Acórdão Nº 0013905-59.1996.8.24.0005 do Terceira Câmara de Direito Público, 31-05-2022

Número do processo0013905-59.1996.8.24.0005
Data31 Maio 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0013905-59.1996.8.24.0005/SC

RELATOR: Desembargador JAIME RAMOS

APELANTE: MUNICÍPIO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ/SC (EXEQUENTE) APELADO: COMPANHIA CATARINENSE DE ÁGUAS E SANEAMENTO - CASAN (EXECUTADO)

RELATÓRIO

Município de Balneário Camboriú, em 27/12/1996, propôs execução fiscal contra a Companhia Catarinense de Águas e Saneamento (CASAN), instruída com a Certidão de Dívida Ativa n. 03069/93, referente ao imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana (IPTU).

Citada, a CASAN opôs "exceção de pré-executividade" alegando a nulidade da CDA; a prescrição da pretensão executória e que, nos termos dos arts. 150, inciso VI, alínea "a", e 155, § 3º, da Constituição Federal, em se tratando de empresa pública prestadora de serviço público essencial, está abrangida pela imunidade tributária.

No dia 26/5/2021, foi prolatada a sentença nos seguintes termos:

"'A Casan - Companhia Catarinense de Águas e Saneamento, sociedade de economia mista prestadora de serviço público essencial, está imune à exigibilidade de IPTU (imposto predial e territorial urbano), já que 'as empresas públicas e sociedades de economia mista prestadoras de serviço público de prestação obrigatória e exclusiva do Estado são abrangidas pela imunidade tributária recíproca prevista no art. 150, VI, a, da Constituição Federal'. (RE n. 407.099/RS, rel. Min. Carlos Velloso, 2ª Turma, DJ de 6.8.2004)' (TJSC, AI n. 2010.051171-7, rel. Des. João Henrique Blasi, j. 11.4.11) [...]' (TJSC, Remessa Necessária Cível n. 0300664-33.2016.8.24.0040, de Laguna, rel. Des. Cid Goulart, Segunda Câmara de Direito Público, j. 13-11-2018)." (TJSC, Apelação Cível n. 0300001-70.2014.8.24.0035, de Ituporanga, rel. Des. Júlio César Knoll, Terceira Câmara de Direito Público, j. 19.3.2019). (TJSC, Agravo de Instrumento n. 4004987-70.2020.8.24.0000, da Capital, rel. Francisco Oliveira Neto, Segunda Câmara de Direito Público, j. 18-08-2020).

Quanto ao reconhecimento ex officio de imunidade tributária, já decidiu o TJSP:

''APELAÇÃO - Embargos à execução fiscal. IPTU e taxa de serviços urbanos. (...) Matéria de ordem pública - Imunidade tributária. Ocorrência. Benefício que se estende às sociedades de economia mista quando prestadoras de serviços públicos. Precedentes desta Corte. Descabida a cobrança do imposto. Imunidade reconhecida de ofício. Recurso provido. (TJSP, AC nº 0006206-40.2007.8.26.0566, Des. João Alberto Pezarini).''

Nesse sentido, considerando a execução de IPTU, deve ser reconhecida a imunidade tributária que goza a parte executada, razão que enseja a extinção do feito.

Diante do exposto, JULGO EXTINTA a presente Execução Fiscal ajuizada pelo MUNICÍPIO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ/SC contra COMPANHIA CATARINENSE DE ÁGUAS E SANEAMENTO - CASAN.

Isento o exequente da obrigação de pagar as custas judiciais, com base no art. 7º, I, da Lei Estadual n. 17.654/2018.

CONDENO o exequente ao pagamento dos honorários sucumbenciais, os quais fixo em 10% do valor atualizado da causa, com arrimo no art. 85, § 3º, inc. I, do CPC.

Proceda-se ao levantamento e ao cancelamento de eventuais penhoras e restrições.

Transitada em julgado, expeça-se ofício à Fazenda Pública para averbação no Registro de Dívida Ativa da decisão final transitada, nos termos do art. 33 da Lei 6830/1980.

Após, arquivem-se. P.R.I.".

Inconformado, o Município de Balneário Camboriú interpôs recurso de apelação alegando que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ACO n. 1.460-AgR/SC, deixou assente que a CASAN "a despeito de prestar serviço público, desempenha atividade econômica com persecução e distribuição de lucro - beneficiaria os agentes econômicos privados que participam de seu capital social, gerando risco de quebra do equilíbrio concorrencial e da livre iniciativa, o que não se pode admitir, sob pena de desvirtuamento da finalidade da imunização constitucional", motivo pelo qual não preenche os "parâmetros traçados por esta Corte para a extensão da imunidade tributária recíproca".

Alegou, ainda, que "o serviço de abastecimento e saneamento é prestado pela EMASA, criada pela Lei 2498/20053 e, como pode ser confirmado no site da Casan, o Balneário Camboriú não consta no rol de município atendidos pela empresa".

Requereu o provimento do recurso para reformar a sentença e, assim, "afastar o reconhecimento da imunidade recíproca".

