Acórdão nº 0014031-38.2008.8.11.0042 Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, Segunda Câmara Criminal, 07-08-2023

Data de Julgamento07 Agosto 2023
Case OutcomeNão-Provimento
Classe processualCriminal - RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Número do processo0014031-38.2008.8.11.0042
AssuntoHomicídio Qualificado

ESTADO DE MATO GROSSO

PODER JUDICIÁRIO

SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL


Número Único: 0014031-38.2008.8.11.0042
Classe: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO (426)
Assunto: [Homicídio Qualificado, Crime Tentado]
Relator: Des(a).
RUI RAMOS RIBEIRO


Turma Julgadora: [DES(A). RUI RAMOS RIBEIRO, DES(A). JOSE ZUQUIM NOGUEIRA, DES(A). PEDRO SAKAMOTO]

Parte(s):
[MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (RECORRIDO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (REPRESENTANTE), MIRIAN CORREA SANTANA (RECORRENTE), DEFENSORIA PUBLICA DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 02.528.193/0001-83 (REPRESENTANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (RECORRENTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (REPRESENTANTE), GEANE SIMÕES DOS SANTOS (VÍTIMA), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)]

A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a).
RUI RAMOS RIBEIRO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO.

E M E N T A

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO – PRONÚNCIA – ART. 121, § 2º, II E IV C/C ART. 14, II, AMBOS DO CÓDIGO PENAL – RECURSO DA DEFESA – PRETENSA IMPRONÚNCIA – IMPOSSIBILIDADE – MATERIALIDADE E INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA – ELEMENTOS DE CONVICÇÃO EMERGIDOS DA PERSECUTIO CRIMINIS – GOLPE DE FACA NO OMBRO DA VÍTIMA, NA REGIÃO DO PESCOÇO – PONTO VITAL – ALMEJADA DESCLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA PARA OUTRO CRIME DIVERSO DA COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI – INVIABILIDADE – CONTEXTO PROBATÓRIO QUE IMPÕE A NECESSIDADE DE CONHECIMENTO E ANÁLISE PELOS JURADOS – ART. 5º, XXXVIII, “D” DA CF/88 – AUSÊNCIA DE ANIMUS NECANDI QUE NÃO EMERGE DE MODO APTO PARA A FASE DE PRONÚNCIA – COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL – RECONHECIMENTO DA DESISTÊNCIA VOLUNTÁRIA – PROVA – AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO – SINAIS DE DESISTÊNCIA INVOLUNTÁRIA QUE CORRESPONDE AO CONATUS – AFERIÇÃO DO DOLO DO AGENTE – COMPETÊNCIA DO CONSELHO DE SENTENÇA – RECURSO DESPROVIDO.

Havendo prova da materialidade e indícios suficientes de autoria e de participação, a manutenção da pronúncia é medida que se impõe.

Compete ao Tribunal do Júri o julgamento dos crimes doloso contra a vida, nos termos do artigo 5º, inciso XXXVIII, alínea “d” da Constituição Federal.

A desclassificação somente é possível se o magistrado, nesta fase, tiver a absoluta certeza de que o dolo do acusado não era de matar, mas apenas de lesionar a vítima, o que não se verifica, nesse plano.

Segundo a doutrina e jurisprudência dominantes, o reconhecimento da desistência voluntária ou a desclassificação do delito de tentativa de homicídio para outro delito que não seja doloso contra a vida somente é possível quando restar cabalmente evidenciada a ausência de animus necandi na conduta do agente, o que não se vislumbra, de plano, na espécie. Assim, fica a cargo dos jurados a deliberação acerca da existência ou não de dolo na conduta do agente.

R E L A T Ó R I O

Trata-se de recurso em sentido estrito interposto em favor de Mirian Correa Santana, contra decisão proferida pelo Juízo da 12ª Vara Criminal da Comarca de Cuiabá/MT, nos autos da ação penal nº 14031-38.2008.811.0042 (código 126747), na qual foi pronunciada como incursa nas sanções do artigo 121, § 2º, incisos II e IV c/c artigo 14, inciso II, ambos do Código Penal, a fim de que seja submetida a julgamento perante o Colendo Tribunal do Júri (Id. 158317655, p. 13/15).

Inconformada com a decisão, a Defensoria Pública interpôs recurso em sentido estrito (Id. 158317670). Em suas razões, pugna pela impronúncia da recorrente, sob o argumento de ausência de provas acerca da autoria. Alternativamente, busca a desclassificação do delito de tentativa de homicídio para outro crime diverso da competência do Tribunal do Júri, sob argumento de que Mirian não agiu com animus necandi, bem como existem elementos probatórios suficientes que evidenciam a desistência voluntária (Id. 158317674).

Em contrarrazões, o Ministério Público refuta as teses defensivas, requerendo seja negado provimento ao recurso, mantendo-se incólume a sentença proferida pelo juízo da instância de piso (Id. 158317677).

Em sede de juízo de retratação, o juízo singular manteve inalterada a decisão de pronúncia pelos fundamentos fáticos e jurídicos expostos (Id. 158317683).

