Acórdão nº 0013528-93.2014.8.14.0051 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 2ª Turma de Direito Público, 26-02-2024

Data de Julgamento26 Fevereiro 2024
Órgão2ª Turma de Direito Público
Ano2024
Número do processo0013528-93.2014.8.14.0051
Classe processualAPELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA
AssuntoObrigação de Fazer / Não Fazer

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) - 0013528-93.2014.8.14.0051

APELANTE: MUNICIPIO DE SANTAREM

APELADO: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DO PARA

RELATOR(A): Desembargador LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO

EMENTA

EMENTA: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO INTERNO EM APELAÇÃO CÍVEL. AUSÊNCIA DE OMISSÃO. MERO INCONFORMISMO DA PARTE. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

1 – Os embargos de declaração são cabíveis quando o provimento jurisdicional incorre em omissão, contradição ou obscuridade, bem como quando há erro material a ser sanado, o que não se verifica na hipótese dos autos.

2 – O presente embargo apresenta mero inconformismo do embargante com o resultado da decisão recorrida, entretanto, tal inconformismo não autoriza a rediscussão da matéria na estreita via dos embargos de declaração.

3– Recurso conhecido e improvido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Excelentíssimos Desembargadores, integrantes da 2.ª Turma de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, à unanimidade, CONHECER e NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, nos termos do voto do Relator.

Julgamento presidido pelo Excelentíssimo Senhor Des. José Maria Teixeira do Rosário.

Belém (PA), data registrada no sistema.

DES. LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO

Relator

RELATÓRIO

Trata-se de EMBARGOS DE DECLARAÇÃO interposto pelo MUNICÍPIO DE SANTARÉM em face do Acórdão (ID. nº 15346841), por meio do qual conheci do recurso de agravo interno e neguei provimento, nos autos da AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO DE LIMINAR movida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ.

Inconformado, o embargante alega omissão no julgado, pois não aborda fundamentalmente os argumentos levantados pelo Município, em especial no que se refere à afronta à dispositivos da Constituição Federal/88, relativa à impossibilidade de o Poder Judiciário intervir na implementação de políticas públicas pelo Executivo.

Ante esses argumentos, requer que os presentes Embargos de Declaração sejam recebidos e conhecidos.

Foram apresentadas contrarrazões (ID. nº 16184358).

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do presente recurso e passo a proferir o voto.

Como é cediço, os embargos aclaratórios servem para sanar omissão, contradição, obscuridade ou erro material na decisão recorrida, consoante prescreve o art. 1.022, do CPC/2015, verbis:

“Art. 1.022. Cabem embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para:

I - Esclarecer obscuridade ou eliminar contradição;

II - Suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento;

III - corrigir erro material.

Parágrafo único. Considera-se omissa a decisão que:

I - Deixe de se manifestar sobre tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção de competência aplicável ao caso sob julgamento;

II - Incorra em qualquer das condutas descritas no art. 489, § 1o.”

Presente essa moldura, passo ao exame meritório dos presentes Embargos, adiantando, desde já, que não verifico a ocorrência de qualquer vício na decisão impugnada, mas mero inconformismo do recorrente com pronunciamento judicial que lhe foi desfavorável, pois o acórdão apresentou fundamentos consistentes e coerentes entre si, verificando-se que, sob o pretexto de sanar omissões, o embargante pretende na realidade rever a decisão prolatada, o que é defeso na estreita via dos embargos de declaração.

Compulsando os autos, a instrução processual revelou que os habitantes do bairro Jutaí sofrem com ação irregular de grileiros há quase 15 (quinze) anos, desde o ano de 2008 os moradores do referido bairro buscam a regularização de seus imóveis junto ao Poder Público Municipal, o qual se manteve inerte em solucionar a demanda da população.

Ressalta-se, ainda, que, diferentemente do relatado pelo embargante nas razões recursais, o Ofício n° 094/2011-GAB-PJM (Num. 897593 – Pág. 3), oriundo da Procuradoria Geral do Município, afirma que o programa de regularização fundiária do bairro Jutaí já se encontrava no rol de planejamento da Secretaria Municipal de Habitação (SMH).

Ademais, foram vários os requerimentos feitos pelos moradores do bairro Jutaí aos integrantes da Câmara Municipal de Santarém (Num. 897592 – Pág. 16/19) e houve grande repercussão jornalística desse fato, conforme matéria jornalística veiculada no periódico da cidade (Num. 897592 – Pág. 14), o que demonstra que o fato é de conhecimento geral, não prevalecendo o argumento de que nunca houve requerimento dos moradores.

Logo, a reiterada postura omissa e desidiosa do Ente Municipal em relação à população de Santarém é evidenciada pela ausência de provas de qualquer iniciativa para a regularização dos imóveis situados no bairro Jutaí, tampouco o Ente Público Municipal promoveu a contratação de servidores — por meio de concurso público ou contratação temporária por excepcional interesse público — a fim de suprir a falta de pessoal para a execução de obras necessárias ao desenvolvimento urbano e ao correto uso e parcelamento do solo.

