Acórdão Nº 0013356-48.2012.8.24.0018 do Quarta Câmara de Direito Público, 28-07-2022

Número do processo0013356-48.2012.8.24.0018
Data28 Julho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0013356-48.2012.8.24.0018/SC

RELATOR: Desembargador DIOGO PÍTSICA

APELANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA APELADO: SONIA DEVILLA TOMASI

RELATÓRIO

Na comarca de Chapecó, Sônia Devilla Tomasi ajuizou "ação ordinária de indenização" contra Estado de Santa Catarina.

À luz dos princípios da economia e celeridade processual, por sintetizar de forma fidedigna, adoto o relatório da sentença (Evento 116, Sentença 333-338, 1G):

SONIA DEVILLA TOMASI, (qualificada nos autos. ajuizou a presente AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS contra ESTADO DE SANTA CATARINA.

Como fundamento do pedido, alegou na inicial, em síntese, que: em 16/01/2011 soube que seu marido eslava praticando manobras perigosas com o veículo pelas ruas e foi ao seu encontro para solicitar que parasse; mais tarde no mesmo dia, policiais militares tentaram invadir sua residência portando armas; foi puxada com violência pelo sargento Roberto e algemada pelas costas; permaneceu algemada dentro da viatura, exposta aos vizinhos e transeuntes por mais de uma hora, mesmo sem tentativa de fuga; a prisão foi arbitrária e leve cunho político, uma vez que a autora "estava em conflito com a agremiação partidária do PMDB, partido que o citado sargento é simpatizante". Deve ser indenizada pelos danos morais sofridos em decorrência da invasão de domicílio e emprego de violência desnecessária e desproporcional e uso de algemas pelos agentes da ré.

Citado, o réu ofereceu contestação, alegando, em síntese, que: os policiais militares agiram em estrito cumprimento de dever legal e em legítima defesa: a autora e seu marido estavam proferindo ameaças contra os policiais em frente à residência do sargento Roberto e realizando manobras perigosas com veículo; a autora estava muito exaltada e violenta, sendo tomadas as medidas necessárias para manter o controle da situação e impedir que os policiais fossem agredidos. Os pedidos devem ser julgados improcedentes.

A autora replicou (fls. 137-142).

O Ministério Público anotou não ler interesse no feito (fls. 143-144).

Em audiência. inviável a conciliação, foram ouvidas quatro testemunhas arroladas pela autora e cinco testemunhas, bem como um informante. arrolados pelo réu (fls. 183-201).

Alegações finais às fls. 206-213 e 214-221.

É o relatório.

Devidamente instruído, o feito foi julgado, nos termos adjacentes (Evento 116, Sentença 333-338, 1G):

ANTE O EXPOSTO, com fundamento no art. 481, inciso I, do Código do Processo Civil, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado na inicial, CONDENANDO o Estado de Santa Catarina no pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais), acrescidos de correção monetária, na forma da fundamentação supra, a partir do arbitramento, e de juros de mora a partir do evento danoso (16/01/2011).

Condeno o réu ao pagamento dos honorários advocatícios de sucumbência em favor do patrono da autora, estes que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, §3º, inciso I, do Código de Processo Civil. O Estado é isento de custas (LC n. 156/97).

Publique-se.

Registre-se.

Intimem-se.

Transitada em julgado, arquive-se.

Irresignado, o ente federado aviou recurso de apelação. Argumentou, em síntese, que: a) não houve excesso na abordagem policial, nem tampouco conduta antijurídica dos agentes públicos; b) a atuação dos policiais está acobertada pelo manto do estrito cumprimento do dever legal; e c) caso mantida a condenação, dever ser minorado o quantum indenizatório (Evento 116, Apelação 342-355, 1G).

Sem contrarrazões, os autos ascenderam ao Tribunal de Justiça.

A Procuradoria-Geral de Justiça manifestou-se pela ausência de interesse na causa (Evento 120, 1G).

É o relatório.

VOTO

O recurso merece conhecimento, porquanto é tempestivo e preenche os demais requisitos de admissibilidade.

Recebo-o em seus efeitos legais.

Pleiteia o requerido o afastamento do dever de indenizar, sob o argumento de que não houve excesso na abordagem policial, nem tampouco conduta antijurídica dos agentes públicos, bem como que a atuação dos policiais está acobertada pelo manto do estrito cumprimento do dever legal.

Razão não lhe assiste.

Impende salientar que, em casos de danos produzidos por agentes públicos, vigora a teoria do risco administrativo, sendo objetiva a responsabilização do Poder Público.

Nessa linha vão os ensinamentos de Flávio Tartuce:

Voltando especificamente à responsabilidade do Estado, trata-se de responsabilidade objetiva, não se discutindo sequer se houve culpa do funcionário, agente ou preposto do Poder Público. Na verdade, a culpa do agente serve apenas para fixar o direito de regresso do Estado contra o responsável direto pelo evento.

