Acórdão Nº 0014022-67.2013.8.24.0033 do Segunda Câmara Criminal, 31-03-2020

Número do processo0014022-67.2013.8.24.0033
Data31 Março 2020
Tribunal de OrigemItajaí
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão


Apelação Criminal n. 0014022-67.2013.8.24.0033, de Itajaí

Relator: Des. Sérgio Rizelo

APELAÇÃO CRIMINAL. USO DE DOCUMENTOS PARTICULARES FALSIFICADOS (CP, ART. 304, C/C O 298). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA ACUSADA.

PROVA DA AUTORIA. PALAVRAS DO EMPREGADOR DA OFENDIDA E DE TESTEMUNHA. NEGATIVA. MOTIVAÇÃO OBSCURA. COMPROVAÇÃO.

As declarações do empregador da acusada, no sentido de que recebeu diretamente dela atestados médicos cuja falsidade foi comprovada por prova pericial; corroboradas pelos dizeres de uma testemunha, que acolheu os atestados falsos em uma pasta nominal destinada a guardar documentos de trabalho da agente; são provas suficientes da autoria do crime de uso de documentos particulares falsificados, que não são derruídas pela alegação não comprovada de que a acusação é inverídica e que foi inventada para motivar sua demissão por justa causa.

RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0014022-67.2013.8.24.0033, da Comarca de Itajaí (1ª Vara Criminal), em que é Apelante Gleicy Mara Vieira e Apelado o Ministério Público do Estado de Santa Catarina:

A Segunda Câmara Criminal decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado no dia 31 de março de 2020, os Excelentíssimos Desembargadores Salete Silva Sommariva (Presidente) e Norival Acácio Engel.

Florianópolis, 2 de abril de 2020.

Sérgio Rizelo

relator


RELATÓRIO

Na Comarca de Itajaí, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Gleicy Mara Vieira, imputando-lhe a prática do crime previsto no art. 304, c/c o 301, § 1º, ambos do Código Penal, por três vezes, nos seguintes termos:

1. No dia 25 de julho de 2012, no interior do escritório de advocacia Marcelo Xavier Advocacia, localizado na rua José Siqueira, 98, bairro Dom Bosco, nesta cidade, a denunciada Gleicy Mara Vieira fez uso de atestado médico falso, apresentando-o ao seu superior hierárquico, com o intuito de justificar o não comparecimento ao labor (fl. 5).

2. No dia 1º de agosto de 2012, no interior do escritório de advocacia Marcelo Xavier Advocacia, localizado na rua José Siqueira, 98, bairro Dom Bosco, nesta cidade, a denunciada Gleicy Mara Vieira fez uso de atestado médico falso, apresentando-o ao seu superior hierárquico, com o intuito de justificar o não comparecimento ao labor (fl. 7).

3. No dia 6 de agosto de 2012, no interior do escritório de advocacia Marcelo Xavier Advocacia, localizado na rua José Siqueira, 98, bairro Dom Bosco, nesta cidade, a denunciada Gleicy Mara Vieira fez uso de atestado médico falso, apresentando-o ao seu superior hierárquico, com o intuito de justificar o não comparecimento ao labor (fl. 6) (fls. 153-154).

Concluída a instrução, o Doutor Juiz de Direito Augusto César Allet Aguiar julgou parcialmente procedente a exordial acusatória e condenou Gleicy Mara Vieira à pena de 1 ano, 2 meses e 12 dias de reclusão, a ser cumprida em regime inicialmente aberto, e 12 dias-multa, arbitrados individualmente no mínimo legal, substituída a privativa de liberdade por restritivas de direitos, consistentes em prestação pecuniária de valor equivalente ao do salário mínimo e prestação de serviços à comunidade, pelo cometimento do delito previsto no art. 304, c/c o 298, ambos do Código Penal (fls. 258-271).

Insatisfeita, Gleicy Mara Vieira deflagrou recurso de apelação.

Nas razões de insurgência, almeja a declaração de sua absolvição, com fundamento na carência de prova a respeito da autoria dos fatos (fls. 298-303).

O Ministério Público ofereceu contrarrazões pelo conhecimento e desprovimento do reclamo (fls. 307-315).

A Procuradoria de Justiça Criminal, em parecer lavrado pelo Excelentíssimo Procurador de Justiça Paulo de Tarso Brandão, posicionou-se pelo conhecimento e desprovimento do apelo (fls. 324-328).

Este é o relatório.


VOTO

O recurso preenche os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, razão pela qual deve ser conhecido.

A ocorrência material do fato é incontroversa e exsurge do positivado no boletim de ocorrência das fls. 2-3; nos atestados das fls. 5-7, apontados como falsos pela perícia grafotécnica das fls. 90-95, uma vez que a grafia neles empregada e o carimbo utilizado não coincidem com os fornecidos pela médica Patrícia Castro Krzyzaniak (fl. 93).

