Acórdão Nº 0013591-57.2018.8.24.0033 do Quinta Câmara Criminal, 06-10-2022

Número do processo0013591-57.2018.8.24.0033
Data06 Outubro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0013591-57.2018.8.24.0033/SC

RELATORA: Desembargadora CINTHIA BEATRIZ DA SILVA BITTENCOURT SCHAEFER

APELANTE: THIAGO AMARO (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

O representante do Ministério Público ofereceu denúncia em face de Thiago Amaro, imputando-lhe a prática do crime previsto no art. 155, § 1º e § 4º, incisos I e IV, do Código Penal, conforme os fatos narrados na peça acusatória (evento 11 da ação penal):

No dia 16 de outubro de 2018, por volta das 3h23min, horário de repouso da população local, o denunciado Thiago Amaro, agindo em concurso de vontades com dois agentes não identificados, dirigiu-se ao estabelecimento comercial Lojas Havan, na Avenida Sete de Setembro, 1500, Fazenda, nesta cidade, com o intuito de praticar o crime de furto.

O denunciado e seus comparsas arrombaram a porta para ingressar no estabelecimento e, após o rompimento da tela de acesso ao depósito, subtraíram, para todos, 3 (três) celulares - 2 (dois) da marca Samsung e 1 (um) da marca LG, avaliados em R$ 4.100,00 (quatro mil e cem reais).

Contudo, a ação do denunciado e de seus parceiros de crime foi flagrada por funcionários da central de monitoramento do local, que acionaram a Polícia Militar.

Ato contínuo, policiais militares dirigiram-se à Havan e deram voz de prisão ao denunciado, que estava na posse dos bens subtraídos, e foi encaminhado à Central de Plantão Policial.

Os outros dois agentes conseguiram se evadir.

A denúncia foi recebida e o réu citado no ato da audiência de custódia (evento 12 da ação penal), apresentando a resposta à acusação por meio da Defensoria Pública (evento 39 da ação penal).

Recebida a defesa e não sendo caso de absolvição sumária, foi designada a audiência de instrução e julgamento (evento 53 da ação penal).

Na audiência, houve a oitiva da vítima e das testemunhas arroladas pelas partes, bem como o interrogatório do réu (eventos 99 e 158 da ação penal).

Encerrada a instrução processual, foram apresentadas as alegações finais pelo Ministério Público (evento 168 da ação penal) e pela defesa (evento 172 da ação penal) e, na sequência, sobreveio a sentença (evento 174 da ação penal), com o seguinte dispositivo:

Ante o exposto, com fundamento no art. 387 do Código de Processo Penal, julgo parcialmente procedente a pretensão punitiva estatal deduzida na denúncia e, em consequência, condeno o denunciado Thiago Amaro, já qualificado, ao cumprimento da pena de 2 anos e 8 meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, substituída por penas restritivas de direitos consistentes em prestação de serviços à comunidade, na proporção de 1 hora para cada dia de condenação, e prestação pecuniária fixada em 2 salários-mínimos nacionais vigentes na data do fato, bem como ao pagamento de 13 dias-multa, no valor de 1/30 do maior salário-mínimo vigente da data dos fatos (atualizado pelo INPC/IBGE), pela prática do crime descrito no art. 155, §1º e §4º, IV, do Código Penal.

Inconformado, o réu interpôs recurso de apelação (evento 183 da ação penal) e, em suas razões recursais, busca o reconhecimento da causa de diminuição de pena da tentativa, bem como o afastamento da majorante do repouso noturno, prevista no §1º do art. 155 do Código Penal (evento 192 da ação penal).

O Ministério Público ofereceu as contrarrazões no evento 196 da ação penal e os autos ascenderam a este egrégio Tribunal de Justiça.

Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Sr. Jorge Orofino da Luz Fontes, manifestando-se pelo conhecimento e parcial provimento do recurso interposto e, de ofício, pelo afastamento da agravante da reincidência e pela diminuição da pena de prestação pecuniária (evento 11 destes autos).

É o relatório.

VOTO

O recurso deve ser conhecido, porquanto presentes os pressupostos processuais.

Conforme sumariado, trata-se de recurso de apelação interposto por Thiago Amaro contra a sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Itajaí que o condenou ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 02 (dois) anos e 08 (oito) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, a qual foi substituída por duas restritivas de direitos consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária, bem como ao pagamento de 13 (treze) dias-multa, no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, por infração ao art. 155, §1º e §4º, inciso IV, do Código Penal.

De início, cumpre assinalar que não há nenhuma insurgência com relação à materialidade e autoria delitiva.

A defesa do apelante busca o reconhecimento da causa de diminuição de pena da tentativa, argumentando que foi surpreendido pelos policiais militares quando estava prestes a sair dos fundos do estabelecimento, portanto não chegou a ter qualquer disponibilidade sobre a res furtiva.