A CASAN apresentou as contrarrazões alegando que o "capital 'caracterizador do intento lucrativo', conforme definiu o Tema 508, é um capital negociável em bolsa - o que não corresponde à realidade acionária da CASAN (controlada pelo Estado direta ou indiretamente, através da SCPAR, CODESC e da CELESC - anotando que mesmo esta não atua de forma independente no Conselho de Administração da CASAN, posto que compõe o bloco de controle do Estado conforme já decidiu a Comissão de Valores Mobiliários - CVM no bojo do Processo Administrativo Sancionador CVM Nº 19957.011346/2018-08"; que apenas "0,0046% das ações da CASAN estão 'em Bolsa', o que claramente não revela inequívoca atuação voltada a remunerar o capital de seu(s) acionista(s): o Estado de Santa Catarina, e faz com que a tese do Tema 508, cujo julgamento foi, enfim, concluído somente em 25/08/2020, se revele inaplicável à CASAN"; que "a Lei Estadual n.º 15.596/2011 que, até então, pré-autorizava a venda de até 49% da empresa (ou seja: da participação minoritária do Estado na CASAN) foi inclusive revogada pela Lei Estadual n.º 17.917, de 28 de janeiro de 2020".

Disse que "os até então demais acionistas da CASAN são, todos, controlados pelo Estado de Santa Catarina, que assumiu suas respectivas participações acionárias na CASAN"; que o "SCPAr é o BNDESPAr em nível catarinense, vinculado estrategicamente ao Gabinete do Governador de Santa Catarina, com 100% de participação acionária do Estado - e não bastasse, suas ações estão sendo transmitidas para controle direto do Estado"; que "a CODESC era a então gestora da loteria estadual (declarada inconstitucional em 2007), se encontra em liquidação/extinção e seus acionistas são o Estado (com 98%) e o IPREV (o Instituto de Previdência dos Servidores Públicos de Santa Catarina) com 2%; e a CELESC, a despeito de possuir acionistas privados, é controlada pelo Estado de Santa Catarina, já sendo acionista da CASAN antes da sua capitalização, em 2006".

Pondera que "o Tema 508, portanto, claramente exclui a CASAN da regra definida pelo Plenário do STF - benefício este que é confirmado pela tese do Tema 1.140", devendo ser aplicado "à CASAN o entendimento do Supremo no caso da Embasa (estatal da Bahia); julgado no ARE 905129 AgR, relatado pelo Min. Alexandre de Moraes, seguindo a já consolidada jurisprudência da Corte, do ARE 763000 AgR, de relatoria do Ministro Roberto Barroso".

Pugnou pelo "pronunciamento expresso desta Corte, ante o fato de se tratar de premissa fática relevante e absolutamente essencial a demonstrar que a jurisprudência consolidada pelo STF (Temas 508 e 1.140) reiteram a jurisprudência cristalizada desta Corte Regional no que toca ao reconhecimento de imunidade tributária em favor da CASAN".

Em seguida, os autos ascenderam a esta Superior Instância.

VOTO

Ausência de intervenção do Ministério Público

Imperativo registrar, inicialmente, que a ausência de intervenção do Ministério Público no feito se deve ao contido no art. 178, do Código de Processo Civil, e nos arts. 127 e 129, da Constituição Federal.

Ademais, de acordo com o enunciado da Súmula 189, do Superior Tribunal de Justiça, "é desnecessária a intervenção do Ministério Público nas execuções fiscais".

Não se pode olvidar, ainda, que a douta Procuradoria-Geral de Justiça do Estado de Santa Catarina, com fundamento no Ato n. 103/04/MP, racionalizou a intervenção do Ministério Público no processo civil, orientando seus membros a intervir somente naqueles casos em que se evidencia o interesse público.

A interpretação que se faz desse Ato, no âmbito do Ministério Público, como se tem visto em diversos processos, é a de que na execução fiscal e respectivos embargos, não há interesse público a justificar a intervenção do órgão ministerial, na medida em que a Fazenda Pública se encontra bem representada por seu Procurador, que tem envidado os necessários esforços para defendê-la na ação.

Por isso, é desnecessária a remessa do recurso à douta Procuradoria-Geral de Justiça.

Mérito

No mérito, o recurso do Município deve ser conhecido e provido.

É insustentável o argumento expendido pela CASAN, aqui apelada, no sentido de que a ela se deve aplicar a orientação firmada pelo Supremo Tribunal Federal nos julgamentos do ARE n. 905.129-AgR/BA (Evento 66, Decisão STJ/STF 19), da ACO n. 2.730 AgR/DF (Evento 66, Decisão STJ/STF 18) e da ACO n. 2.149 AgR/DF (Evento 66, Decisão STJ/STF 17), em que se decidiu que as empresas públicas e as sociedades de economia mista prestadoras de serviços públicos de abastecimento de água e tratamento de esgoto estão abrangidas pela imunidade tributária recíproca de que trata o art. 150, inciso VI, alínea "a", da Constituição Federal.

Vejam-se as ementas dos referidos julgados:

"AGRAVO REGIMENTAL EM AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA. DIREITO TRIBUTÁRIO. LIMITAÇÕES CONSTITUCIONAIS AO PODER DE TRIBUTAR. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA RECÍPROCA. TRIBUTOS FEDERAIS. SERVIÇO PÚBLICO DE CUNHO ESSENCIAL E DE EXPLORAÇÃO EXCLUSIVA. SANEAMENTO. TRATAMENTO DE ÁGUA. COMPANHIA ESPÍRITO SANTENSE DE SANEAMENTO.

1. A imunidade tributária recíproca pode ser estendida a empresas públicas ou sociedades de economia mista prestadoras de serviço público de cunho essencial e exclusivo. Precedente: RE 253.472, Rel. Min. Marco Aurélio, Redator para o acórdão Min. Joaquim Babosa, Pleno, DJe 1º.02.2011.

2. Acerca da natureza do serviço público de saneamento básico, trata-se de compreensão iterativa do Supremo Tribunal Federal ser interesse comum dos entes federativos, vocacionado à formação de monopólio natural, com altos custos operacionais. Precedente: ADI 1.842, de relatoria do ministro Luiz Fux e com acórdão redigido pelo Ministro...

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