Verifica-se, ainda, que a inércia do Ente Municipal trouxe graves transtornos aos seus munícipes, considerando que estes vivem coagidos pela possibilidade de terceiros se apropriarem ilegalmente do terreno em que residem, conforme relatado nos Boletins de Ocorrência e Notificações juntados aos autos (Num. 897591 – Pág. 16/17; Pág. 25/26; Pág. 28; e Num. 897592 – Pág. 6/7). Além disso, é inegável que tais circunstâncias desencadeiam episódios de violência, ameaças, prática de crimes, etc., as quais comprometem a ordem pública e a paz social.

Ademais, a Lei n° 13.465/2017 não exige a precedência de Lei Municipal que trate de projetos de regularização fundiária urbana, para que só então o gestor público a implemente.

Nesse sentido, a existência de loteamentos clandestinos e/ou irregulares enseja a atuação do Município, eis que recai sobre este a titularidade para regularizá-los, conforme assevera a jurisprudência do STJ:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO Nº 3/STJ. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MUNICÍPIO DE PORTO ALEGRE. LOTEAMENTO IRREGULAR. REASSENTAMENTO. REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA E URBANÍSTICA. DEVER DO MUNICÍPIO. OMISSÃO DO ENTE PÚBLICO AFIRMADA COM BASE NO CONJUNTO FÁTICO E PROBATÓRIO CONSTANTE DOS AUTOS. SÚMULA 7/STJ. 1. A jurisprudência deste Sodalício orienta no sentido de que o Município é titular do dever de regularizar loteamentos clandestinos ou irregulares, mas a sua atuação deve-se restringir às obras essenciais a serem implantadas, em conformidade com a legislação urbanística local (art. 40, § 5º, da Lei 6.799/1979), em especial à infraestrutura necessária para melhoria na malha urbana, como ruas, esgoto, energia e iluminação pública, de modo a atender aos moradores já instalados (AgInt no REsp 1338246/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 14/03/2017, DJe 20/04/2017). 2. No caso dos autos, o acórdão recorrido concluiu pela responsabilidade do ente público municipal quanto ao loteamento irregular, "devendo providenciar a regularização do loteamento, bem como custear e promover as obras de infraestrutura exigidas pela legislação vigente". 3. Não é possível a revisão deste fundamento de que que houve inércia administrativa no dever do ente municipal de fiscalização do ente público, tendo em vista a necessidade de revolvimento do conjunto fático e probatório constante dos autos. Incidência da Súmula 7/STJ. 4. Agravo interno não provido.

(AgInt no AREsp n. 1.169.567/RS, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 10/4/2018, DJe de 16/4/2018.)

Por sua vez, ao não promover a regularização fundiária urbana, o Município de Santarém descumpre o preceito contido no art. 30, VIII, da CF, o que afeta a proteção dos direitos fundamentais da população inerentes à moradia, segurança pública, saúde, ao meio ambiente equilibrado e ao desenvolvimento socioeconômico da região.

Assim sendo, é patente o interesse público na regularização dos imóveis do bairro Jutaí, os quais se encontram ocupados de forma precária na área urbana do Município de Santarém, como forma de efetivar aos habitantes daquele local o direito social à moradia adequada, conforme preconiza o art. 6º do CF/88.

Diante disso, não subsistem as alegações de insuficiência de pessoal e financeira para cumprimento da obrigação disposta na sentença de primeiro grau, vez que o seu descumprimento reiterado se deve a negligência da Administração Pública Municipal, a qual não logrou êxito em acostar aos autos provas ou documentos capazes de desconstituir a pretensão contida na exordial.

Quanto à alegação de que o prazo concedido para cumprimento da decisão seria exíguo, entendo que não deve prevalecer, em virtude do considerável lapso temporal que tramita a presente ação (desde o ano de 2014) sem que o embargante implementasse qualquer solução tempestiva, bem como porque não restou comprovada qualquer deficiência técnica ou financeira que justificasse o seu prolongamento.

Outrossim, a intervenção do Poder Judiciário mostra-se necessária em situações que desrespeitam os termos constitucionais e que afetam negativamente na coletividade.

Nesses termos, corrobora a jurisprudência colacionada a seguir:

REMESSA NECESSÁRIA. APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO ADMINISTRATIVO, CONSTITUCIONAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PRELIMINARES NÃO ACOLHIDAS. NO MÉRITO. POLÍTICA URBANA. DIREITO SOCIAL À SAÚDE, MORADIA E AO MEIO AMBIENTE. OBRAS DE INFRAESTRUTURA E SANEAMENTO BÁSICO E ADEQUAÇÃO DE VIAS PÚBLICAS NO BAIRRO DE ÁGUAS LINDAS. OMISSÃO. RESPONSABILIDADE DO MUNICÍPIO. DISCRICIONARIEDADE. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. INOCORRÊNCIA. 1. Preliminares de carência de ação, ilegitimidade ativa e passiva, interesse processual e perda de objeto, rejeitadas. 2. No mérito, os serviços de execução de obras de pavimentação asfáltica, esgoto e drenagem inserem-se no direito social...

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