Razão não lhe assiste.

O Superior Tribunal de Justiça, em julgado representativo da controvérsia, traz o entendimento do Supremo Tribunal Federal que superou a controvérsia em torno do tema e passou a adotar a teoria da apphehensio ou amotio, segundo a qual o momento da consumação do delito de furto ocorre quando o agente detém a posse de fato sobre a res furtiva, ainda que por breve espaço de tempo e/ou seguida de perseguição ao agente, sendo prescindível a posse mansa e pacífica, ou ainda, desvigiada do bem.

A saber:

AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. CRIME CONTRA O PATRIMÔNIO.SISTEMA DE MONITORAMENTO. CRIME IMPOSSÍVEL. SUMULA 567/STJ. INVERSÃO DA POSSE. NÃO ENFRENTAMENTO DOS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA. SÚMULA 182/STJ. AGRAVO DESPROVIDO.[...]III - "A existência de sistema de monitoramento eletrônico ou a observação do praticante do furto pelo gerente do supermercado, como ocorreu na espécie, não rende ensejo, por si só, ao automático reconhecimento da existência de crime impossível, porquanto, mesmo assim, há possibilidade de o delito ocorrer. Incidência da Súmula 567 desta Corte. Tese firmada em recurso representativo da controvérsia (Resp nº 1.385.621/MG, DJe 02/06/2015)" (HC n.357.795/SP, Sexta Turma, Relª. Minª. Maria Thereza de Assis Moura, DJe de01/08/2016).IV - "Para a consumação do crime de furto, não se exige a posse mansa, pacífica e desvigiada da res furtiva, sendo reconhecida pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal - STF e do Superior Tribunal de Justiça - STJ a aplicação da teoria da amotio, que a apenas demanda a inversão da posse do objeto material do crime" (RHC n. 74.846/DF, Quinta Turma, Rel. Min. Joel Ilan Pacionik, DJe de 26/05/2017).V - No mais, a d. Defesa limitou-se a reprisar os argumentos do habeas corpus, o que atrai a Súmula n. 182 desta eg. Corte Superior de Justiça, segundo a qual é inviável o agravo regimental que não impugna especificamente os fundamentos da decisão agravada.Agravo regimental desprovido.(AgRg no HC 583.297/SC, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 18/08/2020, DJe 25/08/2020).

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. FURTO. CONSUMAÇÃO. POSSE MANSA. DESNECESSIDADE. SÚMULA 83/STJ. AGRAVO IMPROVIDO.1. O Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento, no julgamento do REsp 1.524.450/RJ, sob o rito dos recursos repetitivos, de que o delito de furto consuma-se com a simples posse da coisa alheia móvel subtraída, ainda que por breves instantes e seguida de perseguição ao agente, sendo prescindível a posse mansa e pacífica ou desvigiada.2. Agravo regimental improvido.(AgRg no AREsp 1546170/SP, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 26/11/2019, DJe 03/12/2019).

Assim, ao contrário do que sustenta a defesa, não se vislumbra a ocorrência da tentativa, conforme teoria adotada.

O réu, no inquérito policial, declarou que "eu não sei quem estava comigo, [...] não conheço, [...] não combinamos, eu estava pegando sozinho, eles aparecerem na rua [...]; Eu estava cortando a grade e tinha dois indivíduos passando pelo outro lado da rua, quando eles me viram entrando, entraram também. [...] Ninguém levou nada; [...] não estava com os três celulares" (transcrição extraída da sentença - evento 03, vídeo 213 da ação penal).

Perante o magistrado sentenciante, o acusado exerceu seu direito constitucional de permanecer em silêncio (evento 160 da ação penal).

Em contrapartida, a testemunha Anderson Vieira da Silva, gerente da empresa à época dos fatos, relatou sob o crivo do contraditório que:

[...] trabalhava na filial furtada, localizada na Av. Sete de Setembro, 1500, Fazenda; recém havia assumido a gerência da loja; fui contatado por volta das 03h da madrugada, devido a uma ocorrência de furto em seu local de trabalho; eu só fui identificar esta questão pelas imagens de segurança, além de Thiago, presentes na ação delitiva, estavam, se eu não me recordo, acredito que mais uns dois, porque eles se evadiram; eles arrombaram uma tela de acesso e depois arrebentaram a porta do depósito para acessar esta outra porta, um enclausurado, que também foi cortado. [...] Do valor em si, não me recordo mas foram apreendidos três aparelhos. [...] A central de monitoramento da loja acionou a polícia militar antes de me acionar; e cheguei ao local após a polícia militar; os agentes já haviam detido Thiago; [...] eu não fui informado se os celulares foram retornados a filial, eu já estou fora de lá há algum tempo. [...] quanto os danos, não me recordo de valores, mas a porta de ferro do depósito foi refeita, porque era de ferro e entortou; o...

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