento da quantia descrita no contrato de empréstimo em questão, considerando se tratar de um documento pessoal e de fácil acesso.

Tal medida não seria capaz de descaracterizar a inversão do ônus da prova, tendo em vista que o contrato de empréstimo em questão foi apresentado pela instituição financeira e não pelo consumidor, contudo sabe-se que as partes devem atuar primando pela boa fé processual e o pelo dever de cooperação. No entanto, a autora/ apelante apenas se restringe em afirmar que o banco não apresentou comprovante de que repassou o valor descrito no empréstimo, quando o próprio consumidor poderia trazer aos autos a demonstração probatória de suas alegações.

A inversão do ônus da prova não isenta a produção de provas mínimas sobre os fatos alegados, quando o consumidor tem acesso a elas, inclusive, porque tal medida processual se trata de instrumento que se destina a proporcionar um processo justo e equilibrado, em observância a hipossuficiência não apenas financeira, mas também técnica do consumidor.

Assim, quando o consumidor tem pleno acesso ao seu extrato bancário e deixa de apresentá-lo, simplesmente alegando que faz jus à inversão do ônus da prova, deixa de homenagear o dever de cooperação que se espera das partes para que se alcance, neste âmbito, a melhor prestação jurisdicional possível.

Nesse sentido, vejamos a norma processual civil:

Art. 6º Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva.

Nesse sentido, vejamos o julgado:

EMENTA APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE ANULABILIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. EMPRÉSTIMO. DESCONTOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. INDEFERIMENTO DA INICIAL POR AUSÊNCIA DE DOCUMENTOS NECESSÁRIOS. EXTRATOS BANCÁRIOS. DOCUMENTOS DE FÁCIL ACESSO AO TITULAR DA CONTA. DESOBEDIÊNCIA À ORDEM JUDICIAL. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA QUE NÃO AFASTA DEVER DE PROVA MÍNIMA. RECURSO DESPROVIDO. 1- A juntada de documento a se aferir o mínimo dos elementos que evidenciem o direito da parte autora, qual seja o extrato de sua conta pessoal, é de fácil obtenção, e a desobediência do determinado convola no indeferimento da inicial. 2- “Em termos de provas, mesmo com a aplicação do CDC e a inversão do ônus da prova, em face da hipossuficiência da parte, deve esta demonstrar, ainda que de forma mínima, que tem o direito pretendido. Suas alegações, baseadas no CDC, não gozam de presunção absoluta de veracidade.” (N.U 1013614-32.2020.8.11.0015, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 23/08/2022, Publicado no DJE 30/08/2022).

(TJ-MT 10196461920218110015 MT, Relator: NILZA MARIA POSSAS DE CARVALHO, Data de Julgamento: 11/10/2022, Primeira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 19/10/2022)

Dessa forma, incontestável que a quantia decorrente do empréstimo em questão foi destinado para a autora/apelante e que esta não requereu a devolução da quantia ao banco, fato que afasta a pretensão autoral de cancelamento de avença, danos morais e repetição de indébito, uma vez que não resta caracterizada a conduta ilícita por parte da...

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