Acórdão nº 0013852-17.2014.822.0001 de TJRO. Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia, Segundo Grau, 14-01-2022

Data de Julgamento14 Janeiro 2022
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo0013852-17.2014.822.0001
Órgão1ª Câmara Cível
ESTADO DE RONDÔNIA
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
1ª Câmara Cível / Gabinete Des. Rowilson Teixeira



Processo: 0013852-17.2014.8.22.0001 - APELAÇÃO CÍVEL (198)

Relator: ROWILSON TEIXEIRA



Data distribuição: 17/10/2019 13:00:27

Data julgamento: 26/10/2021

Polo Ativo: JESLIANE GUIMARAES VIAMONTE e outros
Advogados do(a) APELANTE: ANTONIO DE CASTRO ALVES JUNIOR - RO2811-A, JEANNE LEITE OLIVEIRA - RO1068-AAdvogados do(a) APELANTE: ANTONIO DE CASTRO ALVES JUNIOR - RO2811-A, JEANNE LEITE OLIVEIRA - RO1068-A
Polo Passivo: SANTO ANTONIO ENERGIA S.A. e outros
Advogados do(a) APELADO: EVERSON APARECIDO BARBOSA - RO2803-A, CLAYTON CONRAT KUSSLER - RO3861-A


RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta pelos autores Jesliane Guimarães Viamonte e David Alan Barbosa Mendonza em ação de obrigação de fazer c/c indenização por danos materiais e morais.
A sentença julgou improcedentes os pedidos iniciais, ao fundamento de ausência de nexo de causalidade entre a atividade da UHE SAE e os danos alegados pelos autores. Condenou os requerentes ao pagamento das custas processuais e honorários de advogado fixados em 10% sobre o valor da causa.
Em razões recursais, suscitam preliminar de cerceamento de defesa, porque proferida a sentença sem que fosse realizada a necessária instrução processual, com a produção de perícia judicial.
Afirmam existirem provas suficientes quanto à responsabilidade exclusiva da apelada pelos danos ocasionados nos seus imóveis, uma vez que, ao abrir as comportas da UHE Santo Antônio, ocasionou aumento do fluxo das águas, gerando todo o desbarrancamento das encostas do Rio Madeira, e que a perícia judicial realizada não está de acordo com os documentos juntados nos autos e demais laudos periciais elaborados por peritos que já atuaram na localidade.
Alegam que o nexo de causalidade restou comprovado; que não foi obedecida a Resolução CONAMA n. 001/1986, quanto aos estudos ambientais; e que a destruição de seus imóveis está diretamente relacionada ao megaempreendimento implantado pela apelada, tendo perdido não só sua residência, mais o local ribeirinho, sua estrutura social, o peixe para pescar, a terra para plantar, a dignidade.
Pugnam pelo provimento do recurso, com a reforma da sentença para que os pedidos iniciais sejam julgados procedentes.
Em contrarrazões, a apelada aduz que os apelantes apresentam argumentos que não foram apresentados na inicial e alega violação ao princípio da dialeticidade. No mérito, pugna pelo não provimento do apelo.
VOTO
DESEMBARGADOR SANSÃO SALDANHA
Preliminar de Ofensa ao Princípio da Dialeticidade
A apelada suscitou em contrarrazões a ocorrência de ofensa ao princípio da dialeticidade, por não terem os apelantes impugnado a sentença, tratando-se apenas de uma cópia da inicial.
Os recorrentes buscam a reforma da sentença defendendo que o julgado contraria as provas dos autos e os laudos periciais produzidos em casos análogos, tecendo considerações acerca da responsabilidade objetiva da recorrida, defendendo fazer jus à indenização.
As teses trazidas no apelo demonstram as razões de sua insurgência, exigindo a manifestação do Tribunal.
Assim, reconheço que fora observado o princípio da dialeticidade, que, em sentido amplo, se aperfeiçoou com o contraditório, devidamente estabelecido nas contrarrazões, razão pela qual, não comporta provimento a preliminar suscitada.
Assim, afasto a preliminar.
Preliminar de Nulidade da Sentença
Em que pesem os argumentos apresentados pelos apelantes, não se vislumbra nulidade na sentença. Inexiste cerceamento de defesa quando desnecessária ao julgamento da causa a produção de outras provas, sendo suficientes os documentos apresentados.
Eventual prova pericial, para aferir a extensão dos danos alegados, poderá ser produzida em fase de execução, sendo suficiente as provas apresentadas para a constatação dos elementos da responsabilidade civil objetiva.
Assim, rejeito a preliminar de nulidade da sentença.
INTRODUÇÃO AO VOTO
Destaco que se trata de apelação em ação cível, cujo objeto são os efeitos danosos – materiais e morais – nas comunidades circunvizinhantes de Porto Velho e extensão à jusante do Rio Madeira, decorrentes da gestão da instalação e operação do empreendimento Santo Antônio Energia S. A., em face das águas das chuvas sazonais da região do Rio Madeira.
A Santo Antônio Energia tem adotado a linha de defesa, para se escusar da responsabilidade objetiva, centrada na assertiva de que a causa de tudo foram as chuvas intensas que se alastraram na região. Chuvas que provocaram a cheia do Rio Madeira, o que, por ser um fenômeno da natureza, não pode por isso mesmo ser responsabilizada.
A tese jurídica majoritária, que tem motivado a corte de apelação no sentido de não reconhecer a responsabilidade da Empresa Santo Antônio Energia, é que a inundação decorreu, de fato, da enchente do Rio Madeira, que, por sua vez, foi ocasionada por fenômeno natural, impondo reconhecer a ausência de nexo de causalidade entre os danos sofridos pelos moradores da região afetada e o empreendimento relativo à construção da Usina Hidrelétrica de Santo Antônio, de modo que é incabível a responsabilização civil da empresa para fins de reparação.
A propósito, são os seguintes precedentes, dos quais alguns já foram submetidos ao art. 942 do CPC, - a nós parece que o assunto foi tratado a título de meteorologia, data vênia:
Apelação cível. Prova emprestada. Julgamento antecipado da lide. Usina Hidrelétrica de Santo Antônio. Enchente. Distrito de São Carlos. Nexo de Causalidade. Não verificado.
Possível a utilização de prova emprestada de lide em que a controvérsia é idêntica à dos autos, a fim de verificar o nexo de causalidade entre o ato praticado pela parte ré e os danos alegados pela parte autora.
Não verificado o nexo causal, fica afastada a responsabilidade da Usina de Santo Antônio pelos danos decorrentes da enchente ocorrida no Distrito de São Carlos no ano de 2014. (APELAÇÃO CÍVEL, Processo nº 7020943-68.2016.822.0001, Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia, 2ª Câmara Cível, Relator(a) do Acórdão: Des. Kiyochi Mori, Data de julgamento: 17/10/2019)
Ação indenizatória. Direito ambiental. Construção de Usina Hidrelétrica. Ofensa ao princípio da dialeticidade. Preliminar rejeitada Concessionária de serviço público. Responsabilidade objetiva. Nexo de causalidade entre as obras da requerida e os danos causados aos autores. Comprovação. Dano material e moral. Ocorrência. Recurso provido.
Evidenciado que a apelação traz expressa impugnação aos fundamentos da sentença, apresentando razões pelas quais se busca sua modificação com base na prova constante dos autos, está caracterizado o requisito da dialeticidade a permitir o conhecimento do recurso.
Com a sistemática da responsabilidade objetiva, é irrelevante, na espécie, a discussão da conduta do agente (culpa ou dolo) para atribuição do dever de reparação do dano causado, cabendo à concessionária de serviço público provar que sua conduta não ensejou riscos para o meio ambiente, nem ensejou os prejuízos causados aos autores.
Demonstrado que a inundação decorrente de enchente de 2014 foi ocasionada por fenômeno natural, impõe-se reconhecer a ausência de nexo de causalidade entre os danos sofridos pelos moradores da região afetada e o empreendimento relativo à construção da Usina Hidrelétrica de Santo Antônio, de modo que incabível a responsabilização civil da empresa a fins de reparação. (APELAÇÃO CÍVEL, Processo nº 0012733-21.2014.822.0001, Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia, 2ª Câmara Cível, Relator(a) do Acórdão: Des. Isaias Fonseca Moraes, Data de julgamento: 15/10/2019)

