Acórdão nº 0013860-72.2017.8.14.0401 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 2ª Turma de Direito Penal, 05-06-2023

Data de Julgamento05 Junho 2023
Órgão2ª Turma de Direito Penal
Número do processo0013860-72.2017.8.14.0401
Classe processualAPELAÇÃO CRIMINAL
AssuntoTráfico de Drogas e Condutas Afins

APELAÇÃO CRIMINAL (417) - 0013860-72.2017.8.14.0401

APELANTE: SHIRLEY TAIARA FURTADO MARQUES

APELADO: JUSTIÇA PÚBLICA

RELATOR(A): Desembargador LEONAM GONDIM DA CRUZ JÚNIOR

EMENTA

APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. ARTIGO 33, CAPUT, DA LEI 11.343/2006. REFORMA DA DOSIMETRIA DA PENA. TRÁFICO PRIVILEGIADO. PATAMAR DE REDUÇÃO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. REFORMA QUE SE IMPÕE. DETRAÇÃO PENAL. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA EXECUÇÃO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. RECONHECIMENTO DE OFÍCIO. DECISÃO UNÂNIME.

01 – Embora os vetores do art. 42, da Lei de Drogas, isoladamente, não sejam suficientes para afastar a redutora do tráfico privilegiado, conforme posicionamento firmado pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Superior Tribunal de Justiça, constituem elementos idôneos para modular a referida causa de diminuição, quando não valoradas na primeira etapa da dosimetria, sob pena de incorrer em bis in idem (HC n. 725.534/SP, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, A Terceira Seção, julgado em 27/4/2022, DJe 1º/6/2022). Precedentes.

02 – Uma vez que, in casu, a quantidade e a natureza da droga foram usadas para exasperar a pena-base, não podem ser utilizadas também para modular a fração de redução decorrente do privilégio, não havendo fundamentação na decisão do juízo que aplicou o redutor em 1/3 (um terço) e nem outros elementos fáticos e jurídicos que não recomendem a aplicação da redução máxima. Reforma que se impõe.

03 - O Juízo da Execução Penal é o órgão com mais subsídios para realizar a detração da pena, sobretudo porque terá melhores condições de averiguar o tempo exato de pena já cumprido pela apelante, nos termos do artigo 66, III, "c", da Lei de Execução Penal. Precedentes.

04 – Dada a nova dosimetria da pena, o lapso prescricional previsto no art. 109, IV, do Código Penal se consumou após a publicação da sentença, devendo ser declarada, de ofício, a extinção da punibilidade da recorrente, pela prescrição intercorrente da pretensão punitiva estatal.

05 – Recurso conhecido e parcialmente provido. Reconhecimento, de ofício, da prescrição intercorrente da pretensão punitiva. Decisão unânime.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores integrantes da 2ª Turma de Direito Penal do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, à unanimidade, conhecer do recurso de apelação e lhe dar parcial provimento, para reformar a dosimetria da pena imposta a apelante, com o aumento do patamar de redução decorrente do tráfico privilegiado, tornando a pena concreta e definitiva em 01 (um) ano e 08 (oito) meses de reclusão e 167 (cento e sessenta e sete) dias-multa, mantidos os demais termos da sentença, no que couberem, e, após, reconhecer, de ofício, a prescrição, na modalidade intercorrente, da pretensão punitiva do estado, tudo conforme fundamentação do voto do Excelentíssimo Desembargador Relator.

Sala das Sessões do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, aos cinco dias do mês de junho do ano de dois mil e vinte e três.

Julgamento presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Rômulo José Ferreira Nunes.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. DES. LEONAM GONDIM DA CRUZ JÚNIOR (RELATOR):

Trata-se de apelação penal interposta por Shirlei Taiara Furtado Marques, irresignada com os termos da r. sentença condenatória proferida pelo Juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Belém/Pa, nos autos da ação penal ajuizada pelo Ministério Público, cuja peça acusatória imputa a ela a prática do crime disposto no artigo 33 da Lei 11.343/2006.

Consta da sentença (id. 5166918 - Págs. 2/5), ipsis litteris:

(...) Narra a denúncia, em síntese, que, no dia 01/06/2017, por volta das 15h30min, policiais militares realizavam ronda ostensiva de rotina pelo bairro de Fátima quando trafegavam pela Passagem Diogo Móia, às proximidades de uma praça, avistaram um indivíduo, identificado como Elder Patrick Lopes da Costa, conhecido pela prática de roubos na área.

Consta dos autos que os policiais perceberam que a denunciada se encontrava próximo a Elder e ao visualizar afastaram-se do local, no intuito de despistá-los, contudo, não lograram êxito, uma vez que os militares conseguiram alcançá-los e abordá-los.

Ato contínuo, os policiais procederam a revista pessoal de Elder e nada de ilícito foi encontrado com ele. Porém, diante do nervosismo da denunciada, os militares solicitaram que mostrassem o que havia dentro da bolsa que trazia com ela, momento em que encontraram um tablete de maconha.

Perante a autoridade policial, a denunciada confessou a autoria do delito de tráfico de drogas, pois afirmou que entregaria a droga apreendida para outra pessoa a pedido de seu primo Antônio Carlos Furtado Negrão, custodiado no Sistema Penal e receberia a importância de R$ 100,00 (cem reais) pelo serviço. (...)