Dessa forma, vigora a teoria do risco administrativo, que gera uma responsabilidade objetiva mitigada, uma vez que pode ser afastada ou diminuída pela culpa exclusiva ou concorrente da vítima, o que não ocorre na responsabilidade objetiva plena ou integral (teoria do risco integral). Mas se o Estado é o responsável pelo dano ambiental, aplica-se essa última teoria. Em situações tais, não há direito de regresso do ente público contra o seu agente.

Especificamente a respeito da responsabilidade do Estado, o Supremo Tribunal Federal já entendeu que para a responsabilização do Estado sequer se exige que o agente esteja no exercício de suas funções quando da ocorrência do dano:

"Responsabilidade objetiva do estado. Acidente de trânsito envolvendo veículo oficial. Responsabilidade pública que se caracteriza, na forma do § 6.º do art. 37 da Constituição Federal, ante danos que agentes do ente estatal, nessa qualidade, causarem a terceiros, não sendo exigível que o servidor tenha agido no exercício de suas funções. Precedente" (Supremo Tribunal Federal, RE 294.440AgR, Rel. Min. Ilmar Galvão, DJ 02.08.2002) (Direito Civil, v. 2: Direito das Obrigações e Responsabilidade Civil. 12. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2017. p. 603-604).

No mesmo diapasão, colijo precedentes deste Areópago:

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MORAIS POR EXCESSO NA CONDUTA POLICIAL DURANTE ABORDAGEM. TIROS DESFERIDOS CONTRA OS AUTORES. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. INTELIGÊNCIA DO ART. 37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. TIROS QUE ATINGIRAM O VEÍCULO DO AUTOR EM QUE SE ENCONTRAVAM SEUS FAMILIARES. DANOS MORAIS CARACTERIZADOS. INOCORRÊNCIA DE CULPA CONCORRENTE. QUANTUM ADEQUADO. JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA CORRETAMENTE DEFINIDOS. RECURSO DESPROVIDO. (TJSC, Apelação n. 0300129-67.2017.8.24.0041, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Pedro Manoel Abreu, Primeira Câmara de Direito Público, j. 27-01-2022).

REEXAME NECESSÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ABORDAGEM POLICIAL. ALEGAÇÕES DE ABUSO DE AUTORIDADE E AGRESSÕES FÍSICAS. PROVA TESTEMUNHAL DO AVENTADO EXCESSO NO CUMPRIMENTO DO DEVER LEGAL. RESPONSABILIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA. DEVER DE INDENIZAR. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. CONSECTÁRIOS LEGAIS ALTERADOS DE OFÍCIO. REMESSA OFICIAL E RECURSOS VOLUNTÁRIOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS. "É verdade que, para preservação da segurança pública e o restabelecimento da ordem e da paz social pode ser necessária a utilização de força física por parte de policiais. Quando o ato é praticado no estrito cumprimento do dever legal e no exercício regular do direito, sem qualquer excesso ou abuso, a reparação será afastada. Porém, o exercício da função policial com excesso, abuso de poder e agressão física ou moral, obriga o Estado a pagar a indenização dos respectivos danos" (TJSC, Apelação Cível n. 2013.011782-4, de Palhoça, rel. Des. Jaime Ramos, Quarta Câmara de Direito Público, j. 16-5-2013). (TJSC, Apelação / Remessa Necessária n. 0006774-97.2011.8.24.0040, de Laguna, rel. Júlio César Knoll, Terceira Câmara de Direito Público, j. 03-03-2020).

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PEDIDO JULGADO PROCEDENTE. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO ESTADO. ABUSO DE AUTORIDADE. AUTOR QUE SOFREU AGRESSÃO FÍSICA PRATICADA POR AGENTE PÚBLICO DURANTE ABORDAGEM POLICIAL, AO SER DESFERIDO UM TAPA, COM VIOLÊNCIA, EM SUA ORELHA ESQUERDA, RESULTANDO NA PERFURAÇÃO DO TÍMPANO. ESTRITO CUMPRIMENTO DO DEVER LEGAL DESCARACTERIZADO. EXCESSO NA ATUAÇÃO. ABALO MORAL CONFIGURADO. EFEITOS EXTRAPENAIS DA SENTENÇA CONDENATÓRIA PROFERIDA NO PROCESSO CRIMINAL (ART. 935 DO CÓDIGO CIVIL E ART. 109, I, DO CÓDIGO PENAL MILITAR). DEVER DE INDENIZAR. AUSÊNCIA DE IRRESIGNAÇÃO QUANTO AO MERITUM CAUSAE. RÉU QUE, POR OUTRO LADO, PRETENDE A REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO, MORMENTE O CONSIDERÁVEL GRAU DE REPROVABILIDADE DA CONDUTA TRUCULENTA DURANTE AÇÃO OFICIAL, A EXTENSÃO DO DANO EXPERIMENTADO PELA VÍTIMA, ALÉM DAS CONDIÇÕES ECONÔMICAS E...

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