Sobre a autoria, por outro lado, a Recorrente Gleicy Mara Vieira insiste na tese de que não foi devidamente comprovada, razão pela qual reclama a proclamação da sua absolvição, com fundamento no art. 386, V ou VII, do Código de Processo Penal.

Nada obstante, a pretensão não merece ser acolhida.

Reconhece-se que o exame grafotécnico excluiu a Apelante Gleicy Mara Vieira como autora da falsificação dos atestados médicos, porque foram constatadas divergências entre os grafismos presentes nos documentos questionados e os padrões de confronto que forneceu, "que indicam terem sido produzidos por punhos diversos" (fl. 94).

Essa afirmação, todavia, é irrelevante para a apuração do crime em tela, porque a Recorrente é acusada de fazer uso de documentos falsos, e não de ter produzido a falsidade documental. E sobre a conduta efetivamente a ela atribuída na denúncia há abundância de prova, diferentemente do que quer fazer crer a Defesa.

Nesse sentido, o Advogado Marcelo Cláudio Xavier, patrão da Recorrente à época, disse, ao Delegado de Polícia:

Gleicy, depois de um tempo, passou a faltar injustificadamente, e também a ter atritos com as demais funcionárias e advogados [...] ela sempre faltava dizendo que estava doente mas numa dessas ocasiões, ela foi flagrada no centro da cidade passeando, numa manhã em que não iria trabalhar porque estava doente e, ao ser interpelada pela advogada Christiane, que a encontrou, não gostou de ter sido chamada sua atenção; que o declarante soube que o marido de Gleicy ligou no mesmo dia, ameaçando Christiane; que, devido a tudo isso, como o declarante começou a cobrar mais a presença dela, e os atestados, caso faltasse, então Gleicy apresentou, diretamente ao declarante, os atestados falsos que fizeram parte destes autos; que o declarante não recorda a ocasião da entrega dos atestados, mas afirma com certeza que ela entregou diretamente ao declarante, mesmo porque, devido as intrigas com as demais funcionárias, não se dava bem com outra pessoa senão o declarante; [...] que, num certo dia, a advogada Christiane perguntou se Gleicy não trabalharia mais, por causa das muitas faltas, e o declarante falou a ela que Gleicy tinha trazido um atestado, e mostrou a Christiane, a qual estranhou, pois Christiane é paciente da Dra. Patrícia, e estava desconhecendo a letra, e foi Christiane quem levou os atestados da Dra. Patrícia para que esta os visse, e então que descobriram que os atestados eram falsos; [...] que Gleicy foi demitida por justa casa, o valor foi depositado em juízo numa ação consignatória, onde Glaicy foi intimada pelo Juiz do Trabalho e ela não contestou o motivo da demissão, que são os mesmos deste inquérito policial, e apenas recebeu os valores, silenciando sobre os fatos. (fls. 29-30).

Mais de cinco anos após os fatos, Marcelo Cláudio Xavier repisou o acontecido quando ouvido no contraditório. Indagado se a Recorrente Gleicy Mara Vieira entregou-lhe os atestados, respondeu "entregou pra mim, na minha mão", em três ocasiões distintas; acredita que a Apelante entregou mais de três atestados, porque vinha faltando com frequência, mas foram três os que deram problema (mídia da fl. 236).

Em sintonia com seu relato extrajudicial (fls. 15-16), a Advogada Christiane Jacy Krauel aludiu que é paciente da Dra. Patrícia Castro Krzyzaniak, e que foi ela quem levou os atestados entregues pela Recorrente a Marcelo, para que a médica confirmasse a autoria da confecção e da assinatura; presenciou a entrega dos atestados porque isso era questão a ser tratada diretamente com Marcelo (gravação audiovisual da fl. 236).

A médica Patrícia Castro Krzyzaniak, em harmonia com seu primeiro relato colhido no inquérito policial (fls. 10-11), informou que é ginecologista e obstetra e atendeu Christiane Jacy Krauel em seu consultório, a qual pediu que examinasse três atestados médicos, perguntando se os havia subscrito em 25 de julho e 1º e 8 de agosto, todos de 2012. Agregou ter verificado que não se tratava de sua letra, de seu carimbo e de sua assinatura (mídia da fl. 236).

Com efeito, a prova oral produzida pela Acusação é harmônica no sentido de que, por estar faltando com frequência e desagradando os demais funcionários do escritório, a Recorrente Gleicy Mara Vieira passou a apresentar atestados médicos, dentre eles os das fls. 5-7, comprovadamente falsos, porquanto firmados por terceira pessoa, que se passou pela médica Patrícia Castro...

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