CONTEXTUALIZAÇÃO DOS FATOS E MOTIVAÇÕES
CONTEXTO I
(Autos n. 7019187-58.2015.8.22.0001):
Consta do voto condutor do acórdão:
“Na espécie, o dano é incontroverso, visto que a apelada teve sua residência atingida pela cheia ocorrida em 2014, restando perquirir acerca do nexo de causalidade com a construção da usina pela apelante (fizemos o destaque).
Cumpre destacar que o relevo que caracteriza a bacia amazônica é de “planície de inundação” ou “várzea”, altamente suscetível a alagamentos. Isto é, terrenos baixos que, atuando na manutenção do equilíbrio hidrológico da bacia, são alagados quando ocorrem cheias ou enchentes.
A perícia colacionada aos autos, ID 6760341 – fl. 11, é categórica ao afastar a responsabilidade da apelante pela enchente ocorrida em 2014, quando assim estabelece:
[…]
Destarte, com fulcro no retro exposto, a perícia infere não existirem elementos que ofereçam supedâneo e assertiva da autora de que a requerida tenha contribuído em qualquer grau para o fenômeno das enchentes, e, como consequência, impossível imputar responsabilidade à ré por suposto agravamento da cheia ocorrida em 2014.
[…]
Com efeito, tem-se por afirmado na referida perícia que o volume de água da cheia de 2014 resultou de fenômeno natural, que acontece na região com periodicidade, intervalos de pouco mais de uma década.
Apenas a título de argumentação, o laudo emitido pelo perito Ricardo Pimentel Barbosa, prova documental acostada nos autos 0012564-97.2015.8.22.0001, que versa sobre o mesmo tema, em trâmite na 2ª Vara Cível desta Capital, em que são respondidos os quesitos do juízo, assim consignou:
15. […]
Baseado no conhecimento público da expertise do eminente cientista que estuda os problemas ambientais da Amazônia brasileira desde o ano de 1974, que o senhor perito esclareça se existe alguma prova técnica nos autos que se contraponha ao conteúdo do texto acima que isenta as usinas hidrelétricas da responsabilidade pela enchente histórica ocorrida no ano de 2014, do doutor em biologia Philip Martin Fearnside.
R – Não existe.
25. Baseado nos registros textuais constantes dos itens anteriores, que o senhor perito esclareça se existe alguma prova técnica nos autos que impute a responsabilidade à requerida, Santo Antônio Energia S/A, pelas cheias do Rio Madeira ocorridas no ano de 2014.
R – Não existe nenhuma prova técnica que impute a responsabilidade à
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