Nesta instância, a Procuradoria Geral de Justiça, através da Procuradora de Justiça Esther Louise Asvolinsque Peixoto, manifestou-se pelo desprovimento do recurso (Id. 158866658), sintetizando seu entendimento com a seguinte ementa:

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO – ARTIGO 121, §2º, II E IV; E ARTIGO 14, II, AMBOS DO CÓDIGO PENAL – SENTENÇA DE PRONÚNCIA – INSURGÊNCIA DA DEFESA – Mérito. Da autoria e materialidade delitiva dolosa: Depoimento das testemunhas e demais réus apontam para a autoria– outras provas colhidas na fase de instrução – utilização conjunta do inquérito policial como instrumento de convicção judicial – depoimento policial idôneo - fase de pronúncia – indícios de autoria e materialidade – prevalência do Tribunal do Júri – aplicação do in dubio pro societate - improvimento do pedido recursal defensivo. Da não ocorrência de desistência voluntária: alegada desistência voluntária – impossibilidade – tese que não restou comprovada – competência constitucional do tribunal do júri para a análise da matéria. Parecer pelo desprovimento do Recurso em Sentido Estrito Defensivo.” (Sic.)

É o relatório.

V O T O R E L A T O R

Conforme relatado, trata-se de recurso em sentido estrito interposto por Mirian Correa Santana, contra decisão proferida pelo Juízo da 12ª Vara Criminal da Comarca de Cuiabá/MT, nos autos da ação penal nº 14031-38.2008.811.0042, na qual foi pronunciada como incursa nas sanções do artigo 121, § 2º, incisos II e IV c/c artigo 14, inciso II, ambos do Código Penal, a fim de que seja submetida a julgamento perante o Colendo Tribunal do Júri.

Narra a denúncia:

“[...] Provam os autos de Inquérito Policial numeração antiga 2008/262 – Numeração Única 14031-38.2008.811.0042 – CÓDIGO TJ/MT Nº 126747 – que sustenta a presente denúncia, que no dia 22 de novembro de 2006, por volta das 17:30 horas, NO INTERIOR DA QUITINETE EM QUE A ACUSADA E VÍTIMA RESIDIAM EM CONJUNTO, SITUADA NO BAIRRO ALVORADA, NESTA URBE E COMARCA, mediante golpes de facão não apreendido nos autos, a denunciada MIRIAN tentou matar a ofendida GEANE SIMÕES DOS SANTOS.

Desponta dos autos inquisitoriais que inicialmente a Acusada e a Vítima eram amigas, inclusive frequentavam a mesma igreja evangélica universal do reino de Deus e, ainda, eram vizinhas de quitinetes, na mesma república/condomínio, de tal modo que costumavam se visitar reciprocamente.

Apurou-se que a Denunciada vivia em concubinato com o terceiro MARCOS BRUNO DA SILVA ARRUDA e passou a acreditar que Ele mantinha um triangulo amoroso com a vítima GEANE, a ponto de despertar o ciúme da Acusada.

Inclusive, a acusada MIRIAN desconfiava que o bebê de um mês de vida, filho/a da vítima GEANE, era fruto da traição amorosa que supostamente havia entre seu amásio MARCOS BRUNO e a Ofendida.

Os autos revelam que o terceiro MARCOS chegou a se separar da denunciada MIRIAN, porque, segundo ele próprio, não tolerava a amizade entre ela e a Ofendida, a demonstrar que as relações humanas entre essas pessoas eram viciosas, do ponto de vista emocional (fls. 30/31).

Pode-se inferir dos autos que o delito ora tratado foi premeditado pela acusada MIRIAN, porque, posteriormente àquela separação, a Denunciada passou a coabitar na mesmíssima quitinete da vítima GEANE, de tal modo que se aproximou ainda mais dela, em permanente vigilância (fls. 30/31 e 35/37).

Então, no dia 22.011.2006, por volta das 17:30 horas, no interior da quitinete que coabitavam, com evidente intenção de matar, a Denunciada se aproximou, pelas costas da Ofendida, que amamentava o seu filho/a bebê e tentou matar a vítima GEANE, ao lhe golpear o ombro esquerdo (região escapular), por duas vezes, próximo ao pescoço, na região.

Consta que a Vítima se desvencilhou da Denunciada e correu para pedir socorro aos vizinhos da república/condomínio, que lhe prestaram apoio e lhe levaram para o pronto socorro municipal de Cuiabá, tendo sido transferida para o pronto socorro da cidade próxima de Várzea Grande.

Nas unidades de saúde enfocadas, a Ofendida recebeu cuidados médicos, inclusive procedimento cirúrgico, que evitou a sua morte.

Portanto, o homicídio somente não se consumou por circunstâncias alheias à vontade da Denunciada.

Depois do delito, a denunciada MIRIAN e seu amásio MRCOS BRUNO foragiram do local, ao que parece, em conjunto, a demonstrar que reataram o concubinato.

Evidente que a Acusada agiu por motivo torpe e agiu mediante recurso que impossibilitou a defesa da ofendida GENAE, porque, repita-se, impelida pelo ciúme e porque atingiu pelas e nas costas, quando a Vítima amamentava seu filho/a bebê.

Interrogada pelo delegado de polícia, a Denunciada confessou ser a autora do delito e também apresentou a desgastada versão de que teria agido em legítima defesa, após discutir com a Vítima (fls. 36/37).

O laudo pericial médico de lesão corporal e mapa topográfico elaborado sobre a ofendida GEANE é pífio, porque os médicos peritos JORGE BARBOSA CARAMURU E DIONÍSIO JOSÉ B. ANDREONI, não se dignaram em cumprir fielmente seus misteres, como manda a legislação processual penal em vigor, vez que deixaram de solicitar dos prontos socorro municipais de Cuiabá e de Várzea Grande, os prontuários, exames e demais documentos, pertinentes a vítima GEANE, que eram necessários para a complementação do laudo pericial médico enfocado. [...]” (Id. 158317651, p. 1/7)

No presente caso, a...

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