Após regular instrução, foi julgada procedente a acusação em decisão datada de 05/11/2018, condenando-se a recorrente pela prática do delito previsto no artigo 33, caput, da Lei 11.343/2006, às sanções de 03 (três) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicial aberto, mais 334 (trezentos e trinta e quatro) dias-multa, no menor valor unitário previsto em lei (id. 5166927 - Págs. 2/13).

A pena foi, ainda, substituída por duas penas restritivas de direitos.

Inconformada, interpôs o presente apelo (id. 5166930 - Págs. 7 e 13/16), pedindo o seguinte:

1 – O aumento do patamar de diminuição da pena decorrente do privilégio do art. 33, §4º, da Lei de Drogas já reconhecido;

2 – Que seja operada a detração da pena.

As contrarrazões firmaram-se pelo provimento parcial do recurso, apenas para que seja operada a detração da pena (id. 5166930 - Págs. 18/25).

Em segunda instância, os autos foram a mim distribuídos (id. 5166931 - Pág. 1).

A Procuradoria de Justiça emitiu parecer pelo conhecimento e improvimento do apelo (Num. 5166931 - Págs. 7/10).

É o relatório do necessário.

À Douta Revisão, com sugestão de inclusão do feito em Plenário Virtual.


VOTO

O EXMO. SR. DES. LEONAM GONDIM DA CRUZ JÚNIOR (RELATOR):

01 – JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE

O recurso encontra-se adequado, tempestivo, com interesse da parte e legitimidade desta para recorrer. Preenchidos os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço-o, por conseguinte.

02 – DO AUMENTO DO PATAMAR DE REDUÇÃO DA PENA DECORRENTE DO TRÁFICO PRVILEGIADO

A individualização da pena é uma atividade discricionária do julgador e se sujeita à revisão somente em face de ilegalidade flagrante ou teratologia – porque não observados os parâmetros legais estabelecidos ou o princípio da proporcionalidade.

É imprescindível frisar, também, que, identificada a necessidade da aludida correção, nada obsta ao magistrado ad quem fazê-lo com suas próprias ponderações, ainda que o recurso seja exclusivo da defesa, bastando se ater a não agravar a reprimenda imposta ao recorrente pelo juiz a quo.

Nesse sentido:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. HOMICÍDIO QUALIFICADO TENTADO. DOSIMETRIA. ALEGAÇÃO DE REFORMATIO IN PEJUS. INOCORRÊNCIA. PENA-BASE MANTIDA. EXCLUSÃO DE APENAS UM DOS FUNDAMENTOS UTILIZADOS PARA NEGATIVAR AS CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME. DESVALOR DO REFERIDO VETOR MANTIDO. OUTRO FUNDAMENTO USADO PELA SENTENÇA CONDENATÓRIA MANTIDO. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

(...)

II - Alegação de reformatio in pejus. A jurisprudência deste Tribunal Superior se firmou no sentido de que o efeito devolutivo da apelação autoriza a Corte estadual, quando instada a se manifestar acerca da dosimetria, regime inicial e demais questões relativas às peculiaridades do crime, a examinar as circunstâncias judiciais e rever a individualização da pena, seja para manter ou reduzir a sanção final imposta ou para abrandar o regime inicial. No ponto, mesmo se tratando de recurso exclusivo da defesa, é possível nova ponderação das circunstâncias que conduza à revaloração, sem que se incorra em reformatio in pejus, desde que a situação final do réu não seja agravada. Precedentes.

(...)

Desta feita, não há se falar em reformatio in pejus.

Agravo regimental desprovido.

(AgRg no HC n. 689.065/SC, relator Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, julgado em 13/12/2022, DJe de 16/12/2022.)

In casu, da dosimetria da pena operada pelo juízo, observo que a magistrada a quo fixou a pena-base da recorrente em 06 (seis) anos de reclusão e 600 (seiscentos) dias-multa, em razão da natureza e quantidade da droga (500,2 gramas de maconha).

Reconhecida a atenuante da confissão, a pena foi reduzida para o mínimo legal, 05 (cinco) anos de reclusão e 500 dias-multa.

Por fim, reconhecido o tráfico privilegiado, a pena foi reduzida em 1/3, tornando-se definitiva em 03 (três) anos e 04 (quatro) meses de reclusão e 334 dias-multa.

Pois bem. Ocorre que, ao fixar o patamar de redução da pena, decorrente do privilégio, a magistrada sentenciante não apresentou qualquer fundamentação, limitando-se a registrar:

(...) A causa especial de diminuição de pena prevista no § 4º do artigo 33 da Lei 11.343/06 está condicionada ao preenchimento, cumulativo, dos requisitos legais: primariedade, bons antecedentes e agente que não se dedique a atividades criminosas nem integre organização criminosa.

A quantidade de entorpecente encontrado em poder da ré, ainda que seja suficiente para caracterizar a prática do crime previsto no art. 33, da Lei nº 11.343/06, não é tão expressiva a ponto de se concluir que a ré integra organização criminosa ou já se dedicava à atividade criminosa, de modo que faz jus à causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06, mormente ao se verificar que apenas trazia consigo aquela quantidade de entorpecente para receber a ínfima quantia de R$100,00 (cem reais).

(...)

3ª FASE – Causas de Aumento e Diminuição.

Presente a causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006, diminuo a pena em 1/3, tornando definitiva a pena